Dalva Garcia: Simulacro de debate impede diálogo de verdade com a comunidade escolar

Tempo de leitura: 4 min
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Por Dalva Garcia

Tendências e Debates: o simulacro do debate que impede o diálogo com a comunidade escolar

Por Dalva Garcia

Nas últimas semanas os grandes meios de comunicação do País resolveram explicitar o debate sobre a malfadada reforma do Novo Ensino Médio, conhecido pela alcunha NEM.

A reforma do Ensino Médio (lei 13415/2017) foi imposta logo depois do alarde acerca da Base Nacional Curricular Comum (BNCC), que anunciava uma diretriz única para a educação nacional.

Em nome de uma suposta unidade dos currículos escolares no Brasil, a BNCC prometia corrigir distorções das diferenças regionais e econômicas.

Só que fez o contrário. Impôs um discurso homogêneo para professores e alunos. Um único currículo para todo país, baseado em habilidades e competências, ocultando a diversidade e as diferenças regionais.

Em consequência, de Norte a Sul do Brasil, de Leste a Oeste, professores têm que oferecer a mesma “mistura” – uma base curricular mínima aos alunos, que, por sua vez, têm que a engolir.

Na verdade, o BNCC e o NEM são dois presentes de grego do presidente usurpador Michel Temer (MDB-SP) à Educação pública brasileira, formatados pelas empresas privadas de educação.

Tanto a BNCC parecer referenciado pelo Conselho Nacional da Educação (resolução CNE/CP2) quanto o Novo Ensino Médio (NEM) são de 2017.

As campanhas publicitárias do governo federal tocavam bumbos para esses “modernismos”. O NEM apareceu nas campanhas publicitárias do MEC como uma verdadeira revolução messiânica.

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Propagandeavam que os jovens poderiam escolher seu currículo, sairiam das escolas colocados no mercado de trabalho e fazendo o que escolhessem, desde que devidamente orientados a usar o ‘’planner’’ traçado com os professores que orientariam seu “projeto de vida”.

— Planner, como?!

É isso, mesmo. É o jargão empresarial, tão ao gosto de quem anda definindo os destinos da Educação brasileira nos últimos anos.

É como se uma agenda de planejamento resolvesse tudo. Ou seja, transformaram o professor da educação básica numa espécie de do “coaching motivacional” sem o gordo cachê pelos serviços prestados.

Infelizmente, alunos e professores de instituições públicas de todo país já sentem na pele as consequências da propaganda enganosa que cercava desde o início o Novo Ensino Médio.

Um currículo esvaziado de formação básica das principais áreas do conhecimento humano.

Um conjunto de itinerários de formação e expansão recheia os currículos tal qual essência artificial de churrasco colocado em saquinhos de batatas fritas.

Enfim, os jovens começam a perceber o tamanho do engodo do NEM.

Não há perspectiva de prosseguirem os estudos nas universidades públicas e, muito menos, formação decente para o mercado de trabalho.

Mais uma vez a destruição da educação pública no país cai nos ombros do aluno e do professor que deveriam ser “empreendedores de si mesmo”.

Talvez para reduzir o impacto do crescente descontentamento dos jovens, os grandes veículos da mídia estão colocando o assunto em debate.

Investem na polarização dos pró e dos contra.

Maniqueísmo já combatido por filósofos do século XVIII, como Voltaire com seus personagens caolhos.

A coluna “Tendências e Debates”, da Folha de S. Paulo, estampou essa manobra neste sábado, 25/02, com a pergunta: A reforma do Ensino Médio deve ser Mantida? Sim ou Não?

Com base em pesquisas educacionais, a resposta dos críticos da reforma é não.

Os defensores apontam com sagacidade mordaz a tendência do professorado de conservadorismo e crítica infantil de quem não suporta as mudanças “progressistas”.

A professora de filosofia Adriane Cavalcanti, em conversa informal, toca num ponto crucial:

“A defesa chega a ser irônica, pois onde estariam as evidências de que a ‘direção está certa’ se o próprio articulador da defesa aponta ‘problemas de implementação’ sem perspectiva de resolução?”

Mas em um país que continuamente apaga a memória recente é indispensável ler esta síntese precisa que me enviou o amigo Alexandre Pianelli Godoy, professor de História da Educação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), 

Por Alexandre Pianelli Godoy

“A Folha coloca essa armadilha dicotômica do “sim” ou “não”, invariavelmente, para nos convencer que é plural e democrática. Ela apoia a reforma porque segue interesses privatistas, que também são os seus.

A reforma deve ser revogada, bem como a BNCC, a BNCC-Formação e as escolas de tempo integral, pois geram desigualdades abissais entre escolas públicas e entre escolas públicas e privadas.

Essa concepção de currículo corporativo, o ovo da serpente, foi gestada na LDB de 1996 e com os PCN’s no governo Fernando Henrique Cardoso. Ganhou contornos mais fortes com o currículo do José Serra do “São Paulo faz Escola” e as famigeradas apostilas (cadernos de professores e alunos).

E agora mostra a sua cara definitiva com a BNCC e as habilidades e competências codificadas como normas engessadas e incontestáveis.

É urgente, no entanto, pensar no que será feito, o que não me parece que o governo Lula esteja empenhado a fazer com a gestão de Camilo Santana de viés privatista, o pior ministro que Lula poderia ter escolhido para a pasta.

Apesar do Fundeb, os governos petistas deram continuidade às políticas do PSDB e não alteraram essa concepção de educação por resultados a partir da econometria dos organismos internacionais.

Por isso, não vejo muito luz no fim desse túnel com a revogação ou manutenção da reforma, pois se vier algo novo não tenho que certeza de que será para melhor.

O que deve acabar urgentemente é essa jornada integral para professores que os penalizam de tarefas e regras extenuantes e alijam milhares de alunos trabalhadores do processo.

O que deve acabar a médio prazo é essa concepção horrorosa de habilidades e competências que não sai da pauta educacional desde os anos 1990, mas que não produziu nenhum resultado significativo.

Ao contrário, foi adotado como jargão para hospitais, teatros, empresas, comércio, todos com suas habilidades e competências para seus funcionários. Fizeram uma torção linguística econômica naquilo que já era ruim da teoria piagetiana.

E o que deve acabar a longo prazo é essa concepção de que currículos e de reformas educacionais no Brasil são a tábua de salvação, pois ignoraram as múltiplas culturas escolares que, quase sempre, levam essas reformas para o saco dos esquecidos e do fracasso, pois são os sujeitos escolares (professores, pais, alunos, funcionários e corpo diretivo) que mostram que a sua realidade não muda à canetada.

Problemas básicos não foram resolvidos na educação brasileira: baixos salários, classes superlotadas, ausência de planos de carreira atrativos, falta de uma política pedagógica consistente e uma sucessão de currículos centralizados e autoritários.

Mas tudo isso nós já sabemos, amiga Dalva, é de dar uma lassidão na alma e uma grande vontade de desistir. E nem sei por que insistimos tanto, talvez porque a gente não veio ao mundo para assistir o mundo da janela, mas não sei até quando…”

Eu, Dalva Garcia, como professora de filosofia da rede pública de São Paulo, apesar da fadiga, complemento: “Até quando conseguirmos honrar nosso estudo e transformá-lo em ação educativa”.

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Dalva Garcia

Professora de filosofia da rede pública de São Paulo.


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Comentários

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Zé Maria

#RevogaJaNovoEnsinoMedio

NEM? NEM EM SONHO!

O Novo Ensino Médio não serve NEM aos estudantes, NEM aos professores. Precarização da sala de aula não é solução! #RevogaNEM #RevogaJaNovoEnsinoMedio

JADE BEATRIZ
Presidenta da União Brasileira
dos Estudantes Secundaristas
(UBES)
@ubesoficial

https://twitter.com/AnaJadeBeatriz/status/1631418081401552896

Zé Maria

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Os Melhores Cientistas da Educação não escrevem na Folha

nem dão Entrevistas nos Veículos da Imprensa-Empresa.

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