João Pedro Stedile: Só o governo e os capitalistas é que estão agindo
Tempo de leitura: 5 minSó a luta social pode levar o projeto popular a disputar com governos e capital, diz líder do MST
Um dos fundadores do Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do qual também é membro da direção nacional, João Pedro Stédile foi um dos oradores na Conferência Ecumênica Global sobre a Nova Arquitetura Financeira e Econômica, reunida em Guarulhos, São Paulo, de 29 de setembro a 5 de outubro.
Stédile partilhou reflexões sobre a conjuntura econômica, desenvolvidas internacionalmente entre os movimentos de agricultores que compõem a Via Campesina, entidade que reúne representantes de mais de 100 países.
A entrevista é de Marcelo Schneider e publicada pela Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação (ALC), Quito, Equador 02-10-2012.
do site do Instituto Humanitas Unisinos
Eis a entrevista.
No encontro anual do Fórum Ecumênico ACT Brasil, Ademar Ludwig, do MST, partilhou sua visão acerca da situação atual do país. Para ele, há três projetos em conflito no Brasil. O primeiro, do governo do PT, com sua visão desenvolvimentista e assistencialista. O segundo, da direita histórica, hoje situada mais no Democratas e no PSDB. O terceiro projeto seria o da sociedade civil, das organizações populares que tentam discutir modelos alternativos e construir redes de cooperação. Em sua opinião, quais são as forças em conflito no mundo de hoje?
Acho que, de certa forma, essa conjuntura que o companheiro Ademar apresentou sobre a correlação de forças no Brasil se repete na América Latina, ainda que com outros nomes, e também em nível mundial. Há um grande projeto, que é o do grande capital. Embora em crise, ele ainda é hegemônico ideológica, militar e economicamente. O capitalismo tenta se renovar para gerar um novo ciclo de acumulação mais adiante, que ainda não se sabe onde vai estar centrado, mas que será de acumulação sob controle das grandes empresas transnacionais do mundo.
Há um segundo projeto, que aparece também muito claro na América Latina, que seria uma espécie de integração capitalista, em que as burguesias locais querem ter controle sobre a sua produção, mas que não representa solução para os problemas do povo. Ou seja, eles querem desenvolver o capitalismo e a produção sob seu controle, têm contradições pontuais em relação aos Estados Unidos e ao império, mas não representam uma solução verdadeira. Em geral, defendem uma maior ingerência do Estado, não porque sejam estatistas, mas porque hoje, no Terceiro Mundo, o Estado é o principal espaço que reúne a mais-valia social.
Portanto é o Estado que gera a maior parte do capital disponível. Então, esse grupo, precisa deste trampolim, precisa se apoderar desses recursos. E, para conseguir tocar esse montante, que é manejado pelos Estados, precisa ter projetos mais nacionalistas. E há um terceiro projeto, que seria uma alternativa popular. Seria a tentativa de reorganizar as economias dos países e do mundo em favor da solução dos problemas do povo. Quais são esses problemas? A fome, a falta de terra, de trabalho, de moradia e de educação.
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Nesse terceiro projeto, quais são as dificuldades que temos? Como sofremos um impacto muito grande, na década de 90, com a ofensiva generalizada do neoliberalismo, o que vemos hoje é um refluxo do movimento de massas. Só recentemente é que fomos ver, na Europa, as primeiras reações populares à crise econômica.
Há uma criminalização da luta social em toda parte do mundo. É uma criminalização na qual não se precisa matar ou prender o manifestante, o que ocorre ainda em alguns países como a Colômbia, mas é ideológica, feita pela televisão e pelo poder Judiciário. A nossa esperança é que no próximo período haverá uma re-ascensão dos movimentos de massa e que estes, por sua vez, irão colocar o seu verdadeiro projeto popular na agenda de disputa com os governos e com o capital.
O movimento ecumênico, historicamente, sempre esteve envolvido em muitas edições do Fórum Social Mundial (FSM) e, mais recentemente, teve participação ativa no processo que levou à Cúpula dos Povos. Esse movimento mostrou sinais de que há uma dinâmica diferente em voga, marcada por um esforço de convergência de agendas e lutas e é enorme a dificuldade de chegar a um consenso sobre o tema do desenvolvimento sustentável. Há uma diferença entre o tom de desabafo e protesto, que marcou tantas edições do FSM e a metodologia de convergência e pautas comuns da Cúpula dos Povos. Você sente que o momento atual é diferente?
Acho que o espaço da Cúpula dos Povos gerou um clima político novo para essa convergência, sobretudo para que os movimentos sociais incorporassem na sua pauta os temas do meio ambiente, e os fizessem de uma forma politicamente correta. No entanto, mais do que documentos convergentes, o que vai alterar a correlação de forças é se, nos próximos dez anos, conseguirmos criar um clima político de re-ascensão do movimento de massas em todo o mundo.
Qual a sua opinião sobre o papel do Brasil na conjuntura mundial atual?
Esse é um assunto complexo. Primeiro, os capitalistas, que atuam na economia brasileira, têm certa autonomia em relação ao governo. Então, uma coisa é analisar o capitalismo brasileiro e outra coisa é analisar o governo de Dilma Rousseff. O que percebemos no cenário internacional é que, em relação à América Latina, o governo Dilma tem tomado atitudes positivas, ou seja, fortalece a unidade do continente e se propõe a enfrentar os americanos.
No entanto, quando chega ao G20, passa a ter atitudes de subserviência aos grandes interesses do capital. Essa contradição só vai ser resolvida quando tivermos uma re-ascensão dos movimentos de massa aqui no Brasil. No quadro atual, o povo brasileiro e as forças populares estão ausentes da política. Só o governo e os capitalistas é que estão agindo. Evidentemente que, entre essas duas forças, o governo ainda tem um papel positivo. Mas não são iniciativas do povo.
Num modelo econômico que preze a justiça e o cuidado à natureza, quais seriam as ferramentas metodológicas e políticas que o Brasil teria a oferecer à comunidade mundial?
Acho muito ruim utilizar como parâmetro modelos ou exemplos. Acho que o Brasil não é exemplo, assim como a África do Sul, Cuba e China também não podem servir de exemplo. Cada povo tem experiências acumuladas suficientes para encontrar as verdadeiras soluções para seus problemas.
O que está faltando, infelizmente, é que ainda vivemos um período histórico de descenso do movimento popular. Ao excluir as massas da política, o povo não tem espaço para apresentar soluções. Nossa visão é que com a volta das massas aos processos de tomada de decisão, os povos, que têm muita experiência acumulada, é que buscarão as soluções.
O caso do Brasil é, de certa forma, emblemático porque o país é enorme territorialmente, tem uma população muito grande e tem riquezas naturais intermináveis. O caso brasileiro vai ser muito peculiar, porque aqui encontraremos soluções mais rapidamente do que em regiões com limitações expressivas, como a Bolívia, que não tem indústria, ou o Paraguai, que virou uma plataforma só de soja. Nesses países, as soluções para uma economia mais justa serão mais demoradas do que aqui no Brasil.
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Comentários
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Carlos Ribeiro
O maior erro do PT, foi pensar que o Brasil é uma democracia. O golpe já está bem adiantado. Preparemo-nos.
Julio Silveira
A culpa do PT foi após encontrar a cama ter se deitado nela.
Mário SF Alves
Muitos lamentam amargamente o que espetacularização e respectivo julgamento da AP 470 mostra como sendo prove inconteste de ética duvidosa praticada pelo PT. Cabe reflexão.
E será que teria sido diferente se o PT adotasse ou tivesse sido possível a ele adotar e manter a mais absoluta ética na condução desses aproximadamente 10 (dez) anos de governo? Refiro-me aquela mesma ética, que o diferenciou aos olhos de quase todos nós; que o legitimou como algo novo na política nacional. Será que se agisse conforme tal pressuposto o PT sendo o PT teria conseguido governar? E por quanto tempo?
Senão vejamos:
1- Não resta a menor sombra de dúvida de que o capitalismo é movido a corrupção, que, por assim dizer, encontra-se no DNA do sistema;
2- Não restam dúvidas de que seus beneficiários e prepostos sempre farão vista grossa para a corrupção praticada pelos defensores ou integrantes desse mesmo sistema, seja essa corrupção de que ordem e natureza for, sejam milhões de reais, dedólares, seja bilhões, trilhões, pouco importa;
3- A legislação eleitoral é falha e permite a realização de campanhas movidas a fantásticas somas em dinheiro, dinheiro este que, via de regra, é suprido pelos capitalistas visando a satisfação de seus quase sempre inconfessáveis interesses;
4- O Brasil é um dos países mais ricos do mundo, e essa é a causa eficiente de seu eterno, injustificável, constrangedor e desumano subdesenvolvimento, sendo que, historicamente, as forças, interesses ou países que determinam tal condição são exatamente ou predominantemente aqueles que maior proveito tiram de tal condição;
5- Admitindo-se a hipótese de o PT ter podido ser diferente, e que suas metas fossem absolutamente claras, cabendo-lhe exclusivamente a implementação de políticas destinadas unicamente à superação do dito (e maldito) subdesenvolvimento (o que já equivaleria a uma verdadeira revolução), ainda assim, caberia a dúvida: como reagiriam as tais referidas forças? Assistiriam impassíveis a perda de seus “históricos e intocáveis privilégios”? Quais os expedientes seriam adotados para fazer parar o citado modelo de desenvolvimento adotado? A mídia privada, notadamente a televisiva, amplamente denominada PiG, como é que reagiria? Quais as artimanhas hipoteticamente poderiam ser adotadas? Quais as instituições estariam a seu serviço? O STF seria isento em caso de uma armação política destinada a desmoralizar o referido partido?
6- E o PT em situação tão extrema, como reagiria? Com quem ele poderia contar? Teria ele acumulado força o bastante a ponto de tornar-se suficientemente capaz de enfrentar estes seus poderosíssimos adversários? Quanto tempo um governo com tal propósito, pautado por tal irrepreensível ética conseguiria governar de modo a acumular tal força? Com quais capitalistas e/ou empresas poderia contar ao longo da referida trajetória? Com quais instituições públicas poderia contar? O povo já estaria preparado para defender-se e defendê-lo?
Em tempo: ante o exposto pelo menos para mim basta de ser ingênuo. E com ou sem a referida ética, o julgamento do AP 470 está aí bem ao alcance de nossos narizes. E não cheira nada bem.
Só para recordar. Ao que parece, Eduardo Galeano, aquele que escreveu o “As Veias Abertas da América Latina”, continua tendo toda a razão. Os golpes de estado na América Latina são decorrentes de suas incomensuráveis riquezas, sobretudo minerais e terras cultiváveis. Pelo visto, as veias continuam abertas. A bola da vez é o Pré-Sal. E aí daquele que ousar querer tirar o Brasil dessa condição de mera reserva de valor; desse eterno e degradante subdesenvolvimento. Senão isso, como justificar tanta perplexidade, tanta publicidade e tanta dúvida no julgamento da chamada Ação Penal 470, vulgo mensalão do PT?
Willian
O povo não quer luta social. O povo quer subir na vida para comprar, aqui ou em Miami.
Mário SF Alves
Não Willhião. Você mostra que é tendencioso ou está equivocado. O povo só não sabe (ainda) agir politicamente em favor de seus interesses. É só. E ainda. A propósito, o mal de todos nós, leigos, é generalizar demais. Ou você ainda acredita que Lula neste País é um só?
lulipe
Nunca antes na história deste país, os banqueiros e empreiteiros lucraram tanto….
Narr
Stélide tem sido solidário a J. Dirceu. A ponto de ter jantado com J. Dirceu poucos dias antes do começo da condenação à prisão do ex-ministro. Então, que o MST se prepare. Em breve, leremos que há mensalão do MST e que essa turma toda tem que ir pra cadeia. A balança foi desequilibrada. A Direita tá com a corda toda e vem com mais coisas por aí.
MARCELO
Viram a polícia do Tarso Genro do PT
o que fez com manifestantes no Centro
de POA????Se fosse em SP ou Minas…..
Willian
Juro que estranhei que o MST, a UNE, a CUT ou qualquer um dos movimentos sociais não fizeram nem uma manifestaçãozinha nas ruas de apoio aos petistas acusados no mensalão. Queria ver qual seria a reação do povo a estas manifestações.
Bonifa
Sempre fizemos uma associação entre Boff e Stedile como dois pensadores originais e sinceros em abundância, embora travados por alguns equívocos políticos que os impediam de colocar em perspectiva ampla seus potenciais de transformar esperança em experiência fértil e objetiva. Vemos agora com satisfação que Stedile dá mais e mais sinais de estar em rota de rompimento com seus bloqueios ideológicos.
Pedro Cruz
O PSOL, no Rio de Janeiro, aceita até uma ajudazinha da reporcagem de veja. Esses são os “verdadeiros” socialistas. Na verdade são a linha auxiliar dos reacionários. Mas, isto não tem nada a ver com a entrevista com o Stédile. Concordo plenamente, as classes populares não estão atuando, precisam entrar em cena. Um governo popular e democrático como os de Lula e Dilma, terão grandes entraves, principalmente daqui para a frente, se não contar com a ação desses setores. Este problema não é compreendido por alguns setores, como alguns blogueiros sujos, Azenha, Rodrigo Vianna, dentre outros, que querem por que querem, se não pegam a bola e vão embora, que a Dilma avance mais do que pode, sem a ajuda dos movimentos sociais. Como que um governo, como o atual, uma grande composição de fôrças vai enfrentar o poderio dos “capitalistas”, como por exemplo, na regulamentação da mídia e nesse episódio de julgamento de exceção que vivemos, sem a ajuda dos movimentos sociais? Acho que não teremos fôrças para os novos embates, tais como, reforma tributária, política, agrária, adiministrativa, etc., sem grandes apoios ou reivinvicações dos movimentos sociais.
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Fabio
Ora, mas que entrevista tendenciosa… me dá até vergonha!!!
Primeiramente, só gostaria de dizer que a extrema esquerda paraguaia, rompeu com Fernando Lugo, dias antes do golpe!!! Afinal, os primeiros são a verdadeira esquerda, enquanto que os segundos estão a serviço do capital, não é mesmo? Agora diga isso para a população paraguaia, que votou em Lugo e se viu traída… a isto a extrema esquerda, que faz o trabalho que a direita quer, não consegue explicar.
Que organizações populares cara palida???
Muitas destas, estão tendo mais espaço de se organizar justamente nesta última década, estão tendo mais diálogo e liberdade, outras (a maioria) estão apoiando o governo (no caso do Brasil)…
Me digam em quais prefeituras o Orçamento Participativo é implementado? me digam em quais prefeituras a Economia Solidária (bandeira do mestre Paul Singes) é implementada?
Me parece que aqui, na verdade, há um discurso de uma esquerda, que quer ser a esquerda da esquerda, mais por ego, do que por convicção.
Se não vejamos: o respeitabilíssimo candidato Marcelo Freixo, está recebendo dinheiro de empresa, da mesma forma que o PT recebe e o PSOL reclama. Aqui em São Paulo, o Giannazzi grita, espernei, aponta o dedo, para falar das ligações do PT, mas e o discurso do mesmo Freixo, de que aceitaria o apoio do PSDB em um eventual segundo turno??
Quando o PSOL deixa de ser um partido com teto de 1% para ir para o segundo lugar nas intenções de voto, neste exato momento, o discurso se discola da prática.
Hora, quem conhece um pouco de política, sabe que o candidato Giannazzi está escondendo o Ivan Valente de sua campanha!!! Surpresa para aqueles que achavam que o PSOL, era diferente, era coeso??? Pois é, a Heloísa Helena saiu do partido, dizendo que em todos partidos existem malandros!!!!
Por fim, conclui dizendo que existem políticas equivocadas, políticas de concessão, partidos fisiológicos inundando o congresso!! Mas a verdadeira questão, não se aborda por estes mestres de discurso: A REFORMA POLÍTICA. Se fala em defesa ao financiamento público, mas cade a organização? cade a passeata?
Me desculpem, mas eu respeito muito o PT, de todos os partidos modernos de esquerda, foi o único que se propos a governar, com todos os defeitos e dificuldades que o sistema político brasileiro impõe!!!
O resto para mim, é a esquerda fazendo o jogo da direita!!!!
Julio Silveira
Muito coerente Fabio, voce toca na ferida.
Eu agora estou mais para o deboche. Essa esquerda nossa é muito “pragmatica”. Mas não apresenta disposição para a originalidade, ou seja não segue o proprio discurso.
O Proprio MST, por onde anda? Eu sei, está dando entrevista, fazendo critica ao governo que apoiam. Estão agindo que nem os latifundiarios da pecuaria, estão se transformando em gigolos de gado.
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