Wadih Damous, sobre a crise no sistema carcerário: Chega de declarações bombásticas e das medidas de sempre!
Tempo de leitura: 5 minWadih Damous (à direita, na fotomontagem): “Quando o Renan chamou de “juizeco” um juiz que, de fato, praticou ilegalidade, a ministra Cármen Lúcia disse que o senador ofendera toda a magistratura. Até agora não a vi dizer que a magistratura também se sente ameaçada por conta do que acontece com o juiz Valois [à esquerda]”
por Conceição Lemes
Na última quinta-feira (05/01), o deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) protocolou dois requerimentos, solicitando esclarecimentos sobre o sistema prisional.
Um deles ao ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, com 18 perguntas.
O outro, com cinco, à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, que também é presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Damous já foi presidente da Ordem dos Advogados do Brasil — seção Rio de Janeiro (OAB-RJ).
De ambos, ele fez questão de cobrar:
Quais medidas de segurança estão sendo ou serão adotadas pelo Ministério da Justiça, STF e CNJ para preservar a vida e a integridade do juiz Luís Carlos de Valois e familiares ?
Na madrugada 2 de janeiro de 2017, o juiz Valois, responsável pela Vara de Execução Penal do Tribunal de Justiça do Amazonas, ajudou a negociar a libertação de 10 reféns no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), em Manaus. Ele foi chamado pelos secretários de Segurança e de Administração Penitenciária do Amazonas.
Porém, devido a uma reportagem inverídica, absolutamente irresponsável publicada pelo Blog do Fausto Macedo, no Estadão, ele passou a ser ameaçado de morte por integrantes do PCC.
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A matéria dizia que o juiz era suspeito de ligação com a facção Família do Norte (FDN), aliada do Comando Vermelho (CV), e rival do PCC.
“O juiz Valois preza o princípio da dignidade humana, cumpre a Lei de Execuções Penais, é garantista e procura ser justo ”, observa Damous.
“Por isso, está sendo perseguido no Amazonas por alguns de seus pares e pela Polícia Federal, que se tornou uma milícia”, prossegue.
“Ao mesmo tempo, obviamente, ele é elogiado por presos”, continua. “Não por se associar à atividade delinquencial deles, como induz criminosamente a matéria do Estadão, mas por respeitar os direitos legais dos detentos.”
“Quando o Renan [PMDB-AL] chamou de “juizeco” um juiz que, de fato, praticou ilegalidade, a ministra Cármen Lúcia disse que ele merecia a solidariedade de todo o poder judiciário brasileiro e que o senador, ao ofender aquele juiz, ofendera toda a magistratura”, relembra Damous.
“Curiosamente, até agora não vi a ministra dizer que a magistratura também se sente ameaçada por conta do que acontece com o juiz Valois”, ironiza.
À ministra Carmen Lúcia, ele também perguntou:
Se existem estudos do STF e do CNJ sobre os possíveis impactos no sistema carcerário e no sistema de Justiça sobre a decisão do STF que concluiu que a pessoa pode ser presa provisoriamente após condenação em 2° grau, relativizando o principio constitucional da presunção da inocência? Se sim, quais os impactos?
“É obvio que essa decisão absurda do STF vai aumentar ainda mais a superpopulação dos presídios”, antevê.
A íntegra das perguntas à ministra estão ao final, assim como as destinadas ao ministro da Justiça.
Dele, Damous quer saber, por exemplo:
* Tomou conhecimento do “Relatório da visita a unidades prisionais de Manaus/AM, elaborado pelo MNPCT (Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, publicado em janeiro de 2016?
*Tomou conhecimento da visita de juízes da Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) ao complexo penitenciário do Curado (antigo presidio Aníbal Bruno, em Recife, para apurar denúncia de torturas, castigos físicos extremos, mortes violentas e falta de tratamento?
*Quando o governo brasileiro vai divulgar o Relatório do Subcomitê de Prevenção e Combate à Tortura da ONU, que realizou inúmeras visitas a unidades prisionais no Brasil, inclusive no Amazonas e Roraima? A ONU enviou o relatório em novembro. Porém, é prerrogativa do governo divulgá-lo ou não.
Eu conversei um pouco mais com o deputado Wadih Damous sobre os requerimentos à ministra Cármen Lúcia e ao ministro Alexandre de Moraes.
Viomundo – O que o senhor objetiva com esses questionamentos?
Wadih Damous – Nesses momentos de crise, o que se vê é um jogo de declarações bombásticas, de pouco ou nenhum resultado prático. Chega de declarações bombásticas!
Nós queremos que essas autoridades responsáveis por essa área venham a público e enfrentem as questões prisionais de forma objetiva, com medidas efetivas e não as de sempre. Chega, portanto, também das medidas de sempre!
O que aconteceu com os presos em Manaus e Roraima já ocorreu no Maranhão e em outros lugares e vai continuar existindo.
O sistema penitenciário brasileiro é absolutamente disparatado, um absurdo. É a quarta população carcerária do mundo. A maioria presos temporários. Nem deveria estar encarcerada.
Viomundo – Recentemente, a presidente do Supremo foi a um presídio em Natal [RN) e disse que ficou chocada.
Wadih Damous – Chocado fico eu com a ministra. Como ela não sabia que era assim?! Todo mundo sabe!
Viomundo — O ministro da Justiça está dizendo que vai construir mais presídios e combater o tráfico de drogas.
Wadih Damous — É mais do mesmo, cuja perspectiva é sempre lotar, lotar e lotar mais os presídios. Ou a gente muda a filosofia e passa a ter uma política de desencarceramento ou as tragédias vão crescer.
Viomundo – A ministra Cármen Lúcia anunciou a intenção de fazer um censo carcerário.
Wadih Damous — Censo dos presos para quê? Se for para saber quantos são e ficar do jeito que está, não adianta. O censo tem que responder, por exemplo: Por que a pessoa está presa? Por que continua presa? Já tem mandado de soltura? O tempo de prisão temporária já passou?
Viomundo – Membros da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM), da Câmara dos Deputados, chegam hoje à noite (09/01) a Manaus para fazer diligências nos presídios e conversar com autoridades. Dependendo das informações coletadas, pensam em criar uma força-tarefa para o caso. O que acha?
Wadih Damous — Se for feita uma força-tarefa, ela terá que verificar a situação de cada preso, como no censo.
Agora, não basta responder como está a situação destes e daqueles presos. É preciso ir além e cumprir a lei. Aqueles que já têm mandado de soltura, por exemplo, têm que ser postos em liberdade.
Eu acho que tem que se pensar numa anistia a todos os presos que não cometeram crime violento, não atentaram contra a vida das pessoas, aqueles que não oferecem perigo imediato à sociedade.
Viomundo – Por quê?
Wadih Damous – Primeiro, a maior parte dos presos já era para ter saído. E não saem por falta de advogado, lentidão da Justiça com os deserdados da vida, entre outros motivos.
No Brasil, o sistema carcerário é uma monstruosidade. As prisões são cursos de pós-graduação em criminalidade. Eles entram no jardim da infância e saem com pós-doutorado em crime.
As pessoas, quando saem das prisões, não saem ressocializadas. Elas saem para cometer crimes, saem com ódio, ressentidas. E com toda a razão, pelo tratamento que recebem ali.
Um sujeito que furta um pacote de biscoito tem que estar num sistema carcerário com alguém que matou ou é traficante?
São essas coisas objetivas que o Estado brasileiro tem que tratar. O resto é demagogia e violação de direitos humanos.
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