José Antonio Lima: Quando falta espírito olímpico nas Olimpíadas

Tempo de leitura: 4 min

Ética no esporte

08.08.2012 07:25

Em Londres, o espírito olímpico está em falta

por José Antonio Lima, na CartaCapital

A cinco dias do fim das Olimpíadas de Londres, é certo que os Jogos de 2012 entrarão para a história marcados pelo grande número de violações éticas. As “entregadas” e outros artifícios usados para levar vantagem foram cometidos em diversos esportes, do ciclismo ao badminton, por atletas de inúmeros países. O Comitê Olímpico Internacional (COI) e as federações de cada modalidade tentaram reagir, mas pouco puderam fazer para conter a desonestidade, um sinal de que precisam se mover de olho em futuras competições.

O mais notório feito antiético de 2012 ocorreu no badminton. Quatro duplas femininas – duas da China, uma da Coreia do Sul e outra da Indonésia – foram eliminadas por entregar Jogos em busca de uma chave mais favorável na segunda fase da competição. A falta de esforço e os erros propositais ficaram tão claros que a Federação Mundial de Badminton exigiu a eliminação das atletas para não prejudicar a imagem do esporte. A fraude foi facilitada por uma mudança no regulamento do badminton nos Jogos. Antes, os times se enfrentavam no chamado confronto mata-mata e os vencedores iam avançando até as finais. A partir de 2012, há grupos na primeira fase, e as duplas podem “manejar” seu resultados para escolher quem enfrentarão nas fases subsequentes.

Regulamentos parecidos provocaram “entregadas” em outros esportes. Na segunda-feira 6, após estar ganhando do Brasil por 66 a 57 no terceiro quarto, a seleção masculina de basquete da Espanha perdeu por 88 a 82. Com o resultado, caiu em uma chave na qual não está a seleção norte-americana, amplamente favorita ao ouro. O Comitê Olímpico Brasileiro (COB) celebrou a vitória da “dignidade”. O técnico do Brasil, o argentino Rubén Magnano, afirmou que o triunfo representava o “caráter” de seu time. Os espanhóis negaram ter facilitado o jogo, mas a França, rival da Espanha nas quartas de final, entrou com um protesto solicitando a eliminação da rival, rejeitada pelo COI.

Episódios semelhantes ocorreram no handebol e no futebol femininos. O Brasil foi eliminado na manhã da terça-feira 7 pela Noruega, atual campeã olímpica, um confronto que só ocorreu logo nas quartas de final porque as norueguesas perderam seu último jogo da classificação, de forma suspeita, para a Espanha. Para a Noruega, instável na competição, enfrentar o Brasil, um time sem muita tradição, seria mais fácil que encarar a Croácia. O dinamarquês Morten Soubak, técnico do Brasil, lamentou o confronto precoce e a eliminação. “Na maneira como eu cresci, não posso admitir perder de propósito”, disse ele ao portal UOL.

No futebol, a coisa foi mais escancarada. Norio Sasaki, técnico do Japão, convenceu suas jogadoras a empatar com a fraca África do Sul no último jogo da primeira fase. Com o segundo lugar (em vez do primeiro) as japonesas escaparam dos Estados Unidos e da França e enfrentaram também o Brasil, mais fraco. Ganharam por 2 a 0 e estão na semifinais. Sasaki não escondeu o desejo pelo empate. “Foi uma forma diferente de jogar comparada com o jogo normal, mas as jogadoras concordaram comigo”, disse ele à agência AP.

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A mesma desfaçatez de Sasaki tiveram o nadador sul-africano Cameron van den Burgh e o ciclista britânico Philip Hindes. Em entrevista ao jornal Sydney Morning Herald, o campeão dos 100m peito admitiu ter “roubado” na final ao fazer um movimento submerso irregular capaz de dar a ele alguns importantes centésimos de segundo. Sua justificativa? Todo mundo faz. “Se você não faz isso, vai ficar para trás”, disse.

“Obviamente não é a coisa moral a se fazer, mas não estou disposto a sacrificar minha performance pessoal e quatro anos de trabalho por alguém que está disposto a fazer (o movimento ilegal) e não ser pego”, disse. Hindes também admitiu uma fraude. Após um início ruim na prova da perseguição por equipes, Hindes caiu de propósito na pista. Como o regulamento autoriza o reinício em caso de queda, Hindes teve uma segunda chance, foi melhor e, como consequência, o Reino Unido levou a medalha de ouro.

Atos antiéticos no esporte estão longe de ser uma novidade, mas são ainda mais graves nos Jogos Olímpicos. A competição foi fundada por um homem que imortalizou o pensamento segundo o qual “o essencial não é ter vencido, mas ter lutado bem” e hoje exige, por regulamento, “fazer o máximo esforço para vencer”.

O mundo que o barão Pierre de Coubertin imaginou, porém, não existe mais, ou talvez jamais tenha existido. O esporte não é um mundo afastado do restante da sociedade. O esporte é parte da sociedade e, assim, é preciso que as autoridades estabelecidas atuem para reduzir as oportunidades de desvios éticos. Para preservar a imagem do esporte, seu produto, o COI e as federações precisam agir.

No vôlei, uma parte dos confrontos da segunda fase é sorteada para evitar falcatruas como a que ocorreu no Mundial de 2010. Naquele ano, diante de um regulamento feito para beneficiar a Itália, sede do torneio, Rússia, Estados Unidos e Brasil perderam jogos de propósito em busca de confrontos mais fáceis. A medida não evita “entregadas”, mas minimiza a chance de escândalo, e poderia dar resultado em outros esportes coletivos. Mudanças de regras beneficiariam também o ciclismo e a natação, especialmente no nado peito, conhecido pelas polêmicas.

Além de Van den Burgh, o medalhista de prata em Londres, Brenton Rickard, também fez o movimento irregular, assim como campeões em outros torneios, como o japonês Kosuke Kitajima e o brasileiro Felipe França. Todos se sentem à vontade para burlar as regras pois não há fiscalização submersa nos Jogos. Gravações em vídeo embaixo da água só foram usados num único campeonato, na Suécia, em 2010. O nadador sul-africano, que venceu “roubando”, se lembra com saudades da competição. “Foi realmente sensacional, porque ninguém tentou fazer (o movimento ilegal)”, disse Van den Burgh. “Todo mundo jogou limpo e todos estávamos tranquilos porque sabíamos que ninguém iria tentar”.

PS do Viomundo: A Espanha, que perdeu do Brasil no basquete, derrotou a França (66-59) e vai jogar a semifinal com a Rússia (que bateu o Brasil por um ponto na primeira fase) a semifinal; o Brasil perdeu da Argentina e está fora. E o técnico do atleta chinês que perdeu a medalha de ouro para o brasileiro Arthur Zanetti diz que foi roubo!

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Comentários

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FrancoAtirador

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O ESPÍRITO OLÍMPICO ACABOU,

QUANDO TROCARAM AS FOLHAS DE LOURO

POR OURO, PRATA & BRONZE.

O DESPORTO FOI INCORPORADO AO CAPITALISMO

FUNDADO NO TRINÔMIO DINHEIRO, FAMA & PODER.

É TAMBÉM UMA FORMA DE DARWINISMO SOCIAL.
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A Flor da Inglaterra (Keep the Aspidistra Flying)
George Orwell
Tradução de Sérgio Flaksman
Companhia das Letras, 2007
320 páginas

Sinopse

Trata da subordinação forçada a que a Humanidade está submetida em relação ao dinheiro.

O personagem principal, Gordon Comstock, vive na Inglaterra nutrindo constantemente uma sensação de asco e pavor pelo capitalismo e por tudo o que é dele derivado.
Essa obsessão para não embarcar no sistema capitalista inicia em sua infância pobre e o persegue até seus trinta anos, época em que encara tudo isso muito mais à sério, o que o leva a não aceitar empregos que o paguem bem e a se envolver em situações complicadas por causa da falta de dinheiro.

Georges Orwell, pseudônimo de Eric Arthur Blair, foi um rebelde crítico à sociedade em que vivia.

Aqui, em A flor da Inglaterra, Orwell constrói, ao mesmo tempo, uma sátira da vida literária e uma fábula bem realista sobre a sociedade e a marginalização causada pelos problemas sociais.

Uma das melhores críticas em ficção à sociedade capitalista.

Orwell narra os esforços desse personagem atípico de se afundar na lama, com lirismo e ironia, intercalando as desventuras da vida deste guerreiro ao contrário e o encontro a todo instante com uma planta doméstica que ele elege símbolo dessa ordem injusta, vazia e massacrante.

Segundo Gordon, a aspidistra é a flor que todo o inglês “respeitável” que possua uma boa casa, uma família e ao menos um pouco de dinheiro, e todo inglês “não respeitável” e pobre que deseja “entrar na linha”, e assim tornar-se digno de respeito, possuem e regam todos os dias.

A aspidistra simboliza o sentimento de conformidade que a maioria nutre pelo sistema vigente e sobre o qual é impotente, tendo que necessariamente a ele se resignar e se adaptar.

A flor da Inglaterra é um livro único, com um humor seco inigualável e cenas esquálidas em meio à procura por dinheiro e ao combate a esse vil metal.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Keep_the_Aspidistra_Flying#cite_note-2

http://en.wikipedia.org/wiki/Keep_the_Aspidistra_Flying

http://www.amigosdolivro.com.br/lermais_materias.php?cd_materias=4813

http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=12216

http://www.companhiadasletras.com.br/autor.php?codigo=00599

Jairo Beraldo

Usaram da “malandragem” brasileira…otários foram os comandados do Magnano.

Willian

Aproveitando o ensejo, parabenizo a Confederação Brasileira de Atletismo pelo bom desempenho de nossos atletas em Londres. Vimos que o orçamento de R$25.000.000,00 dese ano (R$16.000.000,00 de patrocínio da Caixa Econômica Federal) foi bem empregado.

Alexandre Carlos Aguiar

O esporte é a atividade que você executa para te dar saúde. A partir do momento em que vira competição se transformar em jogo, onde todos os artifícios possíveis e/ou ilegais são usados para vencer. Jogo é assim. Não se pode ser complascente com a falta de ética, mas deve-se entender, porém, que num jogo vale tudo. Ou ao menos se quer que valha tudo.

LEANDRO

O esporte é resultado. Chamo isso de estratégia usada por todos os países.

Fabio Passos

Eu suspeito que a maior parte dos atletas de ponta são preparados com muito mais do que treinamento e boa alimentação. Estas artimanhas de jogar para perder a fim de evitar cruzamentos difíceis também é lamentável.

O esporte virou negócio.
E o sucesso nos negócios é valor mais importante que saúde e ética no mundo em que vivemos.

Mateus

E deveriam retirar, das olimpiadas, o futebol, de gramado, masculino das olimpiadas. E colocar o futebol de areia no lugar dele. Pra mim o esporte que mais fere as regras de uma competição leal é o futebol do gramado.

Wagner

Isso reflete a falta de valores dos dias atuais.

O ganhar a qualquer preço é a tônica do momento. Partidas combinadas, racismo (!!!), brigas…e nada de espírito olímpico. Triste.

josaphat

Não sei se concordo. Esse papo de espírito olímpico não me convence. Quem que realmente está interessado apenas em competir? O negócio é vencer. Perder uma partida para percorrer um caminho mais fácil é um raciocínio lógico dentro de uma situação de jogo. Em um jogo, sempre há um vencedor. Não se trata de brinquedo ou de brincadeira de faz-de-conta. O que não dá para aceitar é a falta de arte, de mandinga para perder. Tem que fazer um teatro bem feito, né.

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