Maioridade penal: reflexão para além do senso comum
por Valdir Roque*
“DUAS TRAGÉDIAS ANTES DA TRAGÉDIA: SEM FAMÍLIA, SEM ESCOLA”.
É emblemática a capa do jornal Extra, do Rio de Janeiro, da última sexta-feira, 22. Parabenizo o jornal por ir além do senso comum e jogar luz, reflexão, a um debate no qual tem gritado alto as vozes do ódio, do simplismo, da busca por audiência ou voto a qualquer custo.
A mídia tenta tornar um adolescente que cometeu um crime bárbaro e, claro, passível de punição, o símbolo da luta pela redução da maioridade penal. Mas, é importante ressaltar que, geralmente, quando um jovem comete tal atrocidade, já foi ele vítima de várias outras tragédias ao longo de sua curta vida. Geralmente ele não teve oportunidade de ter acesso sequer ao sonho de uma vida melhor, já que muitas vezes estão fora da escola, estão abandonados pela família e pela sociedade.
Nossa mídia clama por encarcerar nossos jovens que, se erram, devem, sim, ser punidos, claro. Mas não estimula um debate profundo sobre a redução da maioridade penal. Por isso a capa do Extra é um alento. Será que o Estado Brasileiro está cumprindo com o seu papel com as nossas crianças e jovens? Será que os direitos estabelecidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estão sendo cumpridos?
A a capa do jornal Extra e a declaração do delegado responsável pelo caso, Rivaldo Barbosa, ao jornal O Dia, deixam claro: assim como muitos outros adolescentes que cometem crimes, este adolescente que infelizmente assassinou um inocente na Lagoa Rodrigo de Freitas, Rio de Janeiro, também é uma vítima. Disse o delegado: “Se as pessoas virem o local onde ele mora, vão entender o problema social”.
Entendo as pessoas que defendem a redução da maioridade penal. Afinal, à primeira vista, e diante de tanto apelo de Datena, Marcelo Rezende e cia. parece ser uma fórmula fácil para reduzir a violência. Mas é preciso ir mais longe neste debate. Mais importante do que clamar pela redução da maioridade penal, é lutar para tirar nossos jovens da tragédia social na qual muitos estão inseridos. A tragédia social é fator fundamental para os alarmantes índices de violência.
O Conselho Regional de Psicologia de São Paulo já se posicionou contra a redução da maioridade penal, alegando que crianças e adolescentes são “pessoas em desenvolvimento, o que as coloca em um patamar especial, devendo ser alvos de políticas de proteção e promoção de saúde, educação e lazer, entre outros direitos, com total prioridade sobre outras demandas sociais”.
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Hoje se discute a redução da maioridade de 18 para 16 anos. Ao se fichar um adolescente já desde os 16 anos diminui-se suas chances de reinserção ou inclusão social, já que infelizmente ainda há diversas barreiras para a contratação de ex-detentos no mercado de trabalho. Quem não teve ou ouviu falar de quem teve de apresentar atestado de antecedentes criminais na hora da contratação para um trabalho?
Além disso, o adolescente, em um momento de autoafirmação, tende a aprender muito mais coisas erradas ao lado de detentos mais velhos, com mais experiência no mundo do crime, do que em instituições focadas na ressocialização do menor infrator, como a Fundação Casa, em São Paulo, por mais deficiências que esta possa ter – este é assunto para outro debate.
E se, ou melhor, quando, a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos não funcionasse, qual seria a saída? Baixar para 14 anos, 12 anos, 10 anos? Como bem disse a presidente da Fundação Casa, Berenice Gianela, esta semana, ao portal El País Brasil: “se a maioridade penal baixar, o crime recrutará menores menores”. Até onde iremos nessa sanha?
Também é importante frisar a questão social. O pobre, o excluído, como o menino abandonado pelo pai e pela mãe, que vive nas ruas, ou cujos pais são dependentes químicos, ou que vivem em situação de extrema pobreza, não têm condições de dispor de bons advogados, não tem família influente…
Por que não se pediu redução da maioridade quando um menor de idade de classe média ajudou a atear fogo no índio Galdino, em 1997? Por que não se pediu redução da maioridade penal quando o filho menor de idade de um diretor poderoso da RBS, afilhada da Rede Globo, assumiu ter estuprado uma garota de 13 anos, em 2010?
Boa parte dos defensores da redução da maioridade penal usam discursos vagos, de ódio, para disfarçar seu objetivo maior, de encarcerar pobres. Reduziremos a maioridade penal até ponto de que quem nascer pobre, em situações de exclusão, já vai direto para a cadeia?
Em minhas visitas a diversas comunidades, me deparo com situações de vida no limite, de condições que infelizmente ainda estão muito abaixo do que gostaríamos que as pessoas vivessem.
Em vez de lutar para encarcerar nossos jovens, temos de lutar para que ele tenha condições adequadas para estudar, seja na escola pública ou em casa, onde muitas vezes não há prazer em se ficar porque corre esgoto nas paredes do quarto, porque corre rato por todo canto, porque não há o mínimo de conforto.
Em vez de lutar para encarcerar nossos jovens, temos de lutar para que ele tenha acesso à cultura, ao esporte, ao lazer antes que o tráfico, as drogas, o crime, os seduzam.
Em vez de lutar para encarcerar nossos jovens, temos de lutar para garantir para que nossos jovens tenham acesso aos direitos que lhes vêm sendo negados.
Apesar da boa vontade de muitos e do oportunismo de outros, o fato é que a redução da maioridade penal não é, nem nunca será, solução para o enfrentamento de nenhum tipo de violência.
*Vereador, líder da Bancada do PT na Câmara Municipal de Osasco.
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Comentários
lulipe
Que bonitinho…Quer dizer que a solução é deixar esses “jovens” livres para matar, roubar, estuprar, barbarizar e cometer todo tipo de crime?? A esquerda sempre viu e vê nos criminosos qualidades inexistentes, para ela existe uma aura de romantismo em quem corrompe ou é corrompido, em quem mata com requintes de crueldade, quem comete um estupro, ou queima alguém vivo, não é à toa que ainda veneral assassinos como Lênin, Stálin, Che Guevara, Mao e tantos outros…
Marat
Os jovens brancos, de classe média ou alta, que queimam índios ou mendigos nunca serão molestados pela justiça!
PAULO FERREIRA
essa lembrança foi tão pertinente, que até me deu uma dor no estomago
Marat
A sociedade-Datena é realmente boçal e estúpida… O PT tem parte de culpa, ao não priorizar altos salários para os professores (eles fazem o que os pais não fazem, educar). O PSDB-SP é mais eficiente: corrupto, safado, ladrão e incompetente, mas comprou a impren$$$a e o judi$$$iário!
Julio Silveira
Cidadão Marat, concordo com tudo que diz, mas discordo da intenção dela, por ser uma critica a ideia da redução da maioridade penal. No meu entendimento meu caro, que provenho de uma familia pobre, ou melhor probrissima, para vc ter uma ideia meu paí (já falecido) começou aos 8 anos, junto com seu irmão de onze, a trabalhar vendendo pão, carregando cesto, por que minha avó saia a oferecê-los aos comerciantes para conseguirem ocupação, por que sabia ela criaria a cultura da responsabilidade neles, e ainda os ajudariam na sobrevivencia. Cresceram responsaveis, trabalhadores e mesmo pobres sairam da miséria que viviam. Meus primos, já na minha geração, chegaram a vender bala no trem, nunca roubaram, nunca usaram droga, uma coisa que no nosso tempo já era forte. Cresceram com consciencia e sensibilidade, cidadãos. Um hoje é empresário, com filho advogado, outro virou militar, enfim, todos nós, apesar das vicissitudes de uma familia de origem super pobres, aprendemos desde cedo a entender que podemos e devemos nos responsabilizar por nós, e se não por nossos semelhantes, por nossa familia, emprendo-lhes dignidade e respeito. Ideal seria que não houvesse necessidade desse aperto legal, mas vejo como uma consequencia, uma evolução as tantas liberalidades que são consentidas na atual “educação” familiar, cada vez mais omissa e irresponsavel, e digo isso com a consciência de um homem de familia e pai.
Para mim é normal algum anteparo legal ter que ser promovido para nivelar as coisas que são omissas nessa relação cidadão sociedade. Quando a irresponsabilidade, a inconsequencia, o despreparo, e até o desprezo a ptopria cidadania se torna cultura caba ao estado promover ajustes. Aquele que faz a sua parte na sociedade não deve pagar pelo que não faz, por que isso é injusto e a função do estado é promover justiça e indicar um caminho cultural as familias, não ocupar o papel dela. A visão de muitos esquerdistas é quase de cumplicidade com a criminalidade que fruto da inconsequência e da falta de noção reinante no país, essa que produz esse tipo de cidadania que não queremos mas estimulamos, dessa visão eu discordo. Sds
Joao
Sera, ao menos, que nao deveriamos enrigecer as penas para o albergamento compulsorio? Promovendo mais tempo de internacao e consequentemente uma melhor recuperacao do infrator? Parece que esse discurso da exclusao social para justificar a manutencao do estado das coisas ja nao cabe mais. Nao tenho clareza para justificar a reducao da maioridade penal, mas muito menos para defender este tipo de abordagem do ECA. A pena para crimes graves deve ser a restricao da liberdade, pois nao ha justificativa social cabivel para o contrario. Agora se a abordagem do estado tiver um vies de recuperacao para reinserir na sociedade este individuo, e promover acoes eficazes em vez de um faz de contas, melhor… Mas nao pode ser uma ou outra coisa, ambas se completam, e o que a sociedade espera dos nossos legisladores, é que tambem tenham essa clareza..
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