Fátima Oliveira: Regulamentação do “bebê de proveta” no Brasil

Tempo de leitura: 2 min

por Fátima Oliveira, em OTEMPO

Diante dos descalabros divulgados sobre a fabricação de “bebês de proveta” no Brasil, setores ditos leigos que lidam com a temática aventam a imperiosa e urgente necessidade de uma norma técnica para definir limites para o setor público e privado.

Foi o que solicitei ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, na entrevista coletiva com blogueiros, no último 21, em São Paulo, sobre a qual falarei outro dia; ele se comprometeu a estudar melhor o caso, mas, se for uma norma técnica o instrumento que melhor responderá à situação, ele a emitirá.

Então vai emitir, pois, se não há uma lei e a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) é de caráter ético, é preciso algo que regule o setor das Novas Tecnologias Reprodutivas Conceptivas (NTRc). A única regulamentação é a Resolução CFM 1.358/1992, revogada 18 anos depois pela Resolução CFM 1957/2010, sobre a qual escrevi ” O bebê de proveta envolto ainda pelas neblinas de Siruiz”, no qual finalizo dizendo: “Parafraseando Guimarães Rosa – ‘Eu quase nada sei, mas desconfio de muita coisa’-, repito: ‘A Reprodução Humana Assistida (RHA) é um campo minado de procedimentos experimentais e inseguros que, no Brasil, ainda é terra de ninguém. É abusivo que o Ministério da Saúde não tenha elaborado uma norma técnica sobre RHA até hoje’. É, ‘quem cala consente’!” O TEMPO, 11.1.2011).

Em 2005, o Ministério da Saúde, “considerando que a assistência em planejamento familiar deve incluir a oferta de todos os métodos e técnicas para a concepção e a anticoncepção, cientificamente aceitos, de acordo com a Lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996, que regula o § 7º do artigo 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar”, emitiu a Portaria nº 426/GM (22.3.2005), que “institui, no âmbito do SUS, a Política Nacional de Atenção Integral em Reprodução Humana Assistida e dá outras providências”; e a Portaria nº 388 (6.7.2005), que determina a criação das redes estaduais, municipais e do Distrito Federal de Atenção em Reprodução Humana Assistida. A Anvisa criou, em 12.5.2008, o Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio) para conhecer a produção de embriões humanos por fertilização in vitro que não foram transferidos.

As duas portarias citadas só abordam os serviços da rede SUS. As clínicas privadas navegam num mar onde não existe oficialmente a terminologia “prestação de contas”. Com o intuito de regulamentar as NTRc, foram apresentados vários projetos de lei, na Câmara e no Senado, focados na Resolução CFM 1.358/92, acrescidos do “olhar do autor”. O mais debatido deles, o Projeto de Lei nº 90/99, do senador Lúcio Alcântara, junto ao seu substitutivo, o Projeto de Lei nº 1.184/03, do senador Roberto Requião, em tramitação, hoje está em desacordo com a Resolução CFM, sobretudo no que se refere a quem pode ou não acessar as NTRc.

É imoral calar diante de procedimentos médicos experimentais e inseguros e dos crimes cometidos em nome da ciência. O instrumento mais adequado no momento para cercear e reduzir danos nas NTRc é a norma técnica, cuja definição internacionalmente aceita é “um documento estabelecido por consenso e aprovado por um organismo reconhecido que fornece, para uso comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para atividades ou para seus resultados, visando à obtenção de um grau ótimo de ordenação em um dado contexto”.

Com a palavra, a autoridade sanitária nacional!

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Comentários

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ana reis

alô, alô: alguém aí se importa com a saúde das mulheres l? quantas tiveram a síndrome da hiperestimulação hormonal que pode levar `a morte? alguém sabe quais as verdadeiras taxas de sucesso das FIVs? quem faz acompanhamento a longo prazo dessas mulheres? quem tem idéia de quantos óvulos são necessários para fazer uma linhagem de tecidos de reparação? quantos óvulos foram necessários para fazer a BR -1 da dra Lygia Pereira?

Francisco Ferreira

Cara Fátima, sou fã de sua militância nessa área de genética. Aprendo muito sempre que a leio. Quanto ao caso do bebê de proveta estou concordando com você. É preciso um instrumento que regulamente os setor. Também entendo que deve ser uma norma técnica. Que o ministro Padilha não nos decepcione

Dani

MILTON NAKAMURA FEZ O PRIMEIRO BEBÊ DE PROVETA DO BRASIL!

No dia 7 de outubro de 1984, nascia no Brasil Anna Paula Caldeira. Sua mãe, Ilza Maria, tinha quatro filhos e não podia mais engravidar. Ao casar pela segunda vez, ela e o marido, o médico João Antônio, decidiram ter outro filho e procuraram o ginecologista Milton Nakamura, pioneiro da fertilização in vitro no Brasil, que durante anos viajou seguidamente para a Inglaterra, em busca de detalhes da técnica revolucionária de reprodução externa assistida. Falam que "A primeira vez que ele foi, Nakamura chegou no laboratório dos ingleses Edwards e Steptoe com uma máquina fotográfica em mãos. É claro que foi expulso do local pelos pioneiros do procedimento’’ (médico e também especialista em reprodução humana, Condesmar Marcondes).
Ele era dono do Centro de Planejamento Familiar Dr. Milton Nakamura. Faleceu São Paulo, em 1997, ao desabar de uma sacada. Nunca se soube exatamente como o acidente aconteceu.

Fátima Oliveira

Beattrice, sobre a sua solicitação de comentários sobre dois pontos:
1.Sobre as manipulações genéticas nas NTRc – as possibilidades de manipulações genéticas num laboratório de Fertilização In Vitro existem e são até onde o céu é o limite.
2.Sobre uso de material genético humano em animais, conforme se aventa que era feito na Clínica Abdelmassih é a primeira vez que ouço falar! Portanto disse em meu artigo anterior que, mesmo eu que estudo a área de NTRc há, pelo menos vinte anos, sequer imaginava: “A matéria extrapola o que a imaginação é capaz de supor. Fiquei atônita, enojada, nauseada e… vomitei”. (O Conselho Nacional dos Direitos da Mulher vai calar? Em 17.05.2011)
Não sou a rigor contra as NTRc e nem faço juízo de valor sobre quem opta por elas. Apenas tenho a preocupação com a biosseguranças dessas técnicas, tanto para as mulheres, como para as crianças. No mais, reitero tudo o que já escrevi num número grande de artigos publicados e em livros.

    beattrice

    Uma dúvida paira no ar, entre leigos e especialistas, à medida que estas denúncias sobre o caso particular ABDELMASSIh vem à tona, os pacientes dessa clínica não deveriam ser motivados para fazerem um estudo genético?

beattrice

Fátima,
gostaria de ter seus comentários a respeito de dois aspectos referentes à questão do bebê de proveta no Brasil.
Em primeiro lugar,
a partir das declarações veiculadas pela mídia, a clínica Abdelmassih teria, além de outras transgressões, produzido voluntariamente quimeras genéticas, o que pode redundar em graves consequências pessoais, familiares e sociais. Isso está sendo debatido em algum fórum e ocorre tb em outras clínicas comerciais voltadas para este fim?
Em segundo lugar,
segundo estas mesmas declarações, haveria uma espécie de "vaso comunicante" entre material genético humano e material genético de uso veterinário, em especial de cavalos, e aparentemente não é rara essa interessecção de técnicos e material entre as duas áres, humana e veterinária, com ênfase na criação de equinos.Como isso é regulamentado, se é que é.
Obrigada.

Depaula

Conti… II
É um caso da alçada do Código de Defesa do Consumidor, pois as instâncias reguladoras da atenção à saúde fazem “vistas grossas” – realidade demonstrada pelo Ministério da Saúde por não ter tido a coragem de emitir uma Norma Técnica para a área."

OLIVEIRA, Fátima, in "As novas tecnologias reprodutivas conceptivas a serviço da materialização de desejos sexistas, racistas e eugênicos? (2001) http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revis

Depaula

Cont… I
"A afirmação de Nakamura ainda é voz corrente entre profissionais da área: muitas clínicas são apenas “de fachada” e algumas até fraudam as NTRc, pois vendem implantação de embriões e não o fazem, já que são apenas postos de “captura” (coleta) e/ou tão-somente de receptação de óvulos. Em 1999, a estimativa era que apenas 26 das 86 clínicas que atendiam esterilidade/infertilidade no Brasil integravam o Registro Latino-americano de Reprodução Assistida (uma espécie de controle de qualidade dos serviços). Ora, a onipotência de alguns esterileutas é tão grande que sequer se submetem ao “controle de qualidade” entre seus pares! O fato de um profissional ou serviço se recusar a integrar o Registro Latino-americano de Reprodução
Assistida é indicativo de que não é confiável.

OLIVEIRA, Fátima, in "As novas tecnologias reprodutivas conceptivas a serviço da materialização de desejos sexistas, racistas e eugênicos? (2001) http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revis

Depaula

"Milton Nakamura, o responsável pelo “Show da Morte” de Zenaide Maria Bernardo, o primeiro óbito público no mundo decorrente das NTRc (Hospital Santa Catarina, na cidade de São Paulo, 1982), afirmou durante um treinamento de fertilização in vitro ministrado pela equipe da Universidade de Monash, da Austrália: “Hoje há uma inundação de equipes que oferecem esses tratamentos. Algumas delas sem condições técnicas em equipamentos e mesmo em conhecimento médico”.
OLIVEIRA, Fátima, in "As novas tecnologias reprodutivas conceptivas a serviço da materialização de desejos sexistas, racistas e eugênicos? (2001) http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revis

Depaula

Espero que o ministro Alexandre Padilha crie essa Norma Técnica urgentemente. Fátima Oliveira tem razão.
Essa gente das clínicas de bebeê d eproveta é poderosa, não apenas porque ganham muito dinheiro, mas porque são bancados pelas multinacionais da indústria farmacêutica. Então se acham. Pelo que sei ainda não teve um ministro cabra-macho que ousasse fazer uma Norma Técnica, porque lei podemos esperar sentados que não haverá nos próximos CEM anos. Os laboratórios não vão deixar. Bancam qualquer cmapanha de senador, de deputado para continuarmos sem lei.
E quando nada funciona, apelam, colcoando em em cena o espectro Nakamura, um que morreu de modo estranho, caiu da janela do seu big apartamento, quando era um dos maiores especialistas brasileiros. Roger Abdelmassih e muitos outros foram alunos dele.
Força Padilha! Não se intimide com gente safada. Há muita gente honesta e de bem na Reprodução Assistida. Conte com eles.

Tetê

Estou com Fátima Oliveira e não abro! Espero que o ministro Padilha emita logo essa NT!!!!!
“Parafraseando Guimarães Rosa – ‘Eu quase nada sei, mas desconfio de muita coisa’-, repito: ‘A Reprodução Humana Assistida (RHA) é um campo minado de procedimentos experimentais e inseguros que, no Brasil, ainda é terra de ninguém. É abusivo que o Ministério da Saúde não tenha elaborado uma norma técnica sobre RHA até hoje’. É, ‘quem cala consente’!” O TEMPO, 11.1.2011)". Fátima Oliveira

Marina

Gostaria só de acrescentar que há um regulamento da Anvisa que disciplina os aspectos técnico-sanitários relativos aos Bancos de Células e Tecidos Germinativos, que é a Resolução de Diretoria Colegiada – RDC N.°33 de 2006, que está sendo revista, sendo que a nova proposta de RDC será votada em uma reunião pública da Diretoria Colegiada da Anvisa, no dia 26 de maio próximo, às 16:30, conforme notícia veiculada no site da Anvisa (http://portal.anvisa.gov.br/wps/portal/anvisa/home/!ut/p/c5/04_SB8K8xLLM9MSSzPy8xBz9CP0os3hnd0cPE3MfAwMDMydnA093Uz8z00B_AwN_Q_1wkA48Kowg8gY4gKOBvp9Hfm6qfkF2dpqjo6IiAJYj_8M!/dl3/d3/L2dBISEvZ0FBIS9nQSEh/#)__Esta RDC se limita aos critérios técnico-sanitários, mas não deixa de ser um marco regulatório na área de Reprodução Humana, haja vista a inexistência de Lei ou Norma Técnica que discipline os outros aspectos desta área da Medicina.__

    Tetê

    Marina a autora falou sobre isso: "A Anvisa criou, em 12.5.2008, o Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio) para conhecer a produção de embriões humanos por fertilização in vitro que não foram transferidos". É apenas para "controle dos embriões estocados!
    …..
    4° Relatório do Sistema Nacional de Produção de Embriões – SisEmbrio
    Dados relativos ao ano de 2010
    O SisEmbrio – Sistema Nacional de Produção de Embriões foi criado pela
    Resolução de Diretoria Colegiada/Anvisa n.º 29 , de 12 de maio de 2008, com o objetivo de
    conhecer a produção de embriões humanos por fertilização in vitro que não foram
    transferidos. O sistema permite saber quantos embriões estão disponíveis para serem
    doados para pesquisa e é um passo importante para o aprimoramento do controle sanitário
    das clínicas de reprodução humana assistida no Brasil. http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/0a204

    Marina

    Tetê, esta norma é relativa somente ao SisEmbrio. A RDC que citei abrange os critérios técnicos-sanitários para a parte "laboratorial" da reprodução humana assistida (da coleta das células e tecidos germinativos até sua liberação para uso), sendo aplicável a serviços públicos e privados. Saliento que é a RDC 33/2006 e que foi revista e será discutida nesta quinta pela Diretoria da anvisa. A RDC que institui o SisEmbrio é a 29/2008.

    Mari

    AVE, Marina! E essa gente não cumpre nada! A Clínica do Roger Abdelmassih nem faz parte do Registro Latino-americano de Reprodução Assistida, a REDlara, que congrega 90% de todas as clínicas da América Latina. Caso de Polícia!
    A Rede Latino-americana de Reprodução Assistida (REDE) é uma instituição científica e educacional, que agrupa mais de 90% dos centros que realizam técnicas de reprodução assistida na América Latina.
    A REDE foi estabelecida em 1995, com 50 centros, e conta hoje com um total de 141 centros; possui o Registro Latino-americano de Reprodução Assistida (RLA), que cataloga anualmente todos os resultados das técnicas de reprodução assistida reportados por estes centros. Com o intuito de promover especialização à comunidade científica, a REDE oferece o Programa de Educação Continuada, composto por congressos anuais, e o Programa de Educação Continuada Online – PEC Online http://www.redlara.com/home1.asp

    Tetê

    Obrigada, Marina! De qualquer modo é como você disse: "não deixa de ser um marco regulatório na área de Reprodução Humana, haja vista a inexistência de Lei ou Norma Técnica que discipline os outros aspectos desta área da Medicina".
    Então concordamos que é preciso uma Norma Técnica URGENTEMENTE. Era pra ontem, viu Dr. Padilha?

Pipa

Fáááá´tima, eu não sabia que tínhamos uma Política Nacional de Atenção Integral em Reprodução Humana Assistida! E só abrange a RedeSUS? Isso tem algum significado, pois o Ministério da Saúde legslou pra dentro (a rede SUS) e deixou as clínica sprivadas de fora!!!! Alguém pode explicar mais um pouco? Para mim o lobby das privadas é tão pesado que nenhum ministro até agora consegui colcoá-las na linha! Meu Deus! Terra de ninguém mesmo

Silvio I

Fátima Olivera:
Está certo, todo o exposto pela Doutora, mais temos um problema, que e o homem. O dinheiro tem um atrativo muito especial, ao quais homens amorais, se deixam seduzir. Uma das medidas que deveriam ser tomadas, que em toda gravidez produzida, por estes métodos, se proceda a fazer se umas análises de DNA, para confirmar si realmente esse feto, e originário de embriões pertencem a essas pessoas. De esta forma, se pode brecar o uso de outros embriões, no processo de fertilização. E colocar penas de acordo, para que ninguém intente cometer esse tipo de delito.

Silvio I

Fátima Oliveira:
Está certo, todo o exposto pela Doutora, mais temos um problema, que e o homem. O dinheiro tem um atrativo muito especial, ao quais homens amorais, se deixam seduzir. Uma das medidas que deveriam ser tomadas, que em toda gravidez produzida, por estes métodos, se proceda a fazer se umas análises de DNA, para confirmar si realmente esse feto, e originário de embriões pertencem a essas pessoas. De esta forma, se pode brecar o uso de outros embriões, no processo de fertilização. E colocar penas de acordo, para que ninguém intente cometer esse tipo de delito.

    beattrice

    Concordo totalmente, a análise de DNA deveria ser feita obrigatoriamente e no início do período gestacional.

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