Parentes de desaparecidos estranham “silêncio dos governantes” sobre denúncia em livro

Tempo de leitura: 3 min

Da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, encaminhado via e-mail por Ricardo Maciel

Excelentíssimo Senhor

Doutor José Eduardo Cardoso Ministro

Digníssimo Ministro da Justiça

Senhor Ministro,

A Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos da Ditadura Militar foi tomada de triste surpresa com a notícia que saiu nos jornais da grande imprensa de que um dos possíveis integrantes do aparato repressivo, Sr. Cláudio Guerra, segundo sua própria confissão, foi responsável pela morte e desaparecimento dos corpos de, pelo menos, 12 presos políticos, além de lideres camponeses e vitimas de grupos de extermínio.

Alguns, por volta de dez, foram incinerados num forno de uma Usina na cidade de Campos, Estado do Rio de Janeiro, o que até nos faz lembrar o holocausto ocorrido na 2ª. guerra mundial, no qual os nazistas mandavam para os fornos, para morrerem incinerados, milhões de pessoas por serem judeus, comunistas, ciganos, entre outros.

A notícia estarrecedora vem acompanhada de nomes já conhecidos da repressão política, como o Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (comandante do DOI-CODI do 2º. Exército) e outros mais. Até a morte de um dos mais terríveis torturadores do país, Sérgio Paranhos Fleury, delegado do DOPS de São Paulo foi um assassinato tramado nos bastidores da Comunidade de Informações coordenado por aquele Coronel e realizado pelos integrantes do CENIMAR (Centro de Informações da Marinha), segundo as denúncias deste senhor Claudio Guerra.

Mais uma vez os familiares de desaparecidos são atingidos e enxovalhados por informações de um policial sobre seus parentes, cujos restos mortais jamais lhes foram entregues, o que lhes faz sofrer ainda mais. Sempre que se fala dos nomes de seus parentes desaparecidos com relatos sobre como teria sido o seu fim, os familiares transbordam sua dor e lamentam não terem informações oficiais e concretas.

O descaso das autoridades machuca ainda mais as feridas abertas que sangram até o presente momento. Serão verdadeiras as informações? Fica, mais uma vez, a pergunta sem resposta. A dúvida persegue os familiares que não obtiveram a resposta definitiva e contundente do estado brasileiro até os dias de hoje. E perguntamos: até quando iremos conviver com essa dúvida, com a falta de esclarecimentos sobre o fim de cada um dos desaparecidos políticos? Até quando o estado brasileiro vai nos negar o direito à verdade e à justiça?

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Imagine Vossa Excelência, como ficam parentes do dirigente comunista David Capistrano e seu companheiro de militância política, José Roman, da professora da Universidade de São Paulo, da Escola de Química, Ana Rosa Kucinski, que teria sido estuprada antes de ser morta juntamente com seu esposo, Wilson Silva, por seus algozes ou, de Fernando Augusto de Santa Cruz, desaparecido desde 24 de fevereiro de 1974, cujo cadáver teria sido incinerado, conforme as informações do policial?

Enfim, imagine Vossa Excelência, como fica a sociedade brasileira, frente a dor dos familiares que recebem tais denúncias sem que as autoridades do poder publico digam-lhes uma palavra de solidariedade, uma palavra de ânimo, uma palavra que lhes fortaleça e que lhes faça acreditar que saberão toda a verdade. Muito menos ouvimos uma palavra que indique a vontade política de apurar tais crimes.

Reiteramos, portanto, que nos causou muita tristeza e dor não ter tido nenhuma manifestação política no sentido de enfrentar a questão por parte do governo federal. Afinal é papel do estado e de seus governantes apurar crimes como estes. Nossos familiares tombaram por todo o povo brasileiro que vivia sob uma ferrenha ditadura militar, sem voz, sem direito a se organizar e participar, sem liberdade e sem justiça.

Estranhamos o silêncio dos governantes, neste momento, porque afinal, temos tantas pessoas do governo que também conheceram de perto e foram vitimas das atrocidades da ditadura militar.

O que podemos dizer-lhe é que seguiremos em busca da verdade e da justiça em que pese a omissão dos governantes que, muitas vezes, nos deixam ainda mais cheios de dor e tristeza.

Gostaríamos que fossem tomadas todas as medidas cabíveis de forma imediata. A nossa espera tem sido longa demais. Diante de afirmações como estas do policial, o que podemos fazer, nós familiares de mortos e desaparecidos políticos?

Atenciosamente,

Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos

Em 03 de maio de 2012

Leia também:

Lista dos 233 torturadores feita por presos políticos de 1975

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Comentários

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Lincoln Secco: Dirigentes atuais da USP querem apenas respirar o ar do mercado « Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] Parentes de desaparecidos estranham “silêncio dos governantes” sobre denúncia em livro […]

Roberto

Tem certeza que estão pedido isto para o ministro Zé?

marcosomag

este senhor nunca apareceu nos relatórios criteriosos do Tortura Nunca Mais, por exemplo. Suas declarações devem ser investigadas com o devido distanciamento. Para mim, pode ser jogo tergiversador em cima da Comissão da Verdade.

    Luiz Carlos Azenha

    É por ai. Precisamos de uma investigação. abs

duarte

Em menos de seis meses, privataria tucana, cachoeira e agora o submundo sujo da tortura durante a ditadura, e nada na mídia, vivemos um mundo de informações paralelo, com muita gente olhando sem dizer nada, lembrem que em todos os casos acima a imprensa tem um papel, na privataria o silencio, no cachoeira o dinheiro e na ditadura sangue….nunca é bom falar nisso…..

oziel f. de albuquerque

Quem deveria tomar providencia contra estes torturadores não é o governo,e sim o poder jusdiciario o que eles fizeram são crimes.

Julio Silveira

Mas o ministro não é o Zé? pelo menos assim que os amigos o tratam, inclusive o Dantas. Assim como tem Greenhalgh, nem todos no PT são confiáveis para o povo.

Pedro Migão

Eu estou acabando de ler o livro. Os detalhes que ele dá a respeito da repressão me pareceram bastante convincentes.

O livro também mostra com detalhes como foi planejado o atentado do Riocentro em 1981 – e porque a bomba explodiu.

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