Fátima Oliveira, as meninas danadinhas e os quilombolas

Tempo de leitura: 7 min

É cantar “Chora boi da Lua” pelos quilombolas…

por Fátima Oliveira, no blog Talubrinando

– A Branca não deixa nem a gente brincar o São João sossegada, c’os diachos! Cê viu Estela o que saiu no jornal da famiglia?

–…

– Nããããão? Pois escute que vou ler, afe! Como a Branca se acha! Saiu no Estado Maior, a parte destinada às coisas mais importantes do jornal lá do outro lado da ponte: “Roseana diz a ministras que MA tem governo – A governadora Roseana Sarney teve ontem dura conversa com as ministras que vieram a São Luís se reunir com quilombolas que cobram demarcação de áreas. O grupo foi direto do aeroporto para o Incra, quando deveria ter ido primeiro ao Palácio dos Leões” (Estado Maior, Jornal Estado do Maranhão, 23.06.2011).

– Não entendi! Se as ministras foram chamadas pelos quilombolas e vieram para uma reunião com eles, por que primeiro precisam de tomar a benção à governadora?

– Imagina! Eu não saio daqui sem descobrir essa historia timtim por timtim… Ou não me chamo Lô! Tenho minhas fontes confiáveis. Mas pelo andar da carruagem…

–…

– Quiquêisso Estela! Que carruagem de Ana Jansen, menina?! Qual nada, a dela é também uma miragem. Pura arrotação de poder! Como eu ia dizendo… Se as ministras vieram em socorro dos quilombolas, quem cuida da agenda delas escorregou na casca de banana… Primeiramente era ouvi-los, pois não? Foram primeira e unicamente convidadas/chamadas por eles. Ou estou enganada? Não foi a governadora quem convidou as ministras. Foram os quilombolas!

Então, primeiramente atender a quem chamou; e só depois acunhar a Branca que, ela sim, tem responsabilidade no cartório por esse estado de coisas! Acontece que na mexida dos pauzinhos no Planalto pra branca não sair mal na fita, advinha queeeeeeeeeeem deu a mexidinha básica? Papai, claro, que ali é homem que tem poder, c’os diachos!

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– …

– Foi concertada uma agenda oficial com o Palácio dos Leões, como se a Branca estivesse chamando e dando uma dura no governo federal. Tudo pra não ficar feio demais pra ela! Um baita erro, mas foi concertado pelos gabinetes das três ministras. Errado? Erradíssimo, mas era pra cumprir, como manda o figurino do Pacto Federativo, já que houve quem concordou com a encenação.  Eita povo que gosta dum teatro, minha gente!

– E as meninas danadinhas não cumpriram! – Que meninas Estela?

– Desculpe-me Dindinha, é que como eu as conheço há trocentos anos, pelo menos duas delas, daí a intimidade… As meninas, quer dizer: as ministras Maria do Rosário (Direitos Humanos), Luiza Bairros (Promoção da Igualdade Racial) e Márcia Quadrado (Desenvolvimento Agrário).

– Pois bem, antes dos salameleques com a governadora, foram ter com os quilombolas. Pra quê? A Branca subiu nas tamancas, que aquilo é terrível, birrenta, mimada e gosta dum barulho que só ela! Sabe que a melhor defesa é o ataque e resolveu levar as ministras às cordas. E deu no que deu. Criou uma cortina de fumaça e saiu por cima da carne seca. E não se falou mais no assunto que as ministras estavam ali porque a Branca não deu conta de fazer o que deve… E não se fala mais nisso! Só que ela engrossou o gogó pras ministras e os puxa-útero de plantão estão no maior acezume porque as ministras ainda tiveram de pedir desculpas, por uma questão de educação e de rigidez do protocolo do pacto federativo, que a Branca invocou, pois ela não é nem um tico burra. Ai que ódio!

– Ora, ter de pedir desculpas à Rosengana, é dose, mas fazer o que, não é? Bem que elas poderiam ter dito que nessa história toda quem tem de pedir perdão é ela, a governadora, aos quilombolas. Mas deixa pra lá…

– Olha só o que madame disse: “Aqui tem governadora, tem comando e eu exijo respeito. Duvido se vocês fossem para outro Estado não iriam primeiro falar com o governador?! Faço questão de protestar porque não admito e não aceito este tipo de coisa. Sou da base do governo Dilma e meu governo é aberto a sem-terra, quilombolas e movimentos sociais”.

– O quê? Dindinha é preciso carradas e carradas de óleo de peroba! O pai dela foi governador; ela está no governo pela terceira vez (ou é quarta?) e há quilombolas no Maranhão não é desde ontem, não! E pucardiquê nunca se importaram com a sina dessa gente sofredora e lutadora?

– Ora se é! Mas dizem que o que está por trás da irritação também é a ciumeira do clã com o governador de Pernambuco. Falando no pai dela, tá por aqui. Eles não faltam  nessas festas mais importantes do Maranhão, coisa de sabedoria política mesmo: “Quem não é visto não é lembrado”. Ainda bem que eu não estava aqui ontem minha rosa, porque teria topado com essa gente. Lembra que os encontrei no Carnaval?

– Hemhem…

– O cara é senador do Amapá, de estar lá com o povo que o elegeu, não! A desculpa agora para estar aqui sabe qual foi? Receber uma comenda da Polícia Militar do Maranhão, feita sob medida para a família. Espia só o que está no jornal deles: “A Comenda Gran Cruz Hermelindo Castelo Branco, a maior honraria do Mérito do Alto Comando. O senador é a segunda pessoa a receber a homenagem. Além dele, só a governadora Roseana Sarney possui a comenda”. Aguentar quem há de?

– Dindinha eu fico besta como é que a senhora que vive entonada naquele mato sabe de tanta coisa que parece que tá é aboletada, direto e reto, em Brasília, viiiiixe Maria!

– Mistérios de Dona Lô Estela! Se conforme. Tenho minhas fontes. Há um zumzumzum que a famiglia, pra demonstrar poder, queria por queria trazer Dilma a São Luís para os festejos juninos. Mexe daqui, dacolá, mas os quilombolas, felizmente, melaram a festa junina do clã com direito a fotografia com a presidenta e o escambau…

– Como Dilma viria festejar São João com a governadora com os quilombolas acampados no Incra, protestando contra a violência no campo e a demora na titulação de áreas remanescentes de quilombos? Pra isso o Maranhão não tem governo, não é?

– Hemhem Estela. Já pensou? Ficaram lá de prontidão, cerca de quarenta comunidades remanescentes de quilombos, durante 12 dias! E também, “20 pessoas ameaçadas de morte realizaram greve de fome por pouco mais de 24 horas”. E mais, exigiram a presença das ministras! Ô Estela, não estava sabendo disso, não?

– Saber eu sabia, mas não tinha essa dimensão e a riqueza de detalhes que a senhora está dizendo…

– Pois bem, diante desses desacertos todos, da Branca é claro, o ocorrido é que Dilma foi prestigiar o São João de Pernambuco, em Caruaru, na quarta-feira, dia 22… E tá Eduardo Campos lá todo porloche… Não sei muito bem como está tocando o governo. Não deve ser nenhuma brastemp, mas pelo menos não tem acampamento de quilombola nas fuças e clamando por uma medida de Brasília, né não?

– Quer dizer então que a Branca depois da brigaiada com as ministras, à noite estava no Arraial da Lagoa da Jansen sendo homenageada pelos Bois de Axixá e da Maioba… Foi o que ouvi hoje na televisão… Se bem que o arraial lá é feito pela Liga Independente do Bumba-meu-boi do Maranhão, com o patrocínio do governo do Estado.  Tudo em casa. Os cabras têm de homenageá-la! Um acinte! Os quilombolas no maior sufoco e essa gente pegar uma coisa assim que é patrimônio cultural original dos negros, pelo menos aqui no Maranhão é, e louvar a Branca! Sabia Estela que se não fosse a teimosia dos negros não haveria bumba-meu-boi? Pois é, teve um bom tempo em que era proibido brincar boi (1861 ou 1868 até 1960) e a polícia prendia na hora os brincantes!

– Eu não sabia!

– Como os bois eram mais de áreas suburbanas e rurais da Ilha e não havia polícia que vencesse os batalhões de boi, proibiram apenas de entrar na área central de São Luís, mas eis que o presidente João Goulart, numa visita a São Luís assistiu a uma apresentação de bumba-meu-boi e ficou deslumbrado, afrouxaram a proibição… Depois de um século!

– …

– Espie só a manchete: “Governadora Roseana é recebida com festa por brincantes de boi no Arraial da Lagoa”.  O certo é que o Jornal Pequeno de hoje tascou: “Governo federal promete plano doações a quilombolas do Maranhão”. Ué, o Maranhão tem governo, não?! Matéria boa! Foi preciso as meninas danadinhas aqui pra sair uma promessa de  plano! Promessa, viu Estela? Mas saindo da boca daquelas ministras eu boto fé. E não vai demorar, jazim, jazim vai sair…

– Dindinha, “O que não tem remédio, remediado está”… Você foi pra São Luís se distrair. Aproveite a diversão, senhora! E a viagem, como foi?

– Mas enfim, o que sucede é que minha viagem foi muito boa, tirante essa raiva bem cedo ao abrir os jornais lá no aeroporto. Já conversei com comadre Fabiana e estamos acertando um programa junino do nosso jeito. Não está fácil. Há arraial pra tudo quanto é lado. Era fácil no tempo em que tudo isso acontecia na Praça Deodoro e até depois no Parque do Folclore. Mas agora, a cidade ferve por tudo quanto é canto. Arraial, arraial a perder de vista: o Arraial da Lagoa da Jansen; o Arraial do São Luís Shopping, que agora se chama Vila Junina, patrocinado pela TV Globo do Maranhão; o Arraial da Maria Aragão; o Arraial do Ceprama, alí na Madre Deus… E não é fácil escolher…

– …

– Quero ver especialmente o Bumba-meu-boi de Nina Rodrigues, que será hoje à noite, o de Guimarães, o do Pindaré, o de Axixá, o de Cururupu, o de Morros, o de Rosário, o Boi da Lua, o da Madre Deus, o Boizinho Barrica, o Boi Pirilampo… Claro que também estamos programando apreciar tambor de criola, cacuriá, lelê, caroço, dança do coco, dança da fita, quadrilhas, uns grupos de danças portugueses, coisa que está tendo muita. Vamos sair todas as noites, com exceção do dia 25, que é a quadrilha da mãe de comadre Fabiana, que rola festa a noite toda.

– Viiiixe, é um mix de sotaques… Pensei que a senhora gostasse só de sotaque de matacra e de orquestra…

– E era, mas depois fui aprendendo a beleza de cada sotaque e hoje sou apaixonada por todos eles. Foi toada de boi, tô dentro! Não há dúvida, bumba-meu-boi é uma ópera. As toadas são sempre magníficas. Muitas se eternizam, como Boi da Lua, Boi de Lágrimas, Bela Mocidade…

– É verdade!

– Falando nisso, acho que vou levar lá pra Matinha um boi de Cururupu, que é de sotaque de costa de mão. É diferente e bonito de doer; e se a gente não adjutorar para cuidar vai acabar… É preciso divulgar mais esse sotaque. No ano passado levamos um sotaque de orquestra. Mamãe já havia levado sotaque de zabumba, que é o ritmo original do bumba-meu boi… Tá nora de levar outro. Já sei, vou fazer assim: cada ano um sotaque. O que achas, hein Estela? Pergunte também a Cesinha, viu? Ele é paridinho por sotaque de zabumba. Aprendeu com mamãe, que adorava! Já papai se amarrava num sotaque de orquestra. E pior, não gostava dos outros ritmos.

– …

– Está bem querida! Deixe que vou descontar tanta raiva, porque essa gente não merece nem a minha raiva, me esbaldando de tanto catar as minhas toadas de boi prediletas: “Chora Boi da Lua”, “Boi de Lágrimas” e “Bela Mocidade”…

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Comentários

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Luci

Fátima quer dizer que a Branca comprou o Boi!
Fátima que enrolação danada é esta do professor Cloves da Universidade Federal do Maranhão que destratou o aluno nigeriano Nuhu?

Luci

A Branca exerce seu dominio, poder, aquel dos colonizadores. Visistei o Maranhão e não volto nunca mais, não pelo povo maravilhoso pela exclusão a que estão submetidos visível e dolorosa.
Parabéns Fátima por demonstrar como a democracia ainda não chegou a determinados lugares do Brasilm para os Quilombolas esta é a cruel realidade.

Mari

Dizem que Dilma não gostou da reprimenda pública que Roseana deu nas meninas danadinhas.
Rescaldo da anajancise da Branca: um pedido de desculpas a Dilma pelo rapapé da filha (é o que corre à boca miúda em Braísilia:
27/06/2011 – 12h28
Sarney recua e defende artigo que mantém sigilo em obras da Copa
GABRIELA GUERREIRO
E BRASÍLIA
Depois de defender o veto ao artigo da medida provisória que mantém em segredo orçamentos para as obras da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada do Rio em 2016, o senador José Sarney (PMDB-AP) recuou nesta segunda-feira e passou a defender o artigo. Sarney disse que, depois de analisar o projeto, percebeu que "não há dispositivo de sigilo" no texto.

Hélio Augusto

Boi da lua é uma das toadas clássicas e mais prestigiadas do bumba-meu-boi, ao lado das outras duas que Fátima Oliveira citou: Bela Mocidade e Boi de Lágrimas.
BOI DA LUA
Carlos César Teixeira

Meu São João…

Meu São João, meu São João…

Eu vim pagar a promessa
De trazer esse boizinho
Para alegrar sua festa
Olhos de papel de seda
Com uma estrela na testa…
Olhos de papel de seda
Com uma estrela na testa…

Meu São João…

Meu São João, meu São João…

Eu vim pagar a promessa
De trazer esse boizinho
Para alegrar sua festa
Olhos de papel de seda
Com uma estrela na testa…
Olhos de papel de seda
Com uma estrela na testa…

Chora, chora…

Chora Boi da Lua
Vem pedir uma esmola
Praquela boneca de anil
Mamãe eu vi Boi da Lua dançar no planeta do Brasil…
Mamãe eu vi Boi da Lua dançar no planeta do Brasil…

Para ouvir:
Boi da lua: http://youtu.be/4c9UVA4CJ1Y
Bela Mocidade: http://youtu.be/OcQYMEOJ2pM
Boi de Lágrimas: http://youtu.be/KCqMBs1_GfQ

Hélio Augusto

Não que a autora não tenha razão em seus argumentos, até tem em praticamente todos os ângulos, mas eu os achei excessivamente caústicos, beirando à falta de educação. Tanto quanto o comportamento da governadora com as ministras. Por outro lado há ques e destacar que a autora é criativa e escreve muito bem. Tem uma narrativa dinâmica e gostosa. De todo modo a governadora foi eleita pelo voto popular, merece respeito.

    Marcelo Bacelar

    Qual é, Hélio Augusto? Qual falta de edcuação, a da governadora mimadinha, filhinha de papai? E ainda apelou para o fatod e que era mulher como a sministras. De certeza se achando discriminada.

Mari

E pensar no poder dessa gente no Governo Dilma. é de amargar

Hilton Neves

Um texto literário pra lá de divertido. Admiro quem faz ficção a partir da realidade. Isso é uma arte. Parabéns Fátima Oliveira, pois sua personagem Dona Lô é espetacular. Quanto à Branca só posso dizer que ela é ridícula em sua arrogância sem limites

Urbano

Pelo "Chora boi da lua", minha opinião é a de que a pessoa mais importante no Maranhão é o Papeti.

Sérgio Arce Gomez

Corrigindo: Parodiando Porfirio Diaz (nâo Paschoal Orozco): "Pobre Maranhão. Tão longe de Deus e tão perto dos Sarneys.

Sérgio Arce Gomez

Parodiando Pasqual Orozco: "Pobre Marãnhão. Tão perto dos sarneys e tão longe de Deus".

Daniela

Estou pasma com esse estrelismo da nossa governadora. Deixo claro que nunca votei nela. Ainda bem que estou de alma lavada com a matéria aqui postada e já estava muito triste porque não havia lido nada na imprensa maranhense que dissecasse esse escarcéu dessa legítima herdeira de Ana Jansen. A minha pergunta é se ela se arvorou de cantar de galo por que uma da sministras era negra e ela deve ter confundido com as mulheres negras que são suas serviçais, já que na cabeça de BRANCO negro só pode ser subalterno. É um caso a se pensar. E muito mesmo.

Josélio Brandão

A Branca teve um ataque de dona de capitania hereditária. Bem pior do que um ataque de anajansismo, que er asó rica e poderosa. A Branca acha que é dona do curral chamado Maranhão.
O apelido de Branca para se referir à Roseana Sarney é muito usado aqui no Maranhão. Com razão. Branca como sinônimo d epoder, de poderosa, mandona.
Por ser um Estado com expressiva população negra e que sempre foi governado por brancos e onde os brancos até hoje ocupam praticamente todos os espaços de poder, vide exemplo da família Vitorino Freire (1945 – 1964), derrotada por Sarney, que nunca mais saiu do poder, desde 1965, mandando no governo do Maranhão.

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