Adilson Filho: Solução para arrastões é a fórmula para a convulsão social

Tempo de leitura: 3 min

arrastão

por Adilson Filho, especial para o Viomundo

A cidade maravilhosa se prepara para receber a última estação antes do verão e o clima já começa a esquentar com um velho problema conhecido dos cariocas: os arrastões nas praias.

No último fim de semana, jovens vindos em maioria do subúrbio e da baixada fluminense tocaram o terror e dessa vez a confusão foi estendida para os bairros vizinhos, Lagoa, Humaitá, Botafogo e outros. A população, mesmo já acostumada a esse tipo de situação, se assustou com algo que jamais tinha acontecido; pois os arrastões, antes, concentravam-se nas praias e, no máximo, nas ruas de dentro da orla marítima.

Diante dese quadro caótico, a solução encontrada pelo “grupo do Cabral”, pra variar só um pouco, é mais do mesmo. É inacreditável a vocação que tem os nossos dirigentes de não aprender com os próprios erros.

O Rio precisa de uma resposta eficiente para esse problema agora, mas a “esquizofrenia” aparentemente calculada do secretário de segurança faz com que ele pese a mão no acionamento da engrenagem pra, na semana seguinte, filosofar belas palavras de combate ao sistema que ajuda a perpetuar.

Enquanto isso, seguimos dando voltas, voltas e mais voltas e parando sempre no mesmo lugar. Reforça-se o policiamento nas praias, no fim de semana posterior afrouxa-se, no outro o couro come pra tudo quanto é lado, daí retira-se os jovens dos ônibus ferindo a constituição e entupindo as delegacias.

Na primeira oportunidade, arrastões novamente em diversos pontos. Guerra nas redes sociais, pressão de todos os lados na opinião pública. Volta-se então a revista nos ônibus depois de atravessarem meia cidade abarrotados de gente e promete-se reforço do aparato policial na orla, que provavelmente durará dois ou três domingos até o próximo arrastão que tem tudo pra ser ainda pior.

Será que precisa ser algum gênio pra perceber que essa aí é a fórmula perfeita do fracasso, o caminho mais rápido para a convulsão social que a cidade está prestes a entrar? Quem pauta o secretário de segurança? A mídia? Sabemos que sim. Uma parcela da sociedade que só pensa em murar, excluir e segregar? É evidente. Políticos e intelectuais que só ajudam a botar mais lenha na fogueira da polarização, reforçando paradoxalmente aquilo que dizem combater? Começo a acreditar que também.

O fato é que por qualquer ângulo que se queira olhar o Estado não pode ser pautado por ninguém.

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Querer discutir o problema de forma mais aprofundada e abrangente agora é inapropriado, insistir na fórmula do ataque reativo de repressão não preciso nem mais dizer.

Será que essa não é a hora oportuna para uma ação mais inteligente da polícia, que equilibre a questão da ordem com os direitos de todos nós?

Atuar na prevenção, mapeando os locais de saída mais críticos, organizando (talvez, junto a guarda municipal), as entradas nos ônibus. Colocar viaturas em locais estratégicos parando os ônibus que apresentaram problemas no caminho.

Largar essa molecada nos 474 da vida se esgoelando pelas janelas como animais e deixá-los atravessar meia cidade num nível excitação a mil é pedir pra arrumar problema dos grandes. E mais a mais, o trabalhador que quer ir à praia com sua família está tendo seu direito cerceado por causa duma galera que toca o terror a vontade e “toma” esses ônibus caindo aos pedaços na marra.Conseguindo neutralizar essa saída é centrar as atenções na orla com boa distribuição, seguindo o mesmo padrão de acompanhamento na hora da volta. Isso certamente minimizará o problema para níveis menos traumáticos de repressão, pro caso de algo sair do controle.

No mais, não há muito o que fazer. Para falar da questão estrutural poderia ficar aqui até amanhã, pois isso passa por diversos fatores de extrema importância, como fomentação de polos de cultura, investimento em escolas mais atraentes, a reforma da polícia, a abertura da cidade de modo a integrar as duas realidades tão distintas e, como não posso deixar de esquecer a regulação dos meios de comunicação para que tenhamos uma mídia com conteúdos onde esses jovens apareçam representados e não marginalizados e estigmatizados. Mas, como disse, a sociedade espera do Estado uma resposta para esse problema agora. Domingo que vem, a previsão é de sol e todos os cidadãos cariocas tem o direito ao seu lazer, todos.

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Comentários

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Urbano

Arrastão pra valer mesmo é o que os bandidos fascistas da oposição ao Brasil sempre fizeram neste…

Edgar Rocha

Colegas Mário e Dhiego, não sei nem se posso agradecer pelo fato de que, desgraçadamente, as peças se encaixam e a obviedade do que se delineia já causa arrepios em muitos. Me sentiria um urubu se o fizesse. Esforcei-me pra compreender, a partir do que observo em torno de minha realidade limitada e do imprescindível trabalho de informação deste espaço, o Viomundo, entre outros, a fim de extrair dentro de mim um pouco de serenidade. Coloco minha opinião, na certeza de que posso encontrar gente bem mais preparada do que eu e disposta a dialogar sobre este tema, que pra mim é dos mais urgentes. Respeito eventuais discordâncias e tenha certeza de que, sendo bem mais embasadas do que meu ponto de vista, são incorporadas à minha opinião sem nenhum pudor. A gente precisa mesmo tentar entender. Ao menos pra não se sentir tão perdido, ou ficar à mercê de nosso fígado (o meu fala muito, tenham certeza). Compreendo que certos desabafos extremados que lemos na internet ou escutamos no cotidiano, sejam mesmo fruto da impotência diante de agressões constantes e reais. Procuro pedir que sejamos condescendentes e tenhamos um pouco de paciência também com os que agem sob o espasmo da indignação ignorante. Não dá pra ser racional o tempo todo. Além de violentada, a população em geral vem sendo manipulada habilmente pelos que desejam implantar o caos, de maneira fria a calculista. São estes os perigosos. Esta gente que não perde a cabeça nunca. O ódio deles é muito maior, sobretudo quando sofrem derrotas e frustram seus egos. E se existe manipulação massiva, com certeza, existirá gente mais susceptível. Caso contrário, não teríamos com o que nos preocupar. Que fique claro, a razão pra disseminação do medo é justamente, forçar as pessoas e as instituições a curvarem-se diante de uma solução egoísta e imediata. Não tenho dúvidas de que aquilo que por anos ouvi chamarem de ‘mudança de paradigmas sociais’, entendido como uma abstração inevitável, uma força da natureza a qual nós temos que nos adaptar, é algo milimetricamente arquitetado. Por mais neurótico ou “conspiranoico” que pareça, não vejo outra forma de entender a naturalização da maldade que só faz crescer já há um bom tempo.
De qualquer forma, obrigado por considerarem meu ponto de vista.

    Mário SF Alves

    Pois é, meu caro Edgar, o tempo passou. Nossa esperança e nossas convicções estão sendo violentamente postas à prova. A esse respeito, vide agressões e injustiças feitas à presidenta Dilma, ao Stédile, ao Mantega, ao ex-ministro Padilha, ao Hadad, ao José Genuino, ao José Dirceu, ao Vaccari e a outr@s.

    Cinquenta anos de iniquidades. Cinquenta anos à espera da divisão daquele bolo ao qual se referiu o ex-todo poderoso ex-ministro Delfim Netto, um dos baluartes daquele hediondo regime que mediante o vergonhoso e trágico golpe civil-militar de 64 jogou por terra as até hoje imprescindíveis Reformas de Base do eterno presidente João Goulart, e que, sob o pretexto de livrar o Brasil da ameaça comunista, mergulhou o País em 21 anos de trevas e em tenebrosas transações.

    Receita errada, premeditadamente errada. “Apostou-se tudo” na falácia do crescimento econômico via modernização conservadora, mantendo inalteradas as distorções estruturais. Não à toa falaram em milagre econômico, e não à toa contra-argumentamos que milagre mesmo era o brasileiro viver com o salário mínimo da época.

    É isso: bolo sem fermento não cresce nunca. Por isso mesmo vamos continuar queimando nossos parcos neurônios. E sorte a nossa que podemos pensar juntos, sem pretensões, e tão somente por puro amor à humanidade.

lulipe

Será que a Dep. Maria do Rosário aceitaria um convite para pegar uma praia no próximo domingo no Rio???

maria nadiê rodrigues

Morei algumas décadas na Cidade Maravilhosa, passando pelo tempo em que a gente mal sabia que existiam batedores de carteiras, inocentes delinquentes se comparados aos de hoje. Vi a violência subir degraus. Foi, contudo, após as imagens que observei nas televisões com o primeiro arrastão em Ipanema, num domingo, com mães se perdendo dos filhos, e tantos desesperos de todos, que eu me decidi a deixar aquele paraíso, que é a capital do Rio de Janeiro. Sou apaixonada por ela, e acho que a conheço melhor que muitos cariocas da gema, como eles dizem. O problema das vítimas de um crime dessa natureza é o de não saber, em absoluto, o que fazer, como sair da encruzilhada, pra onde correr, ou se deve ficar no mesmo lugar. Enfim, eu, graças a Deus, não me vi nessa situação, mas fico horrorizada com tais imagens.

Marco André

Praia do Pinto e Catacumba retornam, após mais de 50 anos de escassos avanços sociais na Vila Kennedy e outras, para aterrorizar a elite que aplaudiu intensamente sua remoção/expulsão.

Edgar Rocha

São 01:12 da matina e eu só vou conseguir dormir em Itaquera, São Paulo, quando uma dúzia de garotos agressivos com a cara cheia de cachaça, narguilê e sei lá o que mais, deixar (isto vai ser por volta das 03:00, como sempre tem sido nestes últimos tempos). Acaba de passar uma viatura que desfilou lentamente pela rua, como se não vissem nada acontecer. Aquela mesma história: o cidadão (sic) tem o direito de ir e vir. De preferência em motos, sem capacete, sem carteira de habilitação, pois são menores, quebrando garrafas nas paredes das casas ou em carros tunados. Por estes dias (num período de duas semanas) morreram sete garotos em acidentes diversos. Acidentes? Sei lá. Ao que tudo indica, com a presença ostensiva da polícia, parece que estão fazendo proteção a eles. Nas redondezas anda ocorrendo chacinas, como todos sabem. É ver os noticiários. E os moleques são peixinhos dos “ome” da região. São galinhas dos ovos de ouro.
Enfim, a questão é tão ambígua que chega a ser perfeita. Se de um lado, na classe média, grupos se organizam em milícias de marombados (começou no Rio e já, já a moda pega por aqui), por outro lado, é preciso construir a imagem do inimigo interno pra justificar estas ações abençoadas pela mídia ao estilo sheherazade. As manifestações de rua não foram suficientes pra dar vasão ao ódio de classe. Nem pra tirar o PT do Governo. Parece que vem surgindo uma nova estratégia. O heroísmo de quem foi às ruas brigar contratudoquetaí, foi desmascarado. O Brasil e o mundo já reconhecem a enorme palhaçada, o jogo de manipulação midiática com pretensões muito pouco democráticas. É preciso investir em algo mais concreto, algo que desperte um certo senso de ação que as instituições insistem em negar à sociedade, seja por questões óbvias, já que setores como o judiciário e as polícias estão envolvidos até as tampas com o golpismo, seja pelo malfadado “republicanismo”, que nada mais é que a soma de todos os argumentos para justificar a covardia moral dos que deitam em berço esplêndido, apostando nas fichas do lulismo pavamô, nada revolucionário e embasado na omissão, muito mais que na conciliação.
Sempre que comento questões de segurança, atento para um fato que esfola a pele do cidadão comum, mas que escorrega sem nenhum atrito sobre o couro oleoso de nossos representantes. Falo da banalização da violência infringida de forma reichiana pela mídia, da relevância da corrupção dos agentes de segurança no processo de solidificação de conceitos que vão ao encontro desta banalização e do processo de cooptação massiva da juventude como setor mais susceptível da sociedade ao discurso fascista. Discurso este que seduz pela ilusão da proximidade com o poder, pelo direito instituído pelos administradores do crime (oficiais ou não) ao abuso perante a todos os outros setores realmente responsáveis pela sustentação do país (falo da base: trabalhadores, o cidadão comum, o ser produtivo e por que não dizer, a própria classe média e sobretudo, as próprias famílias dos jovens) e que sustenta a enorme sensação de insegurança, de medo, de desarticulação social.
O caldo de cultura para as investidas fascistas contra a fronteira democrática que os impede de tomar o poder está criado. Há um inimigo comum que é o jovem e, por conseguinte tudo que ele representa (negro, pobre, morador da periferia). Há agentes corrompidos, educados e formados para agir movidos pelo ódio e pela indiferença em relação ao cidadão. Há o heroísmo de classe, surgindo com hordas de salvadores da pátria (arruaceiros disfarçados de bons moços). Há um conjunto de lideranças sob risco iminente de serem desmascarados ou confrontados pelas forças progressistas. Há a inoperância dos representantes destas forças, cuja inércia coloca em risco não só a democracia, como também a confiabilidade nos setores de defesa contra o golpe.
Resta saber se o caos se instalará como querem os estrategistas desta empreitada golpista. Fazendo um paralelo, Hitler soltou sua matilhas de cachorros loucos – a juventude hitlerista e as S.A. – sob a desculpa de se restaurar a ordem e o Estado de Direito, usando do discurso revolucionário para justificar moralmente suas ações tresloucadas. Em resposta, o parlamento lhe conferiu plenos poderes sobre as S.S. – o braço armado do Estado – chegando sobre os ombros de um povo que não aguentava mais ser achacado por garotos ensandecidos e sem limites. Ele conseguiu o poder institucional em suas mãos, através da coação física da cidadania. O passo seguinte foi a perseguição a estes mesmos jovens – seus aliados – e o extermínio dos mesmos. O resto todos sabem.
Ainda falta no Brasil a revelação da figura aglutinadora que provavelmente está controlando a crescente onda, agora com a juventude fascistoide agindo por iniciativa heroica. Do outro lado, considerando a promiscuidade entre as PM’s (lembrando que esta se encontra nas mãos de representantes da direita) e o crime organizado – sobretudo os narcos – as gangues de garotos enfurecidos botam terror, impulsionados tanto por usas lideranças do crime, quanto pelo Estado que os administra. Quando a figura articuladora surgir, com certeza colocará o exército nas ruas – a nossa SS – pra limpar o terreno (eliminando a garotada do crime e também seus novos antagonistas milicianos e marombados). Se conseguirem instalar o caos, não vai demorar para que a própria Dilma “negocie” ao modo republicano, com o grupo que estiver por trás desta bagunça. Ai, colegas, o mal já estará banalizado. E crescerá para todos os lados. Da direita para a esquerda. Veremos os efeitos de uma síndrome de Estocolmo.
Concluindo, tudo que os golpistas querem no momento, e acredito nisto por força de contingências históricas já analisadas exaustivamente desde o fim da 2ª Guerra, é instaurar um estado de guerra civil, capaz de catalizar os agentes políticos para uma solução que só poderá ser oferecida pelos próprios gestores do processo. Estes, ao contrário de Hitler, não são corajosos (ou burros), o suficiente para assumir sua liderança no esquema. E nem permitirão a personificação do pensamento restaurado do fascismo, com data marcada pra perder a validade, assim que o poder voltar pras mãos dos que nunca aceitaram dividi-lo com outros setores da sociedade. Será um genocídio ao estilo “ditabranda”. Sem observadores capazes de estabelecer um senso crítico sobre o que enxergam. E tudo isto, lógico com o apoio externo de sempre. O mesmo que não tem pudor em apoiar ditaduras como a Saudita, nem de infringir o sofrimento profundo a toda uma região do mundo, pelo mero prazer sádico de ver pessoas se digladiando ou fugindo. Creio que nem mais o petróleo justifique tamanha maldade no Oriente Médio. O que poderão fazer com os pobres deste país, já que o ódio ao povo é a única coisa escancarada neste jogo complexo que se descortina?

    Mário SF Alves

    Prezado Edgar,
    São 14:37 h e só agora, após 15 minutos, conclui a leitura de seu texto. É de fundir os neurônios. Não o texto, mas a amplidão da realidade à qual você se propõe a investigar.
    Pois que seja assim. Sacrifiquemos um pouco os tais neurônios, contanto que o resultado disto seja a efetiva contribuição ao entendimento de nosso inadiável progresso civilizatório.
    Saudações democráticas.

    Dhiego

    Caro Edgar, conseguiste amarrar todos os elementos que formam o complexo quadro que vivemos. Tenho me questionado bastante sobre a ausência desta figura aglutinadora da qual tu falou, de que todas as condições para o horror já estão prontas, à espera do líder. É assustador. Sou professor de História e, com a devida referência, vou usar teu comentário/texto em minhas aulas. Saudações.

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