Número de policiais candidatos cresce 27% em 2022; 94,9% concorrem por partidos de direita

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Foto: Divulgação

Da Redação

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou nesssa terça-feira, 16-08, levantamento que aponta aumento de  27% no número de policiais candidatos nas eleições gerais do Brasil em 2022.

Neste ano, há 1.866 candidatos oriundos das forças de segurança pública e defesa; em 2018, eram 1.469.

Os números foram obtidos a partir de dados preliminares do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O levantamento também mostra que se forem consideradas as proporções de candidatos dessas categorias em relação ao total de candidaturas em cada Unidade da Federação, teremos uma média de 6,6% de participação de policiais nas eleições em 2022.

“Quando falamos em ‘politização’ das forças de segurança, há uma acepção do termo que é positiva, ou seja, há a aposta da Constituição de que todos os brasileiros se tornem cidadãos ativos e conscientes de seus deveres e obrigações, bem como busquem defender seus projetos políticos e interesses. Ruim é a radicalização partidária e ideológica desses profissionais e a politização das instituições policiais, como se elas fossem propriedade desse ou daquele grupo de pressão e/ou político”, diz o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima.

Amazonas e Distrito Federal são os estados com os maiores percentuais de candidatos policiais em relação ao total das candidaturas locais:  11,3% e 10,1%, respectivamente.

No Ceará, apenas 4,3% de todas as candidaturas registradas no TSE são, até o momento, de profissionais da segurança pública.

Em números absolutos, Rio de Janeiro é o estado com o maior número de candidaturas de policiais:  251 nomes. Em seguida, São Paulo, com 238, e Minas Gerais, com 126.

Vale lembrar, porém, que esses três estados são os que têm os maiores efetivos de policiais militares e civis do país.

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Se separadas por corporações, as 1.866 candidaturas ficam assim distribuídas:  a grande maioria é composta por policiais militares:

—  Policiais militares, 807

— Policiais civis, 188

— Bombeiro Milita, 117

— Militar reformado, 245,

— Membro das Forças Armadas, 60

— Outras ocupações, 449.

Os candidatos policiais foram identificados a partir da ocupação e do nome de urna informados no cadastro disponibilizado pelo TSE em seu Portal de Dados Abertos (dados gerados às 18h35 do dia 15/8).

No caso dos candidatos oriundos das PMs, observa-se um crescimento de 8,8% em relação a 2018.

“Ao contrário dos integrantes do Ministério Público ou do Poder Judiciário, que precisam abrir mão de suas carreiras caso queiram se candidatar, a legislação  permite que policiais disputem eleições sem a necessidade de saírem de suas carreiras nas polícias e/ou estejam sujeitos a regras de transição. A legislação acaba por privilegiar as carreiras policiais em relação às demais e isso facilita candidaturas e protagonismo”, explica o diretor do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Perfil ideológico das candidaturas

Lima agregou as agremiações partidárias em que policiais concorreram nas eleições ocorridas entre 2010 e 2018 nas categorias esquerda, centro-esquerda, centro-direita e direita.

Em média, 81,0% dos profissionais das forças de segurança do Brasil que concorreram nas eleições ocorridas entre  2010 e 2018 eram de partidos de direita e centro-direita, tradicionalmente mais vinculados às bandeiras conservadoras da sociedade.

Em 2018, esse número foi de 89,9% e agora em 2022 subiu para 94,9% das candidaturas de policiais e demais profissionais da área.

O PL, partido pelo qual Jair Bolsonaro concorre à reeleição, aparece com 232 nomes, seguido pelo PTB, com 140 policiais candidatos, seguido do Republicanos, com 137. Em sentido oposto, também é válido notar que, em 2018, os partidos à esquerda conquistaram 2,9% das candidaturas de policiais para as suas fileiras.

“Ao invés de se reaproximarem do universo policial e realizarem um trabalho de base e formação política que pudesse rivalizar com a narrativa de centro-direita e direita, partidos de esquerda buscam lançar candidatos policiais sem, no entanto, construírem um discurso alternativo sobre ordem e segurança”, diz o diretor do Fórum de Segurança.

Com informações do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

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Zé Maria

“Brasil, Uma Democracia Militarizada”

Por Por Maud Chirio (*), no Blog do MIro (8 de junho de 2021)

Publicado originalmente em francês no The Conversation:
(https://theconversation.com/le-bresil-une-democratie-militarisee-160636)
Traduzido por Caio Cursini

[Excerto]

“Um Exército que Nunca Renunciou ao Poder”

A militarização do poder brasileiro é o resultado de um pacto selado
entre o ‘fascista outsider’ Bolsonaro e generais ultraconservadores
ávidos por se aproximar ou mesmo retornar ao poder.
Esse fenômeno contraria nossa representação da trajetória política
do país: a de uma transição democrática consolidada , que teve
como pilares não apenas a submissão das Forças Armadas
ao poder civil, mas também sua renúncia a qualquer agenda política.

Como entender essa situação?

Três conjuntos de fatores parecem ser considerados,
em diferentes escalas de tempo.

A primeira é a incompletude da transição democrática brasileira,
sem justiça, sem expurgo das forças da ordem e sem imposição real
de autoridade civil à instituição armada.

Desde 1985, todos os presidentes brasileiros tiveram que levar pinças
com suas equipes, para implantar mecanismos de justiça de transição,
nomear ministros da defesa ou considerar reformas no treinamento
militar.

Recorde-se que o primeiro ministro da Defesa escolhido por Lula,
o diplomata José Viegas, foi obrigado a renunciar em 2004
porque ousou se opor aos elogios à ditadura por parte de altos
comandantes.

A cultura institucional militar permaneceu hostil à classe política civil,
com o imaginário de corrupção e incompetência generalizada;
e laudatória em relação à ditadura.

No entanto, até 2018, os quadros tiveram o cuidado de não intervir
abertamente no jogo político, mesmo durante as eleições do
ex-sindicalista Lula (2002, 2006) e depois da ex-guerrilheira
Dilma Rousseff (2010, 2014).

As pressões foram realizadas principalmente nos bastidores
e em questões relativas à corporação, ou suas ações
durante a ditadura.

Nesta instituição resistente à integração em uma democracia civil,
os setores muito radicais, abertamente nostálgicos por uma ordem
autoritária e muito sensíveis à ascensão da “Nova Direita” no
espaço ocidental, eram considerados muito mais isolados
do que realmente eram – esse é o segundo fator.

Oficiais aposentados, para muitos, ex-membros do aparato repressivo
[da Ditadura Militar (1964-1985)], criaram pequenos grupos ativistas
na década de 1990, verdadeiros caldeirões de uma fusão entre os
imaginários de contra-insurgência da Guerra Fria e o pensamento
da Nova Direita Americana.

‘O comunismo não morreu: suas novas faces foram as lutas culturais
progressistas (feminismo, direitos das populações periféricas, indígenas
e LGBTQ+, defesa do meio ambiente, do multilateralismo), defesa dos
direitos humanos e políticas memoriais, promovidas por partidos
disfarçados de social-democratas (como o Partido dos Trabalhadores),
mas na verdade com ambições totalitárias.’

Esse sistema de pensamento, há muito percebido como anacrônico
e delirante, na verdade se espalhou a partir de meados dos anos 2000
dentro do exército ativo.

Um último conjunto de fatores diz respeito às missões das Forças Armadas
no regime democrático:
a defesa do território é periférica, se comparada às operações de segurança
urbana (combate ao narcotráfico, “pacificação” de favelas) e administração
territorial.
As forças armadas estão se convertendo, adaptando sua formação e garantindo
sua legitimidade pública tornando-se policiais – violentas – e construtoras de
estradas, pontes, agentes paliativos do Estado onde ele não está muito presente.

Assim, a corporação militar bastante autônoma, desconfiada da classe política
e dos poderes civis, acaba por reforçar a convicção de que ela [a Corporação Militar] pode e sabe governar.

Notemos, então, que os antigos comandantes da Missão das Nações Unidas
para a Estabilização do Haiti (MINUSTAH), muitas vezes envolvidos nas grandes
operações de manutenção da ordem no Brasil, fizeram ou fazem parte da guarda
mais próxima a Bolsonaro.

Esses fatores entrelaçados sustentaram o estabelecimento de um
projeto de energia em meados da década de 2010.
Enquanto o primeiro mandato de Dilma Rousseff (2010-2014) foi
desestabilizado por protestos populares, crise econômica
e escândalos de corrupção [forjados pela Operação Lava Jato e a Mídia]],
alguns dos oficiais aderiram a uma distorção do jogo democrático
do qual esperavam se beneficiar.

Eles são particularmente queimados pela Comissão Nacional da Verdade
(2012-2014), que denuncia e condena oficialmente os crimes cometidos
sob a ditadura:
eles veem isso como uma manifestação do “revanchismo” de uma esquerda
‘comunista’.
Os oficiais estão se posicionando em todos os lugares:
no judiciário, nas milícias digitais, na administração, e estão se candidatando
às centenas em todas as assembleias do país.
Algumas das equipes aplicam estratégias de “guerra híbrida” dos manuais
militares ocidentais, com a intenção de desestabilizar discretamente os
sistemas políticos enquanto fingem respeitar suas regras.

As Forças Armadas têm, portanto, desempenhado um papel central,
ainda que nos bastidores, na saída do caminho da democracia brasileira
desde o golpe institucional contra Dilma Rousseff (2016) até a eleição
de Jair Bolsonaro (2018).

O mandato atual é a retribuição por esse papel, mas o ex-capitão
que consideravam disposto a servir aos seus interesses está
cada vez mais desacreditado por sua gestão catastrófica
da crise sanitária devido ao Covid-19.

Bolsonaro, politicamente isolado, só está protegido pela popularidade
que ainda mantém com um terço da população.

Ao distanciar-se do presidente, os quadros não pretendem, no entanto,
sair definitivamente das estruturas de poder; pelo contrário, querem se dar
os meios para sobreviver politicamente a uma queda ou não renovação
do poder do presidente.
As consequências desse projeto de poder para a sobrevivência da democracia
brasileira nos próximos anos são difíceis de prever.

(*) Maud Chirio é Historiadora, Professora na Universidade Gustave Eiffel, França.

Artigo embasado por diversos Capítulos da Obra
“Os Militares e a Crise Brasileira”
(João Roberto Martins Filho org. Alameda, 2021),
em especial, os de Manoel Domingos Neto,
Eduardo Costa Pinto, Adriana Marques, Piero Leirner
e da própria autora.

Íntegra:
https://altamiroborges.blogspot.com/2021/06/brasil-uma-democracia-militarizada.html

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