MST: Convocação de Stedile para depor em CPI é mais uma etapa da criminalização do movimento

Tempo de leitura: < 1 min
Foto: Rafael Stedile

NOTA DO MST

Convocação do João Pedro Stedile para CPI é mais uma etapa da criminalização contra o MST

Parlamentares ligados aos ruralistas e ao bolsonarismo deliberaram nesta terça-feira, 20 de julho, convocar o integrante da Coordenação Nacional do MST, João Pedro Stedile, para prestar depoimento na CPI.

As ações coletivas que reivindicam política pública de reforma agrária, são fruto das necessidades concretas das famílias Sem Terra e resultado de uma acintosa e secular concentração da propriedade da terra.

Economista, João Pedro é reconhecido mundialmente como uma referência e grande autoridade no tema da questão agrária no Brasil e do combate às injustiças sociais.

A CPI do MST, cada vez mais, tem se revelado uma cortina de fumaça para tentar apagar os crimes e o triste legado de destruição ambiental, assassinatos no campo e ódio de classe do bolsonarismo.

Ainda não há data para o depoimento do João Pedro Stedile e os requerimentos aprovados foram apresentados por parlamentares do União Brasil, PL e PP, partidos que estão na base de apoio do agronegócio e do bolsonarismo.

21 de junho de 2023, São Paulo – SP

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST

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Zé Maria

“Sentia-me dentro de um cerco que se fechava.
Decidi, então, escrever um poema que fosse
o meu testemunho final, antes que me calassem
para sempre.”
Ferreira Gullar

https://youtu.be/atJKqa_sNOk

Zé Maria

http://aspta.org.br/files/2015/03/feira-Guapi-2.jpg
https://outraspalavras.net/wp-content/uploads/2015/04/150424-Agroecologia.jpg
http://aspta.org.br/files/2015/03/Afojo_Guapimirim_fev2015-21-621×400.jpg
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AGROECOLOGIA & ORGANIZAÇÃO COLETIVA: A REVOLUÇÃO DO SÉCULO 21
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Isso é o que mete Medo/Pavor
no AgroGolp Tóxico e Predador.
E além disso na Burguesia Toda.
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A Rede Complexa da Agroecologia:
Espaço de Produção dos Encontros das Organizações Camponesas

Como a troca de conhecimentos, técnicas e afetos abre espaço
para novo tipo de produção rural, num país onde ainda predomina
modelo dos desertos verdes

[Reportagem: Juliana Dias e Mariana Moraes | AS-PTA | 04/3/2015]

Cresce o número de agricultores que se interessam por realizar a transição
dos sistemas produtivos convencionais para a produção de alimentos
em harmonia com a Natureza.

O incentivo vem de outros agricultores experimentadores e de uma rede
de entidades, grupos e organizações governamentais.

O crescimento dessas iniciativas está relacionado à habilidade de mobilizar
e ativar laços de proximidade presentes no dia a dia das comunidades
destes produtores de alimentos saudáveis.

O conhecimento acumulado por gerações é a fonte primeira da competência
destes agricultores para a preservação dos recursos naturais e inovações
na organização produtiva e social.

Isso mantém a centralidade da mão de obra familiar e o pertencimento
à comunidade.

Os camponeses, com uma cultura fortemente marcada pelos laços territoriais, formam uma população diversificada, com diferentes modos de ocupação do espaço, tradições acumuladas e identidades afirmadas.

São agricultores familiares; assentados da reforma agrária; trabalhadores assalariados que residem no campo; povos da floresta (agroextrativistas, caboclos, ribeirinhos, quebradeiras de coco de babaçu, açaizeiros); trabalhadores dos rios e dos mares (caiçaras e pescadores artesanais); comunidades indígenas e quilombolas, incluindo os diversos tipos de agricultores em situações urbanas e periurbanas.

Ao longo do tempo e em espaços diferenciados, prevalece entre esses grupos um traço comum: as lutas pela condição de protagonistas dos processos sociais.

Dar visibilidade a essas trajetórias é uma via para reconhecer suas contribuições para a sociedade.

O coordenador do programa de Agricultura Urbana da AS-PTA – Agricultura
e Agroecologia explica que um dos objetivos da instituição é “buscar e fazer
com que sejam conhecidas as experiências que indicam outros caminhos
para produzir, valorizar a diversidade cultural e manter os vínculos com o
território”.

Destaca também que além de localizar, a proposta é fazer com que os
grupos se encontrem.

“Promover a troca, o conhecimento e o intercâmbio dessas experiências estimula a organização e a atuação em rede”, destaca.

Esses encontros fortalecem e renovam os espaços institucionalizados
como as organizações camponesas, cooperativas e os sindicatos.
De acordo com ele, essas instituições passam a incorporar em seu cotidiano
o papel de promotores da agricultura familiar.

“É preciso dar visibilidade e fortalecer os agricultores familiares como atores políticos para que sejam protagonistas das se discussões entre o governo e a sociedade”.

Na última década, os Encontros Nacionais de Agroecologia (ENA);
as Jornadas de Agroecologia, realizadas nos estados, inciadas no Paraná;
o surgimento da Associação Nacional de Agroecologia e da Associação
Brasileira de Agroecologia (ABA-Agroecologia) contribuíram para consolidar
algumas convergências que hoje alimentam os processos de articulação
do campo agroecológico em suas diferentes expressões.

Na cidade, os agricultores são ainda mais invisibilizados por um sistema
alimentar que afasta o lugar de produção do lugar de consumo, fazendo
com que o cidadão perca suas referências sobre outras formas de viver,
produzir e comer.

Em contraposição a isso, no município do Rio de Janeiro, a Rede CAU
atua junto aos quintais produtivos e lavouras.

Defende a valorização da agricultura camponesa, o consumo ético e
responsável como dimensão de luta campo-cidade e a adequação e acesso
às políticas públicas.

Essa mobilização social traz visibilidade à agricultura nos espaços urbanos.

Com isso, reconstitui seu percurso histórico para o abastecimento
do município, reivindica um outro modelo de desenvolvimento agrícola
e insere os agricultores camponeses urbanos em espaços políticos
estratégicos.

A Rede CAU tem assento do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional do Município do Rio de Janeiro (Consea-Rio), o qual é presidido pelo agricultor Francisco Caldeira, da Associação dos Agricultores Orgânicos de Vargem Grande (Agrovargem), membro da rede. Também está presente no conselho gestor do Circuito Carioca de Feiras Orgânicas (CCFO), onde a agricultura urbana é representada em diversas feiras. Outro espaço de atuação da rede é o programa Mosaico Carioca de Áreas Protegidas, no qual busca estabelecer um diálogo sobre a importância e o valor das famílias agricultoras em Unidades de Conservação. E participou ativamente nas discussões para a elaboração do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo), lançado em 2013 pelo governo federal. Na visão de Mendonça, a sinergia do coletivo é capaz de protagonizar a elaboração e as mudanças nas políticas públicas.

Na Carta Aberta intitulada “Sociobiodiversidade e Bem Comum Carioca” (*),
a Rede CAU destaca a “tarefa complexa de enfrentar a invisibilidade”, que
muitas vezes encobre a atuação e a voz desses atores sociais. No entanto,
ao evidenciarmos as vitórias desses movimentos é possível constatar que
estão presentes com autoria e representatividade.

A Rede CAU organizou um grupo do Sistema Participativo de Garantia (SPG),
conferido pela Associação dos Agricultores Biológicos do Estado do Rio
de Janeiro (ABIO), credenciada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA).

O SPG é uma modalidade de avaliação da produção agroecológica/orgânica
mais conveniente para o camponês, obtido pelo controle social e verificação
do cumprimento das normas em conjunto com os próprios agricultores,
membros fornecedores do grupo, e com a participação de membros
colaboradores (consumidores e outras instituições de assessoria técnica).

A partir dessa conquista, vários produtores obtiveram seu selo da produção
orgânica, incluindo dois quintais urbanos.

Com isso, ampliam-se os mercados de venda de seus produtos e, sobretudo,
a credibilidade junto ao consumidor.

A concretização do acesso à Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), aliado
ao processo organizativo do SPG, deu a possibilidade de participação destes
agricultores na Feira Agroecológica da Freguesia, além de acessar programas
governamentais, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE),
fornecendo alimentos para estudantes de três escolas públicas na Zona
Oeste do Rio.

Assim, o PNAE viabiliza a garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada
e Saudável e a possibilidade de reflexão sobre o modelo inadequado
de abastecimento da cidade.

Essa política pública permite que diferentes abordagens didáticas
e educadoras, com foco na alimentação, sejam integradas ao processo
de ensino-aprendizagem nas escolas da rede pública.

Conforme o agrônomo Claudemar Mattos, assessor técnico da AS-PTA,
“o certificado da produção orgânica valoriza o sistema de produção
sem o uso de agrotóxicos e sementes transgênicas.

A sua emissão pelo Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (OPAC),
no caso a ABIO, é precedida pela concordância do grupo ao parecer positivo
de uma comissão que realiza visitas de verificação nos sistemas produtivos
dos agricultores”.

As visitas de verificação também têm o objetivo de promover trocas
de experiências entre os participantes do sistema e a orientação aos
agricultores membros, para que eles possam resolver possíveis não
conformidades, ou seja, critérios que impedem a obtenção do SPG.

Os espaços institucionais e políticos se fortalecem com a criação
de ambientes informais, como as feiras agroecológicas e eventos
de cunho cultural e turístico.

Em 2013, a Rede CAU empreendeu a construção de uma feira agroecológica
no bairro da Freguesia, Zona Oeste do Rio de Janeiro, com apoio da AS-PTA
e da associação de moradores da região.

Outro encontro já tradicional é o dia do Tira Caqui, que acontece há cinco
anos, todo dia 21 de abril, em lavouras de caqui existentes no Maciço da
Pedra Branca.

Essas iniciativas, apoiadas pelo Projeto Alimentos Saudáveis nos Mercados
Locais, realizado pela AS-PTA com patrocínio da Petrobras por meio do
Programa Petrobras Socioambiental [nos Governos do PT], têm demonstrado
a relevância das interações, aprendizados e intercâmbios de saberes entre agricultores e consumidores.

Em Guapimirim, um dos 19 municípios que compõem a Região Metropolitana
do Rio de Janeiro, os agricultores familiares da comunidade do Fojo
organizaram uma Associação de Produtores Rurais (Afojo), em 1997.
Mas só foi formalizada em 2007 [Governo LULA II], com a obtenção
do certificado SPG.

A partir daí foi possível construir uma parceria com a Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ) para a criação de uma feira agroecológica
no campus Ilha do Fundão, em 2010.

Essa oportunidade motivou o grupo a empreender coletivamente
para conquistar novos mercados de proximidade.

Em 2011, a Afojo iniciou a participação na Feira Agroecológica de Teresópolis/RJ;
e em 2013 se estabeleceu na Feira Agroecológica de Guapimirim/RJ.

Íntegra da Reportagem em :
http://aspta.org.br/2015/03/04/agroecologia-espaco-de-producao-dos-encontros-das-organizacoes-camponesas
https://outraspalavras.net/sem-categoria/a-trama-complexa-da-agroecologia/

Leia também:

https://aspta.redelivre.org.br/files/2019/02/Agriculturas_V14N2_EditorConvidado.pdf

http://aspta.org.br/files/2019/02/Agriculturas_V14N2_PorNormasSanitariasJustasEInclusivas.pdf

Revista Agriculturas: http://aspta.org.br/numeros-anteriores/
.
.

Zé Maria

https://s2.glbimg.com/TRkJSrFUAH_qM-gOs_03vxzTd_M=/620×465/s.glbimg.com/jo/g1/f/original/2014/02/10/img_0032.jpg

“A BOMBA SUJA”

É como uma bomba D
que explode dentro do homem
quando se dispara, lenta,
a espoleta da fome.

É uma bomba-relógio
(o relógio é o coração)
que enquanto o homem trabalha
vai preparando a explosão.

Bomba colocada nele
muito antes dele nascer;
que quando a vida desperta
nele, começa a bater.

Bomba colocada nele
Pelos séculos de fome
e que explode em diarreia
no corpo de quem não come.

Não é uma bomba limpa:
é uma bomba suja e mansa
que elimina sem barulho
vários milhões de crianças.

Sobretudo no nordeste
mas não apenas ali
que a fome do Piauí
se espalha de leste a oeste.

Cabe agora perguntar
quem é que faz essa fome,
quem foi que ligou a bomba
ao coração desse homem.

Quem é que rouba a esse homem
o cereal que ele planta,
quem come o arroz que ele colhe
se ele o colhe e não janta.

Quem faz café virar dólar
e faz arroz virar fome
é o mesmo que põe a bomba
suja no corpo do homem.

Mas precisamos agora
desarmar com nossas mãos
a espoleta da fome
que mata nossos irmãos.

Mas precisamos agora
deter o sabotador
que instala a bomba da fome
dentro do trabalhador.

E sobretudo é preciso
trabalhar com segurança
pra dentro de cada homem
trocar a arma de fome
pela arma da esperança.

FERREIRA GULLAR

Do mesmo Poeta Brasileiro,
Leia:

“João Boa-Morte,
Cabra Marcado pra Morrer”

Vou contar para vocês
um caso que sucedeu
na Paraíba do Norte
com um homem que se chamava
Pedro João Boa-Morte,
lavrador de Chapadinha:
talvez tenha morte boa
porque vida ele não tinha.

Sucedeu na Paraíba
mas é uma história banal
em todo aquele Nordeste.
Podia ser em Sergipe,
Pernambuco ou Maranhão,
que todo cabra da peste
ali se chama João
Boa-Morte, vida não.

Morava João nas terras
de um coronel muito rico.
Tinha mulher e seis filhos,
um cão que chamava “Chico”,
um facão de cortar mato,
um chapéu e um tico-tico.

Trabalhava noite e dia
nas terras do fazendeiro.
Mal dormia, mal comia,
mal recebia dinheiro;
se recebia não dava
pra acender o candeeiro.
João não sabia como
fugir desse cativeiro.

Olhava pras seis crianças
de olhos cavados de fome,
já consumindo a infância
na dura faina da roça.
Sentia um nó na garganta.
Quando uma delas almoça,
as outras não; a que janta,
no outro dia não almoça.

Olhava para Maria,
sua mulher, que a tristeza
na luta de todo dia
tão depressa envelheceu.
Perdera toda a alegria,
perdera toda a beleza
e era tão bela no dia
em que João a conheceu!

Que diabo tem nesta terra,
neste Nordeste maldito,
que mata como uma guerra
tudo o que é bom e bonito?
Assim João perguntava
para si mesmo, e lembrava
que a tal guerra não matava
o Coronel Benedito!

Essa guerra do Nordeste
não mata quem é doutor.
Não mata dono de engenho,
só mata cabra da peste,
só mata o trabalhador.
O dono de engenho engorda,
vira logo senador.

Não faz um ano que os homens
que trabalham na fazenda
do Coronel Benedito
tiveram com ele atrito
devido ao preço da venda.
O preço do ano passado
já era baixo e no entanto
o coronel não quis dar
o novo preço ajustado.

João e seus companheiros
não gostaram da proeza:
se o novo preço não dava
para garantir a mesa,
aceitar preço mais baixo
já era muita fraqueza.
“Não vamos voltar atrás.
Precisamos de dinheiro.
Se o coronel não der mais,
vendemos nosso produto
para outro fazendeiro.”

Com o coronel foram ter.
Mas quando comunicaram
que a outro iam vender
o cereal que plantaram,
o coronel respondeu:
“Ainda está pra nascer
um cabra pra fazer isso.
Aquele que se atrever
pode rezar, vai morrer,
vai tomar chá de sumiço.”

O pessoal se assustou.
Sabiam que fazendeiro
não brinca com lavrador.
Se quem obedece morre
de fome, e de desespero,
quem não obedece corre
ou vira “cabra morredor”.

Só um deles se atreveu
a vender seu cereal.
Noutra fazenda vendeu
mas vendeu e se deu mal.
Dormiu, não amanheceu.
Foram encontrá-lo enforcado
de manhã num pé de pau.
Debaixo do morto estava
um “cabra” do coronel
que dizia a quem passava:

“Este moleque maldito
pensou que desrespeitava
o que o patrão tinha dito.
Toda planta que aqui nasce
é planta do coronel.
Ele manda nesta terra
como Deus manda no céu.
Quem estiver descontente
acho melhor não falar
ou fale e depois se aguente
que eu mesmo venho enforcar.”

João ficou revoltado
com aquele crime sem nome.
Maria disse: “Cuidado
não te mete com esse homem.”
João respondeu zangado:
“Antes morrer enforcado
do que sucumbir de fome.”

Nisso pensando, João
falou com seus companheiros:
“Lavradores, meus irmãos,
esta nossa escravidão
tem que ter um paradeiro.
Não temos terra nem pão,
vivemos num cativeiro.
Livremos nosso sertão
do jugo do fazendeiro.”

O Coronel Benedito
quando soube que João
tais coisas havia dito,
ficou brabo como o Cão.
Armou dois “cabras” e disse:
“João Boa-Morte não presta.
Não quero nas minhas terras
caboclo metido a besta.

“Vou lhe dar uma lição.
Ele quer terra, não é?
Pois vai ganhar o sertão!
Vai ter que andar a pé
desde aqui ao Maranhão.
Quando virar vagabundo,
terá de baixar a crista.
Vou avisar todo mundo
que esse ‘cabra’ é comunista.

Quem mexe com Benedito
bem caro tem que pagar.
Ninguém lhe dará um palmo
de terra pra trabalhar.”

Se assim disse assim fez.
João foi mandado embora
do seu casebre pacato.
Disse a Maria: “Não chora,
todo patrão é ingrato.”
E saíram mundo afora.
Ele, Maria, os seis filhos
e o facão de cortar mato.

Andaram o resto do dia
e quando a noite caía
chegaram numa fazenda:
“Seu doutor, tenho família,
sou homem trabalhador.
Me ceda um palmo de terra
pra eu trabalhar pro senhor.”

Ao que o doutor respondeu:
“Terra aqui tenho sobrando,
todo esse baixão é meu.
Se planta e colhe num dia,
pode ficar trabalhando.”
“Seu coronel, me desculpe,
mas eu não sei fazer isso.
Quem planta e colhe num dia,
não planta, faz é feitiço.”
“Nesse caso, não discuta,
acho melhor ir andando.”

E lá se foi Boa-Morte
com a mulher e seis meninos.
“Talvez eu tenha mais sorte
na fazenda dos Quintinos.”
Andaram rumo do Norte,
pra além da várzea dos Sinos:
“Coronel, morro de fome
com seis filhos e a mulher.
Me dê trabalho, sou homem
para o que der e vier.”

E o coronel respondeu:
“Trabalho tenho de sobra.
E se é homem como diz
quero que me faça agora
essa raiz virar cobra
e depois virar raiz.
Se isso não faz, vá-se embora.”

João saiu com a família
num desespero sem nome.
Ele, os filhos e Maria
estavam mortos de fome.
Que destino tomaria?
Onde iria trabalhar?
E à sua volta ele via
terra e mais terra vazia,
milho e cana a verdejar.

O sol do sertão ardia
sobre os oito a caminhar.
Sem esperança de um dia
ter um canto pra ficar,
à sua volta ele via
terra e mais terra vazia,
milho e cana a verdejar.

E assim, dia após dia,
andaram os oito a vagar,
com uma fome que doía
fazendo os filhos chorar.
Mas o que mais lhe doía
era, com fome e sem lar,
ver tanta terra vazia,
tanta cana a verdejar!

Era ver terra e ver gente
daquele mesmo lugar,
amigos, quase parentes,
que não podiam ajudar,
que se lhes dessem pousada
caro tinham que pagar.
O que o patrão ordena
é bom não contrariar.

A muitas fazendas foram,
sempre o mesmo resultado.
Mundico, o filho mais moço,
parecia condenado.
Pra respirar era um esforço,
só andava carregado.
“Mundico, tu tá me ouvindo?”
Mundico estava calado.

Mundico estava morrendo,
coração quase parado.
Deitaram o pobre no chão,
no chão com todo o cuidado.
Deitaram e ficaram vendo
morrer o pobre coitado.

“Meu filho”, gritou João,
se abraçando com o menino.
Mas de Mundico restava
somente o corpo franzino.
Corpo que não precisava
mais nem de pai nem de pão,
que precisava de chão
que dele não precisava.

Enquanto isso ali perto,
detrás de uma ribanceira,
três “cabras” com tiro certo
matavam Pedro Teixeira,
homem de dedicação
que lutara a vida inteira
contra aquela exploração.

Pedro Teixeira lutara
ao lado de Julião,
falando aos caboclos para
dar melhor compreensão
e uma Liga organizara
pra lutar contra o patrão,
pra acabar com o cativeiro
que existe na região,
que conduz ao desespero
toda uma população,
onde só o fazendeiro
tem dinheiro e opinião.

Essa não foi a primeira
morte feita de encomenda
contra líder camponês.
Outros foram assassinados
pelos donos da fazenda.
Mas cada Pedro Teixeira
que morre, logo aparece
mais um, mais quatro, mais seis
— que a luta não esmorece
e cresce mais cada mês.

Que a luta não esmorece
agora que o camponês
cansado de fazer prece
e de votar em burguês,
se ergue contra a pobreza
e outra voz já não escuta,
só a que o chama pra luta
— voz da Liga Camponesa.

Mas João nada sabia
no desespero que estava,
andando aquele caminho
onde ninguém o queria.
João Boa-Morte pensava
que se encontrava sozinho
que sozinho morreria.

Sozinho com cinco filhos
e sua pobre Maria
em cujos olhos o brilho
da morte se refletia.
Já não havia esperança,
iam sucumbir de fome,
ele, Maria e as crianças.

Naquela terra querida,
que era sua e que não era,
onde sonhara com a vida
mas nunca viver pudera,
ia morrer sem comida
aquele de cuja lida
tanta comida nascera.

Aquele de cuja mão
tanta semente brotara
que, filho daquele chão,
aquele chão fecundara;
e assim se fizera homem
para agora, como um cão,
morrer, com os filhos, de fome.

E assim foi que Boa-Morte,
quando chegou a Sapê,
desiludido da sorte,
certo que naquele dia
antes da aurora nascer
os seus filhos mataria
e mataria a mulher,
depois se suicidaria
para acabar de sofrer.

Tomada essa decisão
sentiu que uma paz sofrida
brotava em seu coração.
Era uma planta perdida,
uma flor de maldição
nascendo de sua mão
que sempre plantara a vida.

Seus olhos se encheram d’água.
Nada podia fazer.
Para quem vive na mágoa,
mágoa menor é morrer.
Que sentido tem a vida
pra quem não pode viver?

Pra quem, plantando e colhendo,
não tem direito a comer?
Pra que ter filhos, se os filhos
na miséria vão morrer?
É preferível matá-los
aquele que os fez nascer.

Chegando a um lugar deserto,
pararam para dormir.
Deitaram todos no chão
sem nada pra se cobrir.
Quando dormiam, João
levantou-se devagar
pegando logo o facão
com que os ia degolar.

João se julgava sozinho
perdido na escuridão
sem ter ninguém pra ajudá-lo
naquela situação.
Sem amigo e sem carinho
amolava o seu facão
para matar a família
e varar seu coração.

Mas como um louco atrás dele
andava Chico Vaqueiro
um lavrador como ele
como ele sem dinheiro
para levá-lo pra Liga
e lhe dar um paradeiro
para que assim ele siga
o caminho verdadeiro.

Para dizer-lhe que a luta
só agora vai começar,
que ele não estava sozinho,
não devia se matar.
Devia se unir aos outros
para com os outros lutar.
Em vez de matar o filho,
devia era os libertar
do jugo do fazendeiro
que já começa a findar.

E antes que Boa-Morte,
levado pela aflição,
em seis peitos diferentes
varasse seu coração,
Chico Vaqueiro chegou:
“Compadre, não faça isso,
não mate quem é inocente.
O inimigo da gente
— lhe disse Chico Vaqueiro —
não são os nossos parentes,
o inimigo da gente
é o coronel fazendeiro.

“O inimigo da gente
é o latifundiário
que submete nós todos
a esse cruel calvário.
Pense um pouco, meu amigo,
não vá seus filhos matar.
É contra aquele inimigo
que nós devemos lutar.
Que culpa têm os seus filhos?
Culpa de tanto penar?
Vamos mudar o sertão
pra vida deles mudar.”

Enquanto Chico falava,
no rosto magro de João
uma luz nova chegava.
E já a aurora, do chão
de Sapê, se levantava.
E assim se acaba uma parte
da história de João.
A outra parte da história
vai tendo continuação
não neste palco de rua
mas no palco do sertão.

Os personagens são muitos
e muita a sua aflição.
Já vão todos compreendendo,
como compreendeu João,
que o camponês vencerá
pela força da união.
Que é entrando para as Ligas
que ele derrota o patrão,
que o caminho da vitória
está na Revolução.

A partir da Folha 155 (17 do pdf):

https://www.kbook.com.br/wp-content/files_mf/todapoesia.pdf

.

Zé Maria

Faz mais de 40 Anos – senão Décadas – que os
Trabalhadores Sem Terra são Criminalizados.

Não vai ser Diferente agora com essa Choldra de
Madeireiros e Garimpeiros ilegais, e Ruralistas
Grileiros, Bandidos da Burguesia Latifundiária,

que há Séculos ocupam o Congresso Nacional
para impedir o Desenvolvimento Social do Brasil.

Zé Maria

O Único Movimento Criminoso que existe no braZil
é o dos Nazi-Fasci-NeoLiberais da Extrema-Direita.

https://twitter.com/historia_pensar/status/1671305021353230341
https://twitter.com/vamilsonoficial/status/1671367176375115778

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