Foto: Levante Popular da Juventude
TEMER É O USURPADOR: O GOLPE É CONTRA A NAÇÃO, O MUNDO DO TRABALHO E AS LIBERDADES DEMOCRATICAS
por Ignacio Godinho Delgado
O golpe é um drible no Estado de Direito para desalojar governantes legitimamente eleitos e instalar em seu lugar usurpadores, pessoas, grupos que ascendem ao poder por via de procedimentos ilegítimos.
Por que o STF, em seu papel de guardião da ordem constitucional, não reage, acovardando-se sob a consideração de que sua função é a de um reles tabelião, ao zelar apenas pelo rito do impedimento?
Há no STF três ministros manifestamente golpistas.
Gilmar Mendes é uma afronta ao Judiciário, por seu partidarismo militante. Qual o poder que dispõe para silenciar a reação de seus pares aos achaques diários que faz à dignidade da suprema corte?
Toffoli foi uma péssima escolha de Lula; um fraco que sucumbiu à chantagem de Gilmar.
Celso Mello é um reacionário da velha estirpe. É capaz de reagir indignado a uma conversa privada de Lula, obtida por procedimentos ilegais, mas manter-se indiferente à ação criminosa de um juiz de primeira instância, que comanda um estado policial à margem da lei sob as barbas de nossos doutos magistrados.
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Espera-se que o conjunto do STF seja maior que o medo/sedução/cumplicidade diante da mídia familiar e oligárquica, que comanda o golpe e parece afetar bastante juízes e procuradores. Se não for assim, com a homenagem devida a Marco Aurélio Mello, o STF terá abdicado de operar como a última fronteira da cidadania.
Não há lei nem jurisprudência que defina as “pedaladas fiscais”, nem os tais “créditos suplementares não autorizados”, como “crime de responsabilidade”. Caberia ao STF definir, então, se há motivo para o impedimento. Lembremo-nos que até Fachin, em seu voto vencido de dezembro de 2015, definiu que para abertura do processo de impedimento é preciso estar definido o crime de responsabilidade.
Se por acaso o STF definir que é o caso, soçobram diversos governos estaduais e o vice conspirador. Por outro lado, não há, ainda assim, como acusar Dilma desses atos, porquanto em dezembro de 2015 o Congresso alterou a meta fiscal. Estamos, pois, inequivocamente diante de um golpe.
O impedimento só vale se aceitarmos a subversão completa da ordem jurídica. Como diz Wanderley Guilherme dos Santos:
O atentado ao contrato social básico é outro, de cujo exame o Supremo fugirá como lebre. Cabe a qualquer maioria interpretar como lhe convier a forma de aplicar preceitos constitucionais? O rito pode criar o objeto a que se aplica? Se dois terços da Câmara dos Deputados decidirem que as contas do atual presidente da Casa não são contas e que a Suiça não existe, vale a anistia com que pretendem presenteá-lo? Se valer, para quê serve um Supremo Tribunal?
O golpe é contra a Nação, o mundo do trabalho e as liberdades individuais.
É um velho golpe latino-americano, urdido a partir de dentro do país, mas com elos e conexões internacionais, notadamente norte-americanas, de onde parte o financiamento para grupos fascistas como o Movimento Brasil Livre.
Remonta, ainda, às articulações do FBI com a Polícia Federal e o Ministério Público para o “combate ao terrorismo”. Dessa colaboração forjou-se o caldo de cultura da Operação Lava Jato, com seus procuradores salvacionistas e o Comandante Moro, louvando as virtudes da “economia aberta”, abjurando as políticas de conteúdo nacional, conduzindo ações de colaboração com organismos norte-americanos para debilitar as únicas empresas brasileiras classe mundial: as construtoras e as a Petrobrás.
Não será uma surpresa se o governo golpista de Temer, além de mudar o marco regulatório do Pré-Sal, assinar o Acordo sobre Compras Governamentais da OMC, para ampliar o espaço disponível a empresas internacionais no mercado doméstico brasileiro.
O golpe é contra o mundo do trabalho.
Preservados os dispositivos que emolduram as relações entre capital e trabalho no Brasil e adotando a política de valorização do salário mínimo, os governos de Lula e Dilma sinalizaram para uma perspectiva de desenvolvimento em que os ganhos de produtividade das empresas deveriam derivar da disposição de inovar, atendendo a um mercado de consumo de massas em expansão, construção inédita na trajetória do capitalismo brasileiro.
Houve sim, inconsistência entre tal propósito e a política cambial e, com Dilma, descuidos de operação em políticas setoriais como as de energia elétrica, as tarifas da gasolina e as regras de concessões.
Mas sem ilusões, no primeiro governo Dilma, o empresariado industrial, que foi beneficiado com linhas generosas do BNDES, desonerações, além da desvalorização progressiva do real e a promessa de juros civilizados, abandonou o arranjo proposto pelo PT seduzido que foi pelo canto de sereia da redução do custo do trabalho, pedra de toque da promessa neoliberal da década de 1990.
Tal sedução vinha embalada nas imagens da crise advindas da mídia familiar e oligárquica, umbilicalmente ligada ao capital financeiro, que inibiram, na sustentação de um quadro permanente de ingovernabilidade, as disposições de investir de nossos capitães de indústria.
Importa dizer que de tal projeto não virá modernização, inovação tecnológica e bem-estar. Apenas a subordinação crescente da economia nacional, a regressão social e a lei do mais forte, quando finalmente se inscrever no ordenamento jurídico brasileiro que vale o negociado e não o legislado, liquidando décadas de construção civilizatória através do direito do trabalho.
O golpe é contra as disposições constitucionais que garantem os gastos sociais do Estado brasileiro. É, também, contra as liberdades democráticas e os direitos individuais. Quem vê as ações dos governos do Paraná e de São Paulo contra professores e estudantes pode esperar de Temer algo diferente diante da reação dos movimentos sociais à implementação da ponte para o regresso, anunciada pelo PMDB? Por fim, além das afinidades eletivas, Temer vai dever seu governo em boa medida àqueles votos, da bala, do boi e da Bíblia, que tomaram conta do parlamento brasileiro com sua pauta reacionária.
Tempos obscuros se projetam caso prevaleça o golpe.
Conforme Locke
“Quem quer que adquira o exercício de qualquer parte do poder por meios diferentes dos que as leis da comunidade prescreverem não tem direito a ser obedecido (…) desde que não é a pessoa que as leis indicaram, e, em consequência, não é a pessoa a que o povo dera assentimento”
“Do mesmo modo que a usurpação consiste no exercício do poder a que outrem tem direito, a tirania é o exercício do poder além do direito, o que não pode caber a pessoa alguma (…) Mas se qualquer desses atos ilegais se estendeu à maior parte do povo (…) não estou em condições de dizer como se poderá impedi-los de resistir à força ilegal de que se faz uso contra eles”.
LOCKE, J. Segundo Tratado sobre o governo – Capítulo XVII – Da Usurpação e Capítulo XVIII – Da Tirania
Um governo de Temer nada mais é que uma usurpação. E como tal deve ser encarado pela imensa corrente em favor da legalidade que se forjou no Brasil nos últimos meses, diante da conspiração contra a democracia comandada pela mídia familiar e oligárquica, apoiada por interesses impatrióticos e antipopulares e operada pela dupla Cunha e Temer.
Ignacio Godinho Delgado é Professor Titular da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), nas áreas de História e Ciência Política, e pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia-Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento (INCT-PPED). Doutorou-se em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 1999, e foi Visiting Senior Fellow na London School of Economics and Political Science (LSE), entre 2011 e 2012.
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Comentários
Urbano
Mais escroque do que esse golpe só mesmo os seus autores e a leveza com que estão fazendo. Até agora e dentro dos próprios Poderes constituídos e legais só se veem os três símios. Fora disso o que se viu foi o atraso por conta do prolongado olhar de paisagem. O individual não pode prejudicar o público jamais, pois por conta disso a Nação brasileira está pagando muito caro e vai pagar ainda mais, muito mais. O Brasil nunca esteve tão importante no cenário internacional como sob o auspício do PT; e vêm os de sempre e fazem a sua fascista reintegração de posse grileira, pois não pertence a eles, mas a todos os brasileiros independentemente de raça, cor, credo e status.
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