Jeferson Miola: Governo deveria tratar a carestia como emergência social
Tempo de leitura: 4 min
Governo deveria tratar a carestia como emergência social
Por Jeferson Miola, em seu blog
O governo deveria tratar a carestia dos alimentos como uma emergência social devido ao risco de causar insegurança alimentar, fome e endividamento de milhões de brasileiros.
Para adquirir os itens alimentícios da cesta básica, o trabalhador brasileiro gasta, em média, mais de 40% do salário mínimo, que desde 1º de janeiro é de 1.518 reais. Em São Paulo o custo da cesta básica é o maior do país – R$ 851,82, quase 60% do salário mínimo.
O pesado comprometimento da renda do trabalho com alimentação reduz drasticamente o poder aquisitivo de 70% da população brasileira, que fica sem dinheiro “para atender as [demais] necessidades vitais básicas dos trabalhadores e suas famílias com moradia, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social”, que deveriam ser garantidas com o salário mínimo [art. 7º da Constituição].
O Dieese calcula que o salário mínimo deveria ser hoje de R$ 7.156 para assegurar condições mínimas de sobrevivência. No entanto, o valor vigente representa apenas 21% do salário mínimo necessário calculado pelo Dieese.
A população brasileira é, na sua enorme maioria, pobre, de baixa renda, e sobrevive com uma remuneração deficitária.
Cerca de 38% ganha até um salário mínimo e 32% ganha entre um e dois salários mínimos. Além disso, outras 20,5 milhões de famílias, 53,9 milhões de pessoas, recebem em média 671,21 reais por mês de auxílio do Bolsa Família [Fonte: mds.gov.br]
Isso significa, portanto, que mais de 80% da população do país sofre drasticamente com a carestia; e, portanto, depende de políticas de Estado para não padecer de uma catástrofe humanitária.
A experiência internacional mostra que para enfrentar os efeitos do alto custo da alimentação e seus impactos nefastos para os trabalhadores e suas famílias, governos nacionais precisam adotar medidas extraordinárias, com custo orçamentário relevante. A austeridade fiscal, nesse contexto, não é remédio; é veneno.
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A inflação de alimentos desafia governantes no mundo inteiro. É um fenômeno pós-pandemia que persiste no tempo e cobra dos governos a adoção de medidas de proteção e ajuda às pessoas, especialmente aquelas mais vulneráveis.
Em ensaio publicado na Foreign Affairs, a professora da Universidade de Massachussets Isabella Weber descreve dois tipos de governos:
[i] o dos EUA, Reino Unido, Japão e da Índia, que colheram resultados eleitorais desfavoráveis, porque perderam a batalha contra a inflação de alimentos, e
[ii] os governos de países que venceram essa batalha, como do México e da Espanha.
“Os governos podem se manifestar e proteger os cidadãos contra choques de custos em tempos de desastres”, ela sustenta.
No México, por exemplo, no ano de 2023 o governo do então presidente Andrés Manuel López Obrador, conhecido como AMLO, despendeu 20,4 bilhões de dólares, correspondentes a 1,4% do PIB do país, em medidas para assegurar o acesso da população a alimentos e itens essenciais de consumo.
AMLO “lançou um ambicioso pacote de políticas com o objetivo de estabilizar os preços de bens dos quais as pessoas e as empresas não podem prescindir”, descreve Isabella.
O governo mexicano estabeleceu um acordo com os oligopólios do setor da alimentação para garantir um teto do preço da cesta básica com 24 produtos essenciais – além de alimentos de consumo habitual das famílias, itens essenciais de higiene.
E AMLO também estimulou a produção da agricultura familiar, como faz o governo Lula por meio do PRONAF, para aumentar a produção de milho, feijão, arroz, leite e alimentos básicos e criar estoques reguladores.
AMLO também “limitou os preços da gasolina, do diesel e do gás liquefeito de petróleo, bem como os preços da eletricidade para as famílias, por meio de subsídios que foram pagos em parte pelas altas receitas da empresa estatal de petróleo, a PEMEX”. Tudo para preservar o poder de compra corroído pelo custo elevado dos alimentos.
Na Espanha, o primeiro-ministro Pedro Sánchez também adotou medidas extraordinárias para preservar o poder aquisitivo da população: determinou um teto de preço para o gás, proibiu os proprietários de aumentar os aluguéis em mais de 2%, reduziu drasticamente os custos de transporte público e eliminou temporariamente o imposto sobre valor agregado em itens alimentares essenciais.
Ao lado dessas medidas, Sánchez ainda criou uma instituição governamental para “monitorar os lucros corporativos, e introduziu impostos sobre lucros inesperados em empresas de energia e bancos”.
Além de analisar a viabilidade dessas medidas que foram exitosas no México e na Espanha, o governo brasileiro deveria viabilizar com a máxima urgência a complementação da cesta básica da população mais vulnerável, articulando municípios, movimentos sociais e organizações populares neste esforço que deve envolver toda a sociedade.
Uma linha do PAA – Programa de Aquisição de Alimentos poderia ser direcionada para disponibilizar alimentos para pelo menos as 20,5 milhões de famílias beneficiárias do Bolsa Família e para os milhões de trabalhadores que sobrevivem com um salário mínimo.
O enfrentamento da carestia dos alimentos é complexo e demanda recursos orçamentários em escala relevante.
Confiar somente na safra deste ano, que se espera recorde, e no “bom comportamento” do dólar, não será suficiente para controlar “a inflação pós-pandemia, [que] é diferente da inflação que o Brasil e o mundo tiveram no passado”, alerta o Nobel de Economia de Economia Joseph Stiglitz.
Como conclui seu ensaio Isabella Weber, “em uma era de choques e emergências sobrepostas, a política de preços de itens essenciais provavelmente continuará sendo um campo de batalha definidor” do destino eleitoral de governos.
A carestia de alimentos representa uma grande ameaça para o governo Lula na eleição de 2026.
O governo preciso agir, e rapidamente, pois o fascismo está sempre à espreita, alertava Umberto Eco.
*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.
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Comentários
juarez
Café é sobremesa e não alimento.
Vou ao mercado, arroz de 22 reais, batata de 2,80, cebola também, verduras e legumes equilibrados. Não sei onde reside a inflação de alimentos. Caro está produtos de limpeza e o governo deveria interferir.
Zé Maria
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/2/2f/Clash_of_Civilizations_map.png/370px-Clash_of_Civilizations_map.png
O NaZionalismo Imperialista dos Estados Unidos da América
impõe ao Mundo e dissemina a Brutalidade Capitalista ilegal,
Amparado em um Liberalismo Hipócrita, pois Falso, logo Imoral,
com a Desonrosa Condescendência ou Conivência dos Demais.
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marcio gaúcho
Estamos prisioneiros da arapuca da dolarização. Tudo virou commodities. Preço internacional. Não interessa aos produtores e comerciantes se os custos no Brasil são mais baixos. Tocam goela abaixo dos consumidores os preços de mercado internacional, para uma economia que paga salários em reais. Uma distopia que vai nos levar para o esgoto da vala negra da humanidade.
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