Tribunal cassa liminar que suspendia leilões do pré-sal; litro de petróleo vai ser entregue por 1 centavo às multinacionais

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Da Redação

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região cassou na manhã desta sexta-feira (27/10), a liminar concedida ontem pelo juiz Ricardo Augusto de Sales, da 3ª Vara  Federal Cível  da Seção Judiciária do Estado do Amazonas, suspendendo os leilões do pré-sal marcados para hoje.

O TRF1 acatou o recurso da Advogacia Geral da União (AGU).

O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, disse à agência Reuters, que só espera a publicação da decisão para iniciar os leilões.

Desde quarta-feira (25/10), foram ajuizadas em todos o País várias ações civis públicas visando à suspensão dos dois leilões simultâneos do pré-sal previstos para esta sexta, 27 de outubro de 2017.

Segundo o advogado Cláudio Nicotti, a decisão liminar (na íntegra, ao final) do juiz de Manaus, agora cassada, foi no ponto-chave da ação: o vício de iniciativa. Os leilões são com base na lei 13.13.365, originada no projeto de lei 131, do senador José Serra (PSDB), que alterou o marco regulatório do petróleo. E tal mudança só poderia ser feita pela presidência da República.

Mas nem tudo está perdido ainda.

Uma outra decisão importante foi tomada pelo juiz federal substituto da 13ª Vara/DF, em resposta ação popular do senador Roberto Requião (PMDB-PR).

Ele não concedeu a liminar. Porém, afirma no corpo de sua decisão que, mesmo saindo os leilões, os contratos ainda não terão sido assinados e dependem de regras que só terão eficácia a partir de dezembro. Ou seja, poderão ser anulados.

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Alegou que a matéria é extremamente complexa e que se sentirá melhor ouvindo as duas partes. Diz que julgará imediatamente a ação logo vença o prazo dado à União:

Dada, pois, a altíssima complexidade técnica dos temas aqui versados, relacionados à outorga de contratos de partilha de produção para exercício das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, reputo recomendável a adoção de postura de maior autocontenção face a decisões administrativas deste jaez, nomeadamente quando ausentes, como no presente caso, dados e circunstâncias bastantes a evidenciar as irregularidades apontadas.

(…)

De todo modo, não vislumbro risco de perecimento do direito ou de irreversibilidade da medida, pois o pagamento do bônus de assinatura e a própria assinatura dos contratos de partilha de produção estão previstos para conclusão apenas no mês de dezembro deste ano (fl. 327 – rolagem única).

Tais as razões, INDEFIRO o pedido liminar, sem prejuízo de reapreciação do pleito após o oferecimento da contestação.

Treze petroleiras estrangeiras estão na disputa de 7.977 quilômetros quadrados de reservatórios distribuídos em oito grandes campos de pré-sal nas bacias de Santos (SP) e Campos (RJ). Eles contêm, pelo menos, 12 bilhões de barris de petróleo de altíssima qualidade.

O governo usurpador de Michel Temer espera arrecadar R$ 7,75 bilhões em bônus de assinatura com as duas rodadas.

Isso significa que o barril de petróleo custará às multinacionais menos de R$ 1,50.

“Vão entregar por um preço menor que o de uma garrafinha de refrigerante”, denuncia José Maria Rangel, coordenador da Federação Única dos Petroleiros (FUP).

Como cada barril contém 159 litros de petróleo, o litro sairá por um centavo.

“As petroleiras estrangeiras vão  levar o nosso petróleo  e ainda teremos que importar derivados a um custo muito mais alto”, alerta José Maria.

Além disso, os percentuais mínimos que as petrolíferas terão que ofertar em excedentes de óleo à União são menos da metade do que foi estipulado para o leilão de Libra, em 2013. Os valores estabelecidos nos editais das 2ª e 3ª Rodadas variam entre 12,98 % e 22,08%.

No leilão de Libra, o percentual foi de 41,65%. Ou seja, além de colocar em xeque a soberania do país, o governo ainda privilegia as multinacionais, abrindo mão dos recursos que garantiria com maiores excedentes do petróleo.

Seção  Judiciária do Estado do Amazonas

3ª Vara  Federal Cível  da SJAM

PROCESSO: 1002469-44.2017.4.01.3200

CLASSE: AÇÃO POPULAR (66)

AUTOR: WALLACE BYLL PINTO MONTEIRO

RÉU: AGENCIA NACIONAL DO PETROLEO, GAS NATURAL E BIOCOMBUSTIVEIS, PETROLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS

DECISÃO

Não se visualiza prevenção em relação ao processo relacionado pelo sistema; razão pela qual deve ser dado prosseguimento ao feito.

Trata-se de ação popular proposta por WALLACE BYLL PINTO MONTEIRO contra a AGENCIA NACIONAL DO PETROLEO, GAS NATURAL E BIOCOMBUSTIVEIS e a PETROLEO BRASILEIRO SA – PETROBRAS, objetivando que seja liminarmente declarada, incidenter tantum, a inconstitucionalidade formal da Lei n.13.365/2016, que alterou grande parte da engenharia institucional montada pela Lei n.12.351/2010, e sejam tornados nulos os Editais da segunda e terceira rodadas de licitações de partilha de produção, publicados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, em 23 de Agosto de 2017, requerendo ainda que seja determinada a suspensão  de  todos  os  procedimentos  previstos  nos  mesmos  e,  consequentemente  a  declaração  de nulidade de todos os atos praticados decorrentes do ato administrativo eivado de inconstitucionalidade.

O requerente aduz que, em 23 de agosto de 2017, foi publicado o Edital da Segunda Rodada de Licitações de Partilha de Produção; bem como publicado o Edital da Terceira Rodada de Licitações de Partilha de Produção – cujo objeto é a “OUTORGA DOS CONTRATOS DE PARTILHA DE PRODUÇÃO PARA ATIVIDADES DE EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL”.

Alega que essas licitações ocorrerão no dia 27 de outubro de 2017, com previsão de assinatura do contrato de partilha de produção em dezembro de 2017.

Aponta que o Edital define as normas que deverão ser obedecidas por todas as interessadas em participar  da  3ª  Rodada  de  Licitações  de  Partilha  de  Produção  e  foi  elaborado  de  acordo  com  as disposições pertinentes, dentre as quais a Lei n.º 9.478/97, a Lei n.º 12.351/2010, a Lei n.º 13.365/2016, a Resolução ANP n.º 24/2013, a Resolução CNPE nº 9/2017, o Decreto nº 9.041/2017, Resolução CNPE nº

7/2017, Resolução CNPE nº 13/2017, as quais devem ser consultadas e observadas.

Assevera que a Lei n.13.365/2016 promoveu uma radical alteração na Lei n.12.351/2010, na medida em que retira, da Petrobrás, a atuação como operadora única dos campos do pré-sal, com uma participação de pelo menos 30%, além de deixar de ser a única empresa responsável pela condução e execução,  direta  ou  indireta,  de  todas  as  atividades  de  exploração,  avaliação,  desenvolvimento  e produção.

Descreve que a aprovação da Lei n.13.365/2016, que trouxe uma radical alteração no campo material e procedimental, não respeitou o processo legislativo regular, ocorrendo a violação direta à Constituição, em razão do vício de iniciativa.

Sustenta o autor a violação ao princípio da separação de Poderes (art. 2º), não observância das competências privativas do Presidente da República e dos Ministros de Estado (art. 84, incisos I, II e III, c/c o art. 87 da CF) e a violação a soberania popular (art. 1º, parágrafo único, da CF), quando do processo legislativo que culminou na Lei n.13.365/2016.

Afirma que a “realização de leilões com base nos editais combatidos por esta ação implica séria lesão ao patrimônio público tanto por perda de receita tributária, como por decisão governamental de abdicar de explorar suas reservas de petróleo para desenvolvimento da indústria nacional e geração de emprego e renda para os brasileiros”.

Argumenta que houve violação ao princípio republicano (art.1º da CF) e o “Leilão do Pré-Sal colocará em risco a segurança jurídica que tanto afirma querer preservar”.

Acompanharam  a  inicial  os  documentos  de  ID  n.3259946,  3259954,  3259978,  3259993,

3260001, 3260012 e 3260067.

Manifestação  da  ANP,  acompanhada  de  documentos  (ID  n.3268592,  3268627,  3268636, 3268640, 3268642, 3268649, 3268653 e 3268674).

É o sucinto relatório. Decido.

Inicialmente destaca-se que será imediatamente analisado o pedido de tutela provisória ante a evidente urgência do caso, considerando a realização de leilão na data de 27/10/2017, o qual poderá acarretar – de acordo com as argumentações do autor – potenciais danos irreparáveis ao patrimônio público, bem como violação ao ordenamento jurídico. Destaca-se que a ocorrência de eventual conexão será apreciada após assegurado o contraditório, tendo em vista que a documentação apresentada pela parte requerida foi produzida unilateralmente pelo ente público peticionante.

Ademais, reconhece-se desde já a legitimidade passiva da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, tendo em vista que a mesma, por força da Lei n.9.487/97, tem por finalidade principal “promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis (…)”, assim como tem por obrigação fomentar a política nacional de petróleo, gás natural e biocombustíveis, nos termos da política energética nacional prevista no Capítulo I da lei supramencionada.

Corroborando o acima exposto, identifica-se que os incisos do artigo supra citado descrevem como função da autarquia federal (ANP) as atividades de estocagem, comercialização e distribuição dos biocombustíveis, inclusive no pertinente às contratações dos agentes de mercado operadores dessas atividades, devem passar obrigatoriamente pelo crivo e fiscalização da ANP.

Portanto, considerando que a presente demanda versa sobre a alienação de cotas em campos petrolíferos do Pré-Sal, com valor econômico imensurável, identifica-se evidente interesse da ANP como órgão regulador da política energética nacional, uma vez que esse procedimento envolve, de forma direta, várias das suas atribuições legais.

Importante frisar, desde logo, que a tutela provisória – como a pretendida pelo autor da ação popular – consiste em medida excepcional, não em regra, e, para seu deferimento, constituem condições indispensáveis a existência da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e o perigo de dano (periculum in mora), para que se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produção de efeitos concretos do provimento jurisdicional principal.

Baseado neste norte, deve-se observar, como — mediante acuidade — obtempera ANTONIO CARLOS CINTRA et alii que:

“Assim,  a  garantia  cautelar  surge,  como  posta  a  serviço  da  ulterior atividade jurisdicional, que deverá restabelecer, definitivamente, a observância do direito: é destinada não tanto a fazer justiça, como a dar tempo a que a justiça seja feita.” (“Teoria geral do processo.” 11ª edição, Malheiros Editores, São Paulo, 1995. p. 318)

De igual sentir, são do jurisconsulto mineiro HUMBERTO THEODORO JÚNIOR  essas palavras:

“O  provimento  judicial  definitivo  não  pode  ser  ministrado instantaneamente. A composição do conflito de interesses, através do processo, só é atingida mediante a seqüência de vários atos essenciais que enseja a plena defesa dos interesses das partes e propicia ao julgador a formação de convencimento acerca da melhor solução da lide, extraído do contato com as partes e com os demais elementos do processo. (…) É indubitável, porém, que o transcurso do tempo exigido pela tramitação processual pode acarretar ou ensejar variações irremediáveis não só nas coisas como nas pessoas e relações jurídicas substanciais envolvidas no litígio, como, por exemplo, a deterioração, o desvio, a morte, a alienação,etc.”  (THEODORO JÚNIOR, Humberto. “Processo cautelar”. 11ª edição, Livraria e Editora Universitária de Direito, São Paulo, pp. 39/40)

De fato, a preocupação externada pelo requerente, no que concerne à preservação do patrimônio público em risco de ser alienado a partir de atos que seriam eivados de ilicitudes (conforme defende o Autor popular) tem as medidas de tutela provisória um  instrumento de garantia de um resultado útil para o provimento final do processo .

Portanto, provimentos provisórios como o requerido pelo Autor aplicam-se a este caso, na medida em que se constata que o curso regular do processo de conhecimento, há  o risco que venha a resultar em grave prejuízo o simples fato de aguardar-se o fim do longo rito processual comum, em todas as suas fases,  mesmo  diante  do  regular  impulso  oficial,  que  é  quase  sempre  insuficiente  para  abreviar  o andamento do processo.

Trata-se, assim, de decisão tomada in status assertionis, constituindo-se em medida provisória, passível de revisão ou cassação a qualquer instante, e que se subordina à garantia da eficácia do provimento final. Destina-se, portanto, principalmente, na imperiosa necessidade de estabilidade ou equilíbrio na situação de fato, entre as partes, ante a ameaça à eficiência da prestação jurisdicional.

Neste momento de exame urgente e superficial, característicos das tutelas provisórias, entendo cabível e necessária a concessão de decisão liminar em sede da presente ação popular, consoante disposto no art. 5º, §4º, da Lei nº 4.717/65 e da fundamentação a seguir exposta.

A parte Requerente argumenta que o art.61, §1º, inciso II, alínea e, da Constituição Federal atribui ao Presidente da República a competência privativa para deflagrar o processo legislativo quando se trata da criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, inciso VI.

Destaca que o art. 84, inciso VI, da CF, por sua vez, estabelece a competência privativa do Presidente da República para dispor, mediante decreto, sobre a organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa, criação ou extinção de órgãos públicos e a extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos.

Descreve-se, então que, ante a análise dos dispositivos constitucionais que tratam da iniciativa privativa de projetos de lei pelo Presidente da República e da disciplina por decreto de matérias afetas à organização e funcionamento da administração pública federal (art. 61, § 1º, e art. 84, inciso VI, ambos da CF), é possível constatar que estes objetivam preservar a autonomia do Poder Executivo no que concerne à sua organização e funcionamento.

Assevera que não cabe aos Deputados Federais e Senadores deflagrarem o processo legislativo, referente à Lei n. 13.365/2016, sem comprometer fortemente a independência e harmonia dos Poderes de que trata o art. 2º da CF.

Afirma que a Lei nº 13.365, de 2016, originada de projeto de lei de iniciativa parlamentar (PLS nº 131, de 2015, de autoria do Senador José Serra) não pode ser considerada formalmente constitucional ao propor significativas alterações no marco regulatório instituído pela Lei nº 12.351, de 2010, que, por seu turno, se originou de projeto de lei de iniciativa privativa do Presidente da República.

Aponto que esse aparente vício constitucional macula o processo legislativo da lei de 2016 que promoveu drásticas alterações na Lei nº 12.351, de 2010, no que concerne ao regime de partilha de produção em áreas do pré-sal e às competências dos órgãos e entidades públicos envolvidos.

Observa-se patente a verossimilhança das teses autorais que afirma, em relação aos bônus de assinatura, ser é perceptível a distorção de valores e o rebaixamento dos valores apresentados nos editais (o total do bônus de assinatura para as quatro áreas a serem licitadas na 2ª Rodada do Pré-Sal é de apenas R$ 3,4 bilhões; na 3ª Rodada, esse bônus é de R$ 4,35 bilhões), o que apresentaria risco de danos fabulosos em detrimento no patrimônio público.

O Autor popular, no exercício de um dos mais importantes instrumentos de cidadania, ressaltou que os bônus de assinatura das 2ª e 3ª Rodadas do Pré-Sal totalizam apenas R$7,75 bilhões, o que representa pouco mais da metade do bônus da licitação de Libra (fruto da ‘1ª rodada’ de licitações), que foi de R$ 15 bilhões; aduzindo que não há qualquer justificativa plausível para que os valores sejam tão baixos e tão lesivos ao patrimônio público.  Essas informações são importantes para formação do convencimento do Juízo, principalmente porque suscitam a gravidade dessa alienação do patrimônio público de bilhões de reais, com base em atos aparentemente eivados de graves vícios numéricos e jurídicos.

Diante do exposto, observo que, a priori, há plausibilidade das argumentações expostas pelo Requerente, devendo-se, por isso, assegurar a eficácia do provimento final, visando a espancar qualquer possibilidade de ocorrência de danos ao patrimônio público – principalmente em face dos valores envolvidos; destacando-se que o periculum in mora resta evidente diante da realização de leilão na data de 27/10/2017.

Outrossim, sendo devidamente resguardado o estado das coisas atuais com determinação para que os requeridos suspendam o prosseguimento dos processos licitatórios, verifica-se que é desnecessário, no presente momento, a declaração, uma vez que a análise pormenorizada do mérito será realizada após a fase de dilação probatória.

Ante o exposto, defiro o pedido liminar no sentido de determinar que os Requeridos procedam à suspensão de todos os procedimentos licitatórios referentes aos Editais da Segunda e Terceira rodadas de licitações de partilha de produção, publicados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, em 23 de Agosto de 2017.

Intimem-se, com urgência e através de Oficial de Justiça Plantonista, a Requerida ANP, por meio da PGF/AM, e a Petrobrás, por meio de representante legal no endereço indicado na exordial, para tomarem ciência e darem cumprimento a este decisum; sob pena dos Requeridos responderem solidariamente pelo pagamento de multa diária de R$10.000.000,00 (dez milhões de reais), nos termos do art. 77, §2º, do CPC/2015, sem prejuízo das demais sanções cíveis, político-administrativas e cabíveis.

Citem-se os requeridos, para que, querendo, ofereçam contestação no prazo de 20 (vinte) dias, consoante art. 7º, inciso IV, da Lei n. 4.717/1965.

Deverão os Requeridos, com fulcro no art. 7º, inciso I, “b”, da Lei da Ação Popular, fazer juntada de cópia do Edital completo da segunda rodada de licitações de partilha de produção objeto desta demanda, considerando que já foi apresentado nos autos o Edital referente à terceira rodada; bem como poderão proceder à juntada de demais documentos que entenderem pertinentes ao esclarecimento dos fatos.

Decorrido o prazo para contestação, intime-se o Ministério Público Federal, nos termos da mencionada lei.

Intime-se  a  parte  autora  para  comprovar,  no  prazo  de  quinze  dias,  a  quitação  eleitoral(regularidade perante a Justiça Eleitoral), bem como para se manifestar sobre a alegação de conexão.

MANAUS, 26 de outubro de 2017.

JUIZ RICARDO A. DE SALES

Seção Judiciária do Distrito Federal

20ª Vara Federal Cível da SJDF

PROCESSO: 1014682-64.2017.4.01.3400

CLASSE: AÇÃO POPULAR (66)

AUTOR: ROBERTO REQUIAO DE MELLO E SILVA

RÉU: AGENCIA NACIONAL DO PETROLEO, GAS NATURAL E BIOCOMBUSTIVEIS, UNIÃO FEDERAL, PETROLEO BRASILEIRO SA PETROBRAS

DECISÃO

ROBERTO REQUIÃO DE MELLO E SILVA propôs a presente Ação Popular objetivando, em caráter liminar, suspender “as rodadas de licitação do Pré-Sal previstas para o dia 27/10/2017” (fl. 39 – rolagem única).

Narra o autor que a ANP instaurou a 2ª Rodada de Licitações de Partilha de Produção, cujo objeto consiste na outorga de contratos de partilha de produção para exercício das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural em 4 blocos, quais sejam: Norte de Carcará, Sul de Gato do Mato, Entorno de Sapinhoá e Sudoeste de Tartaruga Verde, distribuídos nas bacias de Santos e Campos.

Insurge-se, em apertada síntese, contra o critério adotado pela ANP para apuração do percentual do excedente em óleo para a União (inciso III, art. 2º, da Lei nº 12.351/2010).

Assevera que o “Poder Executivo não apresentou justificativas específicas para excedentes em óleo da União tão baixos, pois variam de 10,34% a 22,08%. No caso do Entorno de Sapinhoá, bloco a ser licitado na 2ª Rodada, o excedente em óleo da União é de 10,34%, enquanto, no regime de concessão, o campo de Sapinhoá gera uma participação especial de 28,67%. Em função da produtividade média dos poços e do preço do petróleo, o percentual de 10,34% pode ser reduzido para 1%” (fl. 05 – rolagem única).

Aponta, ainda, que a MPV 795/2017 permite que os custos de exploração e desenvolvimento da produção sejam objeto de duas deduções fiscais, gerando uma sensível redução da receita líquida para fins de cálculo da participação especial dos entes federativos ou do excedente em óleo dividido entre a União e contratados, e outra da base de cálculo do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica – IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL. Relata que “com a edição da MPV nº 795/2017, a base de cálculo da CSLL e para determinação do IRPJ será reduzida de US$ 23,2 para US$ 1,2 por barril. Assim, esses tributos gerarão uma receita de apenas US$ 0,408, em vez de US$ 7,888 por barril, o que representa uma perda de arrecadação de US$ 7,48 por barril” (fl. 07 – rolagem única).

Por fim, aduz que a Lei nº 13.365/2016, ao alterar a Lei nº 12.351/2010, criou um “direito de preferência” em favor da Petrobrás e modificou a estrutura orgânica da empresa. Segundo avalia, “nos termos da Constituição de 1988, cabe privativamente ao Presidente da República, mediante decreto, dispor sobre organização e funcionamento da administração federal. Iniciativa de edição de lei ordinária com esse fim também seria de competência privativa do Presidente da República” (fl. 09 – rolagem única).

Procuração e documentos às fls. 40/548.

Manifestação da ANP às fls. 552/588, com documentos (fls. 589/603).

DECIDO.

A tutela de urgência, na forma do art. 300 do CPC, somente poderá ser concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Sumariamente examinada a questão, como é próprio deste momento da caminhada processual, tenho por ausentes, por ora, os pressupostos necessários ao deferimento da medida.

A ação popular traduz poderoso instrumento constitucional vocacionado à defesa, pelos cidadãos, do patrimônio público, da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural (CF, art. 5º, LXXIII).

Como assevera o saudoso Ministro Teori Zavascky, “o direito à ação popular sempre representou um traço importante nos direitos de cidadania, de muito significado ainda hoje, quando tais direitos assumem novos contornos, mais complexos e multiformes” (Processo Coletivo: tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. 6 ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014 – página 78).

O controle operado por esta modalidade instrumental (como, de resto, por todos os canais de exercício da jurisdição constitucional), no entanto, não é ilimitado e incondicionado.

O Ministro Luis Roberto Barroso, em clássica lição, adverte que “deve-se cuidar para que juízes e tribunais não se transformem em instância hegemônica, comprometendo a legitimidade democrática de sua atuação, exorbitando de suas capacidades institucionais e limitando impropriamente o debate público. Quando não estejam em jogo direitos fundamentais ou a preservação dos procedimentos democráticos, juízes e tribunais devem acatar as escolhas legítimas feitas pelo legislador, assim como ser deferentes com o exercício razoável da discricionariedade pelo administrador, abstendo-se de sobrepor a eles sua própria valoração política”[1].

Na mesma perspectiva, dissertando sobre o controle jurisdicional de atos governamentais, o Professor Gustavo Binenbojm consigna o seguinte:
“Com efeito, naqueles campos em que, por sua alta complexidade técnica e dinâmica específica, faleçam parâmetros objetivos para uma atuação segura do Poder Judiciário, a intensidade do controle deverá ser tendencialmente menor. Nesses casos, a expertise e a experiência dos órgãos e entidades da Administração em determinada matéria poderão ser decisivas na definição da espessura do controle. Há, ainda, situações em que, pelas circunstâncias específicas de sua configuração,a  decisão final deva estar preferencialmente a cargo do Poder Executivo, seja por seu lastro (direto ou mediato) de legitimação democrática, seja em deferência à legitimação alcançada após um procedimento amplo e efetivo de participação dos administrados na decisão.

Os standards básicos a serem levados em conta pelo magistrado, no momento de exercer o controle jurisdicional sobre atos administrativos, são os seguintes: (i) grau de restrição a direitos fundamentais (quanto maior, mais intenso o controle); (ii) grau de objetividade extraível do relato normativo (quanto maior, menos intenso o controle); (iii) grau de tecnicidade da matéria (quanto maior, menos intenso o controle); (iv) grau de politicidade da matéria (quanto maior, menos intenso o controle); (v) grau de participação efetiva e consenso obtido em torno da decisão administrativa (quanto maior, menos intenso o controle)” (BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo: Direitos fundamentais, democracia e constitucionalização. Rio de Janeiro: 2008, Renovar. pg. 316).
Dada, pois, a altíssima complexidade técnica dos temas aqui versados, relacionados à outorga de contratos de partilha de produção para exercício das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, reputo recomendável a adoção de postura de maior autocontenção face a decisões administrativas deste jaez, nomeadamente quando ausentes, como no presente caso, dados e circunstâncias bastantes a evidenciar as irregularidades apontadas.

Fixada a premissa, relativa aos limites da interferência jurisdicional no âmbito de políticas governamentais deste nível, passo ao breve enfrentamento dos principais fundamentos agitados na peça inaugural.

Sem prejuízo de reexame posterior da questão, reputo não suficientemente comprovada a alegada lesividade do ato, pois a metodologia empregada para cálculo do excedente em óleo, segundo a ANP, “estabelece um mecanismo de apropriação de renda por parte da União na proporção da rentabilidade do empreendimento, que será tanto mais alta quanto maior for a produtividade média dos poços produtores e/ou mais elevado o preço do petróleo” (fl. 574 – rolagem única).

A propósito, o item 8.3 do Edital dispõe que “opercentual do excedente em óleo para a União, a ser ofertado pelas licitantes, deverá referir-se ao preço de barril de petróleo tipo Brent de US$ 50,00 (cinqüenta dólares norteamericanos) e à produção diária média de 11.000 (onze mil) barris de petróleo por poço produtor ativo”.

A adequada aferição a respeito do caráter vantajoso (ou efetivamente prejudicial) das escolhas adotadas pela ANP para o regime de exploração, por envolver diversas variáveis econômicas de alta envergadura técnica, desafia larga dilação probatória, não restando segura e cabalmente demonstradas, neste momento da caminha processual, as impropriedades descritas na inicial.

Noutro giro, a Lei nº 12.351/2010, ao definir o conceito de excedente em óleo, atrelou os critérios de sua apuração ao estipulado no contrato de partilha de produção, consoante se infere do inciso III do art. 2º, abaixo transcrito:
“Art. 2o  Para os fins desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições:

III – excedente em óleo: parcela da produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos a ser repartida entre a União e o contratado, segundo critérios definidos em contrato, resultante da diferença entre o volume total da produção e as parcelas relativas ao custo em óleo, aos royalties devidos e, quando exigível, à participação de que trata o art. 43;”

No que tange às graves desconformidades atribuídas à MPV nº 795/2017, decorrentes das renúncias de receitas dela decorrentes, embora o fundamentado estudo técnico carreado aos autos pelo Autor (fls. 44/62 – rolagem única) indique a probabilidade de que haja redução na arrecadação de IRPJ e CSLL incidentes sobre as operações de exploração do petróleo, tenho por inviável, neste momento, o alcance de qualquer prognóstico conclusivo sobre os impactos macroeconômicos e fiscais derivados do formato de exploração eleito pela autoridade encarregada da condução da política energética nacional, que, mercê da elevada sensibilidade e do caráter estratégico do setor para a economia, deve ponderar variados e complexos elementos.

Também não diviso, à primeira vista, a inconstitucionalidade formal suscitada, eis que a Lei 13.365/2016 operou modificação na participação da Petrobrás no modelo de negócio da exploração de petróleo, mediante “o direito de preferência para atuar como operador e possuir participação mínima de 30% (trinta por cento) nos consórcios formados para exploração de blocos licitados no regime de partilha de produção”. Não se trata, todavia, de ato normativo que importe propriamente em “organização e funcionamento da administração federal” (CF, art. 84, VI, “a”) ou que verse sobre qualquer das matérias arroladas no §1º do art. 61 da Constituição Federal.

Destaco, por derradeiro, que a publicação da minuta do contrato se deu dia 05.07.2017, conforme se extrai do cronograma de fl. 327 da rolagem única, tendo o autor popular optado por ingressar em juízo às vésperas da realização do leilão.

De todo modo, não vislumbro risco de perecimento do direito ou de irreversibilidade da medida, pois o pagamento do bônus de assinatura e a própria assinatura dos contratos de partilha de produção estão previstos para conclusão apenas no mês de dezembro deste ano (fl. 327 – rolagem única).

Tais as razões, INDEFIRO o pedido liminar, sem prejuízo de reapreciação do pleito após o oferecimento da contestação.

Cite-se. Intime-se o Ministério Público Federal.

Intime-se.

Transcorrido o prazo para manifestação da parte contrária, com ou sem apresentação da peça de resistência, façam-se os autos novamente conclusos para reexame do pedido de medida urgente.

Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se com urgência.

Brasília, 26 de outubro de 2017

MARCOS JOSÉ BRITO RIBEIRO

Juiz Federal Substituto da 13.ª Vara/DF, em exercício na 20ª Vara/DF
[1] BARROSO, Luis Roberto. O Controle de constitucionalidade no direito brasileiro – São Paulo: Saraiva , 2012. PP. 409/410.

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Comentários

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Cleusa Pozzetti Siba

Que tristeza!! Que vergonha infinita!!! Que ódio desses criminosos!!!

Luiz

O que me admira é ainda ter gente que vota em um Serra, em Alckmim, em Aécio, nessa quadrilha nojenta e abjeta do PSDB. Vendilhões da pátria. FHC já deveria ter sido preso e condenado por crime contra a soberania nacional e ainda faz pose de intelectual. Só muito sangue para lavar nossa terra. Fuzilamento para esses entreguistas. REAÇÃO BRASIL. VAMOS ACORDAR.

emerson57

Ainda bem que não estamos em nenhum pais ao norte do equador. Lá um roubo como esse seria impedido à bala pelo povo!

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