No desmanche do BNDES, grana do FAT e do FGTS seria entregue a bancos privados, denunciam funcionários
Tempo de leitura: 5 minAFBNDES: Comunicado sobre a proposta de mudança na metodologia de cálculo da TJLP
Vivemos um dos momentos mais graves da história do Banco. Pedimos a atenção e reflexão de todos.
A imprensa vem noticiando há duas semanas que uma mudança na metodologia de cálculo da TJLP está em curso.
Trata-se de uma mudança profunda na precificação do crédito do BNDES, com impactos significativos sobre o Banco e sobre o investimento em capital fixo no Brasil.
A mudança basicamente consiste em que a TJLP flutuará como uma taxa de juros de mercado, mais especificamente a taxa de juros de títulos do governo federal de “longo prazo” (NTN-B de cinco anos).
A proposta está em estado adiantado de elaboração, uma vez que há informações de que um projeto de lei está para ser encaminhado ao Congresso Nacional.
Onde essas mudanças vêm sendo planejadas? Dentro do próprio BNDES, por um pequeno grupo ligado à Diretoria. Parece que há alguns meses trabalham no tema.
Depois que a imprensa publicou o que está acontecendo, a Diretoria resolveu, no final da semana passada, comunicar aos superintendentes a mudança em curso.
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A Diretoria da AFBNDES possui algumas posições sobre o tema e gostaríamos de compartilhá-las com os funcionários do Banco.
Essas posições dizem respeito a três questões: sobre transparência na relação entre Diretoria do Banco e quadro funcional; questões preliminares sobre a natureza da proposta de precificação da TJLP; e sobre a natureza da luta em defesa do BNDES.
Em primeiro lugar, não podemos aceitar que um projeto de lei dessa importância seja encaminhado para Brasília sem a devida discussão com a Casa.
Isso é um desrespeito completo ao quadro funcional. Não adianta mencionar retoricamente, em encontros sociais internos, que se preza a capacitação técnica dos funcionários do BNDES e, ao mesmo tempo, redefinir a forma de atuação da instituição sem nenhum debate interno.
Pelo que podemos julgar, não fosse a imprensa, talvez nem os superintendentes estivessem a par da mudança de curso à vista.
Em segundo lugar, é fundamental que os funcionários do BNDES avaliem a proposta de uma perspectiva ampliada, buscando captar o sentido mais profundo das mudanças em curso.
Nesse sentido, é preciso olhar a proposta de nova TJLP à luz das demais propostas que a atual Diretoria encaminhou e está encaminhando para entender como devemos reagir a elas.
A pergunta que todos devemos fazer é para onde está apontando uma Diretoria que reduz deliberadamente o funding de longo prazo do BNDES, e agora propõe uma TJLP de mercado?
Além da possível elevação da taxa de juros de longo prazo, bem como do aumento de sua instabilidade, talvez a mais grave consequência da medida seja a mudança do papel que até hoje se atribuiu à TJLP.
A TJLP tem sido tratada como a taxa que deveria incentivar ou induzir o setor privado em direções consideradas meritórias pelo governo (onde, por exemplo, para citar um clichê que a atual direção costuma fazer uso, como se fosse uma orientação mais concreta do que realmente é: “os benefícios sociais são maiores que os privados”).
Note-se que essa é a interpretação prevalecente, não apenas numa abordagem desenvolvimentista, ligada à tradição do BNDES, ou mesmo prevalecente na administração do professor Luciano Coutinho, mas também é a visão que está implícita na Política Operacional (PO) recém lançada, com toda pompa e coordenação midiática!
Pois é, contraditoriamente, a nova TJLP vai de encontro ao papel da TJLP presente na nova PO.
Historicamente, é fundamental que todos tenham conhecimento disso, a mudança de precificação do crédito do BNDES na direção de uma taxa de mercado faz parte do que já foi chamado de “Proposta Arida”.
O economista e ex-presidente do BNDES Pérsio Arida, num texto para discussão da Casa das Garças de 2005, sugeriu um conjunto de reformas para os chamados mecanismos compulsórios de poupança, em referência à forma como operam BNDES e a Caixa Econômica (o texto é facilmente acessado na internet, “Mecanismos Compulsórios e mercado de capitais: proposta de política econômica”.
Desde então o ex-presidente tem se empenhado numa cruzada anti BNDES e Caixa Econômica, que pode ser acompanhada em vários vídeos no Youtube).
Além da precificação por taxas de mercado, a proposta prevê também mudanças na gestão do FAT.
Ao invés de confiar na administração dos recursos dos fundos pelo BNDES, Arida sugere “leilões em que instituições financeiras privadas competiriam pela aplicação dos recursos do FAT ou do FGTS em setores ou atividades pré-selecionados. Essas modificações atenuariam os efeitos do monopólio exercido pela CEF e pelo BNDES e reduziriam o escopo de pressão dos grupos de interesse”.
Não pode haver dúvida quanto à visão de mundo ao qual a proposta da nova TJLP está vinculada.
Não podemos discutir a proposta de mudança de precificação desligada da direção para a qual ela aponta. Do nosso ponto de vista, ontem anteciparam o pagamento de um funding precioso para o banco; hoje estamos propondo a precificação do crédito a mercado; amanhã estaremos possivelmente sendo mais uma vez surpreendidos com a notícia da organização dos leilões mencionados na citação acima.
Nossa terceira consideração diz respeito à legitimidade da luta em defesa do Banco.
O BNDES é uma conquista histórica do povo brasileiro.
Se democraticamente for compreendido que a instituição deve sair de cena para deixar o setor financeiro privado assumir as funções de promoção de política de desenvolvimento e política industrial, temos que aceitar, isso é parte do jogo democrático.
Vimos nos EUA um debate eleitoral que opôs visões diferentes sobre uma instituição afim, como é o Exim Bank.
Que se discuta em eleições futuras o que se espera do BNDES, até mesmo a necessidade de sua existência, mas não podemos aceitar que se esvazie uma instituição dessa importância para o Brasil com campanhas de mídia. Não temos medo do debate democrático nacional.
Temos convi cção que nenhum candidato a presidente ganhará eleição prometendo desmantelar o BNDES como indutor do desenvolvimento nacional.
Que se estabeleça o debate sobre o BNDES, que a proposta Arida seja apresentada, de forma transparente, num debate democrático.
Finalmente, caros e caras colegas, nosso diagnóstico é que o momento é gravíssimo.
Ao mesmo tempo, não é hora para abatimentos, para desesperança. Podemos muito se estivermos unidos.
Sabemos também que não somos os senhores da verdade, longe disso, vemos nosso papel de forma modesta. Queremos apenas o debate, internamente e na sociedade brasileira.
Na discussão sobre a devolução antecipada dos 100 bi, vimos como o debate pode transformar o que aparentemente são grandes justificativas técnicas em discutíveis estratégias de imagem e adesão a valores culturais autoritários.
Enquanto isso, acompanhamos como os tradicionais centros do saber econômico (universidades americanas e europeias, FMI, Banco Mundial etc.) estão questionando a validade de diversas premissas teóricas consideradas até a crise de 2008 como canônicas, inclusive a relação entre juros e inflação (vide recente artigo de André Lara Rezende).
Temos observado como o debate internacional sobre as necessidades de investimento em infraestrutura, no mundo desenvolvido e emergente, está levando à formação de um consenso sobre a importância do papel dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo (e a recuperação das economias em crise).
Nesse intuito, a Diretoria da AFBNDES conclama todos os funcionários do BNDES a refletir sobre os rumos do BNDES e sobre as consequências do desmantelamento da instituição para o desenvolvimento brasileiro.
Estamos abertos para o debate e para o contraditório. Precisamos reunir forças e nos articular com amplos setores da sociedade civil para que essa discussão tenha na Casa o seu centro referencial, mas que extrapole as fronteiras internas e se transforme, de forma democrática, em um amplo debate nacional.
E, principalmente, conclamamos os funcionários a que manifestem aos seus superiores o entendimento de que não estão de acordo com o envio de uma proposta de projeto de lei sem a prévia discussão na Casa. Contamos com vocês.
24 de janeiro de 2017
A Diretoria da Associação dos Funcionários do BNDES — AFBNDES
Comentários
Luiz Carlos P. Oliveira
Algum coxinha duvida? Vamos lá, eu provo:
https://www.google.com.br/amp/economia.estadao.com.br/blogs/joao-villaverde/a-batalha-do-proer-nao-acabou-20-anos-depois/%3famp
Luiz Carlos P. Oliveira
Em dezembro de 2002, quando o FHC deixou o governo, olha o que ele aprontou antes, quando negociou com o FMI, aquele que Lula mandou às favas:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u43177.shtml
Só que o efegagá achou que o PSDB ganharia a eleição, senão jamais teria deixado o dinheiro para o governo Lula. E mais, deixou 1 bilhão, mas o governo teria que economizar 39 bilhões. Coincidentemente, 39 bilhões foi o dinheiro que FHC gastou para salvar da falência os bancos Econômico e Nacional. Esses bancos quebraram, assim mesmo, e ainda hoje, devem 29 bilhões ao governo. Essa é mais uma herança maldita do dinheiro público mal aplicado.
Luiz Carlos P. Oliveira
Só para terem uma ideia, os bancos cobram, em média, de 2 a 2,5% ao mes nos empréstimos para capital de giro. Imagina pegar a 7,5% ao ano e aplicar a 24% ?
Também quero essa teta para mamar.
Luiz Carlos P. Oliveira
Estamos falando aqui de centenas de bilhões de reais, dinheiro do FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, que o Traíra Mor quer tirar da Caixa, do Banco do Brasil e do BNDES e entregar ao Bradesco e Itaú. Isso é uma vergonha, um disparate, uma tramoia sem fim. Desde quando dinheiro público pode ser administrado por bancos privados?
Ah, mas o governo quer fazer leilão do dinheiro disponível. Quem garante que os bancos privados vão usar esse dinheiro somente para investimentos? Para quem não sabe, financiamento para investimento é uma coisa, financiamento de capital de giro é outra.
Investimento é o financiamento de máquinas, equipamentos, construcões de plantas industriais, etc.
Capital de giro é empréstimo em dinheiro, simplesmente.
E como vai funcionar esse leilão? Provavelmente o banco privado “contrata” 200 milhões, à taxa de 7,5% ao ano – eu disse AO ANO – (taxa da TJLP hoje). E pode emprestar a 300% ao ano, nos juros de cheque especial ou cartão de crédito. Mesmo que exista uma fiscalização do emprego dessa grana preta, duvido que se consiga fazer com que ela seja aplicada somente em financiamentos, pelos bancos privados. Aliás, os bancos já ganham comissão por intermediação de negócios do Proger, do Finame e outras linhas de crédito do governo.
Não é uma gracinha? O que o governo, o FAT ou a mãe Joana ganham com isso? Alguém vai lucrar, e muito. E não será o trabalhador e nem o empresariado. Os empresários, inclusive, deveriam pressionar para que esse assalto ao erário público não seja aprovado. Eles serão também prejudicados com o aumento da taxa de juros para investimento.
RONALD
Que pessoalzinho medonho é esse de temer-traíra. Ainda ver cara deste pulha do André Lara; um sujeito que era para estar encarcerado para sempre e está aí conspirando com essa malta sem fim !!!!!!!!!!!!!!!!
Chega de traidores !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Eu
Ronald, se você se referiu à foto na imagem que encima o texto, ela não é do André Lara Rezende, mas do Pérsio Árida, tão ou mais ruim que o primeiro. No mais, concordo com todo o resto de seu comentário. Saudações!
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