Quarta, 18 de maio de 2011, 10h09
por Ana Cláudia Barros, Terra Magazine
A máxima “a internet é um espelho fiel da sociedade” parece ainda mais cabível quando observadas as ondas de discriminação e ódio que têm emergido nos últimos meses no Twitter. Análise da evolução diária das denúncias no microblog, elaborada pela SaferNet e obtida com exclusividade por Terra Magazine, confirma o que já se suspeitava: eventos do “mundo real” impactam diretamente o ambiente virtual.
Nas cinco principais ondas de ataques e nas manifestações de menor proporção deflagradas no Twitter, no período que vai de novembro de 2010 a 16 maio deste ano, essa correlação fica evidente, conforme enfatiza o presidente da SaferNet Brasil – organização não-governamental que combate crimes contra direitos humanos na rede -, Thiago Tavares.
Ele chama a atenção para o “aumento significativo” da frequência e da violência dos ataques após a entrada em cena do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ).
– Com suas declarações polêmicas, o Bolsonaro acendeu o pavio e encorajou algumas ondas sucessivas de homofobia no Twitter e nas outras redes sociais no Brasil; Orkut principalmente – afirma, destacando a conexão entre realidade “online” e “offline”.
– Se forem cruzados os dados da planilha com as notícias veiculadas na imprensa, é possível perceber ligação com fatos, como disputas no Congresso, violência a homossexuais na Avenida Paulista, chuvas no Nordeste, metrô em Higienópolis.
Sobre as ondas menores, acrescenta:
– Elas têm se apresentado constantes ao longo de 2011. Em sua maioria, foram detonadas pela polarização do debate em torno dos direitos dos homossexuais.
De acordo com Tavares, a incidência das manifestações de discriminação começou a se acirrar a partir do final do segundo semestre de 2010. Sobre os motivos deste crescimento, argumenta:
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– Dois fatores são importantes e, em conjunto, ajudam a entender esses números. O Twitter se expandiu muito no Brasil do segundo semestre pra cá. Hoje, tem em torno de 15 milhões de usuários (no mundo, são cerca de 180 milhões). O aumento expressivo na base de usuários também influenciou no número de casos – diz, prosseguindo com a explicação:
– Outro fator importante foi a violência no debate eleitoral. Essa agressividade que permeou a campanha dos candidatos foi transposta para os eleitores. O clima de animosidade criou um ambiente propício para essas manifestações exacerbadas de ódio.
Evolução das denúncias de manifestações de ódio no Twitter em 2010(Fonte:SaferNet)
Evolução das denúncias de manifestações de ódio no Twitter em 2011 (Fonte:SaferNet)
De janeiro a dezembro de 2010, 2.372 tweets(mensagens postadas no microblog) com teor discriminatório foram encaminhados à Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos, criada pela SaferNet e operada em parceria com os ministérios públicos federal e estaduais e a Polícia Federal.
Ao todo, foram contabilizados 23.589 denunciantes. Só de janeiro a 16 de maio de 2011, 1.181 tweets com as mesmas características foram reportados à SaferNet, quase a metade do acumulado no ano passado inteiro. Até a mencionada data, 8.942 pessoas se dispuseram a delatar os casos de discriminação. Todas as denúncias são anônimas.
“Detonadores”
O presidente da SaferNet explica que as ondas de preconceito no Twitter Brasil são desencadeadas pelo que chama de “perfis detonadores”, usuários que “assumem a dianteira e inauguram uma sequência de ódio, uma gritaria generalizada”.
A primeira grande onda aconteceu entre 1º e 4 de novembro do ano passado, logo após o anúncio do resultado das eleições presidenciais. Conforme a SaferNet, o perfil da estudante de Direito Mayara Petruso, apontada na época como pivô da polêmica em razão do comentário de que queria afogar os nordestinos, foi, de fato, o estopim das manifestações de preconceito. Neste período de quatro dias, 4.002 pessoas acionaram a ONG para denunciar.
Tavares comenta que foi necessário um “tratamento de choque” para estancar o tumulto na rede.
– Preparamos um relatório com 1.037 contas do Twitter, mandamos a lista para o Ministério Público e comunicamos à imprensa. Foi imediato. Cessou rapidamente.
– Se você comparar essa onda com as demais, vai perceber que as outras ondas duram, no máximo, 48, 72 horas estourando. A onda contra os nordestinos após as eleições, por sua vez, iria perdurar por mais de uma semana. Ela já durava cinco dias. Era uma atividade enorme. As mensagens estavam cada vez mais agressivas. Isso nos surpreendeu. Era uma onda absolutamente sem controle. Por isso decidimos adotar uma ação enérgica.
O segundo “tsunami” virtual foi registrado entre 17 e 19 do mesmo mês, após o lançamento, às vésperas do Dia Nacional da Consciência Negra, da campanha no Twitter “#HomofobiaNão”. Em contraposição ao movimento, grupos conservadores criaram o perfil e a hashtag “#HomofobiaSim”, o que impulsionou uma sequência de manifestações de repúdio aos homossexuais. Ao todo, 8.574 denunciaram.
Já a terceira onda, observada entre 29 e 30 também de novembro, teve como mote o neonazismo. Os alvos? Negros e gays. Os dois perfis apontados como os responsáveis pela propagação do ódio (@anjooslava e @anjonazistaheil) já não estão mais ativos, mas os comentários racistas e homofóbicos podem ser vistos via buscador Topsy, que mostra quem foram os autores da divulgação de determinado tweet e exibe as mensagens mais repassadas pelos usuários.
Entre os recados deixados pelos perfis, ataques frontais como: “Eu odeio homossexuais, desejo que todos eles tenham uma morte sofrida e dolorosa, meu sonho é um dia ver a humanidade livre dessa raça!”; “Meu avô foi brutalmente assassinado por um negro. Como eu vou defender esses lixos?”; “Rejeite o lixo multicultural! Despreze a escória homossexual!!! Não irei me acovardar, e sim massacrar”; “Esse país é um lixo, eles querem te obrigar a amar negros, homossexuais. Se for pra viver nesse lixo a minha vida toda, prefiro a morte”.
A quarta grande onda, ocorrida em 28 e 29 de dezembro, também foi alavancada pela aversão aos gays, lésbicas, transexuais e bissexuais. Segundo a SaferNet, os perfis detonadores foram @contraGays e @estuproSim, este último cancelado.
A série de ataques mais recente aconteceu em 12 deste mês, após a eliminação do Flamengo na Copa do Brasil pelo Ceará. Em um único dia, 5.150 internautas, indignados com o teor das mensagens de preconceito contra nordestinos, recorreram à SaferNet.
Comentários
lipp
Vou fugir daqui… esse pais nao e pra gay ser feliz. Confesso: eu desisto!
Salvador
Essa novela e a do codigo florestal têm servido muito bem para ofuscar a visão de uma sociedade sempre disposta a brigar por frivolidades e questões diagonais, Bolsonaro está no direito dele e no exercicio da represntação dele, tanto quanto o Gabeira ou o Jean Wyllys. A intolerancia está entre os homofobicos e os homossexuais que não admitem contrariedade. Enquanto isso, os Paloccis, Sarneys, Maias, Calheiros, Malufs, etc pastejam nas verdinhas e na letra morta do país. Parabens Brasil, está dando um show!
Daniel
E a campanha do coiso só serviu pra essess nazis malditos terem ainda mais espaço. Valeu, Çerra, por mais este desserviço…
Carlos Oliveira
Qual é o rigor metodológico, os experimentos acadêmicos que levaram a certeza de que apenas o Bolsonaro é o motivador dessas reações? Os defensores dos "direitos" dos homossexuais também poderiam ser considerados motivadores. Eles chamam quem não pensa igual ao secto deles de "nazistas", "retrógrados", "medievais", "fanáticos", etc. Ou seja, se não professam a causa deles, são desprezíveis, desprovidos de conhecimento e por aí vai. Todo mundo precisa respeitar a vontade de todos, cada um faz da vida, do corpo o que bem entender. Até aí, tudo bem. Agora, não me venham dizer que respeitar significa concordar com o comportamento cuja fé, visão de mundo e de família condenam. Tenho medo de que isso possa se polarizar demais e levar as pessoas ao enfrentamento físico. Vamos ter mais responsabilidade, ou isso vai virar guerra tácita.
Bruno
Nenhum, uai. Mas rigor metodológico não dá audiência.
Russo
Este tal de bolsonaro não é uma aberração política. Lamentavelmente representa um número expressivo de brasileiros preconceituosos, fascistas, retrógrados, ignorantes.
Luís
Tem gente que devia ser proibida de usar computador.
Marcelo Fraga
A classe média (a velha, que de vez em quando chamo de classe mérdia) e a elite agora mostram o que realmente são.
Mostram o quão reacionários, preconceituosos e fascistas são. Esses estúpidos se escondem atrás de uma suposta anonimidade para exporem aquilo que não "cojones" para dizer "cara a cara".
Jose Emílio Guedes
Esse Bolsonaro é o próprio "Jair Belzebu" e deve estar chafurdando nesse lamaçal todo que ele criou. Está adorando toda essa publicidade ao seu redor. Temos que parar de alimentar esse porco.
FrancoAtirador
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Conceder microfone e câmera a neonazistas, só poderia dar nisso.
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Ivonete
Sistematicamente o deputado Bolsonaro fere a dignidade do cargo e fere o capítulo primeiro da constituição. No entanto, não é punido. Deve haver alguns grupos poderesos lhe dando respaldo. Grupos certamente vinculados a instituições conservadoras e tradicionais que não desejam a aprovação da lei contra a homofobia e também não desejam que os homossexuais conquistem sua cidadania. Sabemos em que instituições esses ativistas fascistas se abrigam. Cadê o ministério público!
Bruno
Para pensar: só ele fere a dignidade do cargo "sistematicamente"? O problema do Congresso (em especial de sua dignidade) é bem mais profundo que as declarações de UM deputado (0,2% da Casa) sobre um assunto. Limpar o Congresso de homófobos é importante, mas nunca irá acontecer se não nos livrarmos dos outros parlamentares e seus outros vícios tão ou mais lesos à Nação.
Valdeci Elias
Eu acho que a violência contra o homosexual, sempre houve. O Twitter e Bolsanaro só fizeram chamar a atenção da midia sobre o tema, e divulgar os acontecimentos. Não houve um aumentos dos casos, más sim a divulgação dos casos.
Vilma Seabra
Os perfis @anjooslava e @contragays pertencem à mesma pessoa. É ele : Marcelo Vale Silveira Melo
Pitagoras
Este tal de bolsonaro não é uma aberração política. Lamentavelmente representa um número expressivo de brasileiros preconceituosos, fascistas, retrógrados, ignorantes. Let's face it!
Gerson Carneiro
Procurei no site da Câmara dos Deputados e a única representação do ano de 2011 que consta lá é contra a deputada Raquel Roriz. Nenhuma contra o Jair Bolsonaro.
Ninguém cala o deputado Jair Bolsonaro. Ele pode afirmar o que quiser em relação a quem quiser e ninguém o deterá. Ele já chegou a chamar a Maria do Rosário de "vagabunda" e ameaçou bater nela, lá mesmo nas dependências da Câmara. E não foi punido. É a tal imunidade parlamentar. Para além do corporativismo. Ele debocha de quem ameaça processá-lo.
E não adianta esperar por eleições porque há insanos em número suficiente para elegê-lo novamente.
Aline C. Pavia
Cassação e cadeia, simples assim. Mas quem tem "cojones"?
Bruno
Mas foi ela que bateu nele. As imagens mostram isto com cristalina clareza. Independentemente do que o Bolsonaro é ou representa, apenas ela perdeu a razão.
Hailey
Você confundiu a Min. Maria do Rosário com a Sen. Marinor Britto.
Bruno
Ah, mais um detalhe, Gerson: se você acha que as atitudes de um deputado são improbas, ilegais, indecorosas, ou seja, incompatíveis com a função de um congressista, você tem que exigir do SEU deputado ação adequada. Se não há representação contra o Sr. Bolsonaro, decerto é porque nenhum dos mais de 500 deputados ali presentes teve a decência de dedicar duas horas para redigir e protocolar uma representação contra ele. Inclusive o(s) que você ajudou a se eleger(em), pelo seu voto e pela proporcionalidade dos votos às coligações.
Quanto a esperar ou não pelas eleições: é nelas que escolhemos nossos representantes. Escolher um deputado comprometido com a protocolação de denúncias contra atos indecorosos de seus pares é uma possibilidade real.
Gerson Carneiro
Meu caro,
Jair Bolsonaro é também produto da democracia. Não posso impedir que pessoas de pensamento e comportamento iguais ao dele votem nele.
Sinto orgulho em ter votado em uma das pessoas mais probas daquele Congresso.
Pessoa esta da qual tenho a certeza que jamais terá o comportamento vil do Jair Bolsonaro. Seu nome: Luiza Erundina de Sousa. Portanto estou com minha consciência tranquila.
Hailey
Não estavam esperando juntar todas as representações (que estão na mesa diretora) para depois serem encaminhadas pro comitê de ética?? aff… quem vai nos salvar do Bolsonaro!!!
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