06/01/2011
por Maria Inês Nassif, no Valor Econômico
Em abril de 1995, no começo do segundo mandato do tucano Fernando Henrique Cardoso, o PMDB na Câmara, que era da base governista, impôs uma derrota ao governo na votação do projeto de reajuste do salário mínimo. O então líder do partido na Câmara, Geddel Vieira Lima (BA), esclareceu as razões do mau humor: “A bancada está nervosa por causa do imobilismo e da inoperância do governo e os cargos [nomeação de pemedebistas para o governo] entram nisso. O governo só responde “não” a qualquer pleito”.
Em 2007, já aliado a Lula, o PMDB, desta vez no Senado, encenou uma nova “rebelião”: 12 senadores do PMDB, que Wellington Salgado (MG) designou de “franciscanos”, votaram contra a MP que criava a Secretaria Especial de Projetos de Longo Prazo, cujo ministro seria Mangabeira Unger. “Os franciscanos não querem um sapato de couro alemão, querem só um chinelinho novo”, disse Salgado, ao reclamar que o governo só dava atenção aos “cardeais” do partido. O baixo clero do Senado ganhou a atenção pedida. Mais tarde, ajudou a derrubar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), contra os interesses do governo.
Ter o PMDB na base de apoio não é garantia de nada para nenhum governo, desde José Sarney (1985-1989). Mas a estratégia do partido para ganhar espaço de poder é tão previsível que mesmo os menos atentos à política conhecem os sinais. O uso do aumento do salário mínimo como chantagem é da tradição pemedebista. A vinculação dos benefícios de aposentadoria e pensões ao salário mínimo torna qualquer aumento não previsto no Orçamento uma bomba de efeito retardado para a política fiscal de qualquer governo. Mas, da mesma forma, um partido como o PMDB, que tem 1.175 prefeitos em todo o Brasil, também coloca em risco seu patrimônio político, já que as prefeituras sofrem um forte impacto nas suas folhas de pagamento com o aumento do piso salarial. A outra ação previsível é a de retaliar os governos dos quais faz parte com o apoio a candidatos não oficiais à mesa da Câmara.
Se o PMDB é altamente previsível em suas ações de chantagem, existe também uma dose de imprevisibilidade no futuro do partido, que parece não fazer parte dos cálculos de seus líderes. Nem o PMDB é imutável. Alguns dados novos tendem a relativizar as manobras tradicionais de chantagem pemedebista sobre o governo Dilma Rousseff.
Oferta de apoio pode ser maior do que a demanda do governo
O primeiro dado, visível, é que, embora o grande líder da bancada de deputados, Michel Temer, tenha se tornado o vice, o novo governo claramente preferiu privilegiar o grupo de José Sarney, o maior líder no Senado. Sarney é tido como um aliado mais fácil. E na Câmara, o grupo que dominou o partido desde os governos de FHC sofreu baixas importantes nessa legislatura.
A mais importante delas é a do próprio Michel Temer, que nos últimos quatro governos foi parte da estrutura de poder da Câmara e do partido. Foi na posição de presidente da Câmara e de presidente do PMDB que conseguiu manter o grupo de deputados a ele ligados como os principais beneficiários das alianças pemedebistas com os governos do momento. Michel Temer (SP), Wellington Moreira Franco (RJ), Carlos Eduardo Alves (RN), Geddel Vieira Lima (BA) e Eliseu Padilha (RS) dominaram a bancada na Câmara nos governos de FHC. Também teve grande poder o deputado Eduardo Cunha (RJ), embora atue em faixa própria. No último governo Lula, a aliança com o PMDB na Câmara para compor a base governista levou Wellington Moreira Franco, então sem mandato parlamentar, a uma das diretorias da Caixa Econômica Federal. Geddel tornou-se o ministro da Integração Regional. Eliseu Padilha manteve uma postura quase que dissidente em relação ao governo, embora isso não tenha abalado a lealdade interna do grupo.
Internamente, a coesão do grupo se dava pela oposição ao grupo de Orestes Quércia, oposicionista nos governos de FHC, governista no primeiro mandato de Lula e oposicionista novamente no segundo mandato do presidente petista. No jogo de poder partidário, o grupo de Temer, estrategicamente colocado na Câmara, polarizava com o seu rival regional. Na disputa local, o PMDB paulista perdeu substância. Hoje, não é quase nada e as negociações para a adesão do prefeito Gilberto Kassab (DEM) já são feitas sobre o reduzido espólio político deixado por Quércia, morto no fim do ano passado.
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Na disputa nacional, a arte de lidar com o baixo clero deu ao grupo de Temer a hegemonia na Câmara, que acabou se estendendo à máquina partidária. Temer é considerado, hoje, como o dirigente pemedebista que mais obteve coesão partidária depois de Ulysses Guimarães, que dirigiu o partido durante a ditadura e no governo Sarney. Não foi à toa que se fez o vice.
Embora o grupo de Temer continue jogando em conjunto o jogo “um apoia, outro ameaça” e mantenha a capacidade de cooptar o baixo clero do partido, está desfalcado na Câmara – Temer é o vice, Geddel disputou o governo da Bahia e ficou sem mandato, Moreira Franco foi para a Secretaria de Assuntos Estratégicos, que não mobiliza grandes verbas e Cunha continua atuando em faixa própria. Outro inconveniente para o grupo hegemônico na Câmara é que o partido perdeu deputados, enquanto pequenos partidos de esquerda reforçaram suas bancadas. A lógica da traição tende a contar contra o PMDB, ao contrário do que acontecia no passado. Em assuntos corriqueiros, o governo Dilma pode prescindir da unidade pemedebista e das chantagens públicas e privadas do grupo. No Senado, a redução da oposição também confere menos poder de chantagem à bancada.
Não é o fim do PMDB. O partido prospera quando é governo, da mesma forma que o ex-PFL definhou na ausência dele. Mas a conjuntura tende a exigir nova visão do que é lealdade. Até porque a derrota, por três eleições presidenciais seguidas, torna políticos dos partidos oposicionistas mais importantes, PSDB e DEM, altamente sensíveis à cooptação. A oferta de apoio ao governo Dilma pode se tornar maior do que a demanda.
* Maria Inês Nassif é repórter especial de Política. Escreve às quintas-feiras
Comentários
redecastorphoto
Esse varejismo descrito abaixo era de esperar-se, "são coisas de nossa vida política", disse o Samuel (Pinheiro Guimarães). Estou em meu segundo dia de Brasília, tentando ajustar-me ao nosso fuso-horário, e já vejo delinear-se um novo desenho de Governo, uma marca-Dilma, cujos horizontes serão bem amplos. A gestão de nossa Presidente não será absolutamente "igualzinha à do Lula". Nosso ex-Presidente, dotado de extrema inteligência, não quis isso, e por uma razão muito simples: a maneira de preservarmos o Poder é diversificá-lo, tudo dentro, evidente, de uma linha comum, que é a de evitar, no que for possível, intromissões do monolitismo exclusivista da direita.
Magalhães Pinto dizia que "política é como as nuvens, você olha pro céu e elas se mostram de um jeito; daqui a pouco, você olha de novo, e já estão diferentes, já é outra coisa…". Quem conhece Brasília sabe da importância das suas nuvens, como se a Capital de Lucio Costa fosse nublada, encostada nelas, por isso nebulosa politicamente. O Brasil não é um País simples, fácil de resolver as coisas.
Apesar de seus Brazilianists (*), desde John Adams e John Quincey Adams os EUA não entenderam o Brasil. Não sabem explicar como sua independência teve como líder final o Regente brasileiro do RUPBeA, Herdeiro da Coroa portuguesa, que depois cingiria sua cabeça como Rei D. Pedro IV; que sua República foi entregue a um protegido do Imperador; que sua Revolução Liberal de 1930 recaísse nas mãos do Ministro da Fazenda do Governo por ela derrubado; que a redemocratização de 1945 elegesse o ultra-direitista Ministro da Guerra do estadonovismo; e, a de 1985, no seis meses antes presidente do PDS.
Ponhamo-nos na cabeça cartesiano-militar de um de Gaulle, que antes já se irritara com o episódio da "guerra das lagostas", e veio visitar-nos no início da ditadura de 1964, sem perceber muita coisa. Tudo isso, apesar das ponderações "loucas" (e justas) de um André Malraux, nos almoços do Eliseu.
A boa-vontade de que goza o Presidente Lula no exterior não se deve à sua condição de ex-operário (**), mas ao fato de que ele e Celso Amorim disseram ao mundo ao que viemos. Porque até então, os paternalistas do Hemisfério Norte não nos entendiam ao certo; agora, entenderão menos.
Em política, sacrificam-se até ideias, como lamentou ter de fazê-lo o Presidente Lula com o anteprojeto vazado da ANCINAVE, por exemplo. O lado artístico da política tem essa base, de enfrentar o impossível, com ou sem PMDBs, PPs et cataerva. Estadista é todo aquele que consegue sobreviver ao caos organizado, para dar passos adiante, só percebidos quando transformados em consolidada obra, ainda que setorial. Por isso, desde Getulio e Juscelino, não tínhamos estadistas e a estrela de Lula iluminou-os na noite brasileira.
Estas reflexões parecerão, para muitos, mero exercício de preparo de uma salada russa. É verdade. A Presidente Dilma já convive com ela, terá de aplicar-lhe umas garfadas, ainda sem grande indigestões, ao menos nestas suas primeiras semanas no Alvorada. No momento, todos a espiam, até nossa "imprensa" amarronzada. Depois, o caldo engrossa. A mulher que elegemos sabe disso e vai responder à altura. Ela é de aço. O resto é bobagem ipanemeiro-higienopolitana de botequim.
Abraços
p/ ArnaC
(redecastorphoto)
(*) Quando teremos nossos estadunidistas? Além do Moniz Bandeira, é claro…
(**) Fosse isso, Lech Walesa estaria nas mesmas nas alturas atingidas pelo brasileiro; além das nuvens.
Marcelo de Matos
É fácil para uma jornalista brilhante como a Maria Inês fazer a cabeça da moçada. É ruim governar com o PMDB? Pior sem ele. O que está em jogo é a próxima eleição presidencial. Aécio Neves desponta como o candidato mais forte da oposição. Os formadores de opinião já começam a fazer, por vias reflexas, a sua campanha. Tentam desqualificar Michel Temer e seus correligionários, como se eles fossem piores que outros eventuais parceiros, do DEM ou do PSDB. Não é recomendável que os petistas se coloquem contra seu aliado eleitoral. Isso traria graves consequências – aliou tem de ser leal e solidário até o fim. Temer é um aliado de grande visão política e institucional, assim como outros quadros do PMDB, a exemplo de Nelson Jobim. Fazer o jogo do jornal “O Estado de Minas” é procurar sarna para nos coçarmos.
Janes Rodriguez
O PMDB do Paraná, fiel à tradição de traição, traiu requião e a aliança construída por ele já no processo de formação das alianças. Vários pemdbistas de jogaram no colo de Beto Richa, cuspindo no prato que comeram do governo federal e do seu próprio partido no estado do Paraná. Definido o resultado eleitoral, os deputados do PMDB já negociaram uma secretaria, ganharam, e correram para a base de apoio a Beto Richa, que não se faz de rogado. Se for pra viabilizar os negócios do interesse do setor privado, dos grandes empresários a quem serve e se serve, vale tudo. Os treze deputados eleitos pelo PMDB já se bandearam pra onde o vento sopra. A essa agremiação, chamam de partido político.
DEVARTE TONINI
DILMA Ñ SE DOBROU NEM AOS DITADORES MILITARES E NUNCA SE DOBRARA PRA TEMER,UM POLITICO ACOSTUMADO COM A SOMBRA,,NUNCA FOI NEM SERÁ A PALVRA FINAL..(DIGO CANETADA FINAL),,,,,,,,,
Sergio José Dias
Este Michel Temer vai dar trabalho. Se eu fosse a Dilma não viajaria nunca!!! Rs, Rs, Rs. Saudades de Marco Maciel e José Alencar, diferente deles Temer quer mandar, e vai fazer o máximo para isso acontecer. Haja olho-de-boi, ou qualquer outro patuá, vai faltar no mercado.
Daniel
E o PMDB, o que é? Partido é que não é. Qual o projeto dele para o Brasil? Fisiologismo endêmico, nomenclatura pura e simples. Ah, o Brasil que se dane. Qualquer seja o partido que estiver na presidência, o PMDB vai apoiar. Partido de aluguel é isso aí…
Fernando
É melhor governar com o PMDB do que ser oposição ao Serra.
edv
Boa!
ana
REFORMA POLÍTICA, JÁ!
Messias Macedo
Sobre o Vice que nos espera!
O peemedebista Michel TemerOSO deveria se espelhar na postura lapidar do ex-vice-presidente José Alencar: discrição, contundência na hora certa e no lugar adequado, confiabilidade…
E lembrando o que o jornalista Paulo Henrique Amorim afirmou há poucos dias: “Michel Temer é o vice-presidente, e não o co-presidente da República!”
Messias Franca de Macedo
Feira de Santana, Bahia, Transição República de Nós Bananas/Brasil Nação [RISOS]
Daniel
Vice é pra ser vice. Só tem que aparecer quando necessário ou chamado pra isso.
edv
Se há uma qualidade em Temer é ser discreto (até na vida pessoal…).
Fazer politca no caleidoscopiano PMDB e domar suas feras é complicado!
Não estaria nas posições em que esteve e está sendo "tolinho"…
mariazinha
Conhecemos bem esse 'polítiqueiro' Temer que não pode ser comparado ao vice de LULA, um administrador. Mama por aí, nas tetas de governos diversos, anos e anos. Suas múltiplas correções faciais demonstram seu lado VAIDOSO, suas atitudes dentro da política atestam seu lado AMBICIOSO, defeitos perigosos em um político pois sem limites, uma bomba pronta a explodir detonando D.DILMA, tirando-a do seu caminho. Não sei como ELA aceitou esse vampiro em sua cola!!! Vai ser corajosa assim…..
Messias Macedo
Entenda o que é ‘ortodoxia de gestão’!
A áurea era Dilma Rousseff começa a nos apresentar Boas Novas! Um exemplo: a presidente Dilma Rousseff anunciou publicamente que terá reuniões regulares com os ministros, cobrando-lhes apresentação de projetos, relatórios sobre as ações em curso… Cobrando-lhes resultados com ‘R’ Maiúsculo! Ineficiência e/ou resultados pífios… R-U-A! Rua!
Os elogios, os incentivos… [por um lado] As reprimendas, “os puxões de orelha”, os esporros, por outro, democraticamente, virão a público! Daí a importância da transparência nas ações governamentais e a competência dos organismos de comunicação… A sociedade tem o direito sagrado de acompanhar, ‘ipsis literis’, tudo aquilo que diz respeito ao Estado democrático e de Direito – resguardadas as informações estritamente confidenciais e estratégicas. Estado democrático e de Direito mantido/sustentado por esta mesma sociedade, que espera, em contrapartida, a prestação de contas dos seus empregados, no caso específico, os ministros de Estado.
Considerando que existem ministros que não sabem nem preparar um relatório… Ah, os assessores se encarregarão?! Então, recomendamos que os senhores Garibaldi, Novais, Montenegro, entre outros, tratem de caprichar, pelo menos, na escolha dos seus assessores mais próximos, de preferência, recorrendo a critérios técnicos e fundados na autêntica meritocracia!
Tarefa difícil para certos ministros, convenhamos!
Messias Franca de Macedo
Feira de Santana, Bahia, Transição República de Nós Bananas/Brasil Nação [RISOS]
Mariana
O deputado é Henrique Eduardo Alves. Carlos Eduardo é seu primo, ex Prefeito de Natal e candidato derrotado ao Governo do Estado ( infelizmente, porque era o melhor dos três candidatos e acabou ganhando a candidata do DEM, Rosalba Ciarline, aliada de José Agripino e com apoio de Garibaldi Alves, também primo dos dois!!!!!!!!!!).
Pedro
Os Alves são quase como o PMDB, fisiológicos. A candidatura do PSB era apoiada por Henrique. A do DEM por Garibaldi. E o candidato do PDT era Carlos Eduardo.
Os três candidatos que foram os mais votados. E os primos de lado contrário. E a família Alves no poder em qualquer situação…
dukrai
a caminhada do PSDB alquimista para o centro pode tornar a situação do PMDB mais precária, além de ser o alvo preferencial nas eleições daqui a dois anos, por ser o partido que mais detém governos municipais. deve perder essa liderança para o PT, em fase de recomposição de forças em que abriu mão de disputas locais pela eleição presidencial.
mariazinha
Pois então! Não demorou para o vampirão temer mostrar OS DENTÕES. Sabia que D. DILMA ia ter problemas com o demoníaco. Acredito que ELA tenha suas defesas pois não é concebível tanta inocência em uma pessoa tão vivida.
Tomara que VC, Inés, tenha razão em não ver tanto perigo para DILMA.
PARABÉNS, BELO TEXTO.
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