Manuel Domingos: Hoje estará em pauta o enfrentamento do imperialismo. Washington conseguirá silenciar a voz altiva da Venezuela?

Tempo de leitura: 3 min
Manuel Domingos Neto: ''Os que gostam da democracia, da liberdade; os que lutam pela soberania de seus países e não querem guerra devem torcer pela vitória de Nicolás Maduro no próximo domingo''. Foto: Reprodução de redes sociais

RELEVÂNCIA GEOPOLÍTICA DA ELEIÇÃO VENEZUELANA

Por Manuel Domingos Neto*, 26/07/2024

Desde que, sob a liderança de Hugo Chávez, a Venezuela desafiou o imperialismo estadunidense, as informações sobre esse país foram sistematicamente embaralhadas.

O domínio secular de Washington sobre a América do Sul fora trincado. Urgia desmoralizar Hugo Chávez e seu discurso libertário.

A Venezuela buscou exercer soberania sobre seus recursos naturais, estabeleceu cooperação militar alternativa, investiu na integração regional e deu suporte a Cuba, evitando seu colapso programado.

O exemplo venezuelano tornou-se intragável para os Estados Unidos: poderia estimular rebeldias em espaço vital a sua hegemonia.

Washington incluiu Caracas no “eixo do mal” e acionou infindáveis expedientes para sabotar o governo venezuelano, inclusive, impondo grandes sacrifícios à sociedade.

Estive na Venezuela há vinte anos e, mesmo conhecendo intimamente as disparidades do Nordeste brasileiro, as condições sociais venezuelanas me chocaram. Como poderia um país tão rico ter tanta gente na penúria?

Nessas eleições, não é o caso de restringir a análise ao desempenho das políticas públicas venezuelanas ou às idiossincrasias de governantes.

O que merece mais atenção é o significado geopolítico desse embate. Estará em pauta neste próximo domingo o enfrentamento do imperialismo. Washington conseguirá silenciar a voz altiva da Venezuela?

Apoie o VIOMUNDO

Depois de tentativas frustradas de golpe, boicote econômico, sequestro de ativos financeiros, apoio a um fantoche autoproclamado presidente e intensa propaganda mentirosa, os estrategistas do imperialismo conseguirão interromper a experiência dita bolivariana?

Não tem cabimento repudiar o avanço mundial da extrema direita e lavar as mãos frente ao caso venezuelano.

Não dá para torcer pela derrota dos ultraconservadores franceses e fechar os olhos diante de vizinhos do mesmo naipe.

É incoerente protestar contra a matança na Faixa de Gaza e vacilar no apoio a Nicolás Maduro, que defende os palestinos.

Não faz sentido propugnar pela integração sul-americana e ignorar a ofensiva da extrema-direita na Venezuela. Obedientes a Washington, os reacionários desse país sabotam iniciativas integracionistas.

Sem analisar corretamente uma declaração de Maduro, Lula ajudou involuntariamente (espero!) os fascistas venezuelanos. Maduro não prometeu guerra caso perca as eleições: denunciou as pretensões da extrema direita venezuelana!

Lula se intrometeu erroneamente na eleição de um país vizinho e amigo. Sua palavra pesa na sociedade venezuelana. Caber-lhe-ia ensinar ao seu colega como se conduzir?

O que se noticiou antes da posse de Lula é que agentes de Washington contiveram iniciativas golpistas de militares brasileiros. Lula estaria agora cumprindo possível compromisso de conter o bolivarianismo?

Maduro reagiu corretamente ao pedir-lhe que tomasse calmante. Errou depois, ao criticar a validade do processo eleitoral brasileiro.

Mas a atitude do Judiciário brasileiro, cancelando o envio de observadores eleitorais a Caracas, foi inadmissível: ajudou a extrema direita venezuelana. O Judiciário brasileiro, que hoje encena a defesa da democracia, mostrou sua índole histórica de colaboração com golpistas.

Uma eventual derrota de Maduro no próximo domingo impulsionará a extrema direita mundial. Seria retumbante vitória de Washington, justamente quando cresce seu isolamento internacional.

Os riscos de instabilidade continental crescerão. Governos democráticos da América do Sul, hoje minoritários, verão o cerco reacionário se fechar.

Os que gostam da democracia, da liberdade; os que lutam pela soberania de seus países e não querem guerra devem torcer pela vitória de Nicolás Maduro no próximo domingo.

Manuel Domingos Neto é doutor em História pela Universidade de Paris. Autor de O que fazer com o militar – Anotações para uma nova Defesa Nacional (Gabinete de Leitura

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

Leia também

Ângela Carrato: Domingo, em jogo o futuro da soberania da Venezuela e da paz na América do Sul

VÍDEO: ‘Brasil, aqui a Venezuela está resistindo aos ataques do imperialismo’, avisa Diosdado Cabello, vice-presidente do PSUV; confira

Assembleia dos Povos alerta sobre a campanha internacional para afetar as eleições na Venezuela

Apoie o VIOMUNDO


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Zé Maria

.

Numa Improvável Vitória da Desgraça, do Candidato Fascista Neoliberal,

serão Inicialmente Impostos à Venezuela 3 Itens do Programa Escrito

pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da América (EUA):

1) A Prisão de Nicólas Maduro e demais Líderes da Revolução Bolivariana;

2) o Fechamento do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela); e

3) A Privatização da Petrolífera Venezuelana PDVSA.

.

Nelson

ACERCA DO SISTEMA DE VOTAÇÃO BRASILEIRO – II

Em 2018, Samuel Gomes, advogado e mestre em Filosofia do Direito, escreveu um pertinente e esclarecedor arrazoado sobre o problema do sistema eletrônico de votação brasileiro.

“Quanto mais estudo a matéria, mais me convenço da iniquidade, irracionalidade e inconstitucionalidade do sistema de votação e apuração exclusivamente eletrônica do voto. O sistema atual é incompatível com a República e sua Constituição.”

“O Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, dentre tantos outros países, considerou inconstitucional o uso de urnas eletrônicas nas eleições de 2005, uma vez que ‘a eleição como fato público é o pressuposto básico para a formação democrática e política’.”

“E em que implica o conceito da eleição como fato público? Implica que ‘qualquer cidadão possa dispor de meios para averiguar a contagem de votos, bem como a regularidade do decorrer do pleito, sem possuir, para isso, conhecimentos especiais’.”

“Dizer que a eleição é fato público significa afirmar que o único ato secreto do processo de captação e apuração dos votos é o momento da manifestação da vontade do eleitor. O voto é secreto. Se não é auditável não é público. Se não é público não é auditável, republicano, constitucional.”

Aqui mesmo neste sítio, o Azenha publicou, em 2014 e 2016, textos em que o professor Gustavo Castañon (UFJF) questiona o sistema eletrônico de votação e expõe alguns resultados que levantam sérias suspeitas acerca da segurança das urnas.

Para terminar, é preciso dizer aqui que Samuel Gomes não faz parte do time da ultradireita, da direita ou memos do centro. Ele é esquerda de carteirinha.

O excelente texto de Gomes está disponível para leitura em https://duploexpresso.com/?p=94586

Nelson

ACERCA DO SISTEMA DE VOTAÇÃO BRASILEIRO – I

“Errou depois, ao criticar a validade do processo eleitoral brasileiro”, escreveu Manoel D Neto.

Sim. Também acho que Maduro errou. Deveria ter contado até dez antes de dizer o que disse. Talvez não tenha conseguido conter a irritação de ver a esquerda a alfinetá-lo constantemente.

Afinal, só Lula III já deu duas ou três estocadas, Petro também já deu uma ou duas. Boric, então, nem se fala, pois mais parece um ventríloquo do governo dos EUA. E até mesmo o incensadíssimo Mujica reincidiu, absurdamente, por várias vezes, nos ataques à Venezuela bolivariana.

Contudo, ficou para mim a dúvida quanto à opinião de Manoel Neto acerca do sistema de votação brasileiro. Isto porque, se errou ao externar sua opinião, que, como consequência, acabou açulando a direita aqui no Brasil, Maduro acertou no conteúdo da crítica ao nosso sistema.

Um sistema de votação que não permite qualquer recontagem de votos não é auditável. Ponto. E tem que ser revisto e aprimorado.

Continua.

Nelson

Acertou o nosso historiador ao colocar uma interrogação na reação do nosso governo ao discurso de Maduro. Afinal, Lula é reincidente. Esta já é a segunda ou terceira estocada, sempre com tom bem agradável aos ouvidos do Tio Sam, que Lula dá na Venezuela bolivariana.

Há críticas a serem feitas ao governo do país vizinho? Sem dúvidas. Assim como há uma pá de críticas a se fazer ao governo Lula III e havia ao Lula II e ao Lula I. A questão é que as críticas entre pares, digamos assim, devem ser feitas pela esquerda e não jogando água no moinho da direita e do Imperio dos EUA.

Espero, sinceramente, que esta nova estocada de Lula seja resultado somente de mais um erro de sua assessoria que não teria orientdado como deveria o presidente. A repetição do erro estaria a demonstrar que há problemas nessa assessoria que devem ser resolvidos o mais breve possível.

Mas, um problema muitíssimo maior estará conformado para a nossa esquerda se o questionamento feito por Manoel Domingos Neto, “Lula estaria agora cumprindo possível compromisso de conter o bolivarianismo?”, for o motivo real para a postura agressiva do presidente diante do governo de Maduro.

Pedro de Alcântara

Seria bom entender que a luta anti-imperialista não é outra coisa senão a luta a favor da humanidade.

Deixe seu comentário

Leia também