E aí Governador, é Água ou Mineroduto?
por Luiz Paulo Guimarães de Siqueira*
29/01/2015
Minas Gerais enfrenta talvez a pior crise hídrica de sua história. Em pleno janeiro, período normalmente chuvoso e com abundância de água, o estado registra que cerca de 140 municípios já adotaram medidas de restrição e limitação no fornecimento de água.
Sem dúvida, esta situação não surge fortuitamente, mas sim, reflexo de uma longa trajetória de ausência de planejamento público por parte do Estado e, também, fruto de gestões marcadas por deixar Minas, literalmente, em choque.
A grave situação de falta d’água está mais intensa na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Se, por um lado, se constitui como a região de maior adensamento populacional, por outro, a RMBH juntamente com o Colar Metropolitano se configuram como a região de maior intensidade das atividades minerárias no estado.
De acordo com o 2º Relatório de Gestão e Situação dos Recursos Hídricos de Minas Gerais, publicado pelo IGAM em janeiro de 2015, a mineração foi o quinto setor que mais obteve outorgas para uso de água em 2013. Mas, somente analisar o número de usos outorgados podem nos levar a uma interpretação equivocada sobre quem são os atores que mais consomem água em MG. Pois não podemos deixar de levar em conta que há uma significativa diferença entre o volume de água outorgado para atender o consumo humano, por exemplo, do que o volume utilizado para atender a exploração mineral.
Neste contexto, chama a atenção a petulância das grandes corporações da mineração de optarem pela utilização de minerodutos para exportar nossos minérios. Para quem não conhece, minerodutos são grandes tubulações que transportam minério diluído em volumosas quantidades de água, formando uma polpa de minério, semelhante à borra de café, sabe?
Como o minério precisa ser diluído e bombeado por água, os minerodutos precisam manter a pressão para conduzir o minério. E é por isso, que para além do alto consumo de água para a formação da polpa do minério, os minerodutos inerentemente causam diversos impactos ambientais. Pois para manter a pressão do bombeamento, os dutos têm de desviar dos morros, percorrendo dessa maneira os vales, que são as regiões onde estão concentrados os cursos d’água, brejos, nascentes, as melhores áreas de plantio e moradia.
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Em Minas, há hoje diversos minerodutos de pequeno porte, como o caso do projeto da MMX em São Joaquim de Bicas, que provocou grandes transtornos na região, destruindo nascentes e prejudicando produtores rurais e o abastecimento de água. Mas há, também, minerodutos de grande porte, que levam os minérios da mina até o litoral, onde são exportados através dos portos. No caso dos grandes minerodutos, o estado conta atualmente com 8 projetos, 4 já em operação e mais 4 que pleiteiam as licenças ambientais. Sobre estes, vamos tentar entender como funcionam e o quanto de água estão tirando dos mineiros.
A Vale/Samarco possuem 3 minerodutos ligando a Mina Alegria, em Mariana, até o porto de Ubú, no Espirito Santo. Depois de anos destruindo os mananciais de Mariana e Ouro Preto, essas mineradoras não tiveram alternativa a não ser captar água instalando uma adutora para utilizar 82% do potencial hídrico do Rio Conceição no distrito de Brumal, em Santa Bárbara.
Moradores da região alegam que na época de estiagem o rio termina, literalmente, no ponto de captação para o duto. São utilizados para a funcionamento dos 3 minerodutos cerca de 4.400m³/hora. Não se pode esquecer que em 2010, um dos minerodutos da Samarco/Vale rompeu no município de Espera Feliz, causando um grande desastre ambiental jorrando lamas de minérios, inviabilizando o abastecimento público da cidade e ocasionando a mortandade de toda biodiversidade afetada.
A multinacional Anglo American se orgulha em dizer que é dona do maior mineroduto do mundo. Com cerca de 525 km, o projeto Minas-Rio parte de Conceição do Mato Dentro até o Porto de Açu em São João da Barra (RJ). A mineradora capta 2.500m³/hora da região e desde sua chegada tem causado grandes transtornos e prejuízos às comunidades no entorno. Tem o orgulho de dizer que o processo de licenciamento ambiental do projeto possui 364 condicionantes e que, diga-se de passagem, sem quase nenhum cumprimento.
Ao iniciar a operação do mineroduto em 2014, foram visíveis as consequências no ambiente, com drásticos assoreamentos dos córregos, mortandade de peixes, de gado e a inviabilização do uso social da água na região.
A Ferrous Resources, empresa de capital estritamente estrangeiro, pleiteia a instalação de um mineroduto partindo de Congonhas até um porto em Presidente Kennedy (ES). Inicialmente, seu projeto era de partir de Brumadinho, através da exploração da Serra da Moeda, também conhecida como Monumento Natural Mãe D’água, mas graças à forte resistência das comunidades quilombolas e do Abraço da Serra da Moeda a mineradora foi obrigada a ajustar seu projeto.
A Ferrous, que em seu projeto alega a intenção de possuir dois dutos, vai captar 3.400m³/hora do Rio Paraopeba, manancial fundamental para o abastecimento da RMBH. Em seu processo de negociação com as famílias atingidas a mineradora possui um legado de sistemáticas violações de direitos humanos, sendo alvo, por exemplo, de representações do Ministério Público Federal.
Além disso, o mineroduto ameaça a segurança hídrica de milhares de comunidades rurais e cidades inteiras como é o caso de Viçosa e Conselheiro Lafaiete. As prefeituras de Paula Cândido e Viçosa, assim como as Câmaras Municipais, estão empenhadas para impedir o retrocesso que representa a passagem do mineroduto na região, ajuizando inclusive ações judiciais contra a mineradora.
A Manabi, que pretende instalar uma mega-mina em Morro do Pilar, também pleiteia a instalação de um mineroduto para transportar o minério de ferro. Marcado por grandes tensões, o processo de licenciamento ambiental do empreendimento tem sido feito na marra, causando muita polêmica.
Entre os vários motivos destacam-se a iminência de destruição de fragmentos de mata atlântica primária, a negligência da existência de comunidades tradicionais e destruição de trechos do patrimônio histórico e cultural da Estrada Real. A Manabi pretende captar cerca de 2.850m³/hora, degradando ainda mais a bacia do Rio Santo Antônio já tão afetada por grandes empreendimentos.
Em 2014, a Prefeitura de Açucena revogou as autorizações concedidas à mineradora após a compreensão que somente destruições o empreendimento deixaria à cidade.
O povo do semiárido mineiro parecia a salvo destes tipos de empreendimentos, pois a região apresenta sérias dificuldades de acesso à água e se já não bastasse a árdua luta dos geraizeiros e comunidades tradicionais contra as eucalipteiras que, sem nenhum pudor, tratam de grilar grandes terras no Vale do Jequitinhonha e Norte de Minas. Mas as mineradoras não ligam muito para a dificuldade de abastecimento do povo não.
A Sul Americana Metais (SAM), do grupo Votorantim, pretende explorar 25 milhões de toneladas de minério de ferro por ano no município de Grão Mogol. E por incrível que pareça, a ousadia da mineradora não tem limites, pretende escoar o minério através de um mineroduto. Serão captados da região 6.200m³/hora para viabilizar o empreendimento.
Lamentavelmente, o IBAMA é condescendente com esse crime e tem conduzido de forma arbitrária o licenciamento, chegando a marcar audiências para fevereiro de 2015, em um gesto de que planeja licenciar o mineroduto às pressas. O Ministério Púbico Estadual e laudos de pesquisadores da UFMG e UNIMONTES denunciam o não reconhecimento de comunidades tradicionais no processo e a inviabilidade de se instalar um empreendimento desta natureza em um local onde, simplesmente, não há água.
Se somarmos os volumes de água utilizados por estes projetos chegaremos ao escandaloso valor de 19,350m³/hora.
De acordo com o diagnóstico dos Serviços de Água e Esgoto do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, do Ministério das Cidades, o consumo médio per capita de água, em Minas Gerais, é de 159 litros por dia. Ou seja, o valor consumido por estes projetos minerários equivale ao abastecimento de cerca de 2.900.000 mineiros ou, o suficiente para atender a demanda de quase 50% da RMBH.
Quando se pergunta às mineradoras do porque de se optar pelo transporte via minerodutos, a resposta, obviamente, é meramente e exclusivamente econômica. Segundo dados das próprias empresas, o custo operacional para se transportar minério de ferro via ferrovia é, em média, de 18,00 US$/ton, já por minerodutos, a média é de 2,00 US$/ton.
Ou seja, a implantação de minerodutos nada mais é que uma estratégia de maximizar o lucro dos acionistas destas grandes corporações. Quem ficar sem água no caminho que se vire…
Os minerodutos possuem algo em comum. Além de todos os projetos possuírem inquéritos instaurados no Ministério Público, ambos estão sendo licenciados pelo IBAMA, mas contaram e ainda tem contado até o momento com o apoio do Governo do Estado.
Uma das características do choque de gestão foi utilizar todo o aparato da máquina pública para beneficiar, à revelia da legislação ambiental, os empreendimentos minerários privados.
Os Governos do PSDB (Aécio Neves 2003 – 2010 e Antônio Anastasia 2011 – 2014) assinaram decretos que declaram de utilidade pública as implantações dos minerodutos para fins de desapropriação e, ainda, colocam a serviço das mineradoras a empresa estatal CODEMIG para realizar o serviço sujo.
Os decretos, assim como a emissão das outorgas para uso de água emitido pelo IGAM, foram assinados antes mesmo da concretização dos processos de licenciamento ambiental, ou seja, sem saber se há a viabilidade ambiental e técnica dos empreendimentos, o Estado tratou de reconhecê-los como fatos consumados.
Ao longo de dois anos, a Comissão Extraordinária das Águas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou um importante e valioso trabalho sobre a questão hídrica no estado.
Em seu relatório e a partir das audiências públicas realizadas, ficou nítida a compreensão e o posicionamento categórico da Comissão em relação aos minerodutos, pois estes representam graves retrocessos na politica estadual de recursos hídricos e devem ser contundentemente impedidos.
Com a demarcação das áreas denominadas “faixa de servidão para mineroduto”, milhares de pessoas estão com sua soberania ameaçada e seus projetos de vida em risco.
Em todas as regiões do estado onde estas mineradoras projetam a implantação destes empreendimentos têm encontrado forte contestação e resistência popular. O que é natural, visto que as comunidades não são envolvidas nos processos de escolha e não possuem o menor controle sob suas riquezas minerais.
O atual modelo de mineração adotado pelo Estado Brasileiro não tem nada a oferecer ao Brasil, a não ser um rastro de miséria e destruição social e ambiental ao povo brasileiro.
Governador Fernando Pimentel, o senhor foi eleito sob o lema “ouvir para governar”, e muitos dos que estão sofrendo com as mazelas da mineração em Minas creditaram e acreditaram neste lema ajudando a eleger este novo Governo.
O povo mineiro já fez a sua opção, não quer assistir às suas águas, casas, nascentes, plantações, culturas, memórias, suor, comunidades e minérios entrando pelo cano; queremos sim, o quanto antes, nos livrarmos destes projetos que nada tem a nos oferecer e empenharmos conjuntamente para garantir a segurança hídrica do estado e isto, significa, definitivamente, enterrarmos de vez esta infeliz ideia de mineroduto.
*Membro da Coordenação da Campanha Pelas e Contra o Mineroduto da Ferrous e militante do Movimento Pela Soberania Popular Frente à Mineração (MAM)
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Comentários
Anselmo Araujo Moraes
Nem ANA nem IBAMA, quem manda é Barack Obama.
Anselmo Araujo Moraes
Agora acredito que a agenda da NOM (iluminatis), esta a pleno vapor.
albertina maletta
Enquanto isso, o IBAMA não perdoa aquela velhinhas que possuem, há anos, um papagaio, ou um macaquinho, dentre outros bichinhos silvestres, ditos de estimação.Tasca-lhes uma multa, recolhe o animalzinho e não quer nem saber. Azar das velhinhas se ficarem deprimidas. Vá entender!
Aroeira
Essa Anglo American já vem destruindo os mananciais, estradas, pastos, plantações, casas, passando por cima de tudo e de todos com licença das autoridades constituídas.
Agora temos uma dimensão do nacionalismo dessas autoridades.
Entregam tudo para quem os financia.
Em nome do cargo ocupado, da autoridade temporária conquistada nos votos, enganando os seus eleitores, fazem o que fazem, tudo pelo progresso (DELES).
Pergunto:
Como podemos parar com isso, se eles se reproduzem como ratos!!!
Luis A. Fonseca
Muito bom este artigo. Eu já havia comentado com amigos e conhecidos sobre a monstruosidade destes minerodutos. A outorga da água utilizada pela indústria cobra o valor de R$0,001(isto mesmo, UM CENTAVO) pelo metro cúbico do precioso líquido. Com isto viabiliza-se a enorme diferença preço entre a tonelada transportada de minério em ferrovias em relação à tonelada transportada em minerodutos. Lembrando ainda que o transporte hoje em ferrovias se dá em ferrovias PRIVADAS(leiam-se privatizadas), ou seja, lá não se faz caridade nem “cortesia com o chapéu dos outros”, como dizemos aqui em Minas Gerais. Diante deste quadro e do quadro formado pelo efeito estufa, pelo El Niño, pelo desmatamento desenfreado, pela diminuição da área de proteção dos mananciais e a diminuição da faixa de proteção dos leitos dos rios, ambos “atualizados” no novo(?) Código Florestal, da crônica deficiência do saneamento, da morte dos rios, onde iremos parar? Urge à sociedade dos homens e mulheres de bem, em todos os níveis, nos unirmos numa cruzada sem trégua contra os mostros que são estas empresas transnacionais, movidas pela sanha do lucro para alimentar outra víbora que é o mercado de capitais sem responsabilidade social. Fica a pergunta: Governador Pimentele e PT, voçês ainda lutam pela justiça de seu povo? Se sim, a chance de mostrar de que lado estão é agora!
O Mar da Silva
Quanto essas empresas doaram às campanhas eleitorais em MG? Se chegaram aos cofres do PSDB, PSD, PMDB, PT, PSDB entre outros significa que só a pressão popular poderá o cenário se modificar.
Quem doa, governa!
carmen silvia
Isto é discutir seriamente a tão propalada “crise hidrica”,matar a cobra e mostrar o pau,como já dizia meu avô.Esse problema da mineração não tem a ver com estiagens sazonais,não tem diretamente a ver com investimentos em novas áreas de captação de água,não tem diretamente a ver com aumento do consumo devido a aumento de população em áreas urbanas,tem sim a ver com roubo de água dos mananciais para aumentar lucro de empresas conduzidas por maquinas que desconhecem a necessidade humana.E agora Fernando,a festa acabou,a luz apagou,você marcha Fernando,pra onde?
irineu Almeida Baptista
Nesta história não tem santo. Tanto o Governo Estadual assim como o Federal (através do IBAMA) não fizeram, e dificilmente farão, alguma coisa que possa proibir essas atrocidades. O Pimentel terá muitas dificuldades p/ barrar esse processo. A exportação de minério tem um peso muito forte no nosso PIB e, consequentemente, na balança comercial. Toda aquela loucura p/ proibir a construção de Belo Monte, que vai ajudar a aumentar a nossa produção de energia elétrica, não vale p/ a construção dos minerodutos. Infelizmente….
FrancoAtirador
http://www.auditoriacidada.org.br
FrancoAtirador
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DIVIDÔMETRO
2014 => R$ 977.897.452.861 = R$ 2,7 Bilhões/Dia
Quanto o Brasil Gastou em Dívida em 2014
Em 2014, até 31/12, a dívida consumiu R$ 978 bilhões = 45% do Gasto Federal
Estoque da dívida – dez/2014
Montante da Dívida Interna (em Reais)
e da Dívida Externa (em Dólares)
Interna: R$ 3.301.051.276.022,50
(3 TRILHÕES, 301 BILHÕES, 51 MILHÕES, 276 MIL, 22 REAIS E 50 CENTAVOS)
Externa: US$ 554.708.937.494,01
(554 BILHÕES, 708 MILHÕES, 937 MIL, 494 DÓLARES E 1 CENTAVO)
Entenda esses números:
http://www.auditoriacidada.org.br/entenda-os-numeros-do-dividometro-e-do-estoque-da-divida
Lucimara Cunha
Teremos todos que nos engajar nesta luta ou assistiremos e cooperaremos com a nossa própria destruição.
Euler
Taí uma matéria que nunca veremos em jornais, aspas, de Minas e do Brasil. Se fosse contra o PT e o governo federal, aí sim, seria manchete com letras garrafais. Ah, esse criminoso monopólio da mídia… Até quando o Brasil vai aceitar essa tutela?
wander
só lembrando que a ANA e o IBAMA responsáveis pela outorga da água e pelo licenciamento dos empreendimentos são vinculados ao Governo Federal e que o novo governador de minas é do PT. cabe a pergunta o governador vai deixar os mineiros morrerem de sede ou vai ou vai fazer que não é com ele assim como o governo federal?
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