Conferência Ecumênica celebra diversidade e cobra respeito a todas a manifestações religiosas no País
Tempo de leitura: 6 min1º Conferência Ecumênica de Águas Lindas (GO) celebra diversidade e cobra respeito as manifestações religiosas em todo país
O evento realizado no sábado (19/8), no Terreiro Sol do Oriente, reuniu 13 líderes religiosos de diferentes doutrinas
Por Adi Spezia*
Celebrar a diversidade religiosa foi um dos objetivos da realização da I Conferência Ecumênica de Águas Lindas, Goiás.
O evento realizado neste sábado (19), reuniu pelo menos treze líderes religiosos que ao final do evento redigiram e tornaram público uma Carta à Sociedade, onde cobram respeito à diversidade das manifestações religiosas em todo país.
O Brasil é um país laico e a Constituição Federal assegura a liberdade religiosa, “deste modo, acreditamos que o combate à intolerância e ao racismo religioso tenham que ser prioridade entre as diversas religiões. A disseminação do ódio a determinados cultos vai de encontro à celebração da fé e da democracia”, conta o documento assinado por pelos líderes religiosos.
Com o tema “Caminhos da Fé”, a Conferência foi Organizada pela Associação Sol do Oriente, frente ao aumento dos casos de intolerância religiosa no país.
Os casos registrados pelo Disque 100, aumentaram em 106% em apenas um ano. Saltou de 583, em 2021, para 1,2 mil, em 2022, uma média de três casos de intolerância religiosos, por dia.
Só em janeiro deste ano, cerca de 70 ocorrências foram registradas pela ferramenta de denúncias de violações de direitos humanos.
Mãe Beth de Iansã, Yalorixá do terreiro Sol do Oriente, conta que a Conferência Ecumênica, teve como objetivo promover o diálogo entre as religiões, pois “preconceito é falta de conhecimento”.
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Reunir todos esses líderes religiosos certamente é um desafio, mas indiferente da religião ou da doutrina “a união e o amor é que constrói tudo, inclusive destrói o preconceito”, reforça Mãe Beth.
Os caminhos de fé podem ser diferentes, mas somos filhos e filhas de Deus que se manifesta das mais diferentes maneiras. Ter um espaço de diálogo, uma roda de conversa como essa, em pleno século XXI, é muito significativo, avalia a Pastora Romi Bencke, secretária executiva do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic).
“É triste quando a gente vê, em nosso país, casas de terreiro e outros espaços sagrados, como, por exemplo, as casas de reza dos povos indígenas, sendo quebrados, queimados, em nome de uma suposta fé”, completa a pastora.
Romi destacou o quão simbólico é a realização da Conferência em um espaço de Terreiro, “simbólico e profético é a gente ter um encontro como esse, nessa casa, no dia em que nós tivemos o sepultamento de mãe Bernadete. Por mais que o assassinato dela não foi por intolerância religiosa, mas foi pela luta insistente dela na defesa do território quilombola, então toda a fé deve ser antirracista, o racismo jamais pode definir a fé de alguém”, afirma.
Defensora dos quilombolas, a Yalorixá Mãe Bernadete foi assassinada na noite de quinta-feira (17), no Quilombo Pitanga dos Palmares, em Simões Filho (BA), o crime choca pela crueldade e escancara racismo religioso e gana pelas terras quilombolas.
O Pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil, Heberte Barbosa, também fez memória as lutas de Mãe Bernadete e apontou diversas semelhanças entre as religiões.
Para ele é por essas semelhas que “nós conseguimos dialogar, não podemos tolerar a violência, não podemos tolerar o desrespeito. O diálogo é fundamental na construção de uma sociedade, de um Estado de direito que seja saudável e que resguarda os nossos direitos, não podemos”, aponta Heberte.
A unidade entre as diferentes religiões e a importância do diálogo foram destacados pelo Padre Jacy, da Igreja católica Ortodoxa Bielorrússia no Brasil.
“Nós somos um tempo sagrado da expressão, aqui estamos dialogando, estamos degustando a palavra de Deus de uma forma sábia, de uma forma humilde, porque Deus é humildade e Deus é sabedoria”, reforça o Padre ao lembrar que somos parte de um todo, de uma grande aliança de fé.
A diversidade religiosa está relacionada a liberdades dos indivíduos de cultuar sua fé, mas também de respeitar e valorizar todas as manifestações religiosas.
Não há uma única religião, ou uma que seja a verdadeiras, reforçam a Mãe Delcione, Yalorixá Seara Espírita De Umbanda Ogum, Oxóssi E Xangô, SEUOOX e o Pai André, Babalorixá do Centro Espírita Comunitário Pai Joaquim de Aruanda.
“Tudo o que a gente faz tem que ser com amor, só o amor vence a ganância, vence o ódio. E a gente tem que amar nosso próximo, como o pastor e a pastora falaram, Deus é um só. Nosso Pai Oxalá, ama todos nós”, lembra Mãe Delcione.
A palavra “intolerância” foi questionada durante à Conferência, é preciso respeitar, não apenas tolerar a religião do outro.
“Gosto de falar a palavra racismo religioso e não intolerância religiosa, porque o que as religiões de matrizes africanas sofrem, quanto ao preconceito, é diferente das outras religiões. É racismo porque a violência que nós sofremos é por conta da nossa origem, da nossa origem negra, da nossa origem africana”, aponta Ogan Michael Laiso Felix, presidente da Associação de Tradições Culturais e Sociais Afro-Brasileiras e Ameríndias do Estado de Goiás (Atracar-GO).
Segundo dados do Censo 2023, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 56% da população brasileira é formada por negros.
Vivemos uma sociedade que tem a maiores parcelas de negros, porém suas estruturas são racistas, então todos os elementos que são de origem negra, de origem africana também sofrem esse preconceito e sofrem essa violência e sofrem esse racismo, analisa o presidente da ATRACAR-GO.
O Pai Obalajô de Xangô, Babalorixá do Ilê Obá Asé Egbé Àlàfin Òyó, também trouxe ao debate as lutas e resistência do povo negro no Brasil, enfatizando o papel da educação na formação de novos sujeitos.
A espiritualidade já existia bem antes da formação das religiões. “Se um for ensinando ao outro, a história vai mudando aos poucos. Temos seguidores e esses seguidores vão ser orientados por nós, politicamente, socialmente, culturalmente e religiosamente”, reforça Pai Abalajô.
Também com um olhar para Educação e a diversidade religiosa, o Monge Gyoushuu Tadokoro, Monge do Budismo Primordial, destacou que o fruto da intolerância, do racismo, da ignorância, é a falta do conhecimento.
“A gente está aqui num plano de diversidade, de ideias diferenciadas, no entanto, o que nós temos de igualdade é o que nós somos de fato, seres, seres cientes, que objetificam algo maior”, reafirma Monge Gyoushuu.
Para o Monge, a falta do conhecimento é o que faz com que as pessoas sejam ignorantes e intolerantes, por isso o budismo tem como primeira premissa a consciência.
Quanto a fé, “ela é essencial e primordial na vida de todos, mas ela não pode exercer uma conduta ignorante, prepotente, sobre a fé ou a conduta de outra pessoa. Se somos todos iguais, então, que sejamos, de fato, dentro da fé de cada um”, reforma Monge Gyoushuu.
A Fé é nada mais do que uma expressão humana, reforça Pai Davi Santiago, que trouxe a importância da realização da 1ª Conferência Ecumênica em Águas Lindas de Goiás, assim como foi pontuado pelo representante da Federação de Umbanda e Candomblé do DF e Entorno, Ogan Rafael.
“Que movimento maravilhoso, grandioso, conseguimos colocar pai de santo, padre, pastor, maçom, budista falando a mesma língua. A falta de conhecimento, infelizmente, nos faz regredir. Andar mais para trás. Isso é ruim”, avalia Pai Davi Santiago.
A falta de conhecimento como fator gerador da intolerância também foi apontada por Shellem Alves Peixoto da Sociedade Ayahuasqueira e Medicinas da Floresta e do Centro Universalista Fogueira Sagrada, e pelo Mestre Maçom e presidente da Loja Maçônica Mensageiros da arte Real, Nildomar Lopes.
“Às vezes, as pessoas ouvem e não conseguem entender perfeitamente [aquela crença] e leva aquilo para o exterior de uma outra forma. Isso gera a intolerância, gera o preconceito. Deus é único, não importa a forma como que você acredita”, pontuou.
A trocamos experiência e aprendizados unanime entre os participantes, entender que é por meio do diálogo frente à diversidade religiosa que desmistificamos preconceitos. “Saímos com o compromisso da unidade em prol da boa convivência entre religiões”, afirmam os líderes religiosos presentes na Conferência.
No entanto, este compromisso também deve ser dos “três poderes da República (Executivo, Legislativo e Judiciário); do conjunto do Poder Público, incluindo a esfera municipal, estadual e federal, a ação educativa diante do combate à Intolerância e ao racismo religioso; além de tratamentos equânimes no que tange aos direitos e deveres das mais diversas práticas religiosas existentes”, lista o documento final do evento.
Ao finalizar a Conferência, Mãe Beth de Iansã, que também é presidente da Associação Sol do Oriente, pontuou a riqueza de cada relato, de cada intervenção e nos mostra o quão é fundamental a promover o debate e troca de experiência, conclui a líder religiosa.
*Adi Spezia, jornalista e integrante do Terreiro Sol do Oriente
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Comentários
Zé Maria
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A Liberdade de o Cidadão escolher ter ou não ter e praticar ou não praticar
uma Religião, qualquer que seja, é um dos Fundamentos da Democracia e
da nossa Constituição Federal Republicana de 1988.
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