Patrick Mariano: Quantos milhões de eleitores vale um voto de um ministro do Supremo?

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Nelson Jr/SCO/STF e Ricardo Stuckert

Nelson Jr/SCO/STF e Ricardo Stuckert

Dilemas da democracia

por Patrick Mariano*, na revista Cult, sugestão de Aton Fon Filho 

Jânio de Freiras, no artigo   “A disputa que decide”, é certeiro quando afirma que nas eleições deste ano a disputa será entre Lula versus o combinado STF-STJ e que isto questiona a legitimidade do resultado do pleito como representação eleitoral democrática.

De um lado, pontua Jânio, 150 milhões de eleitores e, do outro, 11 ministros do STF e 33 do STJ.

A ascensão dessa burocracia estatal sobre o poder político vem de longa data, mas nos últimos anos ganhou forte impulso, notadamente com a aprovação da Lei da Ficha Limpa pelo próprio Congresso Nacional, que cedeu parcela relevante do poder do voto dos eleitores para os juízes, em evidente afronta ao texto constitucional.

A entrega do exercício do poder popular para uma burocracia estatal de clara verniz conservadora, como demonstram as pesquisas sobre a classe social dos juízes e sua vinculação ideológica, se deu gratuitamente, sem qualquer contrapartida por parte de quem o recebeu.

E não é só no poder de decidir as eleições de 2018 que reside o protagonismo do Judiciário, mas também na aceitação jurídica dos vários retrocessos constitucionais praticados pelo atual governo.

Ou seja, o protagonismo político desses ministros em decidir o pleito eleitoral é acompanhando da nebulização do real projeto político defendido, cada vez mais evidente e materializado na cumplicidade com o projeto neoliberal.

Esse fenômeno é bem estudado por juristas do porte de Martonio Mont’Alverne Barreto Lima e Marcelo Semer.

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O primeiro, inclusive, faz uma relação entre o papel da ascensão política da burocracia judiciária no período da República de Weimar para a consolidação do nazismo e o atual momento brasileiro.

Na República Velha, havia dispositivo semelhante ao da ficha limpa com a chamada “política dos governadores”.

Campos Sales (1898-1902) instituiu em acordo entre os governadores e a União um sistema de troca de apoio mútuo. Pelo acerto, os governadores não faziam oposição ao governo federal e o presidente da República não interferia na vida política dos Estados.

Um dos mecanismos de manutenção dessa política foi a Comissão de Verificação de Poderes, chefiada por um político de confiança do presidente com a atribuição de verificar a legitimidade da eleição de deputados e senadores, barrando aqueles que contrariavam seus interesses com a “degola”.

Por isso, o acerto da análise de Jânio, ao retratar o dilema mais atual da democracia no Brasil a 90 dias do pleito: o eleitor estará diante de candidatos “oficiais” na cédula, mas a disputa real é entre o líder das pesquisas e parte da burocracia jurídica estatal.

Quantos milhões de eleitores vale um voto de um ministro do Supremo?

Eu acrescentaria, no entanto, mais alguns pontos, apenas para se somar nesse questionamento do grau democrático político brasileiro.

Protagonismo da burocracia

Em 20 de março de 2015, o Ministério Público Federal apresentou ao país o seu projeto de poder, embrulhado em um pacote denominado “10 medidas contra a corrupção”.

Poucos dias antes, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, se deixou fotografar ao sair da sede da PGR com um cartaz escrito “Janot, vc é a esperança do Brasil”. Era o auge político da instituição.

A proposta, entre outras coisas, acabava com a garantia do habeas corpus no Brasil de uma forma até mais generalizada que o Ato Institucional nº 5 de autoria do general Costa e Silva e legalizava a prova ilícita (tortura, por exemplo) colhida de “boa fé”.

Para quem quiser saber mais sobre o pacote, vale assistir à participação de Marcelo Semer na audiência pública ocorrida na Comissão Especial da Câmara que debateu o projeto.

O protagonismo político assumido por essa parcela da burocracia estatal foi resultado à época, também, de uma massiva campanha de marketing e coleta de assinaturas financiada com dinheiro público.

Basta consultar rapidamente a página hospedada pelo MPF sobre as “10 Medidas” e se encontrará desde flâmulas, material para produção de outdoors, adesivos, camisetas e material de audiovisual estrelado por integrantes da Operação Lava Jato e artistas.

A campanha deve ter custado aos cofres públicos bem mais que uma candidatura a governo de Estado de médio porte.

Rodrigo Janot, após uma negociação de delação até agora pouco transparente com o grupo empresarial JBS, caiu em profundo ostracismo, tendo seus ajudantes mais próximos envolvidos em uma rede de denúncias e acusações, alguns até respondendo a processo criminal.

No entanto, sua sucessora, Raquel Dodge, tem dado amostras de que manterá a instituição no mesmo rumo anterior, ao criminalizar magistrado que, por livre convencimento, proferiu decisão que determinava a soltura de um réu.

Neste episódio, a Associação Juízes pela Democracia soltou nota em defesa da independência judicial, pilar do Estado Democrático de Direito.

No entanto, a principal associação de juízes federais, AJUFE, disse que não se manifestaria porque o desembargador não era seu associado.

Esse silêncio da magistratura nacional é preocupante, pois representa a aceitação da criminalização do ato decisório e da independência dos juízes, base da democracia.

Na prática, a manifestação de Raquel Dodge é um perigosíssimo precedente que quebra a lógica do sistema de justiça e permite que representantes do Ministério Público que discordem de determinada decisão judicial, ao invés dos recursos legais, passe a pedir abertura de inquérito criminal contra quem a proferiu.

A proposta de poder do MPF é, portanto, a consolidação de um sistema de matriz inquisitória e autoritária.

Se na proposta de poder do Judiciário é preciso adentrar a análise das últimas decisões e do silêncio quanto ao desmonte constitucional realizado no país, o pacote das dez medidas, ao menos, serve como publicidade da plataforma de governo desses atores.

Voto sem valor

De fato, o sequestro da política por setores que não passam pelo crivo do voto se revela cada vez mais consolidado.

O valor do voto, base central da democracia é cada vez mais mitigado. Seja por golpes parlamentares, seja pelo crescimento do protagonismo político dessa burocracia estatal sem qualquer legitimidade popular.

O processo do golpe ocorrido em 2016 e o desmonte social imposto ao país, serviu mais ao capital financeiro do que aos partidos que o conduziram.

Basta ver a petrificação do eleitorado do candidato do PSDB nas pesquisas. FHC, do alto do seu apartamento em Higienópolis, ao colocar sua tropa ao lado de Eduardo Cunha e outros atores nesse ataque frontal à democracia, que foi o impedimento da presidenta Dilma Rousseff, praticamente implodiu o que havia de social e democrata na sigla do partido, cedendo espaço e protagonismo político à extrema direita, representada por Jair Bolsonaro.

A democracia, no capitalismo, cada vez mais se torna um jogo decidido antes da entrada dos times em campo, em gabinetes distantes das cabines de votação.

O projeto de poder dessa burocracia estatal representada pelo Ministério Público e Judiciário é a porta de entrada para um sistema de justiça estruturado sobre o arbítrio e o abuso de poder em que a política é cada vez mais relegada às páginas policiais, esvaindo-se como areia das mãos de cada eleitor e eleitora.

*Patrick Mariano é advogado criminalista, mestre em direito pela UnB e integrante da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares – RENAP

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Comentários

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Nelson

Já escrevi, aqui neste sítio, questionando se nós andamos em nosso juízo perfeito ao darmos o direito a apenas 11 pessoas decidirem o futuro de outras 200 milhões. E, na verdade, não são 11, pois a decisão pode se efetivar por maioria simples, com apenas 6 votos.

E será que é tão difícil assim de corromper ou mesmo ameaçar a essas 6 pessoas ou o time completo, de 11 pessoas.

lulipe

O choro é livre, lula não. É melhor JAIR se acostumando.

Sebastião Farias

Caro Patrick, a resposta para sua pergunta é simples: cada cidadão-ministro, como qualquer cidadão-excluído, pobre, miserável, marginalizado, coxinha, mortadela, milionário, empresário, religioso, mulher, branco, negro, índio, nordestino, etc, cada um, tem apenas um voto, porque: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, etc”, conforme dispõe o caput do Artigo 5º da CF, reforçado pelo §Único do Artigo 1º da CF, que assim se expressa: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos diretamente ou nomeados, nos termos desta Constituição”.
Concluindo, o poder natural do Ministro como cidadão, é UM VOTO. Agora, o seu poder e autoridade quando investido na função jurídica, não é mérito seu mas, da confiança, do respeito e da consideração outorgados a ele como árbitro de conflito de direitos e, para ser guardião da Constituição, das Leis, dos direitos dos cidadãos, da justiça imparcial, da paz social, etc.
Deve ser lembrado, no entanto, que quando um juiz desrespeita a Constituição, desrespeita a ética e as boas praticas jurídicas, desrespeita as leis e sua condição de árbitro imparcial, desrespeita os direitos dos cidadãos, desrespeita a justiça imparcial e igual para todos, não promove a paz social, etc, esse cidadão, não merece mais, a dignidade da função de juiz de direito.

Eduardo

O Judiciário Nacional hoje liderado pela Dra Carmem Lúcia, parece convencido de que os fins justificam os meios! Só o STF sabe quais são os fins que justificam meios tão vergonhosos! Juízes frágeis, inferiores e covardes, até indignos não dão ao povo o direito se julgar e decidir democraticamente! O sufrágio não se dá mais pelo voto do cidadão e sim pelo julgamento do que seria um submundo do judiciário que ouso pensar seja hoje a grande infelicidade da nação brasileira! Uma nação cuja carta maior é relevada pelo seu poder democratico protetor certamente está no rumo e próxima da da barbarie cujo combate se dá pela força! Nossa elite politica e institucional merece com louvores o título de “ Burra”! Pobres de nós Brasileiros de boa fé!

Flavio Duarte

A resposta a essa pergunta depende.
Antes disso precisamos saber: Quantos votos Lula ou Dilma tiveram e depois usaram para indicar cada um daqueles Ministros do STF ?

Glaucia

Votar no Alckmin e perder tempo, ou melhor, perder o emprego.
A mídia é usada como propaganda de guerra do mesmo jeito que foi usada no nazismo.
O PSDB quer diminuir o Estado mesmo que com isso milhares de pessoas fiquem sem comer e morem embaixo da ponte.
Muitas pessoas sobre-vivem graças ao salário de aposentados e pensionistas. O PSDB/MDB está implantando um futuro caos social com uma reforma previdenciária que como a reforma trabalhista não foi discutida com toda a sociedade. Deu certo a reforma trabalhista ? Gerou o 1 milhão de empregos prometidos ? Não !
É isso que dá qdo as coisas são ditadas de cima para baixo. Os banqueiros do governo Temer ” escolhem o que é melhor para o povo “.
Um monte de banqueiro no governo atuando em causa própria.
No futuro com uma reforma da previdência tao dura, quase ninguém vai conseguir preencher os tais requisitos para se aposentar e aí teremos milhões de pessoas abandonadas nas ruas, pois não terão onde morar e nem o que comer. Os aposentados de hj não existirão para salvar a patria. É essa a proposta do Estado Mínimo do PSDB.
Mas os banqueiros faturarao muito com seu título de capitalização previdenciário. Um dinheiro que se investe e não consegue o prêmio da aposentadoria a maioria das pessoas, pois ou morrerão antes do prêmio ou não conseguirão fazer o ” mínimo ” para ter direito ao prêmio. 50 anos de trabalho ininterrupto e difícil até para político.
Enquanto isso, os políticos se aposentarao sem problemas, pq é lógico que o pessoal de sangue azul não vai se submeter as mesmas regras de nós pobres mortais. Assim é fácil.
Já pensou trabalhar 49 anos descarregando um caminhão e ganhando salário de trabalhador intermitente, eventual, quebra-galho.
E esses picaretas trabalharão 49 anos ? Pimenta no zóio dos outros é refresco. São uns caras de pau.

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