André Singer: Bolsonaro aquece os aviões para o bombardeio das cidadelas democráticas
Tempo de leitura: 2 minA hora mais escura
Ao alcançar o governo com respaldo popular, projeto autoritário parece prenunciar um golpe contra a liberdade
Domingo, 28 de outubro. Vou à janela e não enxergo tanques. Ligo a televisão e ouço o presidente eleito jurar que o seu “governo será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade”.
No dia seguinte, abro o jornal e leio que a Folha se declara “confiante na Constituição de 1988, na força da democracia brasileira e na construção de um país para todos”.
Por que, então, a vitória de Jair Bolsonaro, com 58 milhões de votos sobre 47 milhões de Fernando Haddad, me parece prenunciar um golpe contra a liberdade?
Porque um projeto autoritário alcançou o governo com respaldo popular. E, do ponto de vista da hegemonia, a maioria nas urnas dá mais poder aos antidemocratas do que os tanques de 1964.
Mas veja”, me dizem colegas, “aí estão as instituições democráticas, funcionando a pleno vapor para preservar o Estado de Direito”.
Por exemplo: ao entrevistar o novo presidente na segunda (29), William Bonner, editor-chefe do Jornal Nacional, defendeu a Folha, criticada pelo mandatário. Exercício pleno da liberdade de opinião.
Depois, na quarta (31), o Supremo Tribunal Federal (STF) referendou por unanimidade uma liminar provocada pela Procuradoria-Geral da República, segundo a qual, invadir universidades lesa “os direitos fundamentais de liberdade de manifestação do pensamento, de expressão da atividade intelectual, artística, científica, de comunicação e de reunião, previstos no artigo 5º da Constituição”.
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Ocorre que no jogo que se começará a jogar em 1º de janeiro de 2019, a força promete falar mais alto do que a retórica.
Durante a referida entrevista à Rede Globo, Bolsonaro anunciou uma guerra contra a Folha.
Não apenas a chamou de mentirosa, como deu a entender que, em sua gestão, o jornal teria cortada a “propaganda oficial”.
Quer, assim, sufocar economicamente a imprensa incômoda, que, aliás, ele proibiu de entrar na sua coletiva da quinta (1º/11).
Para completar, o capitão reformado entregou um superministério da Justiça para Sergio Moro, que teve a falta de juízo (passe o trocadilho) de aceitar.
Em um mesmo passo, derrubou a aparência técnica da Operação Lava Jato e deu ao magistrado de Curitiba o comando dos instrumentos policiais da União.
Com o gesto, Bolsonaro e Moro deixaram simultaneamente claro de que lado estava o Partido da Justiça e o que se deve esperar em matéria de perseguição político-judicial daqui a pouco.
Bolsonaro aquece os aviões para o bombardeio das cidadelas democráticas.
Depois da derrota de domingo, de onde virá a energia para erguer um dique e deter a onda autoritária?
Seremos agora capazes de construir a frente democrática que brilhou pela ausência durante a eleição?
*Professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.
Comentários
Ricardo
O povo sabia o que queria quando elegeu Lula. Agora o povo sabe o que quer ao eleger Bolsonaro.
Antidemocrático é questionar a capacidade de julgamento da população. Se por um lado Bolsonaro vai prejudicar a democracia, por outro o governo do PT a mataria por completo.
Marise
A lenda de Batman e Robin se concretiza no Brasil.
Aqui não tem essa de Quixote e Sancho. Medieval demais!
a.ali
já estão ensaiando num tom bem “profissional”
Bel
Eu ouvi bem o pres. eleito dizer numa entrevista: ¨Assim como muda o comportamento agressivo de um garoto, dando uma palmada nele, …¨
Faltou palmada?
Zé Maria
Não será sequer Porto Rico, mas uma Ilha Wake.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Ilha_Wake
https://pt.wikipedia.org/wiki/Territ%C3%B3rio_n%C3%A3o-incorporado_dos_Estados_Unidos_da_Am%C3%A9rica
Bel
E só se comunica pelas redes sociais. Fazem grupos e nem sabem que para os hackers parece ser mais fácil invadir informações de grupos. Vendem para não sei quem. Tudo se copia.
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