Receita atropela a própria fiscalização e “adota” emenda Jucá, que perdoa R$ 40 bi em dívidas das petroleiras

Tempo de leitura: 4 min

A MP 795 irá consolidar, com efeito retroativo, planejamentos criminosos e simulações como a do caso Schahin, alerta Unafisco

do site da Unafisco

O Congresso Nacional prepara-se para provocar uma das maiores sangrias dos cofres públicos da história republicana do Brasil.

A medida provisória 795, cujo texto base foi aprovado na Câmara por 208 a 184, na noite da última quarta-feira (29/11), perdoa as empresas petrolíferas de multas e impostos não recolhidos ao Fisco.

A Unafisco alerta que o valor total das autuações, hoje em torno de R$ 40 bilhões, pode virar pó, privando os cofres públicos de recursos importantes para o equilíbrio fiscal.

A Unafisco observa que a MP 795 coroa a articulação bem-sucedida da indústria petrolífera, que vem desde 2009 praticando um planejamento tributário abusivo conhecido como “90×10”, em que 90% das receitas são enviadas ao exterior (para empresas off shore ligadas à prestadora de serviço no Brasil) com alíquota zero de imposto de renda, como foi demonstrado em representação dos auditores fiscais da 7ª Região Fiscal ao Ministério Púbico Federal.

A representação demonstra que as empresas do setor, após terem no campo tributário suas tentativas frustradas, perdendo seus recursos até no Carf, recorreram ao lobby na esfera política, aprovando um artigo “jabuti” na MP 651 (art 106 da Lei 13.043/14), que legalizou tais práticas.

Exemplo disso, que consta da denúncia dos auditores fiscais, é o caso de simulação fraudulenta com o planejamento “90 x 10” do caso do Grupo Schahin, autuado pela Receita Federal e famoso por ter revelado o modus operandi de grupos investigados pela Lava Jato.

A MP 651 consta da lista de compras da Odebrecht, segundo acordos de delação. O relator, um dos senadores de destaque da atual base governista [Romero Jucá, acrescenta o Viomundo].

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O artigo 106, surgido no meio de um texto legal que tratava de outro tema, permite o planejamento “85 x 15”, autoriza a bipartição dos contratos entre empresas vinculadas, de forma que 85% das receitas podem ser remetidas a empresas off shore no exterior com alíquota zero.

Não consta do artigo 106 a hipótese de plataformas submersíveis, caso concreto dos contratos da Sete Brasil com a Petrobras.

Uma emenda (nº 64) é apresentada em outra medida provisória (MP 661), por aquele mesmo senador, com objetivo de incluir no artigo 106 essas plataformas.

O relator rejeita a emenda, sob o argumento de que era “jabuti” — estranha ao tema.

O problema é resolvido com a Instrução Normativa RFB 1.662/2016, que inova em relação ao artigo 106 da Lei 13.043/14, estendendo o benefício fiscal para os casos de plataformas submersíveis.

A IN RFB 1.662 é uma repetição do artigo 106, acrescido da expressão “…e plataformas submersíveis”, acolhendo a emenda do senador governista rejeitada na MP 661.

É sabido que os benefícios fiscais só podem ser concedidos por lei específica, e devem ser interpretados de forma literal, para evitar a inserção de artigos sem a devida discussão legislativa, bem como o uso de analogias para extensão indevida de benefícios tributários.

São regras do Código Tributário Nacional, que já completou 50 anos.

A Unafisco vê com preocupação sinais de que setores da cúpula da Receita Federal mostrem concordância com esse esforço para “derrubar” autos de infração constituídos pela área de fiscalização do próprio órgão.

Como explicar uma instrução normativa que inova em relação à Lei, trazendo o mesmo texto da emenda 64 do senador governista, estendendo um benefício fiscal relacionado a um planejamento abusivo que a própria fiscalização do órgão vem combatendo?

Como explicar que a Receita Federal se posicione a favor do artigo 3º da MP 795/17, que anulará autuações que somam 40 bilhões de reais?

Em manifestação emitida pelo centro de estudos (Cetad) da RFB a respeito da MP 795, em setembro de 2017, foi informada remissão de R$ 11 bilhões como decorrência do efeito retroativo dado pelo artigo 3º, valor este adotado pelo relator, deputado federal Júlio Lopes.

Em reportagem publicada pela revista Veja, a Unafisco informou tratar-se de 40 bilhões de reais em jogo.

Após essa matéria, em Nota emitida dia 30/nov, a RFB descreve o planejamento 90 x 10 e informa (fl. 11, 2º parágrafo):

“A Receita Federal passou a contestar esse tipo de contrato e a autuar as empresas. Acumularam-se autos de infração da ordem de R$ 38 bilhões.”

Por que tal informação não constava da manifestação anterior enviada à Comissão Mista da MP 795?

Essa omissão levou a erro vários parlamentares e o próprio relator, não havendo mais tempo hábil para apresentação de emendas com vistas a afastar do texto o artigo 3º.

Outra informação omitida é o desfecho das autuações.

Dos 9 autos de infração julgados pelo Carf, 8 foram mantidos, inclusive em julgamentos posteriores ao artigo 106 da Lei 13.043/14.

Ou seja: trata-se de assunto praticamente pacificado em favor da Fazenda.

Por isso, causa perplexidade a justificativa trazida pela Nota da RFB de que a regra do artigo 106 seria aplicada retroativamente:

“… a possibilidade de a Receita Federal obter sucesso na cobrança dos autos de infração já lavrados se reduz drasticamente. Isso porque, frente à nova norma, o juiz terá grande probabilidade de retroagir a regra para beneficiar o contribuinte.”

A Nota da RFB parece crer que os juízes não conheçam o princípio tempus regit actum, o qual estabelece que a lei a ser aplicada é aquela vigente à época dos fatos.

No campo tributário, não há dúvida sobre isso.

Se houver redução de uma alíquota ou a concessão de isenção para determinado fato gerador, isso vale dali para frente, e não dá direito aos contribuintes de receberem de volta o que foi pago de acordo com a regra anterior.

A chamada retroatividade benigna é exceção prevista apenas no campo penal, inclusive na legislação tributária penal.

Portanto, não há justificativa plausível para estabelecer efeito retroativo às regras do malfadado artigo 106, derrubando os trabalhos de quase uma década dos auditores da fiscalização da 7ª RF.

A RFB deveria atuar como um órgão técnico, de Estado, cuja expertise é a tributação, sendo sua obrigação posicionar-se sobre os vícios decorrentes do processo legislativo, sobretudo quando se trata de proposta de iniciativa do Executivo, e jamais como um órgão cartorial de políticas de governo.

Kleber Cabral, presidente da Unafisco, reforça que a aprovação da referida MP 795 legalizará, com efeito retroativo, um planejamento tributário abusivo que vem sendo combatido pelos auditores da fiscalização da 7ª RF há anos, que passou a permitir o envio de 85% das receitas de exploração do petróleo para o exterior com alíquota zero, em benefício de um segmento altamente lucrativo da economia.

Essa medida jogará no lixo anos de esforço da fiscalização no combate à sangria dos cofres públicos. “Como conciliar essa anistia setorizada com o discurso de ajuste fiscal e equilíbrio das contas públicas?”

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Comentários

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Alexandre

Imaginem quando souberem disso:

https://novoexilio.blogspot.com.br/2017/11/o-canto-da-casuarina-e-o-silencio-dos.html

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Julio Silveira

É impressionante o que a elite nacional conseguiu fazer com as instituições nacionais. A incompetencia aliada a arrogancia transformou todas, sem excessão, numa especie de ferramenta de exploração do povo, para degeneração da expectativa de se ter um estado minimamente isonomico, sem estarem a altura de representar um país honrado, soberano, no século XXI. Com a tradional pequenez que ela tem nos orientado com certeza seguiremos construindo nossa decadencia. E seremo vistos como um ente viciado, que perdeu o rumo, sem se dar conta que é doente, que se aprofunda no vicio acreditando ter tudo sob controle, mas com ações que o empurram mais e mais para o fundo do buraco da decadência,

Nelson

A pergunta não quer calar.

Onde é que estão as entidades empresariais, que vivem a reclamar dos impostos no Brasil? Os golpistas e corruptos estão concedendo gordíssimas isenções a grandes empresas estrangeiras – sim, você leu bem, são estrangeiras – e o mutismo tomou conta do empresariado brasileiro.

O mesmo empresário brasileiro que se derrama em lamentos, sempre tão chorão, afirmando que a carga tributária do país é muito alta, que não dá para ser empresário no Brasil, etc…, ao mesmo tempo em que acusam o funcionalismo público de viver com altos salários e mordomias e, com isso, trazerem prejuízos ao Estado e ao povo.

Nelson

Pagar impostos é coisa para os tabacudos aqui do andar de baixo. Os ditos empreendedores já descobriram que a principal receita para se tornarem empresários de sucesso, ou seja, que obtêm altos lucros, é esta: sonegação de impostos.

Quando a coisa apertar e, for preciso mesmo pagar os impostos, buscar isenções fiscais e subsídios, que serão conquistados com gordos agrados ofertados a uma quantidade suficiente dos que detêm voto nos parlamentos.

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