Jorge Bermudez e Ronald Santos: Que em 2022 a ciência desbanque o negacionismo e a solidariedade, o desprezo pelos mais pobres

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Bordadeiras do Brasil se unem a Padre Julio Lancelotti -- um símbolo da resistência -- contra o genocídio e a destruição, em defesa da vida e do SUS. Foto: Gi Meira Fotografias

Covid-19 2021/2022: passos trôpegos de um governo claudicante

Por Jorge Bermudez e Ronald Ferreira dos Santos*

Chegamos ao final de 2021 e início de 2022 com um governo claudicante a passos trôpegos, cada vez mais erráticos, sem nenhuma sensibilidade ao que acontece com os brasileiros, especialmente com os menos favorecidos.  

Prova disso é o caso da Bahia, cujas inundações provocaram uma tragédia no final de 2021 e que avança em 2022. 

Segundo atualizados de ontem, 2 de janeiro, da Superintendência de Proteção e Defesa Civil da Bahia, já são 25 mortos, 517 feridos e 90 mil desalojados/desabrigados. Ao todo, 661.508 atingidos pelas inundações no estado. 

Apesar do pedido feito ao Itamaraty feito governador da Bahia, o  governo brasileiro rejeitou a oferta de ajuda humanitária oferecida pelo governo argentino, repetindo resposta que deu há dois anos, quando Argentina se dispôs a auxiliar no combate aos incêndios da Amazônia.

Embora Brasil e Argentina sejam importantes parceiros comerciais, a eleição de Alberto Fernández foi motivo de bravatas por parte do governo brasileiro, que ameaçou deixar o Merconsul, repetindo o desmonte da UNASUL por diferenças ideológicas entre os governos da região.

Em outra vertente, a imprensa acaba de noticiar que a Organização Mundial do Comércio (OMC)  causou “incômodo” ao Brasil ao excluí-lo de negociação para assegurar acesso a vacinas para covid-19, em reunião restrita Índia, África do Sul, EUA e a União Europeia.

Ora, a OMC não deveria estar causando incômodo ao Brasil. Mas é o mundo que se vê certamente incomodado pelas constantes posturas negacionistas e excludentes que o Brasil vem manifestando em todos os foros internacionais.

Lá se foi o Brasil do passado recente, líder e respeitado entre os blocos, na região e entre os países em desenvolvimento, hoje transformado no que o ex-chanceler chamou de “pária do mundo”.

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Vale relembrar que, em outubro de 2020, quando Índia e  África do Sul propuseram na OMC a suspensão temporária de direitos de propriedade intelectual para assegurar o acesso a tecnologias — o denominado “waiver” — o governo brasileiro fez oposição a essa proposta.

Assim, em vez de apoiar a iniciativa para fortalecer a atuação dos BRICS e estabelecer negociações com a Índia e China, o Brasil alinhou-se com os EUA, de Donald Trump, contra os interesses dos países em desenvolvimento.

Isso sem falar que governo brasileiro optou por recorrer a atravessadores desqualificados para a importação de vacinas, gerando uma enxurrada de denúncias que vieram a público na CPI da Covid, no Senado Federal. 

Na verdade, é o próprio Brasil que tem-se  auto-excluído ao longo dos últimos três anos por suas posturas negacionistas fartamente comentadas na imprensa internacional. Exemplo disso é a insistência no uso da cloroquina e do famigerado “kit Covid” contra o novo coranavírus. 

O negacionismo do governo brasileiro atrasou o início da vacinação contra a covid-19.

Ainda agora, apesar das evidências científicas e da posição clara da Anvisa, há resistências no governo quanto à necessidade imunização das crianças de 5 a 11 anos de idade contra a covid.

O fato é que a pandemia escancarou a desigualdade, o empobrecimento e a exclusão de populações gigantescas no mundo. 

Também o apartheid das vacinas. Os países ricos abocanharam a produção mundial de imunizantes contra o novo coronavírus. De forma que as populações dos países pobres só possam aspirar a ter as vacinas necessárias dentro de alguns anos.  

No que se refere ao Brasil, o negacionismo do governo e o sentimento de ódio, tão representados nas mídias sociais, expressam a opção ultraliberal deliberada do atual governo e desprezam as populações pobres e marginalizadas.

Esperamos que 2022 nos traga a mudança que nos permita ajudar a construir um Brasil mais solidário, justo e includente. E que possamos reconstruir tudo aquilo que está sendo desmontado.

Que possamos resistir, mudar e reconstruir o Brasil.

Que, ao passar de um mundo virtual para um mais real, possamos aspirar por um mundo menos desigual.

Que a solidariedade substitua a exclusão.

Que a ciência substitua o negacionismo.

Que o afeto prevaleça sobre o ódio.

Somos mais do que menos.

Que venha 2022!

*Jorge Bermudez é pesquisador sênior da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz.

Ronald Ferreira dos Santos, presidente da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar)

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