Valter Pomar: Venezuela e as opiniões do professor Gomes

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Foto: Prensa Presidencial da Venezuela

Venezuela: as opiniões do professor Gomes

Por Valter Pomar, em seu blog

O professor Wilson Gomes, da UFBA, escreveu um texto intitulado “Democratas de conveniência”.

A Folha de S. Paulo publicou este texto, que está disponível aqui: Democratas de conveniência – 06/08/2024 – Wilson Gomes – Folha (uol.com.br)

Um amigo me pediu que escrevesse uma resposta, que pode ser lida aqui. 

O texto contido no link acima (pode ser lido também ao final) é uma resposta “política” a um aspecto da provocação feita pelo professor Gomes, no artigo supracitado. Abaixo segue uma resposta “teórica”, digamos assim.

Por falta de tempo e/ou de capacidade, vou usar o método JTR: por partes.

Gomes: ”Há vários anos, ouvimos a bizarra expressão ‘liberal na economia’, geralmente acompanhada pela adversativa ‘conservador nos costumes’. Serve para designar quem se considera liberal, mas ‘apenas na economia’, podendo ser iliberal e autoritário no resto”.

A premissa deste raciocínio é a seguinte: o verdadeiro liberal é um democrata. Esta premissa tem suas raízes na cultura política gringa. Mas é falsa, tanto lá como aqui.

Grande parte dos clássicos do liberalismo e de seus filhotes tinham uma visão classista acerca da democracia.

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Ser liberal na economia, ser autoritário na política e ser conservador nos costumes não é um ponto fora da curva do liberalismo realmente existente. Portanto, “bizarro” mesmo é – contra a evidência histórica – equiparar liberalismo e defesa da democracia.

Gomes: ”Muitos dos que assim se apresentam não fazem a mínima questão das instituições e exigências da democracia liberal, desde que exista no país um ambiente favorável aos negócios e capaz de gerar riqueza e prosperidade. Alguns chegam a admirar ditaduras em que o PIB é alto e a elite é próspera. Se a economia vai bem, uma ditadura, que mal tem?”

As instituições da democracia liberal – as da realidade, não as dos manuais de propaganda – resultam de pressões contraditórias.

Do ponto de vista da classe dominante, existem três necessidades: defender o Estado contra seus inimigos de fora, defender o Estado contra seus inimigos “de baixo” e garantir que o Estado poderá ser compartilhado em igualdade de condições pelos diferentes grupos “de cima”.

Como estas necessidades não atuam no vácuo, o jogo de pressões resulta nas diferentes instituições realmente existentes em cada país e em cada época.

Mas o objetivo é sempre manter o capitalismo funcionando bem, livre de ameaças e problemas no curto e médio prazo.

Por esta razão, os liberais práticos acham absolutamente normal defender guerras, golpes de Estado e ditaduras.

Os liberais doutrinários às vezes ficam incomodados, mas isto é da vida. Portanto, as “instituições e exigências da democracia liberal” são geralmente “para inglês ver”.

Gomes: ”Essa é a síntese do ‘pauloguedismo’ brasileiro, que aceitou sem escrúpulos servir a um governo que, desde o começo, deixou claro não ter compromisso com bobagens como a democracia e ainda resolveu ser seu fiador. A única condição requerida foi a promessa de ‘fazer as reformas de que o país precisa’ para acelerar o crescimento e facilitar os negócios”.

O pauloguedismo brasileiro é a norma, não um desvio.

Os liberais dos países imperialistas não têm compromisso com a democracia popular; seu compromisso é com as instituições que garantam que os de cima mandem, os de baixo obedeçam e os de fora cumpram seu papel.

E os liberais dos países periféricos, como norma, assumem estes compromissos como seus, portanto fazem de tudo para que a periferia cumpra o papel que o centro demanda.

Gomes: ”Não pense, contudo, o prezado leitor, que o ‘socialista na economia’ se saia melhor no quesito apreço pela democracia.  Afinal, quem acredita que a economia – ou a produção material da vida, nas palavras de Marx e Frederich Engels – seja o motor da história assume que regimes políticos são secundários”.

Não sei o que me deixa mais triste: os que defendem o marxismo vulgar ou os que acreditam nas suas vulgarizações.

Sem dúvida, Marx e Engels acreditavam que a produção e a reprodução da vida material são a base de todo o restante. Mas daí a dizer que, para ambos, “regimes políticos são secundários”, vai uma distância abissal.

Se assim fosse, Marx não teria defendido a “ditadura do proletariado” como indispensável em uma transição socialista; Engels não teria criticado a socialdemocracia alemã por silenciar sobre a defesa da República; e ambos não teriam defendido tanto a luta dos populistas russos contra o absolutismo.

Talvez o que Gomes tenha querido dizer é que Marx e Engels não tinham apreço pela democracia. Isto seria verdade?

Quem conhece a biografia e a bibliografia dos dois, conclui algo diferente: Marx e Engels lutaram pela democracia (burguesa) contra o feudalismo e lutaram pela democracia (proletária) contra o capitalismo.

E, detalhe: sua luta pela democracia proletária contra o capitalismo implicava, na prática, em ampliar – e não restringir – a democracia burguesa realmente existente na sua época.

Por exemplo, garantir o direito de voto para trabalhadores, garantir o direito de organização e de opinião, lutar contra a escravidão etc.

Gomes: Se os ‘liberais apenas na economia’ costumam ser indiferentes à democracia desde que o Estado produza riqueza, os ‘socialistas na economia’ não fazem questão de um regime democrático desde que os meios de produção e a matéria-prima não estejam sob o controle dos capitalistas, da elite ou das potências imperiais.

Não sei exatamente o que Gomes quer dizer com “socialistas na economia”.

Serão os que defendem a socialização de todos os meios de produção?

Serão os que defendem a socialização dos principais meios de produção, deixando os demais sob controle privado?

Serão os que defendem limitações significativas à propriedade privada dos meios de produção?

Serão os defensores do “socialismo de mercado”?

Seja lá o que for, ao longo do século 20, socialistas de diferentes cores e sabores chegaram aos governos de muitos países do mundo, às vezes pelo voto, às vezes por revoluções.

Quando chegaram através de uma revolução, tiveram que construir um novo Estado que, efetivamente, não copiou o modelo liberal. Mas isso não quer dizer que não fizeram questão de um regime democrático.

Pelo contrário, havia uma preocupação permanente de enfatizar o caráter verdadeiramente democrático daqueles Estados produtos de revolução, em comparação com o que havia no capitalismo.

Se aqueles Estados socialistas e seus regimes políticos eram ou não democráticos, do nosso ponto de vista, ou do ponto de vista do liberalismo USA, são outros quinhentos. Mas dizer que não faziam questão é uma desqualificação boba.

Vejamos a outra situação: quando os socialistas chegaram ao governo através do voto.

Nesses casos, descobriram (ou confirmaram) que o regime democrático realmente existente estava montado de forma a defender os interesses dos grandes capitalistas.

E, frente a este fato, alguns se adaptaram e capitularam, outros foram derrotados ou golpeados, alguns poucos resistiram e sobreviveram.

Os que até agora sobreviveram – Venezuela, por exemplo – comem o pão que o diabo amassou. E só sobrevivem porque introduziram alterações no funcionamento do tal “regime democrático”.

Estas alterações visam, em essência, fazer com que algumas instituições de Estado deixem de ser defensoras permanentes dos interesses capitalistas.

Do ponto de vista dos críticos do liberalismo, isso é uma ampliação da democracia. Do ponto de vista do liberalismo USA, isso é um atentado contra a democracia.

Gomes: ”Essa é a chave para entender a inclinação de Lula a ignorar os ataques à democracia, quando eles vêm da esquerda, ao mesmo tempo em que se tornou um pregador da necessidade de salvá-la quando os ataques vêm da extrema direita. Assim como a posição do PT, do MST, de muitos movimentos populares e de vários dos seus ideólogos em defesa de ditadores de esquerda, e até das fraudes que usam para se perpetuar no poder”.

O professor Gomes deve conhecer um Lula diferente daquele que eu conheço. Pois o que eu conheço, tanto no passado quanto no presente, é um respeitador das instituições (veja a atitude dele frente ao judiciário, ou frente às Forças Armadas).

E, mesmo no plano internacional, desde os anos 1970 até hoje, Lula fez inúmeras críticas aos regimes políticos que resultaram de processos revolucionários. Portanto, apresentar Lula como defensor de “ditadores de esquerda” é uma grande besteira.

O que talvez confunda o professor Gomes é que a vida é muito complexa em todas as partes, mas sobremaneira no plano das relações internacionais. Por exemplo, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos são democracias?

Suponho que o professor Gomes não as catalogue assim. E o professor Gomes já viu o presidente Lula atacando o regime político desses dois países?

Por outro lado, é certo que existem no PT, no MST e em outras organizações de esquerda, pessoas que têm uma visão positiva acerca dos regimes políticos existentes em países onde ocorreram revoluções e os socialistas governam.

Mas os que pensam assim, não defendem “ditadores de esquerda”, muito menos fraudes. Apenas não consideram que a única forma e a melhor forma de democracia seja a defendida pelos liberais.

Gomes: Nesta semana, pronunciaram-se Lula, João Pedro Stedile, Breno Altman, Gleisi Hoffmann e a Executiva do PT sobre a fábula da vitória eleitoral de Maduro. O primeiro, mantém-se um crente de que tudo parece conforme as regras do jogo quando se trata dos ditadores de esquerda; os outros disseram algo como ‘esqueçam a democracia, o que importa é o controle do petróleo’. Para todos, o que está em disputa nesta eleição e nas passadas desde que Hugo Chávez chegou ao poder é se a principal commodity do país fica com ‘o povo venezuelano’ ou vai para as petroleiras americanas”.

Novamente, Gomes deve saber algo que eu não sei acerca da posição de Lula, pois sua posição – como é público – não é a de que “tudo parece conforme as regras do jogo”; a posição do presidente é dizer que tudo deve ser conforme as regras do jogo.

Já sobre os demais acusados, acho que o professor Gomes apela, ao dizer que ‘os outros disseram algo como ‘esqueçam a democracia, o que importa é o controle do petróleo”’.

Podemos concordar ou discordar das opiniões da executiva do PT, de Breno Altman, de João Pedro Stedile ou de Gleisi Hoffmann.

Mas o que todos eles disseram, com maior ou menor ênfase e certeza, é que reconhecem o resultado proclamado pelo CNE.

Alguns também disseram que o verdadeiro interesse de certos democratas/liberais/USA é o petróleo, não a democracia.

Me parece que um dos problemas do professor Gomes e de muitos outros que falam de “fraude” na Venezuela, é que estão tão convencidos de que isso é uma verdade óbvia, que parecem não considerar possível que exista quem pense o contrário e, portanto, defenda Maduro em nome da democracia.

Gomes: Por essa perspectiva, todo o clamor mundo afora acerca das violações de direitos humanos, desrespeito às liberdades e garantias individuais, eleições corrompidas desde a seleção dos candidatos, supressão de direitos políticos de opositores, ausência de opinião pública livre e, por último, fraude eleitoral soa aos ouvidos dos ‘socialistas na economia’ como uma demanda inconcebível, uma vociferação sem cabimento ante o que realmente está em jogo. Só uma imprensa burguesa, uma elite que abana o rabo para o imperialismo americano e uns intelectuais tachados ora de liberais, ora de extremistas de direita, poderiam vir com essas exigências de ‘democracia burguesa’ a esse ponto da história.

Muita gente boa tem legítima dúvida acerca do resultado eleitoral na Venezuela. E muita gente boa acha que houve fraude.

Certamente, cabe à justiça venezuelana dar mais elementos, para tentar dirimir as dúvidas sinceras. Mas, vamos combinar, “clamor mundo afora” não é critério para decidir quem ganhou ou quem perdeu uma eleição.

Curiosamente, em geral é a esquerda da esquerda que considera decisivo o “clamor das ruas”.

Já os moderados geralmente argumentam que a decisão cabe à soberania das urnas.

Mas, como vivemos em tempos contraditórios, agora vemos parte da extrema-direita falar em “clamor” como critério de legitimação.

Contudo, melhor evitar o entusiasmo: o “clamor” que serve de referência para fascistas como Corina Machado não foi gestado nas ruas, mas sim por certos meios de comunicação.

O professor Gomes é, até onde eu sei, um especialista no assunto, portanto não preciso dar exemplos.

Gomes: Do ponto de vista dos ‘economocratas’, a democracia sempre foi um acessório. É aceitável, se favorece os objetivos desejados; caso contrário, é um luxo dispensável. Frequentemente, é considerada um estorvo que impede de colocar o país no rumo certo, que a economia se encaminhe para onde o liberalismo econômico ou o socialismo apontam.

Não sei exatamente a quem se refere o neologismo criado ou citado pelo professor.

O que posso dizer, sobre os petistas criticados por Gomes, é que todos, sem exceção, lutaram pela democracia, e seguem lutando. Mas não compartilham da visão liberal made in USA acerca do que seria “democracia”.

Aliás, como já foi apontado antes, não existe consenso a respeito da “democracia”.

Biden e Trump não acham o mesmo a respeito, Lula e Bolsonaro não acham o mesmo a respeito, PT e direita gourmet não acham o mesmo a respeito.

Basta lembrar o que ocorreu entre 2016 e 2022, do golpe até o segundo turno das eleições presidenciais.

Gomes: É nessa convicção que o agro bolsonarista e o MST paradoxalmente se encontram. É nesse culto, não no da democracia, que o PT e o PL, Stedile, o ideólogo do MST, e Filipe Martins, o do rascunho do golpe de Estado, Gleisi Hoffmann e Paulo Guedes dobram os joelhos em contrição. Que se dane que Nicolás Maduro tenha fraudado as eleições e Jair Bolsonaro tenha tentado um golpe justamente para não respeitar o resultado das urnas; quando a democracia atravessa o caminho da economia, ou ela sai da frente ou passam por cima. Exceto, naturalmente, quando o outro lado está prestes a controlar o jogo, através da força ou de fraude. Nesse caso, os socialistas na economia cobrirão as tatuagens com as juras de amor a Castro, Chávez ou Ortega para alardear que a democracia precisa ser salva de Bolsonaro, enquanto os liberais na economia esconderão a minuta do golpe e conclamarão a nação a pegar em armas para enfrentar o ataque de Maduro contra a democracia.

Já respondi, no artigo citado no início deste texto (pode ser lido também mais abaixo), a esta afirmação do professor Gomes. Aqui vou me deter noutro aspecto do problema.

Dizia um velho sábio mais ou menos o seguinte: se essência fosse igual à aparência, não haveria ciência.

Nessa linha, quem pensa que está no centro, ao olhar para os lados vê a esquerda e a direita fazendo críticas às instituições liberais e, quando têm a chance, alterando estas instituições.

Daí alguns centristas concluem que direita e esquerda são equivalentes, por exemplo no que toca à “democracia”.

Seguindo por este caminho, há quem conclua (como Gomes) pela equiparação entre o agronegócio bolsonarista e o MST, o PT e o PL, Stedile e Filipe Martins, Gleisi Hoffmann e Paulo Guedes.

Pergunto: à luz da história do Brasil, esta equiparação faz algum sentido?

São iguais os golpistas e os que lutaram contra o golpe de 1964 e a ditadura que veio depois?

São iguais os defensores do latifúndio e da reforma agrária?

São iguais os que defendem e os que combatem a ditadura do capital financeiro?

As diferenças são tão gritantes, que cabe perguntar por quais motivos alguém vê semelhanças.

Uma resposta, penso eu, é que o centro tenta diluir as diferenças, para assim naturalizar as escolhas que fez no tríplice golpe: impeachment de Dilma, interdição de Lula e eleição do cavernícola.

Um tipo de escolha que tem muitos precedentes, entre os quais Hitler e Mussolini, ambos convidados a assumir o governo, em nome de deter a esquerda.

No Brasil de 1964, muitos liberais votaram no primeiro general-ditador.

Antes, como agora, é comum ver os liberais pavimentando o caminho para a extrema-direita.

Ontem, para derrotar Haddad e o PT, passaram o pano em Bolsonaro; hoje, para tentar derrotar Maduro e o PSUV, passam o pano na fascista Corina.

Podiam pelo menos assumir a responsabilidade pelo que fazem. Mas, claro, é mais fácil adotar a postura do Homer Simpson: “A culpa é minha e eu coloco ela em quem eu quiser!”

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

Foto: @PresidencialVen

Democracia, soberania e ingerência

Por Valter Pomar, na Folha/UOL

No artigo “Democratas de conveniência“, o professor Wilson Gomes acusa Lula, Gleisi Hoffmann, João Pedro Stédile, Breno Altman e toda a executiva nacional do PT de serem “democratas de conveniência”, equivalentes nesse quesito ao agronegócio, Bolsonaro, o PL, Filipe Martins e Paulo Guedes.

A acusação é mera cortina de fumaça para ocultar que é ele, Gomes, quem está defendendo, sobre a Venezuela, a mesma posição da extrema direita e de boa parte da direita gourmet.

O pano de fundo do debate é a relação entre democracia e soberania. Os Estados Unidos atacam as liberdades e os direitos humanos mundo afora, mas Cuba segue mantendo relações com governos democratas e republicanos.

O governo da Itália é dirigido por uma neofascista, mas não se fala em pendurar ninguém de cabeça para baixo. Macron previu guerra civil em caso de vitória da Nova Frente Popular ou do Reagrupamento Nacional e desconheceu o resultado das recentes eleições parlamentares francesas, mas o Itamaraty não proibiu o consumo de croissants, mesmo sendo óbvia a superioridade do pão de queijo.

Israel é um estado serial killer mas, apesar disso, segue contando com a cumplicidade ativa e passiva de inúmeros autoproclamados “democratas”.

Nas relações internacionais, uma coisa é o que achamos, outra o que podemos e devemos fazer.

Essa diferença é aceita por quase todo mundo, exceto quando o alvo é um governo encabeçado pela esquerda.

Neste caso, há quem se julgue no direito de atropelar a soberania, as instituições, a constituição, a cultura política, o bom senso e até mesmo o bom gosto, tudo em nome da “democracia e dos direitos humanos”.

A Venezuela é apenas a mais recente vítima dessa ingerência seletiva. Desde 1999 até hoje, aconteceram naquele país cerca de 30 grandes processos eleitorais. Quando ganhou, a direita sempre tomou posse; quase todas as vezes em que perdeu, a direita berrou “fraude”.

No último período, um Guaidó se autoproclamou presidente e a ficção foi reconhecida por quem sabia tratar-se de uma fraude. A Venezuela teve suas empresas e contas no exterior roubadas e o país foi submetido a pesadas sanções.

A piora nas condições de vida e a onda migratória resultantes foram integral e cinicamente debitadas na conta de Maduro.

Realizadas nesse contexto, as recentes eleições presidenciais obviamente quase deram vitória à oposição. Mas como o Tribunal Superior Eleitoral local declarou a vitória de Maduro —também obviamente por muito pouco—, a reação da extrema-direita e dos EUA foi a costumeira.

Provaram que houve fraude? Não. E, como a Vaza Jato já nos ensinou, “indício” não é prova, “convicção” não gera pena e berrar não dá razão.

Apesar disso, muita gente segue com legítimas dúvidas e outros com absoluta certeza de que houve fraude. Entre estes últimos, há pessoas progressistas e de esquerda, que, entretanto, compartilham a posição de Trump, Milei, Vox, Bolsonaro et caterva.

Quiçá para livrar-se do incômodo causado pelas más companhias, o professor Gomes tenha apelado para uma velha técnica retórica, cuja versão popular é o “pega ladrão”.

Isso não faz dele um “democrata de conveniência”, apenas confirma que o mundo é mais complexo do que certas lacrações acadêmicas fazem supor. Em tempo: gostem ou não, Maduro venceu.

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