Luis Nassif: Jornalismo espírita invade encontro de Dilma com governadores

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Jornalismo espírita invade encontro de Dilma com governadores

por Luis Nassif, no GGN

No jornalismo existem as reportagens e as análises. As reportagens baseiam-se em fatos; as análises, em raciocínios.

Uma das formas de burlar o leitor é rechear um artigo com meras impressões pessoais – do gênero que os compêndios jornalísticos denominam de gossips – e atribuí-las a fontes, anônimas ou não. É diferente da análise propriamente dita, que exige raciocínio, levantamento de ângulos não percebidos pelo leitor.

O gossip tem sido fartamente utilizado para desqualificar qualquer ato de Dilma, uma declaração solta, uma proposta política. Em vez de se debruçar sobre as implicações da atitude, montam-se análises superficiais baseadas no achismo, mas atribuídas a fontes em off para ganhar alguma verossimilhança.

É o caso do encontro de ontem, de Dilma com 27 governadores.

Comparem a reportagem “Dilma manda a governadores recados que eles não queriam ouvir” (http://migre.me/qZcq4) da colunista Vera Magalhães, da Folha – que não estava no evento – com os relatos dos repórteres que assistiram o evento. Basicamente as reportagens do Estadão “Aos governadores Dilma diz que país tem condições de se recuperar” (http://migre.me/qZcrX)-, de O Globo – “Governadores defendem governabilidade e pedem retomada dos investimentos” (http://migre.me/qZcwe) e “Dilma diz a governadores  que o país passa por transição” (http://migre.me/qZcxW) – e da própria Folha – “Dilma pede a governadores ajuda para sair da crise” (http://migre.me/qZczE).

Do lado esquerdo, as afirmações contidas no artigo de Vera; no direito, informações dos repórteres que cobriram o encontro.

O jornalismo de suposição O jornalismo dos fatos
Os dias que antecederam a reunião de Dilma Rousseff com os governadores foram cercados de certo desconforto por parte dos convidados. Quais convidados? Nenhum é identificado.
Diante da crise econômica e política e da popularidade em franco derretimento da presidente, os chefes dos Executivos estaduais temiam ser chamados para dividir o fardo pesado que Dilma carrega desde que se reelegeu. Quais chefes dos Executivos? Nenhum.
Diante da crise econômica e política e da popularidade em franco derretimento da presidente, os chefes dos Executivos estaduais temiam ser chamados para dividir o fardo pesado que Dilma carrega desde que se reelegeu. Quem temia ser chamado para dividir o fardo?
Mais: os que foram reeleitos no ano passado guardavam ainda fresca na memória a experiência pós-junho de 2013, quando Dilma chamou os 27 governadores para assistirem ao famoso discurso dos “pactos” nacionais –eram cinco, no fim nenhum deles se concretizou. Conversou com todos os governadores e selecionou a opinião dos que foram reeleitos? Dificilmente. Fonte espírita.
Os oposicionistas temiam cair na cilada de serem convidados a ajudar numa governabilidade que nem lhes interessa nem é sua responsabilidade. E os dos partidos aliados, que sentem no dia a dia a dificuldade de apoiar um governo impopular, também não queriam se tornar sócios nessa empreitada. Nenhum oposicionista e nenhum aliado é mencionado. Fonte espírita.
Foi com essa (pouca) disposição que a maioria dos 27 viajou a Brasília. Some-se a isso as trapalhadas de cerimonial, que só distribuiu os convites poucos dias antes do encontro, com pauta genérica e sem deixar claro quem falaria ou não, e dá para se ter ideia do clima pré-encontro. A troco de que reunião com a presidente precisa de pauta detalhada? Não explica.

Aí se parte para o encontro propriamente dito e os fatos teimam em discordar das suposições atribuídas a fontes em off. Mas a colunista não desiste.

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Na parte televisionada do encontro, a presidente leu um papel sem olhar nos olhos dos convidados. Citou de forma ensaiada um ou outro dos presentes, para afetar alguma intimidade e consideração –o efeito foi nulo, o truque retórico é manjado e não funcionou com o pouco traquejo de Dilma para o improviso. A rigor, nenhuma informação que contribua para entender o encontro.Não explica como olhar nos olhos de 27 convidados. E não explica como soube se o tal truque retórico não funcionou, se não conversou com uma fonte sequer a quem supostamente se dirigiam os truques retóricos.No mundo real, repórteres extraíram um bom conjunto de informações:Estadão – Em seu discurso, a presidente indiretamente reconheceu que o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Eliseu Padilha, na prática, exerce o cargo de Secretário das Relações Institucionais, responsável pela coordenação política e relação com os partidos e parlamentares. Foi ao informar que o ministro Padilha, logo depois, iria relatar aos presentes as propostas que estão no Congresso e poderão ter grande impacto financeiros nas contas públicas.Neste momento, a presidente Dilma cobrou “responsabilidade de todos” no combate às chamadas pautas-bomba que estão para ser votadas. “Como algumas medidas afetam também os Estados, os governadores têm de ter clareza do que está em discussão”, disse a presidente, ao defender a estabilidade fiscal e econômica do País. Dilma lembrou que algumas das medidas ela “assumiu e vetou”, mas que outras “ainda estão em andamento” no Congresso. Por isso, precisava do apoio dos governadores, sugerindo que eles deveriam influenciar as suas bancadas para que não fossem aprovadas.
E, já no finzinho, mandou o recado que os governadores não queriam ouvir: precisa da ajuda deles para barrar a pauta-bomba no Congresso. Pior: insistiu que a crise é uma “travessia”, sem assumir nenhuma responsabilidade pela instabilidade econômica, e repetiu várias vezes que ela atinge “to-dos”, assim mesmo escandido, os governos. Folha –  Em uma fala de pouco mais de trinta minutos, Dilma elencou problemas econômicos que o Brasil enfrenta, segundo ela, desde agosto de 2014, como “o colapso no preço das commodities, a grande desvalorização da moeda, com impacto nos preços e na inflação”. Mas afirmou que “isso não é desculpa para ninguém”. (…) Dilma disse ainda que o governo federal “tem que arcar com a responsabilidade e assumir suas condições” mas, ao mesmo tempo, “algumas medidas afetam os Estados e, portanto, os governadores têm que ter clareza” da situação.
Equivaleu a dizer aos que se abalaram a Brasília: me ajudem a embalar Mateus porque não pari sozinha.Acontece que os governadores pensam o contrário: a crise é do governo federal, que a criou e a agravou. Se Dilma quer ajuda para o ajuste fiscal, algo que muitos estão dispostos a ofertar, deveria pedir especificamente para isso e assumir a responsabilidade que lhe tange, sem tergiversar. O Globo – Preocupados com a situação econômica, que impacta os estados, os governadores se dizem dispostos a colaborar e a discutir uma pauta de interesse nacional. Esperam que sejam consideradas sugestões já feitas para minimizar os efeitos da crise e a abordagem de questões federativas, como a criação do fundo de compensação para a reforma do ICMS, cujo objetivo é acabar com a guerra fiscal.— Acho que esse pacto pode se efetivar com medidas concretas. Essas medidas (reivindicadas pelos estados) apontam para a melhoria do ambiente econômico, o que significa melhora na governabilidade — disse o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB).Estadão – “A União tem de liderar este processo e assumir todas as suas necessidades e condições, ao mesmo tempo, consideramos que, como algumas medidas afetam também os Estados, os governadores têm de ter clareza do que está em discussão.”
Na parte aberta do encontro, no entanto, a presidente passou longe disso. Folha – A presidente não deixou de lembrar que “assumiu” o desgaste de vetar algumas medidas de “grave impacto” nas contas públicas, como o reajuste do salário dos servidores do Judiciário, aprovado em junho pelo Senado, mas ressaltou que há outros projetos em pauta “que terão impacto sobre os Estados sem sombra de dúvida”.
Resta saber se os políticos que faziam reparos ao modelo da reunião nos bastidores terão coragem de explicitar as críticas diante de Dilma, se for dada a palavra a todos. O mais provável é que também eles se atenham a observações genéricas. O Globo – houve ampla discussão sobre a unificação do ICMS, com os governadores apresentando propostas conjuntas.O Globo –  Após o encontro, o governador do Maranhão Flávio Dino (PCdoB), representante da Amazônia Legal, defendeu claramente a “manutenção do mandato” da presidente Dilma. Ele disse que os governadores trataram da crise política:— Uma síntese do que foi tratado por nós foi a preocupação com a agenda política. A defesa clara e inequívoca da estabilidade institucional, da ordem democrática, do Estado de direito e contra qualquer tipo de interrupção das regras constitucionais vigentes. Portanto, a manutenção do mandato legítimo da presidente Dilma Rousseff que foi eleita para cumpri-lo — afirmou o governador maranhense, representando a Amazônia Legal.Ricardo Coutinho (PSB-PB), que representava o Nordeste, falou da importância de evitar a instabilidade política:— O país não pode permanecer, a partir de uma instabilidade política, gerando uma instabilidade econômica, porque o setor produtivo pensa duas, três, quatro vezes em investir sem saber como será o dia de amanhã. Então, para todos, é importante que se resgate a estabilidade, garantindo a governabilidade para quem foi eleito. Como nós governadores, a presidente Dilma foi eleita — declarou.(…)  — Foi um momento importante de diálogo, mesmo porque há muito tempo a presidente não se reúne com os governadores. Nesse momento de crise política foi uma boa oportunidade para passar a limpo uma agenda propositiva para o país — disse o governador de Goiás, Marconi Perillo.
Nesse caso, o encontro terá sido mais uma reunião longa, cansativa e inócua, como aquela de 2013 e tantas outras. Dilma sairá dela tão impopular e desgastada quanto entrou, os governadores voltarão para seus Estados sem recursos e perspectivas de investimentos e a pauta-bomba continuará à espreita quando o Congresso retomar os trabalhos na segunda-feira. O Globo – Vamos trabalhar a pauta que foi apresentada, de estabilidade política, soluções para garantir o crescimento econômico e a garantia que possamos ter uma agenda federativa. Foi uma reunião madura, com bastante serenidade, com uma posição pensando no Brasil – afirmou Wellington Dias (PT), governador do Piauí.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Comentários

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cidadã

Prezado Nassif,
sobre a nova denominação “Jornalismo Espírita” não concordo que seja uma denominação adequada, pois atrela à religião espiríta a uma discussão que nada tem haver com seus dogmas e princípios, basta uma rápida olhada nos comentários . A liberdade de expressão é um direito e uma garantia fundamental, não de somenos importância o cuidado e respeito que devemos ter com as crenças alheias, muito embora acredite que não tenha sido sua intenção atingir nenhum grupo em particular, pois acompanho e respeito seu trabalho, mas interpretações equivocadas certamente surgirão.

Irapuã Arrais

A matéria é de conteúdo importante e serio, só o titulo que não condiz. Afinal existe realmente o “Jornalismo Espirita”, mas não é nesse sentido que foi dado.
Existe uma imprensa Espirita voltada para as temáticas do Espiritismo como Doutrina Religiosa.
O tipo de jornalismo que esta sendo apresentado no artigo é o famoso e antigo “Jornalismo Marrom” que concentra tudo de ruim e podre no jornalismo.
Creio que o titulo não foi apropriado para a questão apresentada.

    Luiz Ernani da Silva

    Concordo com o Irapuã Arrais. Trata-se sim de uma “imprensa marrom” a serviço de interesses do capital estrangeiro que estão loucos para voltar a tomar conta das riquezas de nosso país.

Jadson Oliveira

Caros Azenha e Conceição, contra o “jornalismo espírita”, nova denominação criada pelo Nassif, só mesmo a democratização das concessões de rádio e TV e, principalmente, a construção duma mídia contra-hegemônica. Aproveito para difundir matéria que traduzi (parcialmente) e publiquei ontem no meu blog Evidentemente. Vai aí só uma parte, abraços, Jadson Oliveira

ATILIO BORÓN: NO BRASIL, A PRESIDENTA DILMA ESTÁ REFÉM DA MÍDIA HEGEMÔNICA

Atilio Borón: Os povos devem cuidar para que se faça a democratização dos meios de comunicação

“Quando se enche de calúnias e mentiras a opinião pública em relação às políticas desses governos (progressistas), temos o direito à legítima defesa. Como vamos nos defender se não há uma maneira de alguns dos presidentes da América Latina se comunicarem com sua população?”

“No Brasil – um exemplo – não existe um sistema nacional de televisão pública. A presidenta Dilma Rousseff só pode se comunicar através da Rede Globo. Está como refém dos grandes meios de comunicação”.
Da Agência Pública de Notícias do Equador e Sul-américa – ANDES, de 30/07/2015 (o título principal é deste blog)

Quito, 30 julho (Andes) – Nas comemorações pelos 10 anos da cadeia de TV teleSUR, durante o Congresso Internacional ‘Comunicação e Integração Latino-americana do e para o Sul’, realizado em Quito, o cientista político e sociólogo argentino Atilio Borón conversou com a Andes sobre a necessidade que tem a América Latina de regulamentar os meios de comunicação, de criar novos meios e sobre o intento de reafirmação do império estadunidense na região.
Borón assinala, sobre o aniversário da teleSUR, que a cadeia de televisão tem cumprido um papel fundamental no surgimento duma consciência latino-americana, “que hoje em dia se dá por suposta, como que sempre esteve, mas não é assim”.
“O despertar da consciência tem a ver com o fato de que tivemos um canal de televisão que, pela primeira vez na história, permitiu que as pessoas de diferentes países da região tomem conhecimento do que ocorria nesta parte do mundo a partir das pessoas que falam nosso idioma, que têm nossa cultura e que basicamente compartilham os mesmos interesses”.
Temos que criar meios de comunicação públicos
A direita se fez forte no controle dos sistemas midiáticos porque reconhecem que é uma batalha necessária, sustenta o cientista político. A partir desta perspectiva há uma crítica na região aos países progressistas que estão criando novos meios de comunicação alternativos aos privados. Críticas que – assegura – devem ser rebatidas.
Não se pode negar o direito aos governos progressistas de criar novos meios de comunicação, sobretudo porque têm sido “vítimas duma campanha permanente de estigmatização”. Borón argumenta que o ataque a partir da mídia (hegemônica) a presidentes como Nicolás Maduro – na Venezuela -, Rafael Correa – no Equador -, Evo Morales – na Bolívia – e os demais governantes progressistas da região (cita outros, como Dilma Roussef, do Brasil, e Cristina Kirchner, da Argentina), buscam apresentá-los como “ditadores disfarçados” que tentam destruir a “imprensa livre”. Expressões que nada têm com a realidade.
(…)

FrancoAtirador

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PRESIDENTE DAS ORGANIZAÇÕES GLOBO CONVOCOU
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GOVERNADORES DO PSDB PARA REUNIÃO EM BRASÍLIA
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“Geraldo Alckmin (SP), Beto Richa (PR), Marconi Perillo (GO) e Simão Jatene (PA)
se reuniram na representação do Governo do Estado do Paraná em Brasília.”
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(http://g1.globo.com/politica/blog/blog-do-camarotti/post/alckmin-critica-politica-economica-de-dilma.html)
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Rádio JP (Jabá Paulista)* inicia Campanha Eleitoral de Geraldo Alckmin à Presidência
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(https://youtu.be/_fG7F1YP2-8)
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*(http://www.viomundo.com.br/denuncias/piaui-radio-jovem-pan-recebia-10-mil-reais-por-reportagem-bajulando-o-governo-kassab.html)
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Julio Silveira

Essa mídia, chamada de espirita, na verdade é digestiva e talvez bacteriológica, por que para seu consumo transformam um pais rico e delicioso de se apreciar, num estrume que eles curtem viver.

Angela Simões

As suposições do jornalismo espírita está mais para mesa branco, eles esqueceram de pedir aos governadores que comparecessem todos de branco.

Sidnei Brito

Ouvi falar que Vera Magalhães é casada com Otávio Cabral, aquele que escreveu “biografia” do José Dirceu e que deixou a Veja para trabalhar na campanha de Aécio.
Por favor: digam-se que isso não é verdade.

    Celso

    Na mosca. Todos da mesma “turminha”.

Urbano

O pig não tem o menor compromisso com o jornalismo e, por extensão, com a verdade.

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