Livro de Amaury Ribeiro Jr., que denunciou doleiro Messer, sobreviveu melhor ao tempo do que crítica de Merval Pereira
Tempo de leitura: 13 minO livro “Privataria tucana”, da Geração Editorial, de autoria de Amaury Ribeiro Jr, é um sucesso de propaganda política do chamado marketing viral, utilizando-se dos novos meios de comunicação e dos blogueiros chapa-branca para criar um clima de mistério em torno de suas denúncias supostamente bombásticas, baseadas em “documentos, muitos documentos”, como definiu um desses blogueiros em uma entrevista com o autor do livro.
[…]
O livro, portanto, continua sendo parte da sua atividade como propagandista da campanha petista e, evidentemente, tem pouca credibilidade na origem.
[…]
O livro de Amaury Ribeiro Jr. está em sexto lugar na lista dos mais vendidos de “não-ficção”. Talvez tivesse mais sucesso ainda se estivesse na lista de “ficção”.
Merval Pereira, em O Globo, criticando o best seller A Privataria Tucana em 2010, uma forma de defender a candidatura derrotada de José Serra.
Da Redação
A denúncia sobre a sociedade entre o doleiro Dario Messer e o ex- presidente do Paraguai, Horacio Cartes, no banco Basa, ex-Amambay, jogam nova luz na atuação do chamado “doleiro dos doleiros”.
A denúncia foi feita no âmbito da operação Lava Jato.
Cartes governou o Paraguai de 2013 a 2018. Ele caiu de paraquedas no Partido Colorado e sucedeu Fernando Lugo, derrubado em um golpe em 2012.
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Cartes chegou ao poder mesmo sob suspeita de envolvimento com o contrabando de cigarros e o narcotráfico.
Empresário milionário, ele agora é senador vitalício. Cartes se referiu ao doleiro Messer como “irmão de alma”.
Os dois podem ter utilizado o banco para lavar dinheiro do narcotráfico, do contrabando e do tráfico de armas.
No capítulo sete de A Privataria Tucana, o jornalista investigativo Amaury Ribeiro Jr. tratou dos serviços prestados por Dario Messer ao tucano José Serra:
Ex-caixa do PSDB recebe mais U$ 1,2 milhão
No final de fevereiro de 2003, logo após a revelação do caso Banestado na IstoÉ, presenciei a execução de uma “operação limpeza” em Nova York, obra de doleiros do Panamá.
Eles tentavam apagar pistas no sétimo andar de um pequeno escritório que administrava investimentos ao lado do conglomerado Citibank, no coração de Manhattan.
Temendo uma ação da polícia e da promotoria distrital de Manhattan, os funcionários se apressavam em dar sumiço em computadores e documentos comprometedores.
Era o fim de quase 20 anos de atividade da lavanderia.
Ali, disfarçada de administradora de contas de investimentos, a Beacon Hill operava com apenas 12 funcionários. Mas era o maior centro de lavagem de dinheiro da América Latina.
Sob o comando do doleiro panamenho Anibal Contreras, a Beacon Hill montara no escritório de Manhattan uma espécie de consórcio de doleiros
de toda a América Latina e até do Oriente Médio, especializado na
abertura de offshores em paraísos fiscais e das chamadas contas ônibus ou de passagem — abertas com o único objetivo de levar e trazer dinheiro sem procedência justificada no exterior.
É preciso dizer que o nome Beacon Hill originalmente nada tem
a ver com a crônica do crime financeiro. É uma cidadezinha histórica nas vizinhanças de Boston, no estado norte-americano de Massachussetts, há séculos identificada com um estilo raro e sofisticado de viver que seduziu celebridades como a atriz Uma Thurman, o senador Ted Kennedy e a poeta Sylvia Plath.
Beacon Hill torna-se sinônimo de movimentação financeira de dinheiro
mal havido por conta da Beacon Hill Service Corporation (BHSC),
o escritório dedicado a deletar o passado espúrio do dinheiro ali
depositado.
Movimentava uma conta de passagem com mesmo nome no extinto Chase Manhattan Bank (atual JP Morgan), que se encarregava de administrar inúmeras subcontas cujos titulares não apareciam, ocultos em nomes falsos ou offshores abertas em paraísos fiscais ou empresas de fachada.
Apesar da pressa e do empenho dos empregados da Beacon Hill, a destruição de pistas não surtiu o efeito desejado.
No Brasil, um arsenal de documentos, já enviados pela Promotoria Distrital de Nova York, deu o respaldo necessário para que uma força-tarefa
composta pela Polícia, Receita e Ministério Público, todos federais,
desencadeasse em agosto de 2004 a operação Farol da Colina.
A empreitada resultou na prisão de 63 doleiros em oito estados do
país.
A operação, que envolveu 800 policiais, é uma alusão ao nome da lavanderia nova-iorquina. Os doleiros e os correntistas que atuavam na Beacon Hill também foram denunciados pela promotoria distrital de Nova York e condenados pela Justiça americana por lavagem de dinheiro e evasão de divisas.
Sete anos passados da operação, o relatório inédito da CPMI do
Banestado, entregue à 23ª. Vara Cível da Justiça de São Paulo, no
processo de danos morais movido por Ricardo Sérgio de Oliveira
contra o autor e a revista IstoÉ, traz consigo algumas revelações.
Entre elas, a evidência de que o empresário Gregório Marin Preciado,
ex-sócio e primo de José Serra, era cliente do escritório da Beacon Hill.
Mais do que isso: ali, Preciado efetuou pagamentos ao ex-tesoureiro de Serra e de FHC.
O relatório da CPMI descortina uma situação interessante: no
período de 1998 a 2002, o primo de Serra depositou US$ 2,5 milhões por meio da Beacon Hill na conta da empresa Franton Interprise, aquela mesma operada por Ricardo Sérgio, em Nova York.
É o que consta dos extratos oficiais da Beacon Hill, obtidos pela CPMI.
A papelada evidencia ainda que o ex-caixa de campanha do PSDB valeu-se mais de uma vez da offshore uruguaia Rigler, operada pelos doleiros Gabriel Levy e Clark Setton — ligados ao também doleiro Dario Messer — para receber a grana no exterior.
Descobriu-se também que, além da Beacon Hill, Preciado usou a lavanderia do MTB Bank para enviar dinheiro para Ricardo Sérgio no exterior.
Por meio da subconta Kundo, operada por Messer, no período de março de 1998 a maio de 2005, o ex-diretor da área internacional do Banco do Brasil no período FHC recebeu cinco repasses que totalizaram US$ 345.955,00.
Casado com a prima de Serra, Vicência Talán Marín, Preciado foi também sócio do ex-candidato tucano à Presidência da República em um terreno na capital paulista.
Curiosamente, a Franton, acima citada, é a mesma empresa que recebeu os US$ 410 mil da Infinity Trading, do empresário Carlos Jereissati, do grupo La Fonte e principal nome do consórcio Telemar, que arrematou a Tele Norte Leste durante o período das privatizações.
Vale lembrar que a Franton também foi beneficiada com depósitos da Consultatum Corp, offshore aberta por Ricardo Sérgio e seu sócio Ronaldo de Souza nas Ilhas Virgens Britânicas.
Impressiona também que Preciado tenha favorecido o ex-caixa de seu parente com soma tão vultosa. Ocorre que, enquanto Preciado fazia inchar o saldo das contas de Ricardo Sérgio, suas próprias empresas viviam em dificuldades, com vários títulos protestados na praça.
Além disso, o primo de Serra estava inscrito na relação de grandes devedores do Banco do Brasil.
Como se verá adiante, Ricardo Sérgio ajudaria Preciado a abater porção substancial de sua dívida com o BB e na compra de três estatais do setor elétrico.
Articulador das privatizações, Ricardo Sérgio direcionou recursos do
banco estatal e do seu fundo da previdência (Previ) para proporcionar o début do primo de Serra na farra da desestatização por meio do consórcio Guaraniana.
É uma façanha que mais à frente será detalhadamente retratada.
A documentação agora revelada radiografa uma estupenda
movimentação bancária nos Estados Unidos pelo primo supostamente arruinado do ex-governador paulista.
Os comprovantes da Beacon Hill especificam o fluxo da dinheirama. São sete lançamentos identificados. As quantias com que Preciado favorece a Franton oscilam de US$ 17 mil em 3 de outubro de 2001, até US$ 375 mil
no dia 10 de outubro de 2002.
Os lançamentos presentes na base de dados da Beacon Hill referem-se a três anos. E indicam que o primo de Serra lidou com polpudas somas em dois anos eleitorais — 1998 e 2002 — e outro pré-eleitoral — 2001.
Seu período mais prolífico foi 2002 quando o primo disputou a Presidência contra Luiz Inácio Lula da Silva. Foram cinco lançamentos superando o
montante de US$ 1,1 milhão.
Seu recorde, porém, ocorreu em 25 de setembro de 2001, quando
depositou em favor da Franton — por intermédio de uma subconta da offshore Rigler, aberta pela Beacon Hill no Chase Manhattan
Bank — o montante de US$ 404 mil.
Aberta no Uruguai, a Rigler era controlada por uma rede de doleiros comandada por Dario Messer, figurinha fácil desse universo de transações subterrâneas.
Durante a operação Sexta-Feira 13, desencadeada pela PF, Messer
aparece como autor do ilusionismo financeiro que movimentou no
exterior cerca de US$ 20 milhões oriundos de fraudes praticadas
por três empresários em licitações do Ministério da Saúde.
Conforme os documentos, a exemplo do que ocorria no MTB,
Ricardo Sérgio recebia os recursos de Preciado por intermédio
das operações a cabo.
O empresário espanhol depositava a grana na subconta da Rigler, aberta pelos doleiros de Messer no JP Morgan Chase, que se encarregava de entregar toda a bolada no escritório da Franton.
Mais audacioso, Preciado inovou nessas operações de repasse de recurso. Em vez de entregar toda a bolada em espécie aos doleiros, o primo de Serra solicitava que uma casa de câmbio espanhola — a Caja de Ahorros Y Pensiones, de Barcelona — depositasse os valores por meio da rede telemática (a internet dos bancos) na conta da Rigler, em Nova York.
Em seguida, os doleiros transferiam idêntico montante para a conta da Franton no Citibank, em Nova York.
Além da “Caja de Ahorros”, Preciado lançou mão de uma conta
no banco suíço UBS, de Zurique — casualmente o mesmo usado
na lavagem do dinheiro da Máfia dos Fiscais do Rio de Janeiro —
para enviar os recursos ao exterior.
Ao contrário das operações do MTB Bank, armazenadas em mídias eletrônicas, as transações da Beacon Hill estão detalhadas em farta documentação em papel, apreendida pela promotoria distrital nova-iorquina.
No jargão dos especialistas em rastrear dinheiro sujo, a Beacon
Hill movimentava uma conta de “segunda camada”, que era alimentada por contas abertas por doleiros, em nome de offshores, na agência do Banestado, em Nova York.
As investigações apontam que a megalavanderia do banco estatal paranaense transferiu a bolada de US$ 24 bilhões para a conta Beacon Hill.
Ao pousar nas contas do escritório, a grana era distribuída pelas subcontas. Por meio das operações a cabo, as subcontas se encarregavam de trazer
para o país ou remeter aos paraísos fiscais toda a bolada que anteriormente havia seguido para o Banestado de Nova York.
Mas por que o dinheiro devia fazer uma escala nos Estados Unidos antes de seguir caminho para os paraísos fiscais? Simplesmente porque, segundo a legislação internacional que rege as casas de custódias, toda operação financeira em dólar entre dois países distintos deve transitar pelos EUA (país da moeda-padrão) antes de seguir viagem.
Isso explica porque mesmo as offshores abertas no Uruguai ou no Caribe centralizam suas operações financeiras em bancos norte-americanos.
Essa é também a razão fundamental para os doleiros terem criado as lavanderias do Banestado, do MTB Bank e da Beacon Hill.
Esmiuçados pelas autoridades policiais e fazendárias brasileiras,
os papéis repassados ao Brasil pela promotoria distrital de Nova
York apontam que Ricardo Sérgio e Preciado não foram os únicos
privatas do Caribe a recorrer à Beacon Hill para remeter e movimentar recursos no exterior.
As investigações detectaram que as contas da Beacon Hill eram
utilizadas por praticamente todos os correntistas do Opportunity
Fund e por sócios e laranjas de outras empresas do grupo de Daniel
Dantas para carrear recursos ao exterior.
Mostram que os correntistas do Opportunity enviavam os valores inicialmente para as contas de doleiros do Banestado por meio das contas CC-5 (domiciliados estrangeiros) de laranjas na fronteira do Brasil com o Paraguai. Do Banestado, toda grana circulava pela Beacon Hill até seguir ao destino final: a conta do Opportunity Fund no Midland Bank, nas Ilhas Cayman, ou outros fundos, estes nos Estados Unidos.
Apenas em um ano — 1997 — US$ 1,7 milhão do fundo do banqueiro Daniel Dantas trafegou por esse duto de dinheiro sujo.
Na família, a irmã e sócia do banqueiro, Verônica Dantas, não demorou a ganhar destaque de cliente especial no escritório de lavagem de dinheiro.
Ex-sócia da filha de José Serra, Verônica, em uma empresa em Miami — como também será detalhado mais adiante — Verônica Dantas, além do Opportunity Fund teria movimentado recursos de outras 150 empresas do grupo Opportunity por meio da mesma lavanderia.
Os papéis recolhidos pela Polícia Federal durante a Operação
Satiagraha comprovam que o banqueiro Daniel Dantas usou também a Beacon Hill para internar dinheiro em operações na Bolsa
de Valores de São Paulo (Ibovespa) nos mesmos moldes de Ricardo
Sérgio.
Ou seja, em operações casadas em que as empresas dos agentes aparecem nos dois lados do negócio: como compradores e como vendedores.
De acordo com a papelada, a dinheirama do fundo de Daniel
Dantas era transportada inicialmente das contas das Ilhas Cayman
para outras de vários fundos administrados pelo banco suíço UBS
no estado de Delaware — principal paraíso fiscal no território continental dos Estados Unidos.
Aproveitando-se do interesse da administração FHC em atrair capital externo, o dinheiro era resgatado a título de investimento por um fundo ligado ao Opportunity.
Numa operação concebida nos mesmos moldes da Calfat (a empresa falimentar de Ricardo Sérgio, que trouxe também US$ 3 milhões do Caribe), esse fundo passava a comprar debêntures (títulos mobiliários destinados à atração de recursos do exterior) da Santos Brasil, empresa que pertence ao próprio grupo Opportunity.
Vale lembrar que a Santos Brasil funciona dentro de um complexo de
contêineres no porto de Santos.
Foi arrematada por Dantas em 2002, durante o governo FHC. A operação mostra, que a exemplo do ex-tesoureiro de campanha do PSDB, o banqueiro se tornou um craque em internar dinheiro de origem suspeita e escondido no estrangeiro.
Traduzindo o economês, pode-se dizer que, seja na simulação de compra de quotas de empresas brasileiras por offshores do Caribe ou em operações casadas na Bolsa de Valores de São Paulo, o banqueiro e o caixa de campanha do PSDB produziram a mágica de, na mesma operação financeira, bater o escanteio e, ao mesmo tempo, cabecear na área.
Os privatas do Caribe podem ser os desbravadores da Beacon
Hill, mas não foram os únicos políticos e empresários a usar a
megalavanderia para esconder haveres mal havidos.
Expostas, as vísceras da Beacon Hill atestam que o megainvestidor Nagi Nahas, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, o ex-governador Paulo Maluf e até mesmo o publicitário Marcos Valério, o operador do Mensalão, eram clientes de carteirinha do escritório de lavagem de dinheiro.
No período de 1999 a 2000, as empresas do publicitário então dono das agências DNA e SMP&B, de Belo Horizonte, fizeram transitar US$ 1.191.425,00 via Beacon Hill por meio de uma subconta London, operada no JP Morgan Bank pelo doleiro Haroldo Bicalho.
A movimentação das agências, encarregadas de distribuir a mesada à base de apoio ao governo, foi abafada na CPMI do Banestado. Mas, ao vir à tona durante a CPI dos Correios, foi fundamental para que o Ministério Público Federal denunciasse o operador do Mensalão por evasão de divisas, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro.
A saga de Marcos Valério, Preciado, Ricardo Sérgio e Dantas na
Beacon Hill talvez permanecesse oculta para sempre não fosse a
paixão confessa de Robert Morris Morgenthau — um herói da II
Guerra Mundial — pelo Brasil.
Quando assumiu, em 1975, o cargo vitalício de chefe da promotoria distrital de Nova York, antes de se tornar o principal caçador de dinheiro sujo no Caribe, ele já havia travado diversas batalhas por outros mares.
Depois de passar uma longa temporada à caça de submarinos alemães, o comandante Morgenthau acabou afundando em 1943 com o destróier USS
Lansdale, torpedeado pelo inimigo, o que o obrigou a ficar quatro
horas dentro d’água. “Era um banho que não estava programado”,
contou ao jornalista Osmar de Freitas Jr.
A admiração pelo Brasil foi construída no período de janeiro de
1942 a junho de 1943 quando Morghentau, a bordo do USS Winslow,
recebeu a missão de patrulhar o litoral brasileiro.
Baseado no Recife, onde não demorou a se apaixonar pela cultura local, Morgenthau aprendeu a ler e falar português.
Os laços de familiaridade com o país e a amizade com o jornalista brasileiro Osmar de Freitas Jr. — as mulheres de ambos também são amigas — levaram Morgenthau a embarcar em uma nova batalha: investigar e destruir a megalavanderia que os doleiros haviam criado no Banestado, no MTB Bank e na Beacon Hill.
Depois de várias tentativas fracassadas de obter documentos por meio do
MLAT29 (a sigla significa Mutual Legal Assistance Treaty. É um acordo firmado entre duas nações no intuito de intercambiar informações para aprimorar o cumprimento das leis penais, um tratado de cooperação assinado entre o Brasil e os Estados Unidos), os peritos Renato Barbosa e Eurico Montenegro e o delegado da PF José Castilho, só tiveram acesso às principais contas de doleiros nos EUA ao serem apresentados ao promotor
pelo jornalista brasileiro.
De início, os policiais duvidaram que o jornalista pudesse ajudá-los na empreitada. Mas não demoraram a perceber que estavam errados.
Morgenthau se prontificou a colaborar com os policiais federais nas investigações. Confesso que eu, que também não estava confiando muito no pedido de ajuda, fiquei impressionado com a velocidade com que o promotor conseguia quebrar o sigilo das contas.
Os policiais federais pediam, por exemplo, a conta Campari na Beacon Hill e três dias depois Morgenthau e seu assistente Jonathan Wasburne apareciam com os dados e a movimentação.
Por sorte dos policiais federais, os promotores nova-iorquinos já estavam no encalço do MTB Bank, fechado por lavagem de dinheiro, e da Beacon Hill.
Haviam descoberto que os clientes da Beacon Hill usavam cartões de crédito abertos em paraísos fiscais para ingressarem com o dinheiro ilegal no país.
O alerta dos policiais federais levou a promotoria a intensificar as investigações contra o escritório.
Cinco meses depois de terem sido apresentados a Morgenthau,
os policiais federais testemunharam o chefe da promotoria anunciar em entrevista coletiva o indiciamento de todos os principais
operadores da Beacon Hill.
Pelos cálculos de Morgenthau, somente em 2001, a Beacon Hill movimentou remessas no valor de US$ 3,2 bilhões. E este valor refere-se a apenas 40 contas que tiveram sigilo quebrado.
O promotor não escondia que o ex-governador paulista Paulo Maluf havia se tornado um dos principais alvos da investigação nos EUA.
Morgenthau abriu imediatamente as portas da promotoria de Nova York ao promotor de São Paulo, Silvio Marques, e ao delegado da PF, Protógenes Queiroz, que comandaria, mais tarde, a operação Satiagraha.
Que, aliás, resultou na prisão de Dantas, logo liberado, por meio de dois habeas corpus desfechados em sequência e com rapidez impressionante, pelo então presidente do Superior Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes.
O promotor e o delegado investigavam Maluf por corrupção e
evasão de divisas. Com a ajuda, eles constataram que Maluf usara a
lavanderia do Banestado, do MTB Bank e da Beacon Hill e direcionara US$ 450 milhões para paraísos fiscais.
Seriam valores desviados dos cofres da prefeitura de São Paulo que tomariam o rumo da Suíça, Jersey (Reino Unido) e outros édens financeiros na Europa.
E mais: foi possível rastrear com precisão, centavo por centavo, US$ 11,6 milhões.
Seria a propina embolsada por Maluf e paga pelo consórcio de
empreiteiras que realizou, nos anos 1990, as obras da Avenida Águas
Espraiadas (a atual Avenida Jornalista Roberto Marinho), na Zona
Sul de São Paulo, durante a gestão malufista na prefeitura.
Todo o dinheiro seguiu inicialmente para as contas CC-5 (domiciliados estrangeiros) de laranjas no Paraguai. Após baldeação na conta de doleiros na agência do Banestado em Nova York, rumou para a conta da ofsshore uruguaia Lespan, no MTB Bank.
De lá, encaminhou-se à conta London, administrada pelo doleiro
Vivaldo Alves, o Birigui, no banco Safra, encarregado de distribuir
a outras três contas que pagavam as contas de cartão de crédito da
família Maluf nos Estados Unidos.
A cooperação da promotoria de Nova York acabou sendo também decisiva para que as autoridades brasileiras flagrassem uma tentativa de internação de US$ 90 milhões dos cerca de US$ 300 milhões que Maluf conseguiu enviar por intermédio de doleiros do Banestado e do MTB Bank para duas contas na Suíça.
Os papéis mostram que, desde a Suíça, o dinheiro seguiu em 1977 para
o Deutsche Morgan Bank, de propriedade do Deustsch Bank, nas
Ilhas Jersey, paraíso fiscal inglês próximo à costa da França.
Nesse mesmo ano, essa renomada instituição financeira alemã, por
meio de três fundos de investimentos, ajuda a internar parte da
bolada ao comprar US$ 91 milhões de debêntures da Eucatex,
uma empresa falimentar da família Maluf no Brasil.
Ou seja, mais uma operação do mesmo formato daquelas operadas por Ricardo Sérgio e Daniel Dantas.
Os representantes do banco alemão no Brasil confirmaram a
operação na Justiça brasileira.
Só não conseguiram explicar qual o interesse que uma instituição bancária poderia ter em investir numa empresa falida.
Morgenthau acompanhou, em 2003 e 2004, o desfecho da CPMI
do Banestado por meio de jornais e revistas do Brasil.
Ao ler que a CPMI caminhava para acabar numa suculenta pizza, intrigou-se: “Eu gosto muito de pizza. O que pizza tem a ver com isso aí?”, reagiu.
Quando soube que a frase era uma expressão brasileira de cunho
satírico, designando um encerramento amigável sem prejuízo para
os suspeitos, Morgenthau disse que, pelo menos nos Estados Unidos, as averiguações não terminariam em pizza.
Em 2008, a promotoria distrital de Nova York processou Maluf na justiça americana por evasão de divisas e por suposta conspiração “com o objetivo de roubar dinheiro de São Paulo”…
Em 2010, Morgenthau pediu sua aposentadoria após 35 anos
no comando da promotoria de Nova York.
Mas, antes de limpar as gavetas, teve o cuidado de colocar o nome de Maluf e de seu filho, Flávio Maluf, na lista vermelha de procurados pela Interpol.
“Foi um ato irresponsável. Vou processar esse promotor”, avisou Maluf.
Os amigos do velho promotor riram da ameaça. Para eles, Morgenthau é, acima de tudo, um sobrevivente.
Durante a guerra, quando navegava no Mediterrâneo, Morgenthau viu o navio que estava ao lado do seu, o USS Paul Hamilton, explodir ao ser acertado pelo inimigo, o que resultou na morte dos 580 tripulantes.
Em 1945, durante a batalha de Iwojima, no Japão, o comandante levou outro susto quando seu navio foi atingido por um avião camicaze. Por sorte, a bomba do avião não explodiu e Morgenthau pilota sua vida hoje aos
90 anos.
Acham graça porque sabem que Maluf corre o risco de ser preso se tentar colocar seus pés nos Estados Unidos e em outros 180 países do mundo que têm acordo com a Interpol.
Já com Daniel Dantas e Ricardo Sérgio a história é um pouco diferente.
Comentários
Zé Maria
Talvez agora se entenda por que os Falcatruas da Direita (mas não só)
estão com tanto medo da decisão do STF sobre sigilo bancário.
“Quem Não Deve, Não Teme”. Há pouco tempo era isso, não é? …
Aliás, hoje em dia, depois dos Algoritmos Randômicos
da *G-MÁFIA*, não existe mais sigilo de coisa nenhuma,
muito menos segurança na manipulação de dados …
No final, tudo vai parar na NSA, dizia Edward Snowden.
Os U.S. querem que todos pensem que a China é o
único Regime Totalitário do Mundo, enquanto no
Ocidente mandam e desmandam, absolutos, na
Economia, na Política, na Tecnologia, nos Meios de
e na Informação …
Estão, inclusive, provocando até Genocídios no Mundo.
Uma Professora da New York University (NYU) – que ainda acredita numa forma
ideal de Democracia Capitalista – fez uma pesquisa sobre o uso de Inteligência
Artificial (I.A.)nas Grandes Corporações de Tecnologia dos Estados Unidos da
América (EUA), especialmente as sediadas no “Vale do Silício”, na Califórnia, concluindo que, devido às implacáveis demandas de curto prazo de um feroz
Mercado Capitalista, onde estão inseridas sem regulação e sem investimento
do Estado, está havendo um Descontrole dos Algoritmos que são criados para funcionarem nos Sistemas de Dados dessas Empresas, que estão se tornando
‘Autônomos’ até “para fazer escolhas sobre conteúdo editorial, levando as pessoas
a tomar decisões muito ruins”, e mesmo perigosas, para si e para outras, inclusive
crianças.
… “nos EUA, também sofremos com uma trágica falta de previsão.
Em vez de criar uma grande estratégia para a I.A. ou para nossos
futuros a longo prazo, o governo federal retirou o financiamento
da pesquisa científica e tecnológica.
Portanto, o dinheiro deve vir do Setor Privado.
Mas os investidores também esperam algum tipo de retorno [Lucro]”.
[É o que o Burro Xucro do MEC quer fazer – e está fazendo – com as Universidades Públicas Brasileiras].
“Isso é um problema. Você não pode agendar os avanços em
Pesquisa & Desenvolvimento [P&D] quando estiver trabalhando
em tecnologia e pesquisa fundamentais” …
[…]
“Em vez disso, agora temos inúmeros exemplos de más decisões
que alguém da *G-MAFIA* tomou”.
“Estamos começando a ver os efeitos negativos da tensão
entre fazer pesquisas que são do melhor interesse da
Humanidade e fazer os investidores felizes.”
… “partes do ecossistema da I.A. já estão impactando
nossos ideais democráticos ocidentais de uma maneira
verdadeiramente negativa.”
“Obviamente, tudo o que aconteceu com o Facebook serve como
exemplo.
Mas veja também o que está acontecendo com a comunidade
anti-vaxxer [anti-vacina].
Eles estão espalhando informações totalmente incorretas
sobre vacinas e ciência básica.
Nossas tradições americanas dirão ‘liberdade de expressão’,
‘plataformas são plataformas’, ‘precisamos deixar as pessoas
se expressarem’.
Bem, o desafio disso é que os algoritmos estão fazendo escolhas
sobre o conteúdo editorial, levando as pessoas a tomar decisões
muito ruins e, consequentemente, deixando as crianças doentes.”
“O problema é que nossa tecnologia se tornou cada vez mais sofisticada,
mas nosso pensamento sobre o que é liberdade de expressão
e como é uma economia de livre mercado não se tornou tão sofisticado.
Nós tendemos a recorrer a interpretações muito básicas:
‘a liberdade de expressão significa que toda a fala é livre,
a menos que seja contra a lei de difamação, e esse é o fim da história’.
Esse não é o fim da história.
Precisamos começar a ter uma conversa mais sofisticada e inteligente
sobre nossas leis atuais, nossa tecnologia emergente e como podemos
fazer com que essas duas se encontrem no meio.”
Segue a Entrevista da Professora-Pesquisadora ao MIT, no original, em inglês:
Amy Webb, futurist, NYU professor, and award-winning author,
has spent much of the last decade researching, discussing,
and meeting with people and organizations about Artificial Intelligence [A.I.].
“We’ve reached a fever pitch in all things A.I.,” she says.
Now it’s time to step back to see where it’s going.
This is the task of her book, “The Big Nine: How the Tech Titans and Their Thinking Machines Could Warp Humanity”, where she takes a bird’s-eye view of trends that, she warns, have put the development
of technology on a dangerous path.
In the US, Google, Microsoft, Amazon, Facebook, IBM, and Apple *(the “G-MAFIA”)*
are hamstrung by the relentless short-term demands of a capitalistic
market, making long-term, thoughtful planning for A.I. impossible. […]
“… you could argue that pieces of the A.I. ecosystem are already
impacting our Western democratic ideals in a truly negative way.
Obviously, everything that’s happened with Facebook serves as
an example.
But also look what’s going on with the “anti-vaxxer community”.
They’re spreading totally incorrect information about vaccines
and basic science.
Our American traditions will say freedom of speech, platforms
are platforms, we need to let people express themselves.
Well, the challenge with that is that algorithms are making choices
about editorial content that are leading people to make very
bad decisions and getting children sick as a result.”
“In the United States, the free flow of ideas can spread unencumbered.
This is the way Silicon Valley was founded. It has bred both competition
and innovation, which is how we got to where we are now with A.I.
among other kinds of technologies.”
“The problem is our technology has become more and more
sophisticated,
but our thinking on what is free speech and what does a free market
economy look like has not become as sophisticated.
We tend to resort to very basic interpretations: Free speech means
all speech is free unless it butts up against libel law, and that’s
the end of the story.
That’s not the end of the story.
We need to start having a more sophisticated and intelligent conversation
about our current laws, our emerging technology, and how
we can get those two to meet in the middle.”
“However, in the US, we also suffer from a tragic lack of foresight.
Rather than create a grand strategy for AI or for our long-term futures,
the federal government has stripped funding from science and tech research.
So the money must come from the private sector.
But investors also expect some kind of return.
That’s a problem. You can’t schedule your R&D breakthroughs when
you’re working on fundamental technology and research.
It would be terrific if the big tech companies had the luxury of working really hard
without having to produce an annual conference to show off their latest
and greatest whiz-bang thing.
Instead, we now have countless examples of bad decisions that somebody
in the G-MAFIA made, probably because they were working fast.
We’re starting to see the negative effects of the tension between doing research
that’s in the best interest of humanity and making investors happy.”
https://www.technologyreview.com/s/613010/why-ai-is-a-threat-to-democracyand-what-we-can-do-to-stop-it/
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