Mike Head: Potências ocidentais exploram crise na Líbia

Tempo de leitura: 5 min

5/3/2011

por Mike Head, Countercurrents

Traduzido pelo Coletivo Vila Vudu

Sob o pretexto de ter de enfrentar uma crise humanitária na Líbia, os EUA e seus aliados europeus já intensificam operações militares e medidas econômicas contra o regime de Muammar Gaddafi.

Entre os preparativos para uma possível intervenção armada, fuzileiros navais dos EUA chegaram à Grécia, de onde facilmente podem alcançar a costa da Líbia, e aviões de carga militares dos EUA já iniciaram voos para a fronteira da Tunísia com a Líbia.

O que começou como uma revolta popular contra o regime repressor de Gaddafi está sendo canalizado, cada vez mais diretamente, com a ajuda do governo interino em Benghazi, segunda cidade da Líbia, como pretexto para uma intervenção imperialista. Essa operação visa a estabelecer um Estado de fato, outra vez como estado-cliente, na Líbia. As forças imperialistas visam a garantir controle sobre o petróleo e os campos de gás, de modo a implantar ali um bastião contra todas as revoltas de trabalhadores e jovens que varrem a região, do Marrocos ao Iraque.

Os líderes britânicos e europeus saudaram a declaração do presidente Barack Obama na quinta-feira, na qual exigiu a saída de Gaddafi e incisivamente se recusou a descartar a imposição de uma zona militarizada, que vedaria o espaço aéreo líbio [orig. no-fly zone]. Os EUA já se declararam, portanto, prontos para apoiar uma operação para derrubar o regime e instalar um governo complacente também em Benghazi.

Para o Guardian de Londres, o primeiro ministro britânico, David Cameron, que já havia convocado os aliados da Grã-Bretanha a elaborarem planos para uma “zona de exclusão aérea”, recebeu com entusiasmo o reforço de Barack Obama em conferência de imprensa ao lado do presidente mexicano Felipe Calderón. “

O jornal britânico afirma que Cameron e Obama já acertaram posições sobre “a  necessidade de ação militar, caso haja grande catástrofe humanitária ou se Gaddafi tornar-se ainda mais agressivo; e sobre a necessidade absoluta de Gaddafi renunciar”.

Segundo o Guardian, Cameron e outros líderes europeus estavam à espera de manifestação de Obama, “uma vez que os EUA não admitiriam que outros assumissem a liderança na resposta à crise da Líbia”. Mas Cameron “saiu à frente, porque já defendera a zona de exclusão aérea, e agora trabalha com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, para que se organize uma reunião de emergência da União Europeia, em Bruxelas, na próxima 6ª-feira, para discutir essa questão”.

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O governo russo, que tem poder de veto nas Nações Unidas, declarou publicamente sua oposição à zona de exclusão aérea. Mas o chanceler britânico, William Hague, disse que, embora “idealmente” a zona de exclusão aérea deva ser sancionada pela ONU, essa sanção não é essencial. Zonas de exclusão aérea sobre o Iraque, implantadas e mantidas por EUA e Grã-Bretanha, que foram o primeiro passo para derrubar o regime de Saddam Hussein, tampouco foram sancionadas pela ONU ou aprovadas pelo Conselho de Segurança.

Washington conta com que os europeus tomem a dianteira, pelo menos publicamente, precisamente por causa do efeito que a ação militar dos EUA terá, de acirrar o sempre crescente antiamericanismo que há em todo o Oriente Médio e que, no caso da Líbia, vem desde a 2ª Guerra Mundial.

Na Líbia, depois da 2ª Guerra Mundial, EUA e Grã-Bretanha aproveitaram a derrota da Itália fascista para continuar a brutal opressão do povo líbio. Entre 1911 e 1943, metade da população líbia foi sacrificada. Depois da independência formal em 1951, manteve-se lá a gigantesca base aérea Wheelus, perto de Trípoli. [NTs: A base aérea Wheelus foi construída pelos italianos em 1923, chamada então Mellaha. Foi usada pela Luftwaffe durante a Batalha do Norte da África e para pequenas unidades de reconhecimento aéreo e costeiro. A base foi capturada pelo 8º Exército britânico em janeiro de 1943. Durante a Guerra Fria, foi usada pelos russos. Antes de julho de 1970, os EUA usaram essa base, onde há hoje um aeroporto civil, Mitiga Internacional Airport (mais emhttp://en.wikipedia.org/wiki/Wheelus_Air_Base).

A descoberta de petróleo em 1959, apenas reforçou a dominação americana, britânica e italiana da Líbia, dominação que fez crescer a hostilidade e criou as condições para golpe militar do coronel Gaddafi em 1969. Uma das primeiras ações de Gaddafi foi fechar a base Wheelus; em seguida, a nacionalização da indústria de petróleo da Líbia, garantiu ao coronel anti-imperialista forte base popular.

Ontem, a Grã-Bretanha anunciou que estava enviando aviões de transporte aéreo para repatriar milhares de egípcios presos em campos de refugiados na fronteira líbia com a Tunísia. A França anunciou que enviara um porta-helicópteros para o largo da Líbia, para ajudar a evacuar os civis. O governo britânico também informou que um dos seus navios havia interceptado um navio com destino à Líbia no qual “foi apreendida quantidade significativa de dinheiro líbio”.

Washington também se posiciona para intervir militarmente, em nome de evacuar alguns dos estimados 180 mil trabalhadores estrangeiros que fugiram da Líbia. Dois navios de guerra dos EUA, o USS Kearsarge e o USS Ponce, se juntaram ao USS Barry no Mediterrâneo, e 400 fuzileiros navais foram levados para uma base naval em Souda Bay, na ilha grega de Creta, prontos para serem transferidos para o Kearsarge. O porta-voz da Base de Paul Farley disse que a movimentação era “parte do planejamento de contingência, para garantir que o presidente tenha ampla opção para decidir relativamente à Líbia.”

O porta-voz do Pentágono, coronel David Lapan, disse não havia qualquer ordem militar além do envio de dois aviões cargueiros, para a Tunísia, na fronteira com a Líbia, na 6ª feira; e da missão de transporte de refugiados do lado tunisino, previsto para hoje. Anunciou também que o esforço “humanitário global”, incluindo os movimentos dos navios, recebera o nome de “Operação Alvorecer da Odisseia” [orig. Odyssey Dawn] (em http://www.defense.gov/news/newsarticle.aspx?id=63031).  (…)

No establishment político dos EUA, cresce a pressão para uma intervenção. O ex-candidato presidencial republicano John McCain e o ex-candidato democrata a vice-presidente Joe Lieberman emitiram declaração conjunta pedindo que a Casa Branca mova-se mais rapidamene “por razões morais e estratégicas”.

Falando na Brookings Institution, em Washington, McCain alertou que o movimento revolucionário visto na Líbia, Egito e outros lugares continua a se espalhar “para além das fronteiras do mundo árabe” e “em todo o globo.”

Dentro da Líbia, o ex-ministro da Justiça de Gaddafi Mustafá Abdel Jalil, que agora lidera a oposição no Conselho Nacional Líbio de Benghazi, apelou para forças estrangeiras contra Gaddafi e pediu a implantação da zona exclusão aérea. Citando fontes de dentro do conselho, o New York Times noticia que a posição teria sido aprovada ontem em acalorada reunião do Conselho revolucionário, onde haveria “profundas discordâncias”.

Há forte oposição a qualquer tipo de intervenção externa também nos protestos populares contra Gaddafi; muitos temem que o próprio Gadaffi esteja explorando a disposição agressiva do ocidente, para posicionar-se como defensor da soberania da Líbia.

Para muitos, os líderes da oposição burguesa em Benghazi sempre manifestaram solidariedade histórica às potências que sempre pilharam a Líbia, solidariedade historicamente enraizada em seus próprios interesses de classe, sempre ocupados em impedir que crescesse qualquer amplo movimento popular, de massas, contra o regime. (…)

O Daily Telegraph de Londres informou que funcionários britânicos têm mantido conversas com antigos aliados de Gaddafi, para identificar “potenciais futuros líderes”. Entre esses estaria Geral Obaidi, antigo ministro do Interior e chefe das forças especiais líbias. Fonte de Downing Street disse ao jornal que Obaidi seria “alguém com quem a Grã-Bretanha poderia negociar”.

O regime de Gaddafi continua a atacar os manifestantes com força brutal. Ontem, cerca de 1.000 manifestantes que gritavam slogans e agitavam bandeiras pré-1969 pró-revolução nacionalista (que Gadaffi então liderava), no subúrbio pobre de Tajoura, nos arredores de Trípoli, foram dispersados depois das orações de sexta-feira por disparos da polícia gás lacrimogêneo e balas de plástico. Outras partes da capital foram patrulhadas por frotas de veículos cheios de soldados, policiais e homens à paisana, armados com AK-47s.

Em Zawiyah, 60 quilômetros ao oeste de Tripoli, os moradores disseram à Reuters, que pelo menos 30 pessoas foram mortas, incluindo o comandante da oposição, quando as forças pró-governo tentaram retomar a cidade. Segundo os moradores, as milícias pró-Gaddafi abriram fogo sobre protesto pacífico em frente ao hospital da cidade, matando sete pessoas e ferindo muitos outros.

Apesar dos esforços intensos para evitar qualquer cobertura pela mídia, também surgiram evidências de detenções em larga escala pelas forças de segurança. Porta-voz da Anistia Internacional confirmou ter recebido, e que estaria tentando confirmar, denúncias de desaparecimentos e violações em Trípoli.

Combates esporádicos ocorreram em outros lugares, especialmente nas áreas próximas de instalações petrolíferas chave. No leste do país, as forças da oposição disseram que haviam deslocado as forças oficiais para oeste e que haviam assumido o controle de Ras Lanuf, terminal de petróleo, que tem estado sob controle do regime. E que houve confrontos ao longo de uma estrada estratégica entre o litoral leste e Sirte, cidade natal de Gaddafi.

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Comentários

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Bonifa

"O governo russo, que tem poder de veto nas Nações Unidas, declarou publicamente sua oposição à zona de exclusão aérea. Mas o chanceler britânico, William Hague, disse que, embora “idealmente” a zona de exclusão aérea deva ser sancionada pela ONU, essa sanção não é essencial. Zonas de exclusão aérea sobre o Iraque, implantadas e mantidas por EUA e Grã-Bretanha, que foram o primeiro passo para derrubar o regime de Saddam Hussein, tampouco foram sancionadas pela ONU ou aprovadas pelo Conselho de Segurança." Vivendo a maior crise de sua história, a Inglaterra assiste seus políticos sedentos de vontade de lançar o país numa guerra que poderia ser a salvação da lavoura. A França, também em crise, desta vez parece que poderá embarcar nessa boquinha. Depois que as hienas fizerem o trabalho, com a ajuda dos traidores locais, chegará o leão para devorar o melhor dos despojos. Toda a beleza da Revolução Árabe terá sido extirpada pelo ocidente sanguinário.

Bonifa

Será a terceira guerra mundial a se iniciar?
Será que o objetivo não é tomar apenas a Líbia, mas de lá retomar o Egito?
Será que esta não é a espoleta que o "capitalismo ocidental" esperava, para detonar a guerra que irá tentar resolver sua crise insolúvel (as crises profundas do capitalismo ocidental só se resolvem por meio de grandes guerras)?

Fausto

É engraçado como tem pessoas que leiem uma notícia dessas e ainda encara os governantes do oriente como opressores e que matam milhões de inocentes a troco de nada. É lógico e evidente que toda informação é manipulada pelas potências ocidentais pra que seu controle petrolífero seja mantido. Foi assim no Iraque, é assim com o Hugo Chavez e será assim com qualquer nação que não esteja de acordo com os interesses americanos. Na Venezuala aconteceu o mesmo, o Hugo Chavez veio com uma história de nacionalizar o petróleo e logo vieram os "oposicionistas" pró-EUA querendo fazer uma revolução para tirá-lo do poder e satisfazer seus interesses.

SILOÉ

A moeda forte hoje ainda é o petrólio. Só que os grandes poços ainda são no oriente médio. E os EUA e Europa que não podem ficar sem esse domínio, fizeram daqueles países "colônias", com controle parcial. Caro mais ainda assim vantajoso.
Surge então China e Russia com os mesmos interesses, mesmo assim, continuava tudo muito bom, tudo muito bem, mas; "como o uso do cachimbo entorta a boca," o cachimbo caiu.
.Veio então aquela maracutáia contra o Iraque que até hoje não deu certo, continuam tentando contra o Irã, tentaram o Brasil com a privatização,e a eleição do Serra, a Venezuela, agora chegou a vez da Líbia e por aí vai…
Não é por acaso que os países grandes produtores de petrólio são governados por ditadores por eles facilmente manipulados e ou substituídos.
Para eles o que menos importa é a DEMOCRACIA.

    Bonifa

    Importa, sim. Eles são contra.

Marat

Mais uma intervenção? Mais mortes de soldados invasores, mais mortes de inocentes árabes… Que o dinheiro das potências ocidentais se esvaia rapidamente, para eles receberem o troco. E que o povo pobre e marginalizado dos EEUU se rebele e deflagre uma guerra civil ali!!!

renato

Hipocrisia é o que impera na mídia em relação à crise líbia. De acordo com as agências internacionais Kadafi já caiu. As "forças revolucionárias" estão libertando o país de um ditador sanguinária. A questão é bem mais complexa. Kadafi deixando de lado seu histrionismo, já foi um problema para Israel e seus aliados. Atualmente está completamente atrelado aos desígnios da OTAN. Foi bajulado por Berlusconi, Zapatero, Sarkozi e outros líderes Ocidentais. O que a grande mídia não divulga é que as armas que Kadafi usa para reprimir a oposição foram fornecidas pelos supostos defensores dos Direitos Humanos. A ditadura saudita é bem pior que a Líbia. Por que a grande mídia a ignora? Dá pena ver o quanto os jornalistas brasileiros são despreparados para fazer análises isentas do que está acontecendo na Líbia.

    Frederico Francine

    Os jornalistas não estão despreparados para uma análise justa do que acontece na Líbia, mas, sim os interesses dos donos do Jornais falam mais alto. Vocês não estão vendo a conversa pra boi dormir sobre a declaração das potencias Ocidentias em mandar navios para retirar refugiados! Desde quando este pessoal preocupou com refugiados? O que acontece na Libia é o seguinte: Os lideres Árabes sabem que com Kadafi pode estar ruím mas com intervenção de forças estrangeiras será muito pior. Por isto a indecisão dos Árabes!

    Renato

    Frederico você tem razão. Erroneamente eu misturei os meios de comunicação com os profissionais de comunicação, os quais não tem liberdade para efetuar uma cobertura isenta.

    Bonifa

    Deveriam mandar navios humanitários para resgatar os palestinos da faixa de Gaza, condenados à morte por inanição com o cerco implacável de Israel.

    Bonifa

    Não tem mais essa história de reprimir a oposição, reprimir os manifestantes pacíficos. O que há na Líbia é uma guerra civil, com os dois lados sofrivelmente armados. Interferência estrangeira por qualquer dos lados será como a interferência nazista na Guerra Civil Espanhola. Hoje, isso é vedado pelas leis internacionais.

aldoluiz

Líbia e a reflexão de carnaval sobre "CONLUIO".
O SISTEMA, a MATRIX, este PROGRAMA que nos mantém oprimidos no medo de tudo e prisioneiros no "labirinto do nada", é MILENARMENTE escravagista e antropofágico em sua alienígena ausência de afeto e humanidade. Ao longo de mais de 4000 anos aperfeiçoa os programas fratricidas em memórias ancestrais de nos esconder nossa pacífica infinita criadora essência divina e perfeita.
Em 1212 a quarta cruzada, ao invés de perseguir os "infiéis", voltou-se contra o Império Bizantino. Aproveitando-se da situação política do Império Bizantino, que vivia um período de lutas dinásticas, os cavaleiros ocidentais invadiram Constantinopla e províncias bizantinas, saqueando e devastando toda a região. O papa Inocêncio III (c.1161-1216), reagiu apenas justificando que os bizantinos eram "maus cristãos".
Ano que vem 2012 completaremos mais 800 anos desde este fato prisioneiros neste fratricida labirinto do nada escravagista e antropofágico que esconde de nós nossa pacífica essência divina e perfeita.
Deu para entender um pouco do que é "conluio"?
P.S.: Nova Bíblia norte-americana muda palavras como "holocausto"

    Gustavo Pamplona

    Falou em Matrix – Matrix (1999) – http://www.imdb.com/title/tt0133093/quotes

    Morpheus: If real is what you can feel, smell, taste and see, then 'real' is simply electrical signals interpreted by your brain / Se real é o que você pode sentir, cheirar, provar e ver, então "real" é simplesmente sinais elétricos interpretados pelo seu cérebro.

    Morpheus: Welcome to the real world. / Benvindo ao mundo real.

    Falou em 2012, não se esqueça de 21/12/2012… onde dizem que o mundo acaba neste dia (hahahaha) ou que o mundo vai entrar em uma nova era.

    Tem uma música da R.E.M. intitulada: "It's the End of the World as We Know It (And I Feel Fine)" / E o fim do mundo como nós o conhecemos (e eu sinto legal)
    http://en.wikipedia.org/wiki/It%27s_the_End_of_th

    Mário SF Alves

    Gustavo,
    Com ou sem Matrix, o fato é que aquele mundo acabou; pelo menos aquele que a grande maioria pensava conhecer. É como você lembrou com o "It's the End of the World as We Know It". O problema é como situar-nos diante do que aí está: o ainda em construção ora terrível, ora admirável mundo novo.

Andre

Só quem nunca explora crises sao as potencias "comunistas", russia e china.

O Ocidente é mau, o resto do mundo é um conglomerado de anjinhos do bem.

Gustavo Pamplona

[Hugo Chávez recebe seu 'bom amigo' Sean Penn na Venezuela]
http://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2011/03/hugo

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