DEBATE ABERTO
Espionagem em governos tucanos aponta relações obscuras com polícia e mídia
As revelações sobre episódios de espionagem política patrocinados por governos tucanos em São Paulo e no Rio Grande do Sul lançam um pouco de luz em uma zona sombria da relação entre poder político, aparato policial e mídia que não fica devendo nada ao escândalo Murdoch.
Marco Aurélio Weissheimer, na Carta Maior, em 08.08.2011
Em setembro de 2010, o governo Yeda Crusius (PSDB) foi alvo de novas denúncias envolvendo o uso do aparato de segurança do Estado para espionar jornalistas, adversários políticos e outras autoridades. As denúncias surgiram a partir da prisão do sargento César Rodrigues de Carvalho, da Brigada Militar, que estava lotado na Casa Militar do governo tucano, onde trabalha como segurança da então governadora, entre outras funções. O Sargento foi preso acusado de extorquir proprietários de máquinas caça-níqueis e de obstaculizar as investigações sobre o caso. Amílcar Macedo, promotor que conduziu o caso, revelou mais tarde que o sargento também tinha a atribuição de executar serviços especiais de espionagem.
A lista de espionados era longa, incluindo políticos, filhos de políticos, jornalistas (entre os quais estou incluído), delegados, oficiais de polícia e das forças armadas, uma desembargadora, entre outros. Segundo as investigações da promotoria, o sargento fazia, pelo menos, dois tipos de investigações: uma para levantar dados sobre a vida do investigado e outra para saber se a pessoa estava sendo investigada por alguma instituição.
Agora, em agosto de 2011, a revista Isto É publicou reportagem afirmando que os governos tucanos em São Paulo desenvolveram uma prática similar a essa atribuída ao governo Yeda Crusius. Intitulada “Central tucana de dossiês”, a matéria de Pedro Marcondes de Moura afirma que “mais de 50 mil documentos encontrados no Arquivo Público de São Paulo mostram como a polícia civil se infiltrou e investigou partidos políticos, movimentos sociais e sindicatos em pleno governo de Mário Covas”. A reportagem afirma:
“Agentes infiltrados em movimentos sociais, centenas de dossiês sobre partidos políticos, relatórios minuciosos com os discursos de oradores em eventos políticos e sindicais. Tudo executado por policiais, a mando de seus chefes. Estas atividades, típicas da truculenta ditadura militar brasileira, ocorreram no Estado de São Paulo em plena democracia, há pouco mais de dez anos. Cerca de 50 mil documentos, até então secretos e que agora estão disponíveis no Arquivo Público do Estado, mostram como os quatro governadores paulistas, eleitos pelas urnas entre 1983 e 1999, serviram-se de “espiões” pagos com o dinheiro dos contribuintes para monitorar opositores. Amparados e estimulados por seus superiores, funcionários do Departamento de Comunicação Social (DCS) da Polícia Civil realizavam a espionagem estatal”.
Entre os alvos dessas operações na administração do PSDB, diz ainda a matéria, aparecem principalmente lideranças do PT e a Central Única dos Trabalhadores (CUT). “Há dezenas de dossiês com informações sobre as duas entidades e seus principais expoentes. Já as investigações a respeito dos tucanos e seus aliados foram suspensas a partir de 1995, quando Covas assumiu o governo de São Paulo”.
Há algumas semelhanças gritantes entre as denúncias que surgem agora envolvendo governos do PSDB em São Paulo e aquelas feitas ao governo de Yeda Crusius no Rio Grande do Sul. Os dois casos envolvem o uso do aparato de segurança do Estado para espionar adversários políticos, contando com o silêncio e, possivelmente, a cumplicidade de setores da mídia. O desenrolar das investigações e dos processos em curso no Rio Grande do Sul talvez possam inspirar algum procedimento semelhante em São Paulo.
Acusado de espionagem era informante da RBS
Em maio deste ano, o juiz Fernando Alberto Corrêa Henning, da 3ª Vara Criminal de Canoas (RS), recebeu a denúncia oferecida pelo Ministério Público contra o sargento da Brigada Militar, o ex-chefe de gabinete de Yeda Crusius, Ricardo Luís Lied, e Frederico Bretschneider Filho (tenente-coronel da reserva e ex-assessor de gabinete da ex-governadora) por acesso ilegal ao Sistema de Consultas Integradas da Secretaria de Segurança Pública (SSP).
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A acusação feita pelo Ministério Público e aceita pela Justiça atualizou denúncias feitas pelo ex-ouvidor da Secretaria de Segurança do Rio Grande do Sul, Adão Paiani, que deixou o governo Yeda fazendo justamente essa acusação: uma estrutura de espionagem política ilegal havia sido montada no Palácio Piratini. Ao longo das investigações, essa estrutura apresentou ramificações midiáticas um tanto obscuras, envolvendo a RBS, o maior grupo de comunicação da região sul do país.
O sargento César Rodrigues de Carvalho era informante de jornalistas do Grupo RBS. O fato foi admitido pela própria empresa em uma nota publicada no dia 10 de setembro de 2010 no jornal Zero Hora. “O nome do sargento até agora não havia sido mencionado nas reportagens dos veículos da RBS em respeito ao princípio constitucional de proteção do sigilo de fonte”, disse a nota. Ainda segundo a RBS, “as informações se referiam a passagens por presídios, situação de criminosos foragidos e o tipo de crime em que estavam envolvidos, incluindo, em alguns casos, fotos”.
No mesmo período, um email foi enviado a vários jornalistas do Estado afirmando que o sargento “prestava serviços a jornalistas no acesso a dados”, em especial para a RBS. Segundo o jornalista Vitor Vieira, do site Vide Versus, jornalistas do grupo teriam recebido dez senhas de acesso ao Sistema de Consultas Integradas. Esse sistema, cabe lembrar, é de uso exclusivo das forças de segurança do Estado, não se destinando a servir como fonte privilegiada para jornalistas. Protegidas pelo sigilo que cerca o processo, há muitas informações sobre esse caso que ainda não vieram a público. Os veículos da RBS, como era de se esperar, não tocaram mais no tema da relação entre seus jornalistas e o sargento acusado de espionagem política e outros crimes.
As revelações sobre episódios de espionagem política patrocinados por governos tucanos em São Paulo e no Rio Grande do Sul lançam um pouco de luz em uma zona sombria da relação entre poder político, aparato policial e mídia que não fica devendo nada ao escândalo Murdoch.
Marco Aurélio Weissheimer é editor-chefe da Carta Maior (correio eletrônico: [email protected])
Comentários
Alexandre Felix
Imagino um longa produzido pela Globo Filmes sobre isso… "O tucano e a araponga". roteiro: Fábio Assunção é filho de um senador correto (Tarcísio Meira) que descobre um esquema gigantesco de corrupção e espionagem comandado por um miliciano ex PM (Wagner Moura). Depois de muitas mortes, nosso herói desmantelará o esquema, com a juda de uma jornalista politicamente engajada (Andréa Beltrão) , causando um grande transtorno para o governo federal…
Regina Braga
Só o fato da notícia sair já é uma grande conquista…Se ela for repetida muitas vezes…O MP,OAB,vão ficar numa sinuca de bico…Ou investigamos ou o que resta da credibilidade vai prá … As pessoas vão começar a reclamar,e aí? Transparência Brasil !!!
Marat
O mais desagradável é saber que, mais uma vez, não vai dar em nada, ou melhor, vai dar em pizza!
Taiguara
Em SP vai acabar em pizza. Aqui em Minas, acaba em pó.
Rodrigo Leme
A central "tucana" dedossiês começou em…1983?
Sem mais.
Se fosse com o nome do PT, esse blog ia deitar 5 textos (dos mesmos de sempre), chamando de PIG pra baixo, e como "o PT é conedenado pelas mesmas práticas de seus adversários", na tal "indignação seletiva da imprensa corporativista". Esqueci algum lugar comum do discurso?
Leider_Lincoln
Seu argumento é qual? Que não havia PSDB ou que não havia Franco Montoro (um dos fundadores do PSDB)? Ou seu argumento é que, após a fundação do PSDB (por Franco Montoro, que iniciou a prática criminosa) em 1988, a espionagem ilegal acabou? Ou que o sucessor de Montoro, também do PSDB pediu para pararem de espionar o PSDB e apenas se "esqueceu" de exigir que a ilegalidade contra o PT cessasse? Faça-me o favor, né?
Junior
Quem é esse cara hein? Será que ele apareceu nesse mundo só agora? Meu Deus !!!!
Alexei_Alves
Freud tinha razão.
O ser humano costuma ver e acusar nos outros os defeitos que, no fundo, sabe ser os seus próprios. Quando o PSDB acusava insistentemente o PT de fabricar dossiês e de espionar os adversários, estava, na verdade, tentando lidar com o seu próprio complexo de culpa e o contraditório desprezo que nutria por si mesmo (Freud explica).
Isso não pode ficar assim. Esse escândalo precisa ser apurado e os responsáveis punidos na justiça!!!!!
GilTeixeira
Não é complexo de culpa e safadeza mesmo! é aquele batedor de carteiras de feira-livre que rouba a grana e sai correndo gritando: pega ladrão!
Antonio
Ora, caberia aos próprios policiais denunciarem estar fazendo trabalhos que não condizem com sua função. Que os tucanos são podres todos sabemos. Que eles usam de métodos ilegais, está comprovado. A sociedade civil tem que se organizar para combater o crime organizado nos poderes brasileiros, mas nem só, tem que se organizar para melhorar esses poderes, com o intuito de expurgar as máfias que se formam ali.
Silvio I
Azenha:
Dizem que a corda se rompe no lugar mais fino. E provavelmente o que vai a passar. Quem vai a pagar vai ser o sargento. Agora os verdadeiros responsáveis, a quem ele servia não vão a ser nem lembrados. O mesmo passa em São Paulo porque a policia intervém a serviço de quem? Com que motivo?
Carlos Cruz
Se houver uma pesquisa maior confirma-se que os metodos truculentos de espionagem dos governos tucanos paulista e gaucho não se restringem a penas a eles. A utilização do aparelho estatal para espionagens ilegais de movimentos sociais ainda é utilozada em larga escala no Brasil e para seu fundamento utilizam-se as mais escabrosas justificativas. É o estado respublicanos sendo utilizado pelo "pudê" momentaneo. Mostra o quanto temso de andar e aprender para que estejamos realmente em uma res publica, e não em uma res privata. Quando a cidadania for descoberta, atraves da educação e de seu exercicio, assimilada, chegaremos lá. Mas ainda falta muito…
MARIA
NEM UMA TV PUBLICA E RADIO PUBLICA NÓS TEMOS PARA NOS OFERECER JORNALISMO DE VERDADE, PARA MOSTRAR À POPULACAO OS DESMANDOS DE TODOS OS PARTIDOS E GOVERNOS DE ONDE QUER QUE SEJAM, TODAS AS CIDADES, ESTADO E GOV FEDERAL. NAO TEMOS VOZ.
Conceição Lemes
Maria, por favor, letras minúsculas nos próximos comentários. Maiúsculas só dificultam a leitura. abs
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