Isabel Bressan: Será o brasileiro solidário no câncer?

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Será o brasileiro solidário no câncer?

por Isabel Bressan, no Blog do Cebes

Nesta segunda semana de setembro será sancionada a Medida Provisória 553/2012. Festejada como medida de estímulo para a economia, dentro do programa econômico Brasil Maior, estabelece desonerações fiscais e da folha de pagamentos para diversos setores.

No embalo dessas medidas a Medida Provisória traz em seu artigo primeiro uma novidade para a Saúde: desconto no imposto de renda devido para pessoas físicas e jurídicas em troca de contribuição a entidades de saúde filantrópicas para aplicarem em ações de combate e prevenção ao câncer. Esses recursos poderão custear prestação de serviços médico-assistenciais para diagnóstico, tratamento, cuidados paliativos e reabilitação, formação de recursos humanos e pesquisas clínicas ou epidemiológicas.

Aí reside uma questão: ao inaugurar uma nova forma de custeio de assistência ao câncer por meio de recursos públicos de renúncia fiscal, a MP não condiciona que o acesso a esses serviços será universal e igualitário, por meio do SUS. Ela atribui ao Ministério da Saúde decidir que ações e serviços farão jus ao benefício.

Do modo como está, poderemos ver entidades como os hospitais filantrópicos Sírio Libanês e Albert Einstein recebendo recursos de empresas e pessoas físicas, advindos de recursos públicos de renúncia fiscal para aplicar no custeio de tratamento de câncer exclusivo para beneficiários de planos de saúde. Estaria aí inaugurada uma nova forma de subsídio público para o mercado de planos de saúde. Ou serão os doadores tão solidários a ponto de direcionarem seus impostos apenas para serviços com acesso universal e igualitário?

Aliás, subsídios públicos para tratamento de câncer por planos de saúde não são nenhuma novidade. Em abril último o Ministério da Saúde lançou um programa para aplicar de 505 milhões de reais no aumento de estruturas assistenciais de radioterapia e na compra de aceleradores lineares para o tratamento do câncer. Por meio da Portaria MS nº 931 instituiu o Plano de Expansão da Radioterapia no Sistema Único de Saúde, que irá criar ou expandir a capacidade assistencial em 80 hospitais.

O Plano de Expansão da Radioterapia no Sistema Único de Saúde não estabelece qualquer fonte de financiamento de custeio pelo SUS para os tratamentos que serão possibilitados pelo aumento da estrutura assistencial. Além disso, os critérios utilizados para a ordem de classificação e de prioridade dos hospitais interessados, embora tenham o mérito de priorizar entidades situadas em áreas com menor oferta de tratamento e de excluir empresas com fins lucrativos, não levam em conta o percentual de dedicação ao SUS de cada entidade.

Resultado: em torno de 60% dos hospitais escolhidos atendem por intermédio da SUS e de clientes de planos de saúde, muitos deles com planos privados de saúde próprios. Sem garantia de custeio adicional do SUS para os tratamentos, esses hospitais irão condicionar o acesso aos serviços ao pagamento de um plano de saúde por parte dos pacientes.

Não é para menos que o Plano de Saúde Santa Casa da cidade de Passos – MG com Registro ANS nº 3387-5 como Plano Filantrópico, que “detém 40% do mercado regional de planos de saúde” e a vantagem competitiva de manter uma “rede própria hospitalar de altíssima qualidade, pronta para oferecer recursos de tecnologia de ponta”, faz propaganda em sua página comercial da possibilidade de investimentos do Ministério da Saúde em seu hospital para instalação de Acelerador Linear para tratamento de câncer e de leitos de UTI.

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Mas não reside aí uma novidade. As iniciativas públicas de alocação de equipamentos de radioterapia no Brasil, a partir dos anos de 1990, não garantiram aumento de recursos financeiros públicos de custeio pelo SUS para os serviços que seriam gerados com a maior oferta de equipamentos. Assim, de modo natural, a maioria dos equipamentos foi para regiões onde o sistema privado de saúde poderia custear sua utilização, em estabelecimentos de saúde de clientela compartilhada.

Desde então, a prática de instalação com dinheiro público de novos equipamentos de radioterapia em estabelecimentos de clientela compartilhada vem proporcionando o aumento da estrutura assistencial para o câncer disponível para o setor privado, deixando para a falta de custeio para o SUS o papel de limitar os gastos em saúde, em nome do equilíbrio das contas públicas, promovendo um estímulo à procura por planos de saúde com promoção do setor privado por meio de ações governamentais, bem ao estilo das antigas receitas de privatização do Banco Mundial.

Agora, para completar esse quadro, teremos com a Medida Provisória 553/2012 a novidade de custear com recursos públicos oriundos da renúncia fiscal a prestação de serviços médico-assistenciais para o combate ao câncer, exclusivos para quem paga plano de saúde?

Com a palavra, o Ministério da Saúde.

Aparecida Isabel Bressan é Médica Sanitarista, Mestre em Políticas Públicas de Saúde pela ENSP/FIOCRUZ e Diretora do CEBES.

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