Altamiro Borges: Quando interessa, o dinheiro da Odebrecht é limpo e financia até quem se diz “pluralista”– mas não é
Tempo de leitura: 5 minMarcelo Odebrecht assiste, ao lado de Jorge Gerdau, Fernando Henrique Cardoso e Geraldo Alckmin, ao discurso de Aécio Neves em jantar de gala, o último do qual participou antes de ser preso; a empresa dele continua financiando a mídia
A Odebrecht e o aniversário da Folha
Por Altamiro Borges, em seu blog
O jornal Folha de S.Paulo segue com as comemorações do seus 95 anos de existência.
A edição do domingo (28) circulou com 424 páginas — o que deve servir “para embrulhar peixes”, como o próprio o chefão Octávio Frias de Oliveira, falecido em 2007, gostava de se referir ao destino dos diários no dia seguinte ao da sua impressão.
O único motivo de alegria é que “o produto que celebra os 95 anos da Folha bateu recorde de anunciantes”, comemorou a ambiciosa famiglia Frias.
Para o diretor-executivo da Folha, Sérgio Dávila, o volume de páginas “mostra a força do projeto do jornal, que segue os princípios de pluralidade, apartidarismo e crítica”. Haja arrogância e cinismo!
Como dizia Honoré de Balzac, “quem se jacta muitos dos seus feitos é porque poucos feitos tem para se jactar”. Mas nem tudo foi festa na Barão de Limeira.
O patrocínio da Odebrecht ao seminário comemorativo do aniversário acabou gerando constrangimentos.
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Leitores e até a ombudsman do jornal questionaram o apoio financeiro da empreiteira denunciada na midiática Operação Lava-Jato.
Após enaltecer o “ótimo ciclo de debates para celebrar os 95 anos”, a ombudsman Vera Guimarães Martins registrou: “Tudo seria festa e êxito se o jornal não tivesse enfrentado uma saia justa nos dias precedentes ao encontro. Programação e palestrantes estavam definidos quando a Odebrecht entrou como uma das patrocinadoras do evento (a Fiesp veio depois). Alguns leitores questionaram o jornal sobre a propriedade de dividir a comemoração com uma marca comprometida na Lava Jato, e quatro palestrantes desistiram de participar: Eurípedes Alcântara, diretor da ‘Veja’, Fausto Macedo, repórter de ‘O Estado de S.Paulo’, e os apresentadores William Waack e Renata Lo Prete, da Rede Globo”.
A própria ombudsman fez questão de enfatizar que “também acho que celebrações institucionais não deveriam ter patrocínio ou que ele deveria ser selecionado com muito cuidado”. Mas não deixou de fustigar os cínicos concorrentes.
“Todos os meios desenvolvem projetos viabilizados pelo dinheiro de grandes corporações. Para ficar apenas nos jornais, a satanizada Odebrecht patrocina o programa de treinamento da Folha (juntamente com a Friboi e a Philip Morris), de ‘O Estado’ (em parceria com a Philip Morris) e do curso de jornalismo da Editora Abril (com a BRF e a Heineken). A mesma empreiteira patrocinou no final de janeiro um seminário de ‘O Globo'”. E concluiu: “Precisamos ou não falar aberta e honestamente sobre isso?”. Aí já é pedir demais aos barões da mídia!
Diante das críticas, o mesmo Sérgio Dávila, régio serviçal da famiglia Frias, saiu-se com a desculpa furada. “O Encontro Folha de Jornalismo teve como patrocinadores a Fiesp e a Odebrecht. Como em outros conteúdos –caso de cadernos, sites e seminários–, a relação das empresas patrocinadoras com o jornal é comercial, sem qualquer interferência na parte editorial”. Será que algum midiota ainda acredita nesta lorota? Na sequência, ele voltou a bater na tecla de que “a Folha defende a pluralidade” — outra conversa fiada e esfarrapada. Sobre este ponto, vale conferir o artigo do filósofo Renato Janine Ribeiro sobre a alardeada pluralismo editorial da Folha:
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Esquerda sem voz
Renato Janine Ribeiro* – 20/02/2016
Se pluralismo é dar voz, com equilíbrio, a visões políticas opostas, a Folha não é um jornal pluralista. Ela tem uns cem colunistas permanentes. É óbvio que nem todos falam de política. Mas, dos que tratam do tema, os simpatizantes de esquerda são poucos. Nem dez.
Destes, quase nenhum simpatiza com o governo federal ou com o PT. Aliás, três colunistas que tinham alguma simpatia por suas políticas — Luiz Carlos Bresser-Pereira, Barbara Gancia e Xico Sá — foram desligados nos últimos dois anos. Há assim, no Brasil, um partido que venceu as últimas quatro eleições presidenciais e conta com a segunda maior bancada na Câmara, mas não tem voz na Folha.
O contraste é grande com o espaço dado a articulistas de direita, incluindo alguns que se dizem liberais, mas que não defendem o princípio básico, supremo, de todo liberalismo genuíno: que haja igualdade de oportunidades, ou seja, que ninguém seja prejudicado ou avantajado pela loteria do nascimento em berço miserável ou rico.
Não penso que a Folha tenha obrigação de dar voz ao PT. Apenas assinalo que, se não pratica o pluralismo, não deve se dizer pluralista. Só isso.
A mesma desigualdade de espaço entre direita e esquerda aparece nas reportagens. É inegável que a Folha aponta falhas ou mesmo crimes nos políticos de direita, mas a proporção de críticas ou ataques é maior à esquerda do que à direita.
Num tema que perpassa nossa política, a corrupção, referências à esquerda são expostas como incontestes, enquanto alusões aos partidos conservadores são comedidas. Há uma diferença de pesos e critérios que é preocupante.
A reportagem é o coração do jornalismo. Apurar informações é essencial, caro e difícil. Exige uma separação clara entre fatos e opiniões. Qualquer estudante de jornalismo sabe que não há fatos em si, que a própria apuração já é marcada por uma convicção prévia.
Todavia, o jornal ou o jornalista deve acreditar no mito de que é preciso haver uma divisão entre o fato e a opinião, entre a informação e o editorial. Porém, nos últimos anos, à medida que se reduziu a apuração de notícias, que se baixou a produção de reportagens relevantes, a fronteira entre fato e opinião diluiu-se.
Em todo curso de jornalismo prega-se “a separação da igreja e do Estado”, ou seja, a Redação e o departamento de publicidade devem estar divididos por uma muralha intransponível, para que o jornal tenha credibilidade.
Essa separação é respeitada, sim, e é uma condição para o jornalismo. Mas a outra muralha, entre as notícias e os editoriais, perdeu importância.
A Folha continua tendo qualidades. Alguns colunistas são realmente bons. O jornal denuncia falhas de partidos de direita, embora em menor número. Entretanto, por opção ideológica ou por outra razão, descuidou das reportagens.
Posso dizer que muitos assuntos importantes na área educacional são omitidos. Em 2013, um colunista de economia descobriu por puro acaso a existência de uma importante política do Ministério da Educação, o programa Caminho da Escola que transportava milhões de crianças para as escolas na zona rural.
Nesta semana, a mídia apenas soube que o governo Alckmin havia reduzido a duração das aulas nas escolas porque uma pessoa postou a informação no Facebook.
Seria bom se o jornal recuperasse o investimento em reportagens que estivessem claramente separadas de opiniões. Opinião quem deve formar é o próprio leitor; o jornal deve lhe dar meios para isso, nada mais.
* Renato Janine Ribeiro, 66, é professor titular de ética e filosofia política da USP, foi ministro da Educação (governo Dilma).
Comentários
Julio Silveira
O Brasil tem a pior elite do planeta. Nossa elite, e principalmente aquela parte que tem a liderança por conta de possuírem dom da imagem associada a palavra, não admitem dissidências. il capo di tutti i campi nacional, diferente de tudo, e todos, o que se conhece ao redor do mundo em termos de máfia, mesmo post mortem deixou como seu principal legado um espirito kamikaze nos seus descendentes. Instrução que serve para enquadrar aqueles que fazem parte de sua classe, mas que ostentem fraquezas como se permitirem flertar com outras classes sociais no País. Tudo isso para não correrem o risco de perderem a dominância classista. Este, na verdade, sempre foi o problema da elite nacional, ela é eminentemente classista, e oligárquica demais para conseguir ser moderna e arejada. E plagiando uma expressão que algumas vezes vi sendo citada em tom de piada, mas com um grande fundamento, e muita verdade, na sua escalada de aversão a entrega do Brasil a dominância da pluralidade social, eles preferem destruí-lo e a seu povo firmando uma patológica dependência ao norte.
Latino-americano
O surrealismo , as narrativas fantásticas na velha mídia e suas constantes contradições, leva os sensatos a perguntar de como é possível uma tamanha alienação e falta de discernimento político de parcela da população brasileira?; o pior , este fenômeno da sujeição servil ao discurso fabricado da velha mídia, esta agressividade e corrupção fomentadas pelas agências secretas norte-americanas , não passam de uma história repetida à exaustão em nossa pobre América Latina; sim, pobre de nós latino- americanos, tão distantes de deus, e perto demais dos Estados Unidos e de sua arrogância. Corrupção política se combate com punições exemplares do judiciário; crises econômicas são superadas com trabalho árduo e união política. Mas , em tempos de recrudescimento do colonialismo, qualquer fato transforma-se , sem qualquer pudor ou naturalidade, em pretexto para se derrubar um governo legítimo. Nem Dilma, nem povo, devem ser penalizados pelo desejo de soberania e afirmação.
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