Serrano: Lei que tipifique crime em manifestação é antidemocrática

Tempo de leitura: 6 min
Pedro Serrano: Cassar mandato é prerrogativa da Câmara e do Senado. É a forma que a Constituição encontra de defesa da soberania popular

por Conceição Lemes

A trágica morte do repórter cinematográfico Santiago Andrade, atingido por rojão durante protesto no Rio de Janeiro, fez com que, imediatamente, vários projetos de lei relacionados a manifestações de rua entrassem na agenda política.

Em 12 de fevereiro, dois dias após o falecimento de Santiago, José Mariano Beltrame, secretário da Segurança do Rio de Janeiro, foi à reunião da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, entregar minuta de projeto que tipifica desordem como crime (abaixo, na íntegra). Em fins de novembro do ano passado, Beltrame já a havia levado ao ministro de Justiça, José Eduardo Cardozo.

No mesmo dia 12, o projeto de lei que visa regulamentar atos de terrorismo entrou na pauta do plenário do Senado e pode ser votado a qualquer momento.

Nessa terça-feira, o ministro Cardozo disse que, até o final desta semana, deve apresentar à Casa Civil da Presidência da República um projeto para regulamentar as manifestações de rua e confirmou o agravamento de penas para crimes cometidos nesses atos. A Agência Brasil noticiou:

Ele [Cardozo] confirmou que irá propor um endurecimento das penas aplicadas aos condenados por crimes previstos no Código Penal que forem cometidos durante protestos, como os que, desde junho de 2013, tomaram as ruas das principais cidades do país.

“Há certos delitos que estão [tipificados] no Código Penal, mas que estão ocorrendo em manifestações lícitas, praticados por pessoas que desvirtuam os atos para danificar o patrimônio público e privado, lesionar [outras pessoas] e, agora, lamentavelmente, cometer homicídios. Por isso, estamos discutindo uma elevação das penas para esses casos. Ou seja, um agravamento da pena”, disse Cardozo ao explicar que o principal objetivo do projeto de lei será disciplinar dispositivos legais, como o que proíbe o anonimato em manifestações populares.

De acordo com Cardozo, o projeto deverá ser encaminhado ao Congresso Nacional em regime de urgência para que seja aprovado e possa entrar em vigor “o quanto antes”. O ministro explicou que a iniciativa não pode ser confundida com uma tentativa de limitar o direito à liberdade de expressão ou de reunião.

O jurista Pedro Estevam Serrano, professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), é contra qualquer lei que atinja as manifestações de rua.  Em princípio, contra inclusive à que o governo federal  venha lançar.

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“Sou contra leis em geral que objetivam tipificar ou agravar crimes cometidos em manifestações de rua”, afirma Serrano. “Não tem sentido tipificar mais um crime! Além de não funcionar, interfere no direito de as pessoas se manifestarem.”

Isso não significa que ele seja contra a punição de abusos. “Crimes cometidos durante manifestações têm de ser punidos, sim”, frisa. “ Só que, no Brasil, já temos leis suficientes para isso. Não vai ser criando mais uma lei que se vai coibir abusos.”

No Brasil, lembra o professor, tem-se a mania de criar leis sempre que há uma comoção na sociedade. Seja por oportunismo, seja para tentar criminalizar o teu opositor do momento.  “Isso não funciona, por isso tantas leis não saem do papel”, argumenta.

“Tem de se agir preventivamente, portanto, antes que os crimes aconteçam”,  defende. “Isso implica ação policial preventiva, de inteligência, e não na base de cassetetes, bombas de efeito moral, balas de borracha ou de verdade.”

“São ações de inteligência policial capazes de identificar os que cometem delitos e puní-los pelos crimes e não porque estão numa manifestação”, observa.

Serrano cita os black blocs, que se autotitulam uma tática e não um grupo. Acontece que os agentes da prática são os mesmos. Assim, de fato, são um grupo.

Frequentemente, alguns  – não são todos!– partem para a violência.

“Tem de se identificar os que costumam partir para o quebra-quebra, observá-los e, se praticarem qualquer tipo de crime – desde destruição de patrimônio público ou privado até ferimentos em alguém –, puní-los isoladamente e não criminalizar todos os membros do grupo”, atenta Serrano. “Em todos as atividades humanas há pessoas que cometem crimes. Não é por isso que vou criminalizá-las.”

“A imensa maioria não vai para as manifestações para praticar crimes, vai para exercer a sua cidadania”, finaliza o professor Pedro Serrano.

“Qualquer lei que tipifique ou agrave o crime pelo fato de ele ser praticado em manifestação é, em princípio, antidemocrática.”

Em tempo. Para Serrano, todo artefato que contiver pólvora deve ter seu uso sujeito a controle estrito do Estado, devendo ser comprado e utilizado apenas por pessoas devidamente credenciadas.

********

Minuta do projeto de lei que tipifica o crime de desordem  do secretário de Segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, entregue ao ministro José Eduardo Cardozo e ao Senado

LEI      Nº                 , DE           DE                                     2013.

TIPIFICA OS CRIMES DE DESORDEM E O DE ASSOCIAÇÃO PARA PRÁTICA DE DESORDEM E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional  decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º – Os artigos 287-A e 288-B, ambos do Código Penal, passarão a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 287-A – Praticar ato que possa causar desordem em lugar público ou acessível ao público, agredindo ou cometendo qualquer ato de violência física ou grave ameaça à pessoa; destruindo, danificando, deteriorando ou inutilizando bem público ou particular; invadindo ou tentando invadir prédios ou locais não abertos ao público; obstruindo vias públicas de forma a causar perigo aos usuários e transeuntes; a qualquer título ou pretexto ou com o intuito de protestar ou manifestar desaprovação ou descontentamento com relação a fatos, atos ou situações com os quais não concorde.

Pena – reclusão de 2 a 6 anos e multa, além e sem prejuízo das penas correspondentes à violência.

§ 1º – Nas mesmas penas incorre quem incitar, publicamente, às praticas descritas no caput.

Formas qualificadas

§ 2º –  Se o crime é cometido:

I – Por ocasião de reuniões ou manifestações públicas;

II – com emprego de substância inflamável ou explosiva, além e sem prejuízo das penas aplicáveis por crimes mais graves que a posse e o uso de tais substâncias possam caracterizar.

III – ocorrendo saques, subtração ou apropriação de bens, públicos ou privados, sem prejuízo das penas aplicáveis aos autores de tais atos, quando identificados.

IV – Se a incitação é praticada utilizando meios eletroeletrônicos que facilitem a divulgação da incitação, tais como rádio difusão, televisão, internet, sistema de alto-falantes ou congêneres.

V – atingindo bens de interesse histórico, artístico ou paisagístico.

 Pena – reclusão de 3 a 8 anos e multa, além e sem prejuízo das penas correspondentes à violência e ao mencionado nos incisos II e III acima.

§ 3º – Se resulta lesão corporal de natureza grave

Pena – reclusão de 4 a 10 anos e multa, pela simples participação nos atos de desordem, sem prejuízo das penas cabíveis aos autores dos atos que tenham causado as lesões, quando possível identificá-los.

 § 4º – Se resulta morte

Pena – reclusão de 6 a 12 anos e multa, pela simples participação nos atos de desordem, sem prejuízo das penas cabíveis aos autores dos atos que tenham causado a morte, quando possível identificá-los.

(…)

Art. 288-B – Associarem-se três ou mais pessoas, em caráter eventual ou permanente, para a incitação ou a prática de atos de desordem, vandalismo ou qualquer forma de violência, a serem cometidos durante a realização de concentrações populares, seja a título de manifestações ou de eventos de qualquer natureza, onde tais concentrações sejam previamente agendadas ou estiverem ocorrendo.

Pena – reclusão de 3 a 6 anos e multaArt. 163-B – Associarem-se, três ou mais pessoas, em caráter eventual ou permanente, para a prática de atos de vandalismo.

Pena: Reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos e multa, além e sem prejuízo das penas cominadas no art. 163-A e seus parágrafos acima.”.

Art. 2º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, em     de             de 2013.

DILMA ROUSSEFF

Exposição de Motivos

Considerando  que dentre os princípios que regem e garantem o funcionamento do Estado Democrático de Direito ganha especial destaque a liberdade de expressão e de reunião e que, em consequência, são de vital importância as medidas assecuratórias ao exercício pleno de tal liberdade.

Considerando que tais direitos, para que possam contribuir na construção de uma sociedade livre, justa, solidária e igualitária, só podem ser exercidos com integral obediência aos cânones da Paz Pública, insculpidos na Carta Constitucional, com destaque, entre outros, para os incisos IX, XV e XVI do seu art. 5º, ou seja, na forma da lei, de forma pacífica e sem armas.

Considerando o amplo noticiário recente, evidenciando a prática reiterada de atos de vandalismo, com consideráveis danos a bens públicos e particulares, bem como ameaças graves e ofensas diretas à integridade física de pessoas inocentes, civis e policiais, aproveitando-se tais pessoas, para a prática dessas ações, de manifestações legítimas e pacíficas, acabando por causar graves temores aos manifestantes ordeiros e assim prejudicando o direito da maioria de exercer plena e livremente seus direitos de expressão e reunião pacíficas.

Considerando que tais condutas ofendem, simultaneamente, vários bens jurídicos relevantes, tais como a paz e a incolumidade públicas, o patrimônio público e particular, o livre exercício pelos cidadãos de bem dos seus direitos de expressão e reunião, como destacado acima, dentre outros.

Considerando, por fim, que tais ações vêm sendo promovidas por grupos de pessoas que se organizam previamente, ainda que eventualmente ou em caráter permanente, o que torna maior a ameaça de tais condutas à paz e à ordem desejadas.

Toma-se a iniciativa de apresentar o presente projeto de Lei, propondo a alteração do Código Penal, para nele introduzir a tipificação de DESORDEM e atividades correlatas, ressaltando que tal iniciativa já encontra similar no direito comparado, inclusive na codificação europeia.

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Comentários

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Fabio Nogueira

Oras! Quem vai subsidiar as decisões dos juízes a respeito dos Crimes de Manifestação? A Polícia Civil está sucateada e atolada em investigações de crimes comuns, aqueles crimes que não têm o pesado agravante de terem sido cometidos por manifestantes. E investigar nunca foi atribuição da Polícia Militar – tirando os P2 da PM, claro. Por outro lado, as PMs nos estados já estão criando batalhões especificamente treinados para lidar com as multidões nas ruas. Assim, me parece que será ato contínuo à aprovação das leis de PPPs (pacificação da participação política) a criação de uma polícia investigativa para atuar nos Crimes de Manifestação. Afinal, os juízes, principalmente aqueles com fortes laços com a comunidade local (com a qual compartilham sua vida social), precisam da materialidade dos fatos em suas mesas para julgar, pela letra da lei, ocorrências que podem vir de qualquer lado, sejam protestos por moradia, por terras ou de cunho sindical – e que certamente serão denunciadas pelos cidadãos de bem. Fica, assim, uma singela sugestão para nomear essa inédita seção policial: DOPS.

augusto2

quem puder acessar e ler -ou tiver acesso a alguma traduçao on line- NAO deixe de acessar algumas vezes por semana o sensacional site (americano,acho) http://www.rt.com.
Informaçao diferente, as pencas sobre o que acontece em kiev, usa , russia etc. É acessar e avaliar sem intermediarios.
Informaçao é poder. Mas tambem é liberdade.

renato

Regime anti democratico em
PILÂO ARCADO – BAHIA.
Governador, peça a PF força Nacional, e ao MP
que retomem a cidade.
Para mim deve servir de esconderilo para
assaltantes de Banco..

O POVO, com medo visto a olhos nus.
Não precisou o reporter dizer nada sobre tal.
O meu POVO BRASILEIRO, além das penurias
morto moralmente…com suas identidades
destruidas, por capangas, por gente corrupta….
Um Grito….não consegui dormir ontem depois
da reportagem, por tudo que a gente luta..aqui.
Pela liberdade e felicidade do POVO.
Estou tenso…estou passando mal.

Romanelli

bom, verdade ..tirando pequeníssimas peculiaridades, como a de NÃO poder usar máscaras, o resto esta previsto, e seria só cumprir..

Agora convenhamos, replicar e triplicar leis, “redundicioná-las” para atendermos DEMAGOGICAMENTE a uma ou outra corrente, isso já faz parte da nossa cultura.

Por exemplo faz parte quando surgiu a lei Maria da Penha que previa penas e ameaças só pros HOMENS ..isso quando o crime de lesão corporal, assassinado doloso, culposo, cárcere privado, tortura etc etc etc, já existiam previstas pra todo mundo ..mas que até hoje quase ninguém cumprir a ferro e fogo

Pior que da exigência pelo aumento da burocracia, por não ter atentado pra aspectos práticos (como a verba pra manter lares especializados às mulheres agredidas, as tais ridículas delegacias especializadas), por não adotar métodos MODERNOS de monitoração Às vítimas e agressores (como com pulseiras e tornozeleiras eletrônicas rastreadoras..

..ou por não ter protegido – mesmo que em menor número, outros cidadãos padecidos do mesmo tipo de agressão no lar (vide o dono da Yoke, que não é fato isolado nem exclusivo) ..esta lei até agora não mostrou pra que veio pois hoje ainda temos 50 mil estupros por ano e a violência não para de crescer.

Agora interessante mesmo, depressivo e chocante, foi ver a tal Maria da Penha que pensou que descobriu a roda, dizer que a proteção da sua lei só servia pra mulher, isso quando um gay ameaçava lançar mão para sua proteção ..e pior de tudo foi ver que tal DEMAGOGIA fez mó sucesso, ainda mais perante as “feminazi” que nos infestam e que em seu dicionário não sabem conjugar palavras como cidadania e/ou ISONOMIA de tratamento dado a qualquer cidadão.

Luis

Com as bostas de ministros da justiça e das comunicações que temos, dá nisso.

JULIO*Dilma2014/Contagem(MG)

Mascarados, nem o zorro, nem o batmam !!!

edson tadeu

É correto que nao ha necessidade nenhuma de se criar novas leis porque se apenas cumprirem as que ai estao ja é o suficiente para conter abusos. Agora uma coisa é se fazer manifestaçao ordenada, pacifica, e outra é destruir patrimonio publicos privados, atentar contra vidas de pessoas como a do cinegrafista e ficar impune isso nao tem cabimento e a meu ver deve ser coíbido na forma da lei. Nao se pode permitir que mascarados geralmente militares entrem numa manifestaçao para tumultuar e sair sem serem punidos porque é ant-democratico. Todas as democracias do mundo repelem mascarados, e nao é possivel que o Brasil seja sempre o ultimo a coibir tais abusos. Tambem entendo que nao ha necessidade de se criar novas leis. ate porque o mascarado ja está cometendo crime. ao esconder o rosto e deve ser preso e punido. principalmente pego em flagrante.

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