Luciano Martins Costa: Indignados e a “geração X”

Tempo de leitura: 3 min

por Luciano Martins Costa, em Observatório da Imprensa

A roda da História está se movendo e a imprensa tradicional parece não se dar conta. Já passa de um milhar de cidades em quase uma centena de países o total de concentrações de cidadãos indignados que produzem o movimento de movimentos cuja denominação a nomenclatura conservadora dos fatos sociais ainda não conseguiu definir.

Há muito mais a ser dito para descrever o contexto em que se produz essa manifestação planetária e mesmo nos meios digitais fica difícil elaborar um quadro do seu significado. Mas eventualmente a complexidade dos fatos exige apenas que o observador abandone certos pressupostos condicionados pela leitura linear de notícias e tente enxergar o novo.

Coloquemos, por exemplo, o fato de que os indignados pertencem, na maioria, à chamada “geração Y” – cujos valores e visão de mundo se colocam em total contraposição aos dos yuppies, que a partir do final dos anos 1980 se apossaram da liderança dos grandes negócios e da condução dos humores do mercado.

Pergunta essencial

Os indignados são essencialmente diferentes da chamada “geração X”, na qual são classificados os predadores de Wall Street, que gozaram a infância no final dos “30 anos gloriosos” e, quando jovens adultos, entenderam que precisavam cuidar pessoal e egoisticamente de seus interesses. Mas também são nascidos na “geração X” os criadores do movimento punk, originalmente uma reação às dificuldades surgidas com a primeira grande crise do petróleo, nos anos 1970.

Assim, é preciso inicialmente diferenciar os indignados de hoje dos alienados de ontem. A atual geração que chega à idade adulta após o advento da internet encontrou o mundo preparado para outros 30 anos de bem-estar e evolução: as novas tecnologias reinventam os negócios, a inovação lança ininterruptamente na rotina aparelhos e sistemas que ampliam o alcance do conhecimento, alargam-se os horizontes geográficos para a ação estimulante do capital.

Mesmo a urgência ambiental, percebida já nos anos 1980 com as ocorrências de chuvas ácidas na Europa, na Ásia, no antigo território soviético e na América do Norte, produziu reações positivas ao impactar a vida social no fim da década passada, como a rápida conscientização sobre a necessidade de novos paradigmas na indústria, no transporte, na vida privada e na organização das cidades.

O que é, então, que não está dando certo?

Essa é uma pergunta essencial da pauta contemporânea.

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Indignados e resignados

O que está destoando desse contexto é justamente a “geração X”, que se aquartelou no capital financeiro, entranhou-se nas instituições do poder – entre elas a imprensa tradicional – e, envelhecida precocemente, não consegue enxergar as possibilidades do novo século.

Há um mal-estar generalizado quando se olha para o futuro, mas essa percepção não parece ter relação direta com o fim da era do petróleo e o advento da era da responsabilidade pessoal pelo destino coletivo. Esse é um pressuposto explícito em todos os movimentos contemporâneos, desde a chamada “primavera árabe” até o “ocupe Wall Street”.

O mal-estar no ambiente da globalização vincula-se claramente à incompatibilidade dos interesses do setor financeiro – chamado genericamente de “o mercado” – com as necessidades e interesses da sociedade em geral.

No momento em que a inovação tecnológica oferece soluções para o desenvolvimento sustentável, a irresponsabilidade individualista dos remanescentes da “geração X” ameaça colocar tudo a perder. Eles se tornaram mais do que conservadores – são reacionários no limite da insanidade.

Podem ser claramente identificados nos conselhos de grandes conglomerados transnacionais, no comando dos gigantescos fundos de investimento e nas chefias de muitos governos importantes. Mas também estão presentes em postos de direção dos grandes grupos de mídia – valorizados como mão de obra qualificada por sua obediência cega aos cânones do chamado fundamentalismo de mercado.

Falta entender

O que diferencia essencialmente a geração dos indignados da geração dos resignados – que resistem a aceitar os novos paradigmas que se impõem ao mundo – é justamente a capacidade de alimentar uma utopia coletiva.

É quase dogma na maioria das redações a interpretação de que a queda do muro de Berlim representou o fim das utopias. É “chique” entre jornalistas adeptos dessa ideologia dizer-se “pós-moderno”, embora poucos deles saibam explicar o que isso quer significar.

Mas acontece que, ao contrário do que alardearam os jornais no fim do século passado, a História não acabou. Ela se desenrola hoje nas ruas de todo o planeta com a manifestação dos novos protagonistas. Mas a imprensa tradicional ainda não entendeu, ou não quer entender.

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Comentários

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João-PR

Sou da geração "X", e luto todo dia por um mundo melhor.
Acho que o articulista cometeu o erro de colocar todos os "gatos no mesmo balaio".
Acho que a geração "X" "briga" mais do que a geração "Y". Essa última, sim, grosso modo, parece-me mais acomodada, e só está saindo ás ruas porque perderam a perspectiva da boa vida que levavam nos EUA e Europa. Não vejo uma politização da discussão, apenas a questão econômica está colocada. É um bom começo para a maioria dos "Y": eles terão que entender o que está por trás da crise econômica, e dai, quem sabe, politizam-se um pouco.
Só para lembrar: a França elegeu Sarkozy, a Itália Berlusconi…ou seja, quem elegeu estes sujeitos são a geração "x" ou "y"?????

Cibele

Conceição, por que o Viomundo praticamente ignorou o encontro mundial de blogueiros? A Carta Maior está dando destaque. Até o PHA publicou alguma coisa. Estou me referindo apenas à divulgação e informação sobre o evento.

eduardo di lascio

Geração X onde cara pálida? É uma elite econômica que deixa os outros milhões de Xs a ver navios, assim como todas as outras gerações passadas e futuras. Esse texto não poderia partir de uma premissa mais furada e generalista. Nota zero.

assalariado.

Os donos do capital, via seu braço ideológico (o PIG), conseguiram criar a "geração Y", multitarefas, um faz tudo, e é claro, suas mentes totalmente direcionada para os seus lucros, e nem pensarem politica, se for, de preferência, que seja apresentada de forma imunda (o Pig é bom nisto), com o objetivo de afastar os jovens e a sociedade do mundo das ideologias politicas. É de fundamental importância para as elites industrial e financeira manterem a sua ideologia do pensamento único/ senso comum, nas mentes da sociedade, até que elas achem a saída, para mais esta crise criada pelo capital.

Marx viveu o surgimento do capitalismo e da crise social gerada a partir daí. Sua proposta filosófica era entender as raízes da crise social.

Com essa base filosófica Marx chega às seguintes conclusões:

a) O capitalismo é uma situação histórica;

b) por ser uma situação histórica, o capitalismo irá se autodestruir devido à presença de forças contrárias que lutam entre si dentro dele;

c) no capitalismo, essas forças são as classes: classe burguesa versus classe proletária;

d) a burguesia, embora esteja com as armas, não precisa usá-las porque, no momento, está em situação privilegiada de superioridade econômica e política;

e) esta situação privilegiada de superioridade pode durar muito tempo devido à presença de uma espécie de droga que cria uma anestesia geral, fazendo as coisas parecerem paradas. Essa droga leva o nome de ideologia dominante.

f) diante dessa ideologia, o papel do filósofo de seu tempo é fazer mover a história dando força ao proletariado a fim de promover a guerra burguesia versus proletariado;

g) o ponto de partida para fortalecer a classe proletária é a criação de uma ideologia nova: a ideologia do proletariado, um espécie de antidroga.

h) a criação dessa antidroga é trabalho dos filósofos.

i) o proletariado, ao acabar com a burguesia através da ditadura do proletariado, também se autodestruiria fazendo surgir uma nova sociedade sem classes: o comunismo.

Sugiro que leiam o restante destes dizeres do controle ideológico burgues, de Karl Marx, neste endereço:
http://ialexandria.sites.uol.com.br/textos/israel

Saudações Socialistas.

MarcioA

E se as utopias deixaram de existir, haveríamos de deixar de caminhar também. Fomos impedidos pelos especuladores do setor financeiro por longas décadas, certamente. No entanto, a utopia deve ser uma consequência de uma glândula do ser humano, descoberta por Eduardo Galeano e que se chama consciência. Sobre a Utopia e outros assuntos vejam: http://www.youtube.com/watch?v=w8rOUoc_xKc

Santiago

Eu acho que os indignados de hoje são os alienados de ontem. Enquanto tudo parecia ir bem para todos, eles não tinham motivo para se indignar, os 99% de excluídos estavam no terceiro mundo. De repente, eles percebem que também fazem parte dos excluídos. Agora é correr atrás do prejuízo. Antes tarde do que nunca.

    Bráulio

    Tem toda a razão, mas cuidado com o "antes tarde do que nunca", porque o que os manifestantes querem agora não é impor uma utopia que traga desenvolvimento e bem-estar pro mundo todo. Eles só querem é que a situação DELES, lá no país DELES, volte à situação de conforto pré-2008 que vc descreveu.

    Hoje eles demonizam Wall St.; se amanhã, algum daqueles prestidigitadores do sistema financeiro inventar um novo esquema de pirâmide que faça o dinheiro voltar pro bolso dos manifestantes, estes não vão querer nem saber DE ONDE veio (ou vai vir) esse dinheiro.

MdC Suingue

Eu acho que o maior erro neste caso será ignorar.
O segundo maior erro será generalizar
O terceiro maior erro será tentar rotular.

Cada caso é um caso, apesar do 'modus operandi' semelhante.

As demandas das massas da Primavera Árabe não são as mesmas das demandas dos Indignados da Espanha e Grécia, que não são as mesmas da Revolta dos Saqueadores de meses atrás e dos agora Occupy de Londres, que não são as mesmas dos Occupy Wall Street, que não são as mesmas dos Acampa Sampa, que não são as mesmas da Cinelândia, que não são as mesmas dos proto-Occupy Movimento Sem Terra e do Movimento Sem Teto.

Toda essa movimentação é linda pois está tirando toda uma massa – e é um erro chama-la de 'geração' pois não há homogeneidade nessa massa – de uma letargia muar incentivada pela sociedade de consumo exacerbado e pela a mídia estupidificante.

Eu pessoalmente estou dando graças ao deuses e aos orixás dos ateus que o debater, o discordar e o questionar deixaram de ser 'demodé' e passaram a ser valorizados de novo.

Mas tudo é ainda muito embrionário, e temos que ver quais vão ser os desdobramentos de cada movimento.
O consenso fácil da democracia direta de um núcleo social pequeno já se mostra mais complicado quando centenas viram milhares, e muito mais compliado quando se trata de milhões. E é aí que cada movimento se difere uns dos outros. Cada sociedade em questão tem suas peculiaridades, a única semelhança é a percepção de que o tecido social está se deteriorando aceleradamente. Como cada uma vai resolver os seus problemas – e se vai – é o que vamos ver mais pra frente,

Certamente já estamos vendo isto nos desdobramentos da revolução na Tunísia e no Egito, que não sei se estão indo pelos caminhos que o Ocidente esperava, com a balança do poder pendendo para o lado de um estado religioso em oposição ao laico.

Mas só a volta do exercício do ativismo e do questionamento do status quo já é um granda avanço para um mundo que parecia fadado a caminhar para o abatedouro sem espernear.

Conheça aqui o primeiro manifesto do Occupy Wall Street: http://cas.podomatic.com/entry/2011-10-06T13_59_2

Conheça aqui John Pilger, o cara que previu em 2008 que Occupy Wall Street estava para acontecer: http://cas.podomatic.com/entry/2011-10-14T18_25_4

Conheca 3 episódios de ativismo explícito, emblemáticos do movimento que sacode a América.
1- Um bate boca sensacional entre Chris Hedges e o âncora conservador
2- O marine que peitou 15 policiais nas ruas de NY
3- O discurso inflamado do cineasta e ativista Danny Glover apoiando Occupy. http://cas.podomatic.com/entry/2011-10-21T10_34_4

Pedro

Artigo muito bom. Ajuda a gente a pensar. Marx analisou a sociedade capitalista e demonstrou que ela é um feixe de contradições. A mais importante delas é a que ele estuda nos Grundrisse, em bela tradução recentemente editada pela Boitempo. Citando Hodgskin, Marx enfatiza essa contradição: "o lucro é um limite para a produção". Se isto podia ser dito em meados do século XIX, parece que agora podemos dizer que o "limite" já estourou. Quando os indignados dizem que O CAPITALISMO NÃO FUNCIONA, poria nessa frase um MAIS, coisa de quem vê o mundo num processo constante de transformação.

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