Helena Simões: O parto humanizado corre risco de acabar?

Tempo de leitura: 5 min

A Helena está aflita com o possível fechamento das casas de parto como a que utilizou para ter a Isis.

Por isso, deu através do Facebook a dica do seu (seu não, leitor, dela) texto a respeito:

Relato do parto da Isis*

por Helena Simões

“Elas pertencem às classes média e média alta, têm nível superior e plano de saúde. Mas, na hora de terem seus bebês, preferem recorrer a casas de parto do SUS (Sistema Único de Saúde) a contar com a megaestrutura oferecida pelos hospitais privados(…)“ Assim começa um caderno especial da Folha do dia 6 de outubro de 2005 sobre casas de parto que li quando estava no sexto mês de gestação. O artigo trazia o seguinte título: “Grávidas buscam as casas de parto como alternativa aos hospitais“.

Depois de ler atentamente a matéria, fiquei fascinada e comecei uma pesquisa pela internet. Encontrei um site sobre casas de parto no mundo e finalmente a Casa de Maria, em São Paulo, cidade na qual resido. Foi lá que nasceu minha filha Isis, no dia 2 de fevereiro de 2006.

Antes de entrar em contato com o serviço da Casa, fiz o acompanhamento do pré-natal com um médico do meu convênio. Ainda no início da gestação, me deparei com a primeira dificuldade: não queria analgesia, o que logo provocou desconforto na relação entre mim e meu médico . Além disso, no decorrer da gestação, percebi que, com grande probabilidade, sofreria uma intervenção cirúrgica, a tão popular cesariana, em nome da minha segurança e do bebê. Estava apavorada com a idéia de ser operada sem motivo, ou pelo simples fato do médico talvez estar com pressa e por isso inventar um pretexto para fazer a cesária. Como iria argumentar com um especialista da saúde, caso isso ocorresse?

Sabe-se que 80 % dos partos feitos por médicos dos seguros de saúde são cesárias, número vergonhoso para as estatísticas de saúde no Brasil. O fato é que, em nome da segurança da mulher e da criança, os médicos querem economizar tempo para realizar mais de dois partos por dia, ganhando mais das seguradoras, aumentando o tempo em suas clínicas com horas lotadas.

Esses médicos contam ainda com uma cultura do medo do parto natural por causa da dor, que leva as mulheres a preferirem escapar de um suposto sofrimento, sem considerar a dolorosa recuperação que envolve uma cesária, além de seus riscos. Lembremos também que, numa sociedade consumista como a nossa, as coisas devem acontecer rápido, como se o nascimento do filho fosse um produto de pronta entrega, que não deve ter atrasos nem contratempos.

Procuramos outros médicos do seguro e percebemos que com todos eles o problema seria o mesmo. Cheguei a ouvir de um obstetra credenciado a confirmação de que os médicos não abrem mão dos procedimentos tradicionais, como episiotomia, analgesia, indução do parto, e mesmo a cesariana, com a finalidade de reduzir o tempo de trabalho de parto, ou mesmo por não saberem como proceder sem intervencionismo. Para nós só havia duas alternativas para garantir que meu direito de ter um parto normal seria respeitado: ou eu pagava um super médico e um parto de alguns mil reais, ou ia a uma casa de parto.

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Sem todo esse dinheiro, resolvemos, meu marido e eu, desafiar a tradição dos médicos, dos seguros e das maternidades tão procuradas pela classe média em São Paulo e recorrermos a uma casa de parto.

Optamos pela casa de parto Casa de Maria, no Itaim Paulista, e não a casa de Sapopemba, também em São Paulo, por considerar aquela mais segura, uma vez que se localiza numa construção anexa ao Hospital e Maternidade Santa Marcelina. Em caso de emergência, a parturiente é transferida para o hospital em menos de três minutos, para receber os cuidados médicos necessários. O Hospital recebe repasse de verba do Estado para garantir atendimento gratuito de qualidade à população que utiliza o Sistema Único de Saúde (SUS).

A Casa de Maria existe desde março de 2002 e já ganhou diversos prêmios pelo seu projeto de parto humanizado. Ela é linda, limpa e os quartos de parto contam com toda a infra-estrutura necessária para que tudo ocorra da melhor forma para a parturiente e para o recém-nascido. A Casa tem uma equipe muito qualificada de enfermeiras obstetras (com formação superior) que durante o trabalho de parto monitoram continuamente os batimentos cardíacos do bebê e a cor do líquido amniótico, de modo a garantir que não haja riscos para a criança, mesmo num trabalho de parto prolongado.

Naturalmente, nossa decisão encontrou resistência na minha família, pois como eu poderia trocar maternidades como a Promatre ou o Santa Catarina por um serviço do SUS na periferia da cidade? Foi difícil convencê-los, mas finalmente consegui o apoio de minha mãe, que inclusive nos levou até lá quando começaram os primeiros sinais.

Na tarde em que se iniciaram as contrações, segui minha intuição e acreditei que tudo ia dar certo. Entrei na Casa de Maria, no dia 1 de fevereiro de 2006 às 20:00 horas. Estava com contrações irregulares e sem dilatação. Mas mesmo assim, a obstetriz de plantão permitiu que eu ficasse num dos quartos de parto, tendo em vista a grande distância de minha residência e conseqüentemente a dificuldade de retornar, caso o trabalho de parto evoluísse rapidamente. Assim permaneci na Casa, utilizando todos os equipamentos como a banheira de hidromassagem, a bola, a barra etc, para ver se a dilatação evoluía. De fato, mais ou menos às 5 da manhã, a dilatação chegara a cinco e estacionou em seis até às 9 horas. Foi então que a enfermeira rompeu a bolsa para acelerar as contrações, na expectativa de que a dilatação presseguisse. Ela confidenciou à minha mãe, que estava acompanhando o trabalho de parto juntamente com meu marido, que no caso de a dilatação não progredir nas 2 horas seguintes, ela me encaminharia ao hospital.

Felizmente, o rompimento da bolsa provocou o aumento das contrações e a conclusão da dilatação por volta das 12 horas.

No momento da expulsão, a obstetriz deixou a meu critério fazer ou não a episiotomia, com a ressalva de que ela o faria, se considerasse necessário.

Eu estava exausta, pois não tinha dormido nada e as dores me deixaram muito fraca. Com o apoio da equipe da Casa, do meu marido e de minha mãe, que ficaram firmes ao meu lado me ajudando a manter o controle, dei à luz a Isis às 13:37, sem cortes, sem rasgos, sem qualquer intervenção cirúrgica ou analgesia, sem exageros antissépticos, num ambiente muito aconchegante.

Após o parto, meu marido cortou o cordão umbilical, e minha filha recebeu imediatos cuidados, permanecendo por alguns minutos num berço aquecido ao meu lado, enquanto a obstetriz procedia ao parto da placenta. Ela foi examinada, pesada e medida. Depois que a placenta saiu e que eu devorei um prato de comida, Isis foi colocada nos meus braços e começou imediatamente a sugar o leite. Nasceu sabendo direitinho o que ela deveria fazer nos seus primeiros momentos de vida. Também foi o pai que depois deu o primeiro banho e vestiu nossa bebê. Ele teve o seu direito de presenciar o nascimento da nossa filha respeitado, sem pagar um tostão. Ao contrário disso, nos hospitais particulares, pais são obrigados a pagar para assistir ao parto de seus próprios filhos!

Fiquei na Casa de Parto apenas 24 horas, junto com minha filha, em um quarto coletivo com cinco leitos. Porém não precisei compartilhá-lo com ninguém, uma vez que só havia mais uma parturiente na casa, que foi alojada no outro quarto. Recebi assistência integral da equipe e orientação para a amamentação. Tudo com paciência e tempo. Uma semana depois eu estava perfeitamente recuperada, pronta para o próximo filho.

Com meu médico, provavelmente eu teria sido encaminhada para a cesária, considerando minha idade, a demora na dilatação, talvez o tamanho do bebê, que nasceu com 3,560Kg, e ainda uma voltinha do cordão umbilical no pescoço, problema resolvido pela obstetriz com muita rapidez e eficiência.

Enfrentamos agora o preconceito dos pediatras em relação à nossa escolha, embora Isis seja uma bebê linda e muito saudável (mas isso é um outro capítulo).

A experiência pela qual passamos foi muito emocionante! Sem dúvida um sentimento único na vida de uma mulher. Agradeço muito à Casa e às mulheres maravilhosas que dão literalmente uma mãozinha à grande mãe, responsável pelo nascimento de todas as espécies: a natureza.

*Texto escrito no dia 04/02/2006, dois dias após o nascimento da minha primeira filha e mandado para amigos por email

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Comentários

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Gerson Carneiro

No mês de março passado, uma amiga que mora na França, foi para o hospital parir. E optou por “parto normal”. Ficou internada no hospital aguardando a hora do parto que ocorreu 48 horas depois da internação. Aqui jamais os médicos ficam aguardando todo esse tempo.

Helena Simões

Gostaria de agradecer a você, Azenha, por ter nos cedido esse espaço aqui para debater sobre o tema. Embora alguns achem que o assunto seja irrelevante, trata-se, ao meu ver, de uma problema sério de saúde pública no Brasil. Com alguns pequenos gestos podemos começar a reverter esse quadro. Muito obrigada!

    Viviane Matias

    Oi Helena!! Estou gestante de 27 semanas, e no inicio confesso iria realizar uma cesárea, mas comecei a ler sobre parto natural e descobri a Casa de Maria. Adorei o seu depoimento sobre a casa, estou indo na próxima semana para conhece-la, como não achei um telefone para entrar e contato e tirar algumas duvidas antes de ir pessoalmente. Mas, fiquei um pouco receosa quando vc disse que as casas podem ser fechadas.
    O seu depoimento era tudo que precisava, pois minha familia também ta torcendo um pouco o nariz para a minha decisão, falando que a minhada idade (38 anos no parto), pode ser um fator que complique, mas para mim ja está decidido, isso caso nada aconteça até o nascimento da Valentina (ago/11).
    Mas desde já agradeço pois matérias assim me encorajam cada vez mais.

    Helena Simões

    Oi Viviane,
    Li seu comentário hoje, muitos meses depois. Deu tudo certo? Você conseguiu ter seu bebê na Casa de Maria?
    Abs

CC.Brega.mim

parto humanizado é incrível e as mulheres que estão aderindo estão realizando uma revolução necessária
morro de inveja, já que meus filhos nasceram de cesárea antes que eu conhecesse esses movimentos

mas estou preocupada é com a informação (ausente) que motiva o post…
as casas de parto podem ser fechadas?!?

    Helena Simões

    Olá,
    sim, CC. Há algum tempo, por exemplo, a Casa de Maria corria risco de ser fechada. Descobri, depois do parto da Isis, que o médico criador do projeto daquela casa de parto morava no meu prédio (assintindo a uma reportagem na TV, reconheci meu vizinho, veja só). Na época, ele andava bastante preocupado, pois não havia procura pelos serviços da casa. O problema perdura até os dias de hoje. Há algum tempo houve uma campanha enorme para que não fechassem uma casa de parto no Rio. Existe uma grande resistência por parte da classe médica, e também por parte das parturientes.

Samuel Antenor

Se as condições de saúde da mulher e do parto não forem adequadas, poderão ocorrer problemas, mas experiências ruins não devem servir de parâmetro para todas as outras. É preciso ter noção da diferença entre uso de tecnologia em situações delicadas e uso desnecessário de procedimentos cirúrgicos. Os fatos relatados por Helena Simões são legítimos e facilmente comprovados, visto ser de conhecimento público o comportamento de diversos profisionais e equipes médicas nos hospitais particulares e conveniados. Parto normal é algo previsto no código genético. E, como tudo na natureza, pode envolver riscos. Ainda assim, o direito de tentar dar à luz de maneira natural não tem sido garantido a todas as mulheres, visto que a humanização do parto requer insistência da parturiente e quebra de resistência dos profissionais, que insistem em procedimentos invasivos na maioria dos hospitais particulares.

    Helena Simoes

    Pois é, Samuel amigo querido, o problema é a cultura que se desenvolveu no país. O Governo Federal, há uns três anos, promoveu uma campanha tímida com a Fernanda Lima falando sobre o parto normal dos filhos gêmeos. Sem dúvida, melhor uma campanha tímida do que nenhuma. Mas até hoje não entendo por que não foi levada a diante. Who knows… A campanha contra deve ser maior. Porém fico pensando no agreste, os interiores do nordeste e outras regiões, onde a parteira ainda é tratada com respeito por todos, com um papel importante nas comunidades. Nesses lugares, o direito é garantido, já que a cultura é do parto domiciliar. Mas claro, a arrogância médica nas capitais do país prevalece e com ela a ignorância de quem nem quer conhecer os benefícios do parto natural.

Aline C Pavia

Se morasse na Europa ou nos EUA vc não poderia fazer essa escolha, Maria.

Dr Marcelo Silber

Continuando…Assim diminuiria muito as possibilidades de toco-traumatismos e intercorrencias graves como anoxia neonatal,paradas cardio-circulatorias do RN que quando presentes, transformam a criança nascitura em um paciente gravíssimo para a vida toda…
Mas acredite,nos paises em que existe parto humanizado com transporte presente sempre que necessário em UTIs móveis (Dinamarca, Suécia e Inglaterra) a incidência de parto normal é superior a 90% por cento, com baixa incidencia de complicações materno-infantis e com grande economia para o Estado!!!!
Grande abraço a ti e Parabens pela sua coragem!!!!
Dr Marcelo Silber

    Helena Simões

    Acabei não vendo o seu post acima. Fiquei curiosa :-): você é obstetra?
    E fica uma pergunta que não se cala: partindo do seu raciocínio, você claramente demonstra que seria vantajoso para o Estado. Mas por que não se investe nisso?
    Agradeço o carinho,
    Helena

Dr Marcelo Silber

Cara Helena
Muito interessante o seu relato.Tema difícil, apaixonante e complexo, mesmo para " profissionais da área" como eu. Formado na Faculdade de Medicina da USP, Residencia no Instituto da Criança do Hospital das Clinicas da USP em Pediatria e Neonatologia e trabalhando como assistente da USP (berçario do Hospital Universitário-USP) e da Unidade Neonatal do Hospital Albert Einstein, vivo os "varios lados" desta fascinante moeda. Sem maiores delongas te digo. Já participei de inumeros "partos domiciliares" e eles sâo até melhores que os das excelentes casas de parto relatadas por você, porem EM TODOS os casos deve haver uma excelente possibilidade de atendimento neonatal, PRINCIPALMENTE COM POSSIBILIDADE DE TRANSPORTE AS UTIs NEONATAIS MAIS PRÓXIMAS e com NEONATOLOGISTA SEMPRE PRESENTE.

    Helena Simões

    Caro Dr Marcelo,
    Penso que o parto domiciliar seja realmente uma ótima opção. Na Holanda, por exemplo, creio que 50% dos partos sejam domiciliares (por favor, reveja esse número, pois não o tenho exato na mémoria). Na Alemanha, país no qual morei 8 anos, os partos domiciliares são muito comuns. Tenho várias amigas que tiveram seus filhos em casa. O interessante é que nesses países, países de primeiro mundo, as crianças nascem com a parteira e no máximo uma doula.
    Sei de um médico que faz partos em casa, sozinho (Dr Walter, muito conhecido por quem prega o parto domiciliar), a Vilma, também conhecida, e praticante de parto domiciliar na Comunidade Monte Azul, na zona Sul de São Paulo. Os dois fazem seu trabalho por preços ao alcance da maioria. Um parto no estilo descrito acima é feito pelo astro dos astros, Dr Jorge Kuhn. Tenho uma amiga que fez dois partos com ele no apartamento dela. Ele vem acompanhado de uma equipe de umas três ou quatro pessoas. Não sei bem quanto está custando agora, mas imagino que seja uns 15 mil reais. Ótimo, um parto com poucos riscos, não é? Mas a uma contradição no que se prega e o que se cobra. O preço é quase desumano :-) A Vilma deve cobrar uns 1000 reais, no máximo, para quem pode pagar. Na favela, faz de graça. Pois é, fica o Jorge Kuhn para os ricos, e quem não quer gastar isso, mas quer garantir seu parto humanizado com a segurança hospitalar por perto, vai para a casa de parto, onde afinal há uma equipe para atender eventuais ocorrências que possam levar a criança a algum risco de vida. Foi esse o meu caso. Eu queria ter em casa, mas não fui apoiada por meu marido. Então procurei um meio termo, o parto humanizado com segurança. Afinal, não é todo mundo que tem dinheiro para ter um Jorge Kuhn ao lado em quanto a parturiente faz o trabalho (o médico ou a parteira orientam).

Eliane

Apesar de não ter filhos, fiquei surpresa ao ouvir o relato de minha prima. Liana, grávida da primeira filha, morava em Salvador (em 2007) e desde o começo da gravidez decidiu pelo parto normal. Na hora do nascimento ela foi acolhida na maternidade agendada pela sua ginecologista-obstetra, com quem fez o pré-natal. Para surpresa da família, a sala onde ela deu a luz ficou lotada de médicos e enfermeiras, pois o último bebê nascido de parto normal naquela maternidade já tinha 4 anos de idade. Cecília nasceu com plateia formada por médicos, enfermeiras e técnicas de enfermagem que trabalhavam lá, muitos nunca tinham visto um parto normal.

daniela

Com a minha primeira filha tinha tudo pra ser um parto tranquilo mas foi uma cesária horrível e quase que a perdi em decorrencia da referida cirurgia. A segunda, pari em casa, com tranquilidade. No Brasil onde grávida é doente, gravidez não é fisiológico e médicos decidem as vidas das mães que ficam passivas, parto humanizado é quebra de paradigma.

@luribra

Bom, como pediatra gostaria de dizer o seguinte: parto normal é muito melhor tanto para o bebê quanto para a mãe. Ponto. Não há mais discussão a respeito. Não vou entrar no mérito dos fatores sócio-econômico-culturais que levaram à absurda prevalência de cesáreas no nosso país pois é uma discussão árdua, difícil, multi-fatorial e que foge ao escopo principal desse post. Minha mensagem é a seguinte: parto é um evento imprevisível, na enorme maioria dos casos transcorre sem quaisquer problemas, com ou sem médico. Só que em uma pequena porcentagem dos casos que complicam, caso não haja um obstetra e/ou pediatra imediatamente disponíveis pode haver complicações graves tanto para a parturiente quanto para o bebê. Quando digo imediatamente é segundos mesmo, não adianta ter uma casa de partos pertinho do hospital, o tempo para transporte e início dos procedimentos adequados é mais do que suficiente para a ocorrência de sérias complicações na mãe e principalmente na criança. E isso pode ocorrer mesmo com pré-natal adequado, exames normais e ausência de quaisquer fatores de risco. Daí eu ser favorável ao chamado parto humanizado mas não fora de ambiente hospitalar. O relato do parto da Ísis é emocionante, mas imagino o que estaria sentindo se tivesse uma complicacão imprevista e agora estivesse com um bebê com uma paralisia cerebral grave ou coisa pior. Agora, se a sociedade acha que o (como disse, pequeno) risco vale a pena dados os benefícios já relatados, tudo bem.

    Helena Simões

    O problema, caro Aluribra, não é o hospital, mas os procedimentos tradicionais realizados dentro dele. A grande maioria dos médicos credenciados aos seguros não está disposta a seguir os procedimentos do parto humanizado (o São Luiz, por exemplo, tem uma sala de parto humanizado subutilizada- aliás é um dos hospitais que mais se pratica a cesária). Fui a diversos médicos e não encontrei nenhum profissional disposto. Poderia ter procurado médicos adeptos do parto natural, e até poderia citar nomes de verdadeiras celebridades da área que cobram até 15 mil reais por um parto natural (???).
    Com meu segundo filho, mudei de médico. Contei logo na primeira consulta quais seriam minhas expectativas em relação ao parto dele (sem anestesia, episiotomia e etc). Ele disse que sem a episiotomia, ele não teria razão de estar presente durante o parto. Ora, então a presença médica não é para garantir condições saudáveis para a parturiente e para o bebê, mas sim para "meter a faca"?. No fim, fomos nos entendendo e acho que ele aprendeu bastante com nossa convivência: fez o parto sem episiotomia e muito feliz disse que estava se sentindo numa casa de parto.
    Isis poderia ter tido uma paralisia cerebral, mas quantos casos de paralisia não acontecem no ambiente hospitalar? Aliás, proporcionalmente, há mais casos de nascimentos com complicações em hospitais, do que em casas de parto.

    @luribra

    Como escrevi antes, o problema da prevalência das cesáreas é bastante complexo, chegamos nesse ponto devido a vários fatores (embora a maior parte das pessoas se satisfaçam com esse maniqueísmo de achar que é porque os médicos são mercenários e pronto; quando vejo o que um pediatra ganha de um convênio para assistência em sala de parto não sei se rio ou choro desses iludidos) e acho que não cabe iniciarmos uma longa discussão sobre isso aqui. Desculpe mas seu argumento quanto à paralisia cerebral, embora baseado em dado correto (paralisias cerebrais são mais prevalentes em hospitais), chega a conclusão errônea (ter filhos em casas de parto reduz risco de paralisia cerebral). O que ocorre é que casas de parto normalmente não aceitam gestantes com fatores de risco (diabete, cardiopatias, infecções, etc) para esse tipo de complicação bem como diversas outras. Logo, a quase totalidade desses partos ocorrem nos hospitais onde muitas vezes, em que pese a melhor capacitação possível da equipe médica e de enfermagem (e sim, infelizmente tenho plena consciência de que boa parte dos hospitais não dispõe disso), o resultado acaba sendo ruim. Meu ponto é que nos casos em que ocorrem complicações imprevisíveis há uma chance muito maior de serem revertidas em ambiente hospitalar do que em casas de parto, se um bebê entra em sofrimento fetal agudo grave, por exemplo, pode anoxiar em questão de minutos e ter sequelas graves pelo resto da vida, supondo que sobreviva. Entendo e compartilho da sua preferência por um parto normal e humanizado, só gostaria de lembrá-los que esse mesmo parto hospitalar (feito por obstetras e pediatras, suporte quando necessário de UTI, analgesia, etc) tão demonizado é um dos responsáveis pela redução maciça da mortalidade neonatal nas últimas décadas.

    Aline C Pavia

    Gisele Bundchen é a top model mais rica do planeta e teve o nenê dela em casa, com parteira, numa banheira.

    Fernanda Lima teve gêmeos por parto natural.

    Vera Viel – esposa do Rodrigo Faro – teve os três filhos em casa, com parteira.

    Mulheres com dinheiro, informações, condições, discernimento, fizeram essa opção. Por que será? Por modismo?

    Enquanto isso fora capitais e cidades metropolitanas, a mulherada continua tendo os filhos em casa, com parteiras, doulas e curiosas. Estou pensando seriamente em me mudar para alguma vila ribeirinha em Rondônia, a pelo menos 2 dias de barco de distância de qualquer posto ou maternidade ou hospital.
    Porque acho que lá na vila serei mais bem-atendida e respeitada no meu direito a um parto normal, natural, vaginal, saudável, do que em pleno centro da Capital paulista.

    Mas cesárea é tão bom né? Tudo acaba em 2 horas e não há dor nenhuma! Uma beleza!

silvia

Meu parto foi normal por escolha minha e o obstetra respeitou isso. A maternindade também era reconhecida por praticar parto humanizado e eu tive um atendimento de primeira por parte da equipe. Mas conheço casos de mulheres que escolheram fazer o parto normal em maternidades que dizem que realizam parto humanizado, mas na verdade acabam largadas na sala de pré-parto, sofrendo muito, sem direito a acompanhante e sem atendimento adequado do profissional de saúde. O parto normal acabou virando um trauma para essas mulheres, quando deveria ser o contrário. Sou totalmente a favor das casas de parto.

    Helena Simões

    Silvia, tive meu segundo filho na ProMatre. Foi uma experiência ruim. Na realidade, queria ter tido Vinicius na Casa de Maria, mas após romper a bolsa no meio da noite, entrei em trabalho de parto com contrações fortes de dois em dois minutos. Ficamos com medo de não conseguir chegar até o outro lado da cidade e ter o bebê no carro.
    Vinicius nasceu, mamou, e foi levado. O pai não foi perguntado se queria dar o primeiro banho. Sumiram com o neném. Eu fiquei esperando para ser trasferida para um quarto durante quase 7 horas, sozinha, sem bebê e sem direito à família. Reclamei várias vezes e diziam que a maternidade estava lotada e que eu tinha que esperar no quarto de parto (não era permitido trazer o bebê para aquele quarto). Já me perguntei se não teria sido melhor ter arriscado de ter meu filho no carro. Pelo menos teríamos chegado juntos à Casa de Maria e lá teríamos sido acolhidos de forma mais humanizada.

rennerocha

Nesse post é contado o relato de um brasileiro que mora no Holanda a alguns anos sobre como é feito o atendimento público de saúde para grávidas: http://www.ducsamsterdam.net/gravidez-na-holanda-

No meio do texto é possível ver as opções para realizar o parto (a cesárea não é uma opção e realizada somente se realmente necessário). Lá também existem casas de parto.

Valdeci Elias

Em 2005, quando minha esposa estava gravida do 2 filho, fizemos um curso de pré natal. Pra minha surpresa, o curso não tratou tecnicas de respiração, pra ajudar no parto. O curso tratou de assuntos da grávidez, ou da criança rescem nascida. Era como se o parto natural não existice. Como o hospital era particular, eu achei que eles queriam induzir o parto cesaria.

    Helena Simões

    Valdeci,
    todos os curso para os casais nos hospitais tratam só de higiene e cuidados com o bebê e a mãe. Não existem mais os cursos que ensinam, por exemplo, a mulher a fazer a respiração "cachorrinho" e mostram ao pai, como ajudar a esposa de forma que ela possa usar a força melhor ou como segurá-la para parir a criança. Eles não o fazem, pois não há uso dessa técnica. E pense, isso é muito coerente, pois a cesária não necessita de preparos. O pior é que eles cobram por esses cursos, e caro.

Aline C Pavia

No Japão, EUA e Europa o obstetra pode até ter seu registro profissional cassado, e até mesmo ir para a cadeia se faz uma cesárea eletiva. A chamada "desnecesárea".
Leiam no Parto do Princípio o relato de uma italiana que fez um parto desassistido: sozinha, na beira de uma praia deserta. O bebê nasceu na posição de cócoras, dentro do mar, e após alguns instantes a moça cortou ela mesma o cordão umbilical. Saiu da praia andando, nua, com o bebê nos braços, após a expulsão da placenta.
Até os idos de 1960-1970 não havia ultrassom. Minhas roupinhas de nenê eram todas azuis, amarelas e verdes, pois a família toda achava – pelo formato da barriga da minha mãe – que eu era menino. Nasci após 17 horas de trabalho de parto, de fórceps, fiquei uns dias com cicatrizes feias na testa e na cabeça. E daí? É disso que a mulherada tem tanto medo?
O fato é que ainda vivemos na Inquisição. Muita gente tem medo e resiste a uma mulher que deseja ser a protagonista do próprio parto. É absolutamente angustiante para os terceiros envolvidos em um parto, saberem que estão ali à toa, se a mulher assim o decidir.

    Aline C Pavia

    Minha prima teve a filhinha dela em um postinho em Votorantim, pelo SUS. 9 consultas e 3 ultrassons na gravidez, e foi só. O parto durou 18 horas e ela pôde tomar chá e comer bolo de fubá durante o trabalho de parto. A neném nasceu sem nenhuma complicação, num ambiente tranquilo e alegre, com a ajuda de enfermeiras e auxiliares que se revezaram no atendimento.
    O ministério da saúde paga 100 por um parto normal e 500 por uma cesárea, então aí o jogo é de compadres – ministério, convênios, SUS, Conselho federal de medicina, o corporativismo de sempre, além do profundo ódio que os profissionais da saúde têm pela mulher que "chora e grita como criança no parto" – "não chorou nem gritou na hora de fazer, então agora na hora de parir não tem porque chorar nem gritar nem chamar a mamãezinha"

    Aline C Pavia

    Por fim para acrescentar mais um elemento de reflexão nesse debate – absolutamente infrutífero no Brasil, as mulheres e a nossa própria cultura acham estranho, sujo, inexplicável e até mesmo desnecessário o nascimento de uma criança pela vagina – lhes envio um vídeo LINDO de um parto humanizado em Barcelona, na Espanha. É um comercial de uma marca de camas. A mãe tira a filha do próprio ventre, acompanhada apenas pelo marido, pelo filho mais velho e pela "comadrona" – parteira ou doula.
    http://www.youtube.com/watch?gl=BR&v=KLBTZMes

    Há 300 mil anos nós fêmeas de Pitecos e Homo erectus e sapiens temos nossos filhos pela vagina, com dor, com algo de sangue, após horas e até dias a fio de trabalho – dilatar bacia, descer a criança, acomodar o canal vaginal, abrir a pelve e a virilha – por isso que tudo isso é móvel, dentro do organismo da mulher – é tudo perfeito para qualquer mulher ter seu filho assim, ainda hoje. O único momento em que a mulher tem de estar absolutamente conectada consigo própria – e alheia a todo o resto em redor – para poder dar à luz. Um processo natural e bonito aqui no Brasil é mera mercadoria, moeda de troca, sem perspectiva de mundança a curto e médio prazos, a julgar pela qualidade dos cursos de medicina do país.

    Quem sabe tendo uma mulher, mãe, avó, na presidência, isso não começa a mudar? Quando Dilma terá coragem de botar a mão nesse vespeiro onde mamam muitas tetas? Quando Dilma baixará diretrizes REAIS e PUNITIVAS a SUS, convênios, conselho de medicina e maternidades, que continuarem empurrando "desnecesáreas" por nossas goelas abaixo, às custas do nosso dinheiro?

    Licia

    Obrigada pelo vídeo !
    Muito emocionante !

    Sergio F. Castro

    Há mais de três decadas atrás assisti um filme de um parto natural (quando fazia pré vestibular, meu prof. de biologia era médico obstetra, e também um excelente mestre) e, desculpem-me, achei horrivel. Foi uma experiencia positiva pois me fez desistir de qualquer intenção de cursar medicina, não acho a cesariana superior ao parto natural, mas considero este debate irrelevante, meus dois filhos nasceram de cesarea e são fortes e saudaveis, portanto que estas tentativas de forçar a barra (tipo proibir a decisão dos pais) não passam de uma espécie de fascismo politicamente-correto recheado de palavras de ordem ideológicas (a amamentação natural é outro ponto), cada caso é um caso a ser considerado e decidido por quem de direito (com a devida assessoria de um médico), OS PAIS! e mais ninguém.

Licia

Há 30 anos, pari gêmeos, no hospital, num parto normal e natural (de cócoras) aos 6 meses e 20 dias. Quando relato minha experiência, muitos ginecologistas me olham desconfiados, como se eu estivesse "inventando"… Hoje em dia se você estiver grávida de gêmeos, já tem 100% de indicação de cesárea. Aqui em Natal, onde moro atualmente, não conheço ninguém que tenha tido parto normal nos últimos anos, mesmo tendo se preparado para tal durante toda a gravidez ! Chega na hora H, o obstetra diz que o bebê está em sofrimento (está com o cordão enrolado no pescoço, ou é muito grande, ou não encaixou, etc.) e que infelizmente vai ser "obrigado" a fazer cesárea. A Mãe, num momento de “super fragilidade” aceita sem pestanejar… E depois os pais ainda ficam agradecendo ao médico como se ele fosse um Deus que salvou a todos ! É muita hipocrisia ! Um momento tão sublime, transformado em uma cirurgia ! E ficamos assistindo ao fechamento de Casas de Parto e de cursos especializados de obstetrizes, sem dar a mínima para as recomendações da ONU (máximo de 15% de cesáreas). O Ministério da Saúde recomenda que o parto humanizado seja priorizado, mas só recomenda… Não fiscaliza, não incentiva e nem oferece condições para tal, permitindo que os planos de saúde determinem que nossas crianças serão extraídas e não paridas !
Parabéns Helena, por ter lutado para parir a Isis ! Saúde !

    Helena Simoes

    Licia,
    a primeira pediatra para qual levei a Isis acabou comigo! Disse que era uma grande irresponsabilidade o que eu tinha feito e que eu tinha MUITA sorte de ter uma filha saudável. Ficou uns quinze minutos da nossa primeira consulta me desrespeitando em nome da segurança do bebê. Eu tentei argumentar, mas a postura dela como autoridade no assunto era de surdez aguda. Ela nem ouvia o que eu dizia e ficava balançando a cabeça para os lados. Tentei mais uma vez e na consulta seguinte ela me chamou disse que percebia que eu era "alternativa" e que provavelmente seria adepta da homeopatia- "medicina de charlatões" (agora me dá vontade de rir). No final da consulta me despedi… para sempre.
    Parabéns pra você também, pois parir um já é difícil, agora dois… Você é heroína em dobro!

giovanni gouveia

Vai chover médicos dizendo que é um absurdo um parto acontecer sem acompanhamento médico…
Quem faz o parto é a mulher, da mesma forma que meu corpo faz o coração bater. Havendo algum problema, sim o médico deverá ser consultado, não havendo problema não tenho por que fazer uma cardioplastia para manter o coração batendo, ou TER que ter um médico do lado na hora do parto(que via de regra não sabe, ou não quer, partejar)
Bela história, Helena e Isis. Parabéns!

    Helena Simões

    Caro Giovanni,
    como respondi a alguém mais acima, o médico que fez o pré-natal do meu segundo filho, ficou muito angustiado quando disse que queria um parto sem episiotomia e sem analgesia. Ele disse, então, que se ele não fizesse a episiotomia, ele não teria razão de estar por perto na hora do parto. Fiquei olhando para ele em silêncio, e disse: "pois é"- o que eu estava pensando: "Mas quem faz o parto, caramba?". Com o tempo fomos nos entendendo. Mas os obstetras devem mesmo rever seus conceitos. Eles se sentem inúteis frente aos procedimentos humanizados. Obrigada!

Mário

Pior é que não dá nem pra dizer que isso é coisa do capitalismo, pois mesmo no Japão e nos Estados Unidos os partos naturais suplantam em muito as cesárias. O que acontece no Brasil, em relaão a essa política de priorização das cesárias é um misto de preguiça e delinquencia (dos responsáveis pelos planos de saúde e dos médicos).

Pedro

O mais triste dessa história é ver cursos como o de Obstetriz na USP Leste, que possui qualidade e preza pelo parto humanizado, ser defenestado pelo COREN/COFEN e estar ameaçado de fechar. São dezenas de profissionais altamente capacitadas em suas áreas tendo que mudar de profissão.

    Helena Simoes

    Pedro,
    eu não conhecia essa informação. Muito triste mesmo. Vou pesquisar sobre o assunto. Obrigada!

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