Rodrigo Vianna: “Nova ordem” visa demolir o projeto nacional herdado de Vargas

Tempo de leitura: 4 min

O tenentismo togado e a crise total: estamos às portas de uma anti-Revolução de 1930

O tenentismo togado (promotores, juízes e Lava-Jato) propõe a demolição do Estado e das forças produtivas que o Brasil foi capaz de construir ao longo de mais de 80 anos. Estão na mira: Petrobras, BNDES, construção pesada, agro-indústria. É uma crise sem precedentes. Uma crise de regime. Uma espécie de anti-Revolução de 1930.

por Rodrigo Vianna, em seu blog

“Estamos às portas de uma crise que já não é de governo, mas de regime”. A frase é de Marco Aurélio Garcia, ex-assessor internacional de Lula e Dilma, que além de ter atuado nos bastidores dos dois governos é historiador e observador da cena política.

Ao contrário do que se imaginava, a Lava-Jato e o movimento comandado por procuradores, juízes e delegados federais não tinham como objetivo apenas derrubar o governo Dilma, nem destruir o “lulo-petismo” – como davam a entender colunistas e políticos ligados ao tucanato.

Este blogueiro, desde 2015, lembra que a Lava-Jato tinha, sim, um claro viés antipetista; mas sempre foi muito mais que isso.

Enganava-se quem via na atuação de Moro, Janot e outros togados um projeto “tucano”.

O MPF e o juiz das camisas negras fizeram uma aliança puramente “tática” com o PSDB e setores de centro-direita para atacar Lula e derrubar Dilma.

Mas a Lava-Jato jamais esteve “a serviço” do PSDB – como os próprios jornalistas tucanos chegaram a acreditar.

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Um analista entrevistado pela BBC usou uma definição interessante para a ação dos procuradores e juízes: seria uma espécie de “tenentismo togado” (clique aqui para ler mais).

O paralelo que se traça é com o movimento militar de jovens e impetuosos oficiais, que se levantou contra a República Velha, num longo enfrentamento que teve como desfecho a Revolução de 1930 comandada por Getúlio Vargas:

Não parece haver um recorte específico no sentido de poupar os demais partidos. No fundo, o que os “tenentes togados” fazem é o processo da vida política brasileira como um todo: “querem, em nome da ética jurídica, dos “valores republicanos”, erradicar a “politicagem” da cena brasileira. Mas é inegável que existe também um viés antipetista, às vezes por questão de classe, às vezes por perceberem a mistura de socialismo com corrupção como satânica ou herética” (Christian Edward Cyrill Lynch, doutor em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ).

O tenentismo teve o papel de ajudar a demolir a velha ordem.

Alguns tenentes foram levados ao governo de Vargas pós-1930, na qualidade de interventores estaduais.

Outros caminharam para o prestismo que depois comandaria o PCB (Partido Comunista do Brasil) durante cinco décadas. Mas o tenentismo, ótimo para demolir a velha ordem, não tinha um projeto para colocar no lugar da Velha República.

Na última hora, um político advindo da velha ordem (Getúlio Vargas, que fora ministro de Washington Luiz, último presidente da República Velha) assumiu o poder e lentamente construiu uma nova ordem.

O paralelo termina aqui. Está claro que, ao contrário dos tenentes (que eram ingênuos e sem projeto, mas lutavam pela modernização do país), os procuradores/delegados/juízes do século XXI não têm um sentido de construção nacional. Mas de demolição pura e simples.

Estamos diante de uma crise de regime, sim. Que, se chegar ao ápice, pode levar à destruição não só do “lulo-petismo”, mas de toda a ordem democrática implantada desde a Constituição de 88.

E mais que isso: em certo sentido, pode levar à destruição do longo projeto de Estado Nacional iniciado em 1930.

O sentido de tudo que aconteceu de 1930 para cá foi: o Brasil pode ser um Estado autônomo, pode incluir as massas no desenvolvimento (com mais ou menos direitos, mais ou menos liberdade), e o governo cumpre papel central no desenvolvimento, dada a incapacidade da burguesia de liderar qualquer projeto nacional.

Os militares de 64 não ousaram confrontar a herança varguista de Estado. Collor tentou, e caiu. FHC anunciou que enterraria a Era Vargas, mas não conseguiu – seja porque dentro do PSDB ainda havia setores que seguraram a onda ultraliberal, seja porque na oposição o bloco PT/CUT/movimentos sociais/partidos de esquerda foi capaz de resistir ao desmonte.

O tenentismo togado, agora, propõe (talvez sem a devida clareza, mas por ações práticas) uma demolição do Estado e das forças produtivas que o Brasil foi capaz de construir ao longo de mais de 80 anos.

Estão na mira: Petrobras, BNDES, construção pesada, agro-indústria. É uma crise sem precedentes. Uma crise de regime. Uma espécie de anti-Revolução de 1930.

Assim como os tenentes não tinham projeto, mas apenas a energia renovadora, os togados não parecem ter outra função que não seja demolir tudo. Mas o poder, como sabemos, não admite vácuo.

Alguém ocupará espaços. Se o tenentismo togado cumpre a tarefa de implodir o sistema político e de minar a própria ideia de um Estado forte, com vistas ao desenvolvimento, sobra o que?

Provavelmente, uma nova ordem baseada em “iniciativa privada, visão gerencial privatista, abertura do país”.

Muita gente se pergunta: por que a Globo foi com tanta sede ao pote na direção de destituir Temer?

Ora, porque a Globo pretende se safar do naufrágio, pretende estar do outro lado do balcão se, e quando, a crise de regime levar de roldão PT/PSDB/PMDB e as agências federais de desenvolvimento – como BNDES, Petrobras e toda a longa e bem sucedida construção varguista do Estado.

A Globo é a organizadora do projeto privatista, do novo regime que já nos espreita na esquina da história.

Mas nem a Globo pode se salvar, se as delações de Ricardo Teixeira arrastarem para a fogueira da destruição os direitos de transmissão esportivas e os esquemas de lavagem de dinheiro já denunciados aqui – https://vimeo.com/album/2146619.

Até 2 ou 3 meses atrás, setores mais responsáveis do centro democrático emitiam sinais de que era preciso “salvar a política” do avanço destrutivo representado pelo tenentismo togado.

Lula era visto como o nome que, de dentro do sistema político, poderia comandar a necessária resistência. Nelson Jobim e Renan, além do próprio FHC, chegaram a vocalizar essa estratégia.

Mas o tempo pode ter passado. A crise de regime pode arrastar a todos, sem exceção.

Em 1930, brotou na última hora uma solução autoritária (Vargas) que deu sentido para a demolição da República Velha. Um sentido nacional, de desenvolvimento.

Minha impressão (e espero estar errado) é que vai surgir nos próximos meses uma liderança autoritária, que ofereça um sentido para a destruição promovida pelo tenentismo togado. Mas agora um sentido regressivo, de recolonização do Brasil.

A anti-revolução de 1930 avança, e me parece que nem Lula teria força agora para deter a onda que se avoluma no horizonte.

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Comentários

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Minas

Vejo claramente uma tentativa de acabar com a Constituição Cidadã de 1988!

Antonio C Guerreiro

Esses canalhas tem um objetivo de ENTREGAR tudo ao capital EXTERNO. Para que toda a riqueza do BRASIL fique nas MÃOS de estrangeiros e NADA NAS MÃOS DOS NACIONAIS BRASILEIROS.
E tudo nas mãos, principalmente, dos EUA.

Antonio C Guerreiro

Senhores esse GOLPE de 16,aplicado pelos juizes e procuradores , são parte de um GOLPE orquestrado e PAGO pelo CAPITAL INTERNACIONAL, com sede nos ESTADOS UNIDOS.
Essas autoridades do judiciário são PAGOS pelo GOLPE.

Bacellar

who os pulling the strings?

Lucas

Após um início de reflexão interessante, a meio ver, o texto incorreu num erro interpretativo. Porque a história não se repete, ela é assim embebida pelas influências do passado, do comportamento, das reminiscências e novidades de uma transformação moral.
Entendo que os togados foram construídos por dois fenômenos relacionados, o primeiro, de alienação do legislativo e bases eleitorais, uma espécie de autonomia de ação necessária para se manter a câmara aberta na ditadura mas que hoje faz do político um indivíduo estruturalmente desconectado da população. Segundo movimento nos foi dado pela constituição, ampla e programática, que ofereceu uma alternativa jurídica à esse vazio de representatividade real. Quando me sinto lesado em meus direitos não vou a meu deputado, mas vou à justiça. Quando a insegurança me assola, não é culpa da polícia, nas do legislativo quite apenas se preocupa com assuntos de cúpula. É por isso que os togados, embora não eleitos, são “elegidos”, elevados a condição de agente políticos. Aí sim vale lembrar do tenentismo, que só nasce de uma ausência quase total de representatividade dos governos pré Vargas. Aquela épocas vivíamos um período de líderes fortes e autoritários, coube bem esta luva histórica à Getúlio. O que cairia bem hoje? O que podemos fazer para preservara república democrática?… Esses togados parecem atuar sobre a república, interferindo sobre a influência excessiva do privado sobre o interesse público. Mas há um vazio que eles não podem assumir sem cairmos em mais um grande erro histórico, eles não podem assumir o poder agente, que precisa ser democrático. A política, campo onde este poder opera, parece pouco hábil para agir republicanamente, insistindo na manutenção de uma estrutura podre. Misturando-a a estrutura social para justificar sua manutenção. Mas não. É preciso estabelecer marcos éticos entorno de projetos de pais claros e transitaveis. Os partidos não parecem ser capazes de construir isso. Acho que é aí quite está o problema.

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