Adriano Diogo, sobre seminário na USP: “Queremos expor as feridas abertas da ditadura e as consequências hoje”
Tempo de leitura: 5 minTerrorismo de Estado é tema de seminário na USP da Maria Antonia, nesta sexta-feira, 13
Evento é organizado pelo ex-presidente da Comissão Paulista da Verdade, Adriano Diogo
por Lúcia Rodrigues*
Mais de cinco anos após a entrega do relatório da Comissão Nacional da Verdade, que previa a responsabilização de torturadores que atuaram durante a ditadura militar, nenhuma das 29 recomendações saiu do papel.
Pior. Nesse período Jair Bolsonaro chegou à Presidência da República e se incumbiu de sabotar pessoalmente qualquer possibilidade de acerto de contas com o passado. Ele nega, inclusive, que houve ditadura militar no Brasil.
Desde o ano passado, os ataques contra aqueles que atuam na área de Memória, Verdade e Justiça se intensificaram.
Além do deboche e das ilações contra as vítimas e seus parentes, Bolsonaro agiu para desmontar organismos do setor.
O governo federal interditou a Comissão de Anistia, esvaziou a Comissão de Mortos e Desaparecidos, interveio no Comitê de Prevenção à Tortura e no CAAF, o Centro de Antropologia e Arqueologia Forense da Unifesp, que analisa as ossadas encontradas na vala de Perus.
“Não poderia nunca encerrar os trabalhos da Comissão de Mortos e Desaparecidos sem entregar os atestados de óbito (dos ativistas políticos executados) para as famílias”, afirma o ex-deputado Adriano Diogo (PT-SP), que presidiu a Comissão Paulista da Verdade Rubens Paiva.
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Nesta sexta-feira, 13, ele vai coordenar um seminário na USP, da rua Maria Antônia, que pretende jogar luz sobre alguns casos emblemáticos da repressão que ocorreram durante o período ditatorial.
A participação de empresários na sustentação financeira à tortura será um dos temas em debate:
“A Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo] voltou a comandar o golpe. O Bolsonaro despacha na Fiesp. Fizeram o pato amarelo. Tão chamando o ato do dia 15”.
O evento também pretende fazer uma conexão entre a repressão dos Anos de Chumbo com a que ocorre nos dias atuais.
“Estamos sob a égide de um regime autoritário. Vivemos um período ditatorial com outras características. Não é com tanques na rua. Mas temos o regime ditatorial de Paraisópolis, por exemplo”, frisa, ao se referir ao massacre da PM que matou nove jovens em dezembro do ano passado.
“Queremos expor as feridas abertas da ditadura e suas consequências hoje. Porque toda vez que não se conta o que aconteceu em períodos de exceção, esse período se repete e vem com mais força”, alerta o ex-presidente da Comissão da Verdade.
O tema central dos debates, Terrorismo de Estado: da ditadura ao desgoverno atual, vai reunir vítimas da repressão, promotores de justiça, defensores públicos, procuradores da República, professores universitários e pesquisadores da área.
As doze horas de discussões, destinadas às mesas distribuídas ao longo da manhã, tarde e noite, serão intercaladas com intervenções culturais, como a da atriz vencedora do Prêmio Shell Fernanda Azevedo.
Caberá a ela abrir os trabalhos do evento com uma performance baseada no desaparecimento forçado da professora da USP Ana Rosa Kucinski, que ocorreu em 1974.
A guerrilheira Iara Iavelberg, companheira do capitão Carlos Lamarca, executada na Bahia, pelas forças da repressão, em 1971, também será homenageada com uma apresentação da atriz Natália Siufi.
Sob ataque
Adriano considera fundamental a denúncia como instrumento para barrar os ataques do atual governo. “Se as organizações de direitos humanos não tivessem denunciado os campos de concentração logo após a Segunda Guerra, o nazismo teria se repetido com muita facilidade.”
“Hoje há uma ofensiva nazifascista no mundo, precisamos ter um grupo que analise isso. Queremos alertar que a situação é gravíssima, mas que não dá para nos acovardarmos. É preciso enfrentá-la.”
Além do seminário desta sexta, o mês de março, que marca o aniversário do golpe de 1964, terá mais dois eventos para relembrar as atrocidades cometidas pela ditadura militar:
*Sábado, 28, às 10h –Ato na sede do antigo DOI-Codi, o principal centro de tortura da repressão militar, localizado na rua Tutoia, 921, ironicamente no bairro do Paraíso.
Além de render homenagem a todos que tombaram nos porões do regime, os manifestantes vão exigir que o local seja transformado em um centro de memória. Até hoje, o espaço é ocupado por uma delegacia de polícia.
*Domingo, 29 — Caminhada do Silêncio percorrer a região do Ibirapuera para lembrar os mortos e desaparecidos da ditadura e dos dias atuais. A concentração está marcada para às 16h, em frente à arena de eventos.
Confira a seguir a programação do seminário, disponibilizada pela organização, que vai ocorrer na rua Maria Antônia, 258, Vila Buarque, no Centro.
Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva cinco anos depois – Terrorismo de Estado: da ditadura ao desgoverno atual
9h às 9h30 – Abertura com a performance do caso de Ana Rosa Kucinski, com Fernanda Azevedo (Cia Kiwi de Teatro)
9h30 às 10h50 – Apresentação do trabalho e relatório da Comissão com Adriano Diogo, Amelinha Teles, Pádua Fernandes, Renan Quinalha e Vivian Mendes
11h às 12h20 – Mortos e desaparecidos: A luta hoje por Memória, Verdade e Justiça
Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos
Vera Paiva, filha de Rubens Paiva, membro da Comissão
Grupo de Trabalho das Ossadas de Perus do CAAF – Unifesp
Edson Teles, coordenador do CAAF, apresenta a situação do trabalho
Comissões da Verdade das Universidades
Rosalina Santa Cruz apresenta caso inédito de desaparecido da PUC-SP
Participação da sociedade civil na Comissão da Verdade
Suzana Lisboa, Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos
Eduardo Valério, promotor de Direitos Humanos do Ministério Público de São Paulo
Rafael Oliveira, Defensoria Pública do Estado de São Paulo
12h30 às 14h – Almoço
Concerto do Octeto da Osusp
14h às 15h30 – Graves violações de Direitos Humanos
Depoimento do maestro Martinho Lutero sobre a participação do coro Luther King nas iniciativas da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva
Marlon Weichert, procurador Regional da República do Ministério Público Federal
Eugênio Aragão, procurador da República e ex-ministro da Justiça (por videoconferência)
O caso Juscelino Kubitschek e a Comissão da Verdade de São Paulo Rubens Paiva, apresentado por Alessandro Octaviani, professor da Faculdade de Direito da USP
15h30 às 18h — Genocídio e tortura ontem e hoje
Papel dos empresários na repressão aos trabalhadores
Sebastião Neto e Rosa Cardoso
Mecanismo Estadual de Combate à Tortura – Protocolo de Istambul
Carolina Toledo Diniz, consultora da Conectas
Mateus Oliveira Moro, defensor público do Estado de São Paulo e coordenador do Núcleo Especializado em Situação Carcerária
Comissão da Verdade da Escravidão
Caso Chaguinhas/Liberdade – tortura e execução histórica – Sítio dos Aflitos
Professor Silvio Luiz Sant’Anna, UNAMCA
Paula Nishida, DPH/Secretaria da Cultura
Paula Vermeersch, historiadora da Unesp
Os genocídios da Democracia
Participação de Solange Oliveira, das Mães da Zona Leste
Comissão Camponesa da Verdade
Clifford Welch e Gabriel da Silva Teixeira, pesquisadores da Comissão da Verdade São Paulo Rubens Paiva
18h às 18:45 – Lanche
18h50 – Apresentação de trecho da peça Ato Institucional nº5 (AI-5) no passado e no presente
Leitura do texto em homenagem à Iara Iavelberg, por Natália Siufi, do Grupo Xingó
19h às 21h – Ato final – Manifesto contra o Terrorismo de Estado: Da Ditadura ao Desgoverno Atual
Homenagem a Rafael Martinelli e Ieda Akselrud de Seixas
Leitura do Manifesto
Debate sobre o desgoverno
Com Adriano Diogo, Amelinha Teles, Eleonora Menicucci, Eliana Vendramini, Luiza Erundina, Maria Auxiliadora Arantes (Dodora) e Rosa Cardoso
*Lúcia Rodrigues é jornalista e cientista social pela USP.
Comentários
Zé Maria
Reprisando:
“Sábado, 28, às 10h –Ato na sede do antigo DOI-Codi,
o principal centro de tortura da repressão militar,
localizado na rua Tutoia, 921, ironicamente no bairro
do Paraíso [em São Paulo-SP].
Além de render homenagem a todos que tombaram
nos porões do regime, os manifestantes vão exigir que
o local seja transformado em um centro de memória.
Até hoje, o espaço é ocupado por uma delegacia de polícia”
[o que simbolicamente demonstra que a Ditadura da Tortura Estatal, mesmo com Aparência de Legalidade,
não acabou].
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