Valter Pomar: Venezuela, buscando respostas para algo que ainda não consegui entender

Tempo de leitura: 3 min
Gabriel Boric, presidente do Chile. Foto: Rafa Neddermeyer/ Agência Brasil

Venezuela: buscando respostas para algo que ainda não consegui entender

Por Valter Pomar, em seu blog

Muitos dos governos, grupos e pessoas que não reconheceram (ainda) o resultado das eleições venezuelanas, reconheceram desde o início o resultado das eleições russas.

Teve muxoxos e questionamentos, mas não aconteceu nenhum movimento de efetivo questionamento em relação a reeleição de Putin.

Será porque acham que o sistema eleitoral russo e o último processo mais democráticos do que o da Venezuela?

Será que acham Putin um democrata?

Suspeito que o motivo real é mais pragmático: no caso da Rússia, não daria em nada questionar.

Já no caso da Venezuela, questionar pode dar em alguma coisa: no melhor dos casos, derrubar o governo; no pior dos casos, deixar o governo na defensiva e acumular forças para o que virá em seguida.

Entendo que a direita brasileira, Cavernícola à cabeça, adote esta tática. Afinal, eles não têm nada a perder e tem tudo a ganhar.

Mas até agora não consegui entender por quais motivos uma parte da esquerda brasileira adota esta tática.

Apoie o VIOMUNDO

Certamente, há os que agem para ter 1 minuto de destaque nos meios de comunicação da direita. Mas vou partir da hipótese otimista, segundo a qual esta postura é marginal (no sentido de mega minoritária).

Certamente, também existem os que estão motivados pelos mais sublimes valores democráticos, combinada com o inegável direito à dúvida, mais uma propensão a dar lições aos outros sobre como fazer a coisa certa, adicionada a visão crítica que muita gente tem acerca da Venezuela, de Chávez e especialmente de Maduro.

Embora exista quem atue movido pelas supracitadas pulsões, a verdade é que a maior parte da esquerda brasileira já demonstrou, por inúmeras vezes, que é extremamente capaz de equilibrar suas dúvidas, seus princípios e suas preferências, com altas doses de pragmatismo.

Assim sendo, fico pensando qual seria a variável pragmática envolvida na postura de quem cobra enfaticamente de Maduro algo que só a justiça eleitoral pode dar; algo que a justiça eleitoral venezuelana sempre deu, mas nos prazos e nas formas previstas em lei.

Será que é para enfatizar que somos pela democracia, evitando que a extrema-direita agarre esta bandeira?

Se for isso, é pragmatismo de tiro curto. Pois as relações entre a direita brasileira e a direita venezuelana são antigas; assim como são antigas as relações entre a esquerda brasileira e a venezuelana. Uma derrota de Maduro, digamos o que digamos, será uma derrota nossa.

Será que é para manter a direita gourmet em situação confortável, sem ter que explicar por qual motivo coabita um governo com (supostamente) bolivarianos radicais?

Se for isso, também é fórmula passageira. Pois mais cedo ou mais tarde a situação vai exigir uma definição. E aí voltaremos ao mesmo problema existente no ponto de partida, com o prejuízo de termos ficado encima do muro.

Se não reconhecermos, vitória da direita. Se reconhecermos, a direita nos acusará do mesmo que antes, pouco importa o que digam as atas e os números.

Será que é para não se isolar dos demais governos da região ou do hemisfério ocidental?

Se for isso, digamos que é dar milho ao bode. Pois dada a correlação de forças atualmente existente, esta será a primeira de muitas vezes em que teremos que fazer escolhas que nos colocarão em conflito com eles.

Salvo, é claro, se a lógica for achar melhor uma péssima concessão do que uma difícil divergência.

Por mais que vire e revire o problema, não encontro uma resposta adequada.

Repetindo, acho que tem pessoas que agem motivadas pelo holofote, outras motivadas por certa soberba, outras por restrições a Maduro & cia., outras motivadas por dúvidas sobre o processo eleitoral, outras para defenderem sua concepção de democracia.

Compreendo essas posições, embora discorde delas.

O que não consigo entender é por qual motivo pragmático uma parte da esquerda está adotando posições que – mesmo não sendo esta a sua intenção – na prática estão contribuindo para legitimar uma intentona golpista, promovida por gente abertamente fascista.

Procuro a razão pragmática por trás desta postura, mas não acho.

E talvez seja porque não exista.

Talvez estejamos diante de um daqueles casos em que, incrivelmente, há muitas emoções envolvidas e bem pouco pragmatismo.

Ou talvez, numa versão mais simplória, não fizemos a devida reflexão sobre o que estava acontecendo e sobre o que poderia acontecer.

E, como decorrência, vamos definindo nossa posição ao longo do processo, sendo jogados para cá ou para lá, a partir das ações e reações daqueles que de fato estão protagonizando a situação.

No final das contas, pode ser só isso. Como diria um amigo cubano, no hay qué pedirle pera al olmo.

Mas é possível pedir um pouco de pragmatismo. Pelo menos isto.

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

Leia também

VÍDEO: Quem está certo sobre a questão das atas na Venezuela? Juan Carlos Monedero explica

Beto Almeida: EUA rechaçam o modelo bolivariano porque ele desafia a doutrina ‘A América para os americanos’

Valter Pomar: Opinião de Reginaldo Lopes é parecida com a de bolsonaristas e tucanos

Pensar a História: A esquerda brasileira e Maduro

Apoie o VIOMUNDO


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Zé Maria

.

“Esquerda ERRA ao chamar Maduro de Ditador
e se posicionar Contra o Resultado na Venezuela”

“O Sistema Político-Eleitoral Venezuelano é Democrático”

Jornalista Breno Altman

No Canal OperaMundi:

https://youtu.be/n2sSUORBfzM

.

Zé Maria

.

“Levar a sério Maria Corina
é como levar a sério Damares”,

Jornalista Breno Altman

Na TV Fórum:

https://youtu.be/1JAOsD9Yr3E

.

Zé Maria

.

“Na Venezuela é a Constituição que garante a mais ampla democracia
na qual a participação popular é decisiva.
Acham que estou exagerando, claro.
Sugiro a companheiros das letras jurídicas que usem o Google,
acessem a Constituição venezuelana e leiam-na.
Eu li.
Duvido que ao final da leitura ainda considerem a Venezuela uma ‘ditadura’
como os colunistas adestrados da grande mídia apregoam aos quatro
ventos.

E não é apenas isso.

A Venezuela tem uma Constituição anti-imperialista que garante
a soberania daquela grande Nação acima de quaisquer ventos
golpistas como os que insistem a soprar do norte a todo momento
sobre Nuestra América.”

Jornalista Caio Teixeira
Agência ComunicaSul
(Link abaixo)

.

Zé Maria

https://x.com/MonederoJC/status/1817994316314226810

“Mensagem à Esquerda:
Reproduzir Discursos da Grande Mídia
[Neoliberal, de Direita, Lacaia dos EUA]
é Desconhecer Realidade da Venezuela”

“Fazer coro com o inconformado império e seus acólitos espalhados pelos
partidos de direita e pela mídia da América Latina é desconhecer a realidade
institucional da Venezuela, conquistada através de eleições limpas
garantidas por uma das mais avançadas Constituições do continente.

Uma Constituição baseada no princípio que deveria estar em qualquer
proposta pretensamente democrática: só quem tem o poder de eleger
tem o poder de destituir, e ninguém mais.”

Por Caio Teixeira, Repórter da Agência ComunicaSul
https://dialogosdosul.operamundi.uol.com.br/mensagem-a-esquerda-reproduzir-discursos-da-grande-midia-e-desconhecer-realidade-da-venezuela/

.

Zé Maria

Coragem e Perspicácia
Não Fazem Mal a Ninguém,
A Não Ser Aos Adversários.

Deixe seu comentário

Leia também